Mudança na distribuição do Fundo de Arrecadação de Custas do judiciário gera debate entre entidades
A possível alteração na distribuição percentual do Fundo de Arrecadação de Custas Cartorárias tem gerado intenso debate entre órgãos públicos. O projeto de lei, que aguarda sanção do governador Jerônimo Rodrigues (PT), propõe aumentar de 1% para 4% a participação do Ministério Público da Bahia (MP-BA) nas receitas cartorárias, reduzindo de 13,2% para 9,2% a fatia destinada ao Fundo Especial de Compensação (Fecom).
Enquanto o MP-BA defende a medida como essencial para a autonomia financeira do órgão e ampliação de ações de interesse público, o Fecom e associações cartorárias alertam para riscos à gratuidade de serviços essenciais e à manutenção de cartórios deficitários. Dados apresentados ao Executivo, para o encaminhamento do projeto à Assembleia Legislativa da Bahia (AL-BA), mostram que entre 3% e 20% de custas cartoriais são utilizados para repasses ao MP dos respectivos estados.
Houve, então, o início de uma batalha de versões. Enquanto defensores do projeto argumentam que o superávit acumulado teria sobrevida pelo menos até 2030, ainda que não houvesse ampliação das arrecadações, os críticos sugerem que a mudança na legislação vai tornar inviável a manutenção de serviços gratuitos e de cartórios deficitários. Os primeiros asseguram que o Fecom manterá suas obrigações legais previstas, e os segundos querem impedir que a medida entre em vigor.
Documentos obtidos dos relatórios anuais do Fecom entre os anos de 2022 a 2024, através do portal da transparência, bem como projeções da Secretaria da Fazenda (Sefaz), obtidos por fontes ligadas ao BN, mostram que o fundo acumulou superávit acima de R$ 30 milhões em dois anos. As mesmas informações projetam um saldo de caixa de R$ 280 milhões até 2025. Em 2023, por exemplo, as despesas foram de R$ 32,8 milhões, enquanto as receitas somaram R$ 177,7 milhões, indicando folga financeira.
Além disso, o superávit acumulado no Fecom não possuiria justificativa, já que o fundo não tem finalidade de represar recursos, mas de custear serviços específicos. Reajustes anuais de custas cartoriais, bem como a adoção de políticas de regularização fundiária desenvolvidas pelo Estado da Bahia e por municípios, gerariam a manutenção de projeções positivas de arrecadação para todos os beneficiários com a legislação proposta.
Foto: Reprodução / Portal da transparência Fecom
Foto: Reprodução / Portal da transparência do Fecom
Segundo as associações cartorárias a redução percentual pode, a longo prazo, comprometer a sustentabilidade do fundo. Eles citam projeções internas que indicam que, sem crescimento na arrecadação, o saldo cairia para R$ 42 milhões até 2030. Porém, análises técnicas da Sefaz, as quais o Bahia Notícias teve acesso, apontam que com crescimento anual de 10% na arrecadação, abaixo da média de 17%, o fundo se manteria estável.
Porém, chama atenção o fato que o site oficial da transparência do Fecom não exibe todas as fontes de receita que eram divulgadas anteriormente, como receita excedente do teto, resultado líquido e resultados financeiros de investimentos. Atualmente, na área de transparência do Fecom aparecem apenas as receitas com arrecadação, o que equivale aos 13,2% das custas cartoriais. No entanto, prints de anos passados comprovam que esses dados já foram públicos, incluindo detalhes sobre aplicações e rendimentos que hoje não estão disponíveis.
Veja:
Foto: Reprodução / Portal da transparência do Fecom
Foto: Reprodução / Portal da transparência do Fecom
Aprovado subitamente na AL-BA, o projeto foi encaminhado pelo Executivo no dia 16 de junho, véspera da apreciação pelos parlamentares. Desde então, associações e entidades ligadas ao sistema de cartórios têm buscado entes como o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), a seção Bahia da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-BA) e até mesmo deputados para tentar evitar que o texto seja sancionado na íntegra por Jerônimo. Todavia, a matéria veio do próprio Executivo, tornando qualquer veto incomum.