Com relatoria de conselheira baiana, OAB aprova ingresso como amicus curiae em ação contra violência doméstica
O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) aprovou, por aclamação em sessão do Conselho Pleno realizada na segunda-feira (25), em Brasília, o ingresso da entidade como amicus curiae na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1.242. A ação, ajuizada no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo Instituto Nós Por Elas (NPE), denuncia inconstitucionalidade estrutural e persistente na atuação do Estado brasileiro no enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher. A relatoria da proposta foi da conselheira federal pela Bahia, Mariana Oliveira.
Em seu voto, a conselheira Mariana Oliveira acatou a proposta da Procuradoria Constitucional da OAB. Ela destacou que a participação da Ordem na ação visa "contribuir tecnicamente com a delimitação do objeto da ADPF às medidas de competência da União, com diretrizes, metas, indicadores e mecanismos de financiamento e governança bem definidos, bem como a previsão de cooperação interfederativa para execução capilar das ações".
A relatora enfatizou a necessidade de construção de um Plano Nacional de Enfrentamento à Violência de Gênero, com recorte claro no âmbito federal. Ela defendeu a organização das recomendações em eixos estratégicos: prevenção e transformação cultural, serviços de proteção e resposta integrada, enfrentamento às violências mediadas por tecnologia e governança com financiamento estável. Oliveira também citou a necessidade de criação, pelo Executivo federal, de "um portal de dados abertos para monitoramento e avaliação, garantindo transparência, participação e auditabilidade".
A presidenta da OAB-BA, Daniela Borges, que participou da sessão, parabenizou a OAB Nacional pela decisão. "Tenho orgulho de ver nossa conselheira Mariana Oliveira como relatora dessa proposta, trazendo uma contribuição técnica e sensível, que fortalece a luta por um Brasil mais justo e seguro para todas as mulheres”, afirmou.
Mariana Oliveira, que também preside a Comissão Nacional de Direitos Sociais da OAB, argumentou que "sem que haja uma uniformização nacional de medidas, com estruturação da execução e monitoramento das ações propostas e com definição ou alocação orçamentária, dificilmente serão alcançadas as mudanças estruturais necessárias a mudar o Estado de Coisas Inconstitucional".
Em seu voto, ela defendeu que a elaboração de um plano nacional com interseccionalidade racial representa uma "solução estruturante" por proporcionar interação ampla entre os Poderes Públicos e a sociedade, englobar o planejamento nacional com regramentos orçamentários, identificar problemas regionalizados e estabelecer convênios com a administração pública estadual.
A proposta foi ratificada pela Procuradoria Constitucional do CFOAB e pelas Comissões Nacionais da Mulher Advogada, dos Estudos Constitucionais, de Direitos Sociais e de Política Criminal. O parecer da Comissão Nacional da Mulher Advogada, anexo ao voto, apresentou o recorte racial, argumentando que “a generalidade do tratamento da violência doméstica e contra a mulher, sem qualquer interseccionalidade racial, despreza as condições que fazem com que mulheres negras representem o maior percentual de vítimas nas estatísticas examinadas, em praticamente todas as regiões do país”.
As comissões nacionais da Mulher Advogada e de Estudos Constitucionais citaram em seus pareceres o Tema 1370 do STF, defendendo que “esse olhar sobre as repercussões econômicas e de implicações na inserção e/ou manutenção no mercado de trabalho torne-se parte integrante de toda e qualquer discussão ao derredor do Estado de Coisas Inconstitucional na prevenção e combate à violência doméstica e de gênero, pois já não se permite que a realidade econômica dessas mulheres seja ignorada”.
A Comissão Nacional de Direitos Sociais classificou a violência contra mulheres e meninas no Brasil como "estrutural, ligada a padrões históricos e culturais", exigindo um enfrentamento igualmente estrutural. A Procuradoria Constitucional do CFOAB afirmou, em suas considerações, que “a urgência e a importância do tema não são minoradas ou desprezadas pela afirmação da necessidade de clareza na definição do objeto do Plano Nacional e na identificação dos agentes envolvidos na deliberação e na execução dos projetos dele decorrentes”.
Durante a sessão, conselheiros federais e membros honorários vitalícios, incluindo Cezar Britto e Ophir Cavalcante, manifestaram-se, classificando o momento como histórico e entendendo que a medida é "não apenas legítima, mas necessária".