A última glória do Ypiranga: o adeus dourado do terceiro maior campeão do futebol baiano
Por Thiago Tolentino
Em 1951, Salvador ainda respirava os ares nostálgicos do futebol romântico. Arquibancadas de madeira, rádios de válvula, camisas de botão e torcidas apaixonadas compunham o cenário de um campeonato baiano acirrado. Foi nesse ambiente que o Esporte Clube Ypiranga, o "Mais Querido", escreveu o último capítulo de glória de sua história centenária. Com campanha memorável, o clube aurinegro levantou seu décimo título estadual, que até hoje permanece como seu último troféu de campeão baiano.
A conquista marcou o fim de uma era. Fundado em 7 de setembro de 1906, o Ypiranga já havia sido uma potência do futebol baiano. Nas décadas anteriores, rivalizou com Vitória e Bahia, empilhando taças entre os anos 1910 e 1940. Em 1951, porém, já vivia sob a sombra do crescimento meteórico do Tricolor e das reestruturações do Rubro-Negro. Ainda assim, a equipe comandada por técnicos e dirigentes locais surpreendeu os favoritos e levou o título para a Vila Canária.
O campeonato foi decidido em pontos corridos, e o Ypiranga terminou à frente de Bahia, Vitória, Botafogo e Galícia. Em campo, nomes como Nadinho, Tará, Mário e Duque escreveram suas trajetórias como heróis do Aurinegro Baiano. A solidez defensiva e a regularidade da equipe também ficaram marcadas na campanha, que teve vitórias decisivas sobre os rivais diretos e a consagração do clube como o segundo maior campeão baiano até então, com 10 taças conquistadas.
A estreia na competição foi no dia 22 de abril, quando o Ypiranga empatou com o Guarany em 1 a 1. Chaves marcou para o time amarelo e preto. No segundo compromisso, 5 de maio, o Ypiranga sofreu sua única derrota na campanha regular: perdeu por 2 a 0 para o Galícia.
A recuperação veio em grande estilo no dia 20 de maio, com uma goleada por 5 a 0 sobre o Vitória — uma das atuações mais marcantes daquela temporada. Os gols foram de Chaves, Raimundo II e Marito. O time seguiu firme e arrancou mais um ponto importante ao empatar por 1 a 1 com o Bahia no dia 3 de junho, na Fonte Nova. Carlito marcou para o Bahia, enquanto Marito empatou para o Ypiranga.
A sequência teve novo brilho no dia 20 de junho, com um sonoro 6 a 1 sobre o São Cristóvão. Israel marcou três gols (hat-trick), enquanto Raimundinho, Novinha e um gol contra fecharam o placar. No dia 28 de junho, o Ypiranga empatou com o Botafogo em 1 a 1. Chaves novamente balançou a rede.
Classificado para a fase decisiva, o aurinegro confirmou o título no dia 10 de fevereiro de 1952, ao empatar com o Vitória por 1 a 1. Juvenal marcou para o rubro-negro, e Raimundinho garantiu o gol do título do Ypiranga. Relembre abaixo todas as partidas disputadas pelo Ypiranga:
- 25/04 - Guarany 1x1 Ypiranga
- 05/05 - Ypiranga 0x2 Galícia
- 20/05 - Vitória 0x5 Ypiranga
- 03/06 - Bahia 1x1 Ypiranga
- 20/06 - Ypiranga 6x1 São Cristóvão
- 28/06 - Ypiranga 1x1 Botafogo
- 08/08 - Guarany 1x1 Ypiranga
- 22/08 - Galícia 1x1 Ypiranga
- 05/09 - Vitória 1x1 Ypiranga
- 23/09 - Bahia 1x1 Ypiranga
- 13/10 - Ypiranga 2x1 São Cristóvão
- 20/10 - Ypiranga 1X0 Botafogo
- 02/12 - Ypiranga 2x2 Guarany
- 16/12 - Ypiranga 2x1 Galícia
- 30/12 - Vitória 2x2 Ypiranga
- 10/01/52 - Bahia 0x3 Ypiranga
- 23/01/52 - Ypiranga 2x0 São Cristóvão
- 30/01/52 - Ypiranga 4x2 Botafogo
- 10/02/52 - Vitória 1x1 Ypiranga (grande final)
A base titular da equipe campeã era formada por: Ferrari; Pequeno, Valder; Zizo, Valter, Raimundo I; Raimundo Mário, Chaves, Novinha, Israel e Raimundinho.
Montagem: Thiago Tolentino/Bahia Notícias
CURIOSIDADES
Naquele 1951, o Brasil também vivia um momento de reconstrução após o trauma do Maracanazo. O futebol local ganhava novo fôlego com estádios lotados e rivalidades inflamadas. E o Ypiranga, fundado por operários e comerciantes da Cidade Baixa, se impôs como símbolo de resistência e identidade popular.
Foto: Arquivo Nacional
No mesmo ano, também foi comemorado o primeiro título estadual na Fonte Nova, tendo em vista que a praça esportiva, hoje comandada pelo Bahia, também havia sido fundada em 1951.
PÓS-CONQUISTA
O brilho não duraria por muito tempo. Após o título, o clube enfrentaria dificuldades financeiras, perdas de jogadores e o gradual afastamento dos holofotes. O profissionalismo crescente no futebol, as mudanças no calendário e a concentração de recursos nos clubes maiores foram barreiras para o Mais Querido. A partir dali, o Ypiranga nunca mais voltaria a disputar um título estadual. O que restou foi a saudade, a mística e um legado que o tempo tenta apagar, mas que a memória resiste em preservar.
Hoje, mais de sete décadas depois, o Esporte Clube Ypiranga segue na luta pela reconstrução. Comandado por novos gestores e presente na segunda divisão do futebol baiano, a Squadra Sports, empresa comandada pelo ex-presidente do Bahia, Guilherme Bellintani, sonha com o retorno à elite.
Foto: Click Mirtis/E.C Ypiranga
Mesmo que o cenário presente seja de recomeço, o passado remete à grandeza: em 1951, o Ypiranga deu sua última volta olímpica como campeão baiano — e fez história.