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Marca Bahia Notícias

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Justiça determina que USP cancele concurso aberto após candidata negra perder vaga

Por Bruno Lucca | Folhapress

Foto: Divulgação / USP

A Justiça de São Paulo determinou que a USP (Universidade de São Paulo) cancele um concurso para docente em literaturas africanas em língua portuguesa. A vaga foi aberta em 30 de setembro após o edital anterior ter sido anulado por suspeição da banca.
 

Érica Bispo, aprovada para o posto em novembro de 2024, teve sua nomeação revogada em março deste ano por supostamente manter relação de amizade com duas professoras que avaliaram sua entrada na universidade.
 

Ela nega a acusação e afirma ter sido alvo de racismo por ser a última candidata preta naquela concorrência. O caso foi levado ao Tribunal de Justiça paulista.
 

Em decisão desta segunda-feira (15), o juiz Marcelo Semer, da 10ª Câmara de Direito Público, entendeu ser necessário suspender o novo processo seletivo porque eventual decisão favorável à Bispo poderia gerar consequências para o novo concurso —já em fase de homologação das inscrições.
 

A USP argumenta que a decisão pela anulação do primeiro edital foi baseada em provas e passou pelo seu órgão máximo, o Conselho Universitário.
 

O recurso contra o processo seletivo foi solicitado por um grupo de seis concorrentes. Segundo eles, a mulher seria incapacitada para exercer a função pretendida e teria ganhado notas altas injustificadas pela intimidade com a banca.
 

Para comprovar sua teoria, eles juntaram fotos nas quais a então aprovada aparecia em grupos com as professoras. Numa dessas imagens, a legenda dizia "entre amigos é muito bom".
 

Bispo afirma que os especialistas em literaturas africanas no Brasil não são muitos e seria comum o encontro em congressos do tema.
 

Uma das concorrentes a ter questionado a banca foi Larissa Lisboa, professora da UFLA (Universidade Federal de Lavras). Segundo ela, a seleção foi toda problemática e o desempenho da aprovada foi questionável, sendo as fotos "a prova de que algo estava errado".
 

Lisboa também questiona a versão compartilhada por Bispo de que o recurso teria viés discriminatório. "Isso me fere profundamente, eu também sou uma mulher negra. No concurso em questão, me autodeclarei assim", diz Lisboa, que não aderiu às cotas para docentes pretos, pardos e indígenas no edital em questão.
 

Para a Procuradoria da USP, as imagens apresentadas foram o bastante para comprovar a relação íntima entre Bispo e as professoras e anular o concurso.
 

Em seu parecer, o órgão rechaçou que o desempenho da candidata tenha sido superior por algum favorecimento e não comentou sobre sua capacidade para o cargo, mas disse ter constatado nas imagens analisadas "contexto suficiente para se reconhecer a afetuosidade entre a candidata indicada e as professoras".
 

A versão foi acatada pelo Conselho Universitário, em 18 de março, com 59 votos a favor e 1 contrário, além de quatro abstenções.
 

Ocorre que, em meio aos trâmites na USP, o Ministério Público de São Paulo também analisava o caso. Em seu parecer, ele contrariou a universidade e afirmou não ter sido "evidenciada a atuação dolosa de qualquer agente público", citando as docentes.
 

O documento foi entregue aos membros da banca, à direção da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas), responsável pelo concurso, e à reitoria, mas já após a apreciação do caso no Conselho Universitário.
 

Para Bispo, a versão da Promotoria prova que a anulação do processo seletivo foi injusta. Por isso, ela e seus advogados buscam a reversão da decisão na Justiça.
 

QUEM É ÉRICA BISPO
 

Érica Cristina Bispo é graduada em letras pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e doutora em literaturas portuguesa e africanas, com pós-doutorado em literatura guineense. Ela é professora de literatura e língua portuguesa do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro desde 2015.
 

Várias entidades, como a Associação de Escritores da Guiné-Bissau e o Congresso Internacional de Literaturas e Culturas Africanas, publicaram notas em seu apoio.
 

"Nem se precisa revisar de frente para trás o curriculum lattes de Érica Bispo para se confirmar a sabedoria majestosa em suas falas-conferências, palestras, comunicações orais, sempre pautada em uma seriedade exemplar diante de seu legado como profunda estudiosa das epistemologias africanas no Brasil", afirma o Congresso.
 

O advogado de Bispo, Raphael de Andrade Naves, diz que a decisão da Justiça de anular o novo edital para professor de literaturas africanas "É um sinal claro de que o judiciário está atento à complexidade do caso".

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