Licença da Foz do Amazonas não muda COP30, diz presidente da cúpula
A licença para exploração da bacia de petróleo de Foz do Amazonas não deve mudar os debates que acontecerão na COP30, a conferência sobre clima da ONU (Organização das Nações Unidas), na opinião do presidente da cúpula, o embaixador André Corrêa do Lago.
"Esse anúncio evidentemente ele tem um impacto sobre o tema no tratamento da COP, mas acredito que está dentro de um contexto muito mais amplo e eu não acho que ele tenha que ser considerado como algo que mude coisas na COP", afirmou nesta quinta-feira (23), no lançamento da oitava carta da presidência aos participantes do evento.
Segundo ele, o processo de licenciamento do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), ao invés de afetar negativamente as negociações sobre redução de combustíveis fósseis no mundo, reforça que o tema deve ser tratado com responsabilidade.
Durante a conferência preparatória, que aconteceu no início de outubro em Brasília, um dos pontos de maior tensão entre os diplomatas foi quando negociadores da Arábia Saudita reagiram energicamente a falas, inclusive do Brasil, que defenderam o afastamento do uso desta fonte de energia.
Na última segunda-feira (20), o Ibama concedeu a licença para a Petrobras perfurar o bloco 59 da Foz do Amazonas, após anos de análise e brigas políticas inclusive dentro do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
"Todo mundo sabia que esse tema estava evoluindo, a questão foi o momento", diz.
"[O processo mostra] que as coisas não são feitas apenas para inglês ver. Ao contrário, é uma demonstração do quanto esse tema está sendo debatido de maneira muito aberta no Brasil e que as instituições brasileiras estão funcionando no ritmo em que as coisas devem acontecer", completou.
CARTA SOBRE ADAPTAÇÃO
A oitava carta da presidência está focada no tema de adaptação e compara a falta de combate à mudança climática com o conceito de necropolítica.
"Sem adaptação, a mudança do clima se torna um multiplicador da pobreza, destruindo meios de subsistência, deslocando trabalhadores e aprofundando a fome. À medida que os impactos se intensificam, a inação não representa uma falha técnica, mas sim uma escolha política sobre quem vive e quem morre", afirma o documento.
O setor de adaptação registra a maior lacuna finacniamento dentre todas as áreas climáticas, de US$ 359 bilhões (R$ 2,03 trilhões), segundo o Pnuma, o programa para meio ambiente da ONU.
Ele e a CEO da COP30, Ana Toni, afirmam que o desafio não é só ampliar a quantidade de recursos, mas fazer com que eles cheguem sobretudo às populações mais vulneráveis e não sirvam para concentrar privilégios entre a parcela mais rica da população mundial.
Por isso, defendem que o investimento público funciona como pilar central para suprir essa lacuna, e não pode haver uma privatização total deste setor.
"Isso não impede que haja financiamento privado quando couber. Não é um ou outro, vamos precisar de ambos", diz Ana Toni.
Eles também afirmam que não se deve priorizar adaptação ante a mitigação (corte nas emissões de gases-esfufa), mas que as duas naturezas de investimento precisam funcionar de forma complementar —atualmente, a segunda reúne muito mais recursos que a primeira.
Enquanto já existe um objetivo de duplicar de US$ 20 bilhões para US$ 40 bilhões o montante de recursos para essa área, há uma nova reivindicação para que isso seja, na verdade, triplicado. Ana Toni diz que é necessário tornar realidade a demanda antiga e ao mesmo tempo dar viabilidade à próxima.
Para fazer isso, a carta defende a criação de novos mecanismos e modelos de financiamento, sobretudo para garantir que os países que têm maior urgência em avançar em adaptação —aqueles em desenvolvimento— não sofram com uma ampliação de suas já grande dívidas externas.
Conheça a lista de soluções financeiras e mecanismos citados pela carta:
- Títulos de resiliência soberanos e subnacionais: direcionam poupanças domésticas para prioridades;
- Trocas de dívida por resiliência e seguros contra perdas e danos: aliviam pressões fiscais e aceleram a recuperação;
- Financiamentos baseados em resultados e fundos rotativos: aumentam a responsabilização e garantem impactos duradouros;
- Plataformas nacionais e Planos de Prosperidade Climática: ajudam a alinhar investimentos às estratégias nacionais.
Bancos multilaterais de desenvolvimento, instituições nacionais de desenvolvimento e fundos climáticos –incluindo o Fundo Verde para o Clima, o Fundo para os Países Menos Desenvolvidos, os Fundos de Investimento Climático e o Fundo de Adaptação– desempenham papéis centrais na aplicação desses instrumentos e no seu alinhamento com as prioridades nacionais.
Finalmente, André Corrêa do Lago afirmou que houve avanços no plano, revelado pela Folha de S.Paulo, de buscar bancos de desenvolvimento e entidades filantrópicas para garantir hospedagem em Belém aos países que mais precisem.
Segundo ele, com estes recursos, foi possível garantir três quartos para cada uma das nações dos LCDs (grupos de países menos desenvolvidos), dos SIDs (grupo de países insulares) e do grupo de países africanos que apresentaram essa necessidade.
A falta de hospedagem em Belém se tornou o epicentro de uma crise diplomática na COP30.
Dezenas de países escreveram uma carta para pressionar o governo Lula a mudar pelo menos parte da conferência para outra cidade —o que não aconteceu.
Lago também afirmou que o protocolo da conferência foi alterado e que não será obrigatório o uso de gravatas, em razão do calor da cidade de Belém.
