Hospedagem em cruzeiro da COP30 é 9 vezes mais cara que travessia até o Mediterrâneo
Se hospedar nos cruzeiros contratados para auxiliar a logística da COP30, a conferência de clima da ONU (Organização das Nações Unidas), custa mais de nove vezes o preço de uma travessia do Brasil até o mar Mediterrâneo e é quatro vezes o pacote para passar o Ano-Novo em Copacabana, no Rio de Janeiro.
A Folha de S.Paulo comparou a cotação oferecida pela organização do evento com os preços de viagens turísticas disponíveis na MSC e na Costa Cruzeiros, as duas companhias que deslocaram embarcações para a conferência em Belém.
As empresas disseram que a comercialização da hospedagem durante o evento é feita pela organização da cúpula.
Procurada, a Secretaria Extraordinária da COP30 ressaltou que reservou 1.600 cabines por preços acessíveis aos países em desenvolvimento e insulares, com diárias de US$ 220 a US$ 600.
"Os valores refletem fatores logísticos e operacionais que diferenciam a hospedagem da COP30 das viagens turísticas regulares. Trata-se de uma operação de fretamento internacional de longa duração, com deslocamento específico até Belém e adaptações de infraestrutura para atender uma conferência desse porte", disse, em nota.
Os altos preços de hospedagem se transformaram na principal crise para a COP30 em Belém, em novembro.
Como revelou a Folha de S.Paulo, dezenas de países pressionaram o governo Lula (PT) e a UNFCCC (o braço climático da ONU), por meio de uma carta, para que a sede da conferência fosse alterada. A organização do evento nega essa hipótese, e criou uma força-tarefa para resolver o problema.
Como uma das soluções, o governo brasileiro contratou dois navios para ficarem atracados no porto de Outeiro e servirem de hospedagem durante o evento.
A Folha de S.Paulo solicitou cotações de hospedagem tanto para o navio Seaview, da MSC, quanto para o Diadema, da Costa Cruzeiros.
Passar as 17 noites da COP30 em um quarto com varanda no navio da MSC sai por R$ 9.803,46 cada diária (R$ 166,6 mil no total). Se forem oito noites, o valor é um pouco maior, R$ 13.234,67 a diária (R$ 105 mil ao todo).
Em abril, essa mesma embarcação sairá do Brasil rumo ao mar Mediterrâneo, em um pacote de viagem que também dura 17 noites. Estão incluídas todas as refeições, "com o melhor da gastronomia internacional", shows "ao estilo Broadway" e "atividades para toda a família".
O trajeto começa em Santos (SP) e para no Rio de Janeiro e em Maceió antes de cruzar o oceano Atlântico. Depois de atracar nas ilhas Canárias, ele passa por Gibraltar, Alicante e Barcelona, na Espanha, Marselha, na França, e encerra viagem em Gênova, na Itália.
Pelo site oficial da empresa, essa viagem custa pouco mais de R$ 18 mil no total, uma diária de R$ 1.069,52, no quarto individual com varanda. Ou seja, a hospedagem na COP30 por este mesmo tempo é mais de 9 vezes a travessia até a Europa.
Para comparar o custo de oito diárias em Belém, é possível fazer um paralelo com o pacote de final de ano da MSC no Seaview.
O trajeto, que começa e termina em Santos (SP), passa por Salvador, Búzios (RJ), Ilha Grande (RJ) e inclui a virada do ano no mar de Copacabana, no Rio de Janeiro, uma das maiores festas de Réveillon do mundo.
Essa viagem custa R$ 24.654 no total, equivalente a R$ 3.081,75 por diária, o que faz a estadia por esse mesmo período na COP30 ser 4,3 vezes mais cara que o pacote de Ano-Novo da companhia.
A opção de quarto com varanda é a mais barata disponível atualmente para a COP30, já que as cabines menores (com janela ou sem) estão esgotadas -essas alternativas foram majoritariamente oferecidas às delegações de países insulares e menos desenvolvidos, por preços mais baratos, para viabilizar a vinda destes representantes para o evento.
Todas as cotações foram feitas para apenas uma pessoa no aposento, já que os diplomatas criticam a possibilidade de compartilhar os espaços com outras pessoas.
Os preços para a COP30 incluem apenas café da manhã. Já os pacotes orçados pela Folha pela MSC incluem todas as refeições, mas não bebidas.
Esse quarto tem aproximadamente 17 m², mais 5 m² de varanda, uma cama de casal (ou duas de solteiro) e um sofá-cama, para até mais duas pessoas.
A suíte deluxe também pode receber até quatro pessoas, mas tem 28 m², além de um terraço privativo de 8 m².
Ficar nela durante os 17 dias da COP30 custa quase R$ 683 mil, ou pouco mais de R$ 40 mil por diária -também cerca de 9 vezes mais caro que o pacote para o Mediterrâneo. A proporção se mantém semelhante na comparação com os pacotes de Ano-Novo.
O porto de Outeiro fica a cerca de 20 km do Parque da Cidade, onde acontecerão as negociações da COP30. O Governo do Pará promete terminar, até o início do evento, a construção de uma ponte que vai fazer com que o deslocamento entre os dois lugares demore cerca de 30 minutos.
Além do Seaview, também ficará ancorado no porto o navio Diadema, da Costa Cruzeiros. Dormir toda a conferência no quarto com varanda custa R$ 153,4 mil -R$ 9.025,20 a diária.
Já o pacote de Ano-Novo oferecido pela empresa custa quase R$ 20 mil, incluídas bebidas alcoólicas. O roteiro da viagem passa por Buenos Aires (Argentina), Montevidéu (Uruguai), Balneário Camboriú (SC), Ilha Grande (RJ) e também pela virada de ano em Copacabana.
Ou seja, a hospedagem para a COP é três vezes mais cara do que o Réveillon neste cruzeiro.
Somados, os dois navios em Belém oferecem cerca de 4.000 quartos, com capacidade para pouco mais de 10 mil pessoas. Destes, todas as quase 1.500 cabines mais simples já foram reservadas, segundo o site oficial de hospedagem.
O tipo de acomodação mais numerosa são os quartos com varanda, que já estão quase esgotadas no navio Diadema, mas ainda há cerca de 50% de disponibilidade no Seaview.
As embarcações dispõem de dezenas de restaurantes e bares, piscinas, decks panorâmicos, espaços para hidromassagem, quadras poliesportivas e academias.
O contrato com os cruzeiros vai até dia 21 de novembro, data oficial do final da COP30.
Contudo, como nas últimas edições da conferência a negociação extrapolou seu prazo oficial, alguns países questionaram o Brasil sobre qual seria o plano se isso acontecer. A organização do evento se comprometeu a realocar quem estiver nos navios e precisar ficar mais tempo em Belém.
A Costa é uma empresa com sede nos Estados Unidos e, em razão de sanções impostas pelo país, não podem se hospedar no Diadema pessoas iranianas, cubanas, sírias, norte-coreanas, russas, bielorrussas e ucranianas de regiões controladas por Vladimir Putin (como Criméia e Donetsk).