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Fux minimiza golpismo ao tratá-lo como 'rudes acusações' e 'choro de perdedor', dizem especialistas

Por Ana Gabriela Oliveira Lima | Folhapress

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil

"Desabafo", "choro de perdedor", "rudes acusações", "declarações inflamadas" e "bravatas". Foram essas algumas das palavras usadas pelo ministro Luiz Fux, do STF (Supremo Tribunal Federal), para se referir às atitudes de Jair Bolsonaro (PL) e aliados que levaram o ex-presidente ao banco dos réus por tentativa de golpe.
 

O ministro votou pela absolvição de todos os crimes imputados ao ex-presidente. Ele entendeu não haver provas de que o político tenha praticado atos de execução do golpe. Com a divergência, Bolsonaro tem 2 votos a 1 pela condenação. Votaram a favor de penalizar o ex-presidente os ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino.
 

Para especialistas ouvidos pela Folha, a perspectiva adotada pelo ministro minimiza o cenário golpista, em um voto longo que trouxe divergências sobre a interpretação da PGR (Procuradoria-Geral da República).
 

O ministro permeou nesta quarta-feira (10) seu voto com fala sobre a necessidade de que os atos praticados pelos réus precisam se enquadrar na letra fria da lei como "mão que calça a luva". Ele disse que o ex-presidente não cometeu crimes contra o Estado ao discutir minutas golpistas com os chefes das Forças Armadas.
 

Ao mesmo tempo, descartou relação do político com o 8 de Janeiro e disse que não é possível responsabilizar suas falas pela violência de terceiros.
 

Fux classificou declarações de Bolsonaro como "choro de perdedor" e afirmou que o desabafo de candidatos derrotados nas eleições não pode ser entendido como ataque ao Estado democrático de Direito.
 

"Deve ser rejeitada, sim, a interpretação ampliativa desse novel tipo penal para abranger condutas que configurem mera irresignação do resultado eleitoral, sem capacidade ou dolo de arruinar as multifacetadas instituições que garantam o governo democrático do país", afirmou.
 

"Obviamente, o legislador não teve intenção de amesquinhar o direito penal. Quanto mais para criminalizar o funcionamento corriqueiro dos órgãos políticos ou desabafo de candidatos derrotados a cargos públicos, comumente chamado de 'choro de perdedor'", disse.
 

Para Juliana Izar Segalla, professora de direito da Uenp (Universidade Estadual do Norte do Paraná), toda a fala de Fux tentou minimizar a tentativa de golpe.
 

"Inclusive a esdrúxula afirmação de que jamais poder-se-ia cogitar do artigo 359-M [golpe de Estado], por ausência de deposição de governo legitimamente constituído", afirma ela.
 

Segundo a especialista, o posicionamento do ministro chama a atenção, "porque o tipo penal do artigo descreve a própria tentativa como crime. Se o golpe tivesse se consumado, não haveria esse julgamento", diz.
 

Segalla destaca entender que o ministro agiu incoerentemente com sua tradição mais punitivista. Para ela, as expressões do ministro sobre "desabafo" e "choro de perdedor" podem ter como objetivo normalizar ações e reações dos réus, minimizando a seriedade do que chama de clara tentativa de golpe. Ela diz imaginar, porém, que tais falas não vão, juridicamente, trazer impacto para o julgamento.
 

Para Diego Nunes, professor de direito da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), Fux adotou no voto uma interpretação excessivamente restritiva, em que não aceita a possibilidade de autogolpe (ou seja, de Bolsonaro tentar permanecer ou retornar por meios ilícitos ao poder).
 

Nunes também interpreta que Fux entendeu que a "minuta de golpe" seria um ato inidôneo, ou seja, incapaz de ameaçar o Estado democrático. "A questão é que a minuta não é um texto solto, mas uma proposta apresentada e discutida por vários dos réus", diz o especialista.
 

"A partir das provas do processo, a meu ver essas falas do ministro minimizam o poder de ação e influência que um presidente no cargo -e que depois de sair continua a ser um líder político de peso- possa ter sobre o seu entorno e sobre os seus apoiadores em geral", diz Nunes.
 

Para Danilo Pereira Lima, professor de direito constitucional do Centro Universitário Claretiano e doutor em direito público pela Unisinos (Universidade do Vale do Rio dos Sinos), o voto de Fux minimizou o conjunto probatório apresentado pela PGR.
 

Ele entende que, com isso, o "ministro Fux deu sua colaboração para que movimentos políticos golpistas continuem a realizar seus ataques contra as instituições democráticas. O voto foi tão contraditório que o ministro seguiu com a condenação do ajudante de ordens [Mauro Cid], mas poupou o responsável pelas ordens golpistas, o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro", afirma Lima.

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