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Coluna

Governança e Desenvolvimento: Entre a liderança e o poder sem integridade - o risco da autoridade sem propósito

Por Jandaraci Araujo

Fotos: Divulgação

Sem propósito, a autoridade perde sua legitimidade e degenera em imposição. E quando esse modelo se perpetua, a liderança se desconecta da ética e do bem comum."

 

Em tempos de crise institucional e desconfiança generalizada, uma questão emerge com força renovada no debate público brasileiro: para que serve o poder? Aqui, não falamos do poder abstrato, mas da autoridade formal, da hierarquia ocupada por líderes em empresas, governos e organizações. Trata-se de compreender como o lugar que se ocupa — com influência, decisão e comando — é exercido.


Quando essa autoridade se desconecta de um propósito coletivo, torna-se terreno fértil para a desconstrução de valores, da confiança e da própria noção de liderança. A hierarquia sem ética perde legitimidade e, pior, pode alimentar práticas abusivas e desumanizantes.


A ausência de integridade, sobretudo quando reiterada por figuras em posição de comando, não se limita a falhas individuais — ela se cristaliza em cultura institucional. Essa cultura, muitas vezes silenciosa, fragiliza relações, naturaliza o assédio e impõe o medo como mecanismo de controle. O poder hierárquico, quando não é exercido com ética e responsabilidade, torna-se fator de risco organizacional.


Estamos, portanto, diante de um fenômeno estrutural. Líderes sem propósito não mobilizam, não inspiram. Apenas mantêm o funcionamento de sistemas centrados em interesses pessoais e estruturas de privilégio. O que deveria ser liderança se reduz à manutenção de status e controle.


A liderança genuína exige mais do que ocupar cargos: pressupõe visão, responsabilidade e serviço. Quando esses fundamentos são negligenciados, abre-se espaço para ambientes tóxicos que sabotam a confiança, desencorajam o diálogo e silenciam a diversidade de pensamento.


Nesse contexto, a integridade se torna um pilar organizacional e um instrumento de proteção coletiva. Mais do que valor ético, ela deve ser compreendida como cultura operacional e ferramenta ativa no combate ao assédio moral e à negligência institucional. Isso é particularmente urgente frente às diretrizes da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), que trata da gestão de riscos ocupacionais com ênfase crescente em fatores psicossociais e saúde mental no trabalho.


A NR-1 reconhece que o ambiente organizacional pode ser fonte de adoecimento. Pressões hierárquicas desproporcionais, assédio disfarçado de performance, práticas de silenciamento — tudo isso precisa ser prevenido e monitorado. Portanto, integridade passa a ser não apenas um diferencial, mas uma exigência legal e estratégica.


Organizações que toleram condutas abusivas sob o pretexto de performance comprometem sua sustentabilidade. O mérito é substituído pela lealdade pessoal. O debate dá lugar à obediência. A governança se torna escudo para interesses particulares — e a ética, mero discurso de fachada.


O primeiro ativo perdido nesse ambiente é a confiança. Sem ela, ruem a cultura interna, a reputação externa e o vínculo social das instituições. Reconstruí-la requer mais do que comunicação: exige ação, coerência e coragem.


Mas há caminhos. Romper esse ciclo exige repensar o papel da autoridade. Entender que poder não é um prêmio pessoal, mas uma responsabilidade pública. Que a liderança deve servir à transformação, e não à autopreservação. Que o cargo é meio, não fim. Isso requer formação ética desde a base, mecanismos de escuta ativa e lideranças que sejam exemplo mesmo na ausência de aplausos.


Liderar é resistir ao culto do ego. O Brasil precisa — com urgência — de líderes que compreendam que autoridade legítima nasce do compromisso com o outro, com o bem comum, com a integridade em cada decisão. Porque servir, com ética e consciência, é o mais alto grau do poder.

 

Jandaraci Araújo é executiva, conselheira de administração e uma das principais vozes em governança, ESG e inovação no Brasil. Com mais de 30 anos de atuação nos setores público e privado, construiu uma carreira sólida na interseção entre finanças, sustentabilidade e transformação digital, com foco em estratégias de crescimento sustentável e geração de valor compartilhado. Mestranda em Administração de Empresas pela FGV, com ênfase em Bioeconomia e Finanças Sustentáveis, possui sólida formação internacional em liderança, governança e sustentabilidade por instituições como UCLA Anderson, Kellogg School of Management e EADA Business School (Barcelona). Co-fundadora e Presidente do Instituto Conselheira 101  - uma iniciativa voltada à inclusão de mulheres negras e indígenas em conselhos e alta liderança. É reconhecida por sua liderança transformadora, Top Voice no LinkedIn, professora, escritora e TEDx Speaker. Recebeu vários prêmios e reconhecimentos como Lide Global, Mulheres Inspiradoras, Trofeu Raça, IBEF-SP e Money Report.