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Carnaval em Salvador nunca mais será o mesmo

Por Mauricio Magalhães

Foto: Divulgação

O Carnaval de Salvador dificilmente voltará a ser o maior e melhor carnaval de rua do Brasil. Perdemos a importância relativa, há tempos. Porém, não encaramos o fato, e continuamos insistindo em não olhar o entorno, e muito menos os motivos. Debates com dialética a serviço da evolução passam ao largo de nossa cultura.

Podemos refletir que são vários os motivos da mudança. A competência de outras cidades, como a festa estabelecida em São Paulo, a surpresa de BH, ou a consolidação do Rio, além de outras dezenas de novos destinos.

A decadência dos blocos é um dos principais motivos do declínio do Carnaval. A preponderância dos Camarotes, associado a falta de compreensão da coexistência de Trios Independentes com Blocos impactaram o Carnaval da Bahia.

Nos anos 80, os jovens empresários dos blocos construíram - sem perceber - um modelo econômico sofisticado e complexo. Foi desenvolvido um hub econômico, um cluster de segmentos, que a partir dos blocos e do ordenamento do desfile, geraram essa cadeia produtiva. TVs e rádios passaram a transmitir, desenvolveu-se uma geração espontânea de camarotes. Nasceu o circuito Barra-Ondina. Hotéis e pousadas fizeram pacotes semanais próximos a 100% de ocupação. Marcas e patrocinadores foram atraídos e irrigaram riqueza; impostos e empregos foram gerados; shoppings enchidos, comércio ativado; empresas de turismo prosperaram; taxis aumentaram faturamento.

Faço parte desse movimento empresarial e sensacional há 40 anos, e acredito que criamos um modelo único de ecossistema econômico, que gera uma cadeia de riqueza infinita e próspera. Cadeia nunca estudada em nossas universidades que insistem em focar em casos americanos de décadas atrás, ou em empresas globais. (Enfim, esse é outro assunto que não se mistura).

Os Blocos são festas ambulantes, com cenários que se transformam no percurso. É um produto único. Nessas décadas, os blocos foram agentes de vendas do “imaginário Bahia” pelo Brasil e pelo mundo, foram pontas avançadas para a Salvador na Geração de Posicionamento, através de suas marcas e de seus artistas. Modelo que foi replicado com o nome de Micaretas, e hoje, a evolução desse negócio se dá através da música sertaneja no Brasil à fora. Acreditem, o modelo deles, que prepondera no país hoje, foi inspirado no nosso, só que com a competência da evolução.

Por anos, os blocos geraram um conceito de time, de agremiação, "sou Camaleão”, "sou Araketu”, “sou ASA”, e grupos se formavam de várias cidades do mundo em torno de um bloco, de um grupo de afinidade, com total engajamento. Era uma força descomunal. Não existe Tom Cruise ou Angelina Jolie sem os estúdios, sem Hollywood, e sem as Produtoras, pois, não existe artista sem a estrutura e estratégia. No momento que “nossos Estúdios” se esvaíram, acabaram os times e a identidade das tribos. Tudo virou apenas cachê, e quem tem dinheiro leva! A Bahia perdeu!

Nessa trajetória, em todo esse período, o combate às cordas nunca arrefeceu. Mas, esse modelo é ou era tão genial que poderia ser apelidado de Robin Hood. Ricos patrocinadores e 3.000 sócios de blocos financiavam a população que assistia, gratuitamente, à Ivete via Corujas ou a Durval via Coco Bambu. Eram mais de 500 mil pessoas no trajeto. Os blocos carregavam pipocas e proporcionavam delírios nos camarotes e apartamentos. Verdadeira apoteose. Melhor ainda quando intercalados por trios independentes. Tudo isso abraçado pelos camarotes. Perfeito!
Detalhe importante: pagando impostos e taxas (corretíssimas) para cidade e para o governo. Subsídio zero. O poder público não gastava dinheiro público com as grandes atrações. Blocos geravam riqueza, turismo e espetáculo. Em torno deles, se formavam, portanto, o ecossistema gerador de valor.

Os camarotes nasceram à luz desse modelo, eram as arquibancadas para os Flamengos/Cheiro de Amor e os Romários/Bel Marques, e, a partir daí, criavam seus subprodutos. Belo diálogo no eco sistema, um verdadeiro ganha-ganha. Camarotes tinha sua mais valia nas atrações que passavam nos blocos.

Ao longo do tempo, o combate às cordas e, principalmente, o discurso populista das autoridades públicas geraram o desgaste do modelo. Acrescente-se a incapacidade dos Blocos em inovarem e evoluírem no produto e no serviço, sendo empresarialmente medíocres, lutando apenas para manter o status quo. Para piorar tudo, os camarotes se voltaram para dentro, tornando-se Yates Clubes, Bahianos de Tênis, e acabaram por também entrar no arco descendente do produto. Faltou estratégia coletiva. Todos eram sócios de um mesmo modelo.

O ecossistema foi desmontado. Camarotes em decadência (não obstante os números Fake News propagados). O turismo do carnaval perdeu espaço, no produto que já foi o melhor do Brasil. Blocos tornaram-se inexpressivos, restando alguns poucos que começam a ser revalorizados. Aqui um conselho ao meio da reflexão: Compre ações de blocos se encontrar, voltarão ao centro do sucesso.

Todos os atores do modelo de carnaval baiano pensaram segmentadamente, e o resultado final foi negativo para Bahia.

Agora, no carnaval, nossos artistas são contratados Brasil a fora. Nenhum deles fica todos os dias em Salvador. Não temos mais “Blocos Time”. Vão ganhar dinheiro fora. Outro ponto: os artistas nacionais e internacionais vinham gratuitamente, era uma fauna de artistas maravilhosos que suplicavam “canjas”. Sumiram! E os que vem, vem por cachês.

Carlinhos Brown fora do carnaval? Choro só de pensar. Absurdo. Precisamos entender os porquês. Muitos acreditam que o problema é de Brown, mas é da miopia-narcisa que nos persegue.

Assim, acabou o circuito lotado no Campo Grande, diminuiu o Circuito Barra. Camarotes vazios, menos turistas, cadeia econômica muito menor.

Mas, a mudança com inovação do modelo anterior é possível. Podemos virar esse jogo! Precisamos, como já dito, de debate, de pesquisa, e de reflexão, colocando os interesses coletivos lado a lado com os interesses de cada segmento.

Salvador está linda! Poucos consideram ou sabem, mas já temos no nosso carnaval a maior festa LGBT do mundo. Vamos sair desse armário, o mais moderno impossível. Vamos construir novas oportunidades com novos olhares, desenvolvendo novos produtos, contando novas histórias, e implantando um novo modelo de carnaval.


Estamos no mundo do “ao vivo”, da instantaneidade, das redes sociais, e da busca de viver experiências diferenciadas e únicas. Não a pasteurização! Nossa visão tem que contemplar geração de valor e de distribuição de riqueza, em uma nova equação econômica do entretenimento e do turismo na terra da felicidade.


Axé!


Viva Salvador!

 

*Mauricio Magalhães, Sócio Conselheiro da GIROS, do Grupo EVA, da RIVER, e Hospital Irmã Dulce

 

*Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias

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