Em cumprimento a decisão do STJ, TJ-BA determina garantia de direitos a militares transgênero na Bahia
Por Aline Gama
O Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) formalizou o acolhimento de uma decisão histórica do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que garante os direitos fundamentais de militares transgênero e proíbe a reforma ou desligamento compulsório com base exclusivamente na identidade de gênero. A informação foi oficialmente disseminada às câmaras e secretarias do TJ-BA, bem como a todos os desembargadores e juízes de direito do estado, incluindo os atuantes nos Juizados Especiais, por meio de Ofício.
O documento, assinado pela Juíza Silvia Lúcia Bonifácio Andrade Carvalho, Assessora Especial da 2ª Vice-Presidência e Coordenadora do NUGEPNAC, detalha os termos da tese jurídica firmada no julgamento do REsp 2.133.602/RJ, que trata do Incidente de Assunção de Competência (IAC) cadastrado como TEMA IAC 20/STJ. A medida assegura que o entendimento seja uniformemente aplicado por todos os magistrados baianos.
A ementa do caso, reproduzida no ofício, estabelece de forma cristalina que a identidade de gênero constitui expressão direta da dignidade da pessoa humana, atributo protegido pela Constituição Federal. De acordo com o documento, o STJ, se alinhou à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e ao sistema interamericano de direitos humanos, que reafirmou o direito fundamental da pessoa transgênero à alteração de prenome e de classificação de gênero no registro civil, independentemente de cirurgia ou laudos médicos, bastando a manifestação de vontade do indivíduo.
Um dos pilares da decisão reside na despatologização da identidade transgênero. O STJ destacou que a Classificação Internacional de Doenças (CID-11), da Organização Mundial da Saúde, deixou de categorizar a transexualidade como transtorno mental, passando a considerá-la sob o prisma da saúde sexual. Esse avanço científico-normativo foi crucial para afastar o antigo paradigma, que permitia à Administração Militar fundamentar licenças e reformas compulsórias no diagnóstico ultrapassado de "transexualismo", entendido no passado como um desvio psicológico. A prática foi declarada incompatível com o conhecimento médico atual e com os direitos humanos.
Com base nesses fundamentos, o STJ fixou teses jurídicas vinculantes para as Forças Armadas. Ficou estabelecido que é devido o uso do nome social e a atualização de todos os assentamentos funcionais, comunicações e atos administrativos para refletir a identidade de gênero do militar. A decisão veda expressamente a reforma ou qualquer forma de desligamento fundada exclusivamente no fato de o militar transgênero ter ingressado por vaga originalmente destinada ao sexo/gênero oposto.
Por fim, o TJ-BA assentou que a condição de transgênero ou a transição de gênero não configuram, por si só, incapacidade ou doença para fins de serviço militar. Fica, portanto, proibida a instauração de processo de reforma compulsória ou o licenciamento ex officio fundamentados exclusivamente na identidade de gênero do militar, devendo prevalecer uma análise individualizada de sua saúde, livre de qualquer preconceito institucional.
