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Coluna

Governança e Desenvolvimento - Namoro no Trabalho - Amor ou Cilada Corporativa?

Por Roberta Carneiro

Governança e Desenvolvimento - Namoro no Trabalho - Amor ou Cilada Corporativa?
Foto: Mari Neto / Divulgação

Namoros no ambiente de trabalho despertam curiosidade e, muitas vezes, polêmica. O que para alguns parece apenas uma consequência natural da convivência diária, para empresas pode significar risco ético, jurídico e reputacional.


Afinal, aquele "crush" no colega de trabalho pode virar uma bomba-relógio para carreiras bem-sucedidas? Casos recentes, de repercussão internacional, mostram que sim. O CEO da Nestlé foi demitido por um relacionamento não divulgado com uma subordinada. O CEO da Astronomer renunciou após viralizar um vídeo dele numa cena de afeto com a Chief People Officer em um show da banda Coldplay.
A questão não é moral, mas de gestão. Quando a vida pessoal se mistura com a profissional, pode surgir um conflito de interesses que precisa ser tratado com clareza e responsabilidade.

 

 


Conflito de interesses é qualquer situação, efetiva ou potencial, em que interesses pessoais, familiares, relacionais, financeiros ou profissionais de um indivíduo possam comprometer, influenciar ou parecer influenciar sua capacidade de tomar decisões de forma imparcial, ética e no melhor direcionamento para a organização.


Ele se caracteriza não apenas pela ocorrência de um prejuízo material, mas pela existência de risco à credibilidade, à governança, à cultura e à reputação, ainda que não exista o dano financeiro. É um risco ético que exige gestão ativa, mecanismos de transparência e mitigação.


Essa definição parte da premissa de que o dever primário de lealdade de todos os colaboradores deve estar orientado exclusivamente aos objetivos organizacionais e não aos interesses particulares, diretos ou indiretos, de quem toma a decisão. A simples aparência de conflito já é suficiente para comprometer a confiança nas decisões e atuações.

 

O que diz a lei
Não há no Brasil uma lei que proíba namoros no ambiente corporativo. A CLT não trata do tema e, portanto, a vida privada dos empregados está, em tese, protegida, inclusive pela Constituição. 


A Justiça do Trabalho, no entanto, tem equilibrado o direito à intimidade com o poder diretivo do empregador. Já houve empresas condenadas por dispensar funcionários apenas pelo fato de estarem namorando colegas, sem que existisse norma interna clara que proibisse a prática ou porque não ficou provado um prejuízo ao ambiente profissional. 


Em outras situações, quando o relacionamento afetou hierarquia, produtividade ou imparcialidade, as cortes reconheceram a legitimidade de medidas mais duras.


E aqui está um ponto central: a maioria das medidas que tratam de relacionamentos afetivos no trabalho não decorre de exigência legal, mas de boas práticas de governança. 

 

A regra é clara
Cada empresa, conforme sua maturidade em governança e avaliação de riscos, define como lidar com essas situações. Algumas não estabelecem restrições, outras proíbem relações entre executivos e subordinados, e há ainda as que exigem comunicação formal ao RH ou ao setor de compliance quando surge um envolvimento amoroso. 


Conheço empresas que proíbem executivos de C-level de se relacionarem com qualquer pessoa da empresa. Se houver, o envolvimento precisa ser comunicado, e um dos dois terá de deixar a companhia. 


Outras vedam relações entre superiores e subordinados na hierarquia corporativa, ou namoros dentro de um mesmo setor, não importando o nível hierárquico. Em caso de relacionamentos, novamente há o dever de comunicar, e um dos dois terá de mudar de departamento.


O importante é que as regras sejam transparentes, conhecidas de todos e aplicadas com proporcionalidade.

 

O exemplo vem de cima
E, claro, cabe às lideranças servir de modelo. Altos (as) executivos (as) que não cumprem regras representam uma ameaça à cultura ética da empresa. Sem contar o risco reputacional e financeiro, com potencial para processos por assédio moral e sexual, fraudes, além de criar no ambiente de trabalho a suspeita de que há favorecimento e direcionamento de oportunidades a quem se envolve com o (a) chefe.


Outro problema comum é quando a relação se trata de caso extraconjugal, o que inibe sua comunicação à área de compliance. Ainda assim, não se pode abafar tal situação. Insisto que não há aqui qualquer julgamento moral. O problema é quebrar a política interna da empresa, algo que pode ser passível de demissão.


Em resumo, namorar no trabalho não é em si um pecado corporativo. É uma realidade que, bem gerida, pode conviver com um ambiente saudável. Mas exige atenção. 


Para as empresas, o caminho passa por definir regras objetivas, garantir transparência e aplicar controles que preservem a integridade da organização. Para os profissionais, a recomendação é manter clareza de papéis, comunicar de forma adequada e compreender que, em cargos de liderança ou alta visibilidade, o padrão de conduta esperado será sempre mais rigoroso. Afinal, reputação é o ativo mais precioso, e não se pode arriscá-la em nome de descuidos evitáveis.

 

Roberta Carneiro é advogada especializada em Sistema de Integridade/Compliance, Governança Corporativa, Ética Empresarial, Diversidade & Inclusão (D&I) e sustentabilidade. Conselheira certificada em CCoAud+ IBGC. Sócia-fundadora da Consultoria Eticar. Atua como Conselheira de Administração, exercendo a função de membro independente, em Comitê de Auditoria, Comitê de Ética, Comitê de Risco, Comitê de Governança e Comitê ESG. Coordenadora da Comissão de Ética e Integridade do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) 2023-2024. Coordenadora-geral do IBGC Capítulo Bahia. Mestre em Direito, pós-graduada em Direito Público, com especializações em Compliance e Criminal Compliance. Especialista em Materialidade conforme as normas e padrões GRI 2021, IFRS e ODS, certificada internacionalmente pela Global Reporting Initiative (GRI) para Relato de Sustentabilidade.