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A prática da vaquejada, reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por meio de uma emenda em 14 de março de 2024, como uma atividade esportiva e cultural, tem impulsionado tanto a economia quanto a cultura de diversos municípios da Bahia. A decisão da Corte reforçou a importância da vaquejada ao manter a Emenda Constitucional n.° 96/2017, que inseriu na Constituição o reconhecimento da vaquejada como patrimônio cultural imaterial brasileiro.
A vaquejada consiste em uma disputa na qual os vaqueiros tentam derrubar o boi, puxando o animal pelo rabo. Com regulamentação, critérios de capacitação e saúde dos animais, o esporte tradicional nordestino impulsiona a economia e a cultura em diversos municípios da Bahia.
É o que diz Leonardo Almeida, presidente da Associação Brasileira de Vaquejada (ABVAQ) ao Bahia Notícias. Advogado, o cearense conta que a associação surgiu para lutar pelo reconhecimento da prática cultural nordestina, nos termos jurídicos.
“Na época, o Supremo entendeu que ela [a lei cearense] não poderia subsistir no mundo jurídico nacional e, portanto, a declarou inconstitucional. Foi com esse propósito que, em 2014, nós reativamos a ABVAQ. Ela já existia, mas estava inativa e foi reativada com o propósito exatamente de defender a vaquejada, de criar todo esse arcabouço legislativo, jurídico que hoje protege a vaquejada e que recentemente, o Supremo Tribunal Federal referendou como válido”, explica.
Oficialmente vinculada ao Ministério da Agricultura, a Associação Brasileira de Vaquejada é responsável por regulamentar e capacitar todos os eventos e profissionais da vaquejada pelo Brasil. Nas regras estabelecidas pela organização, o bem-estar e a saúde animal, sejam cavalos ou bois, é um dos principais tópicos.
Com dois grandes circuitos em atividade, o Circuito Valmir Velozo (CVV) e o Campeonato Baiano de Vaquejada (CBV), o esporte atrai competidores de todas as regiões do Brasil, principalmente do Nordeste. Os prêmios chegam a cifras milionárias.
O Circuito Valmir Velozo é atualmente o maior da Bahia, contando com 11 etapas anuais e uma premiação superior a R$ 1 milhão. “O CVV não só democratiza o acesso ao esporte, como também movimenta a economia. Cada etapa gera empregos diretos e indiretos, fomenta o turismo e beneficia o setor de hotelaria, ambulantes e comerciantes locais”, destaca.
Com grandes programações, os valores custam muito caro. Contudo é preciso ter ponderação na desigualdade no estado, como lembra o representante da CBV. "Para mim o modelo de ter presidente é problemático, eu sempre gosto de ressaltar isso. O pessoal me chama de presidente, mas a realidade é que temos que ser mais democráticos aqui na região. Uma realidade de uma corrida não é a maior que a minha de R$ 500 mil. Prefiro dividir o sucesso com a Bahia, a gente tem que unir as coisas do estado e suas particularidades", conclui Rocha.
A REGULAMENTAÇÃO
Com forte teor crítico à prática, entidades e associações pró direitos dos animais questionaram a decisão do STF, embora os participantes e organizadores desses eventos garantam a atividade de forma responsável. É o que diz o presidente da ABVAQ.
“Estamos avançando agora para garantir também a constitucionalidade das leis criadas, que foram aprovadas pelo Congresso Nacional e do nosso próprio regulamento. Porque a partir da existência do regulamento, com regras claras que dizem como é que os animais devem ser tratados, como eles devem ser transportados, número de vezes que eles podem correr, ausência de qualquer ferimento no animal, tudo isso [é importante]”, garante o presidente.
A prática ilegal da vaquejada é crime, quando realizada de modo irregular sem seguir critérios garantidos da ABVAQ. A entidade apura e presta uma denúncia formal ao Ministério Público do estado, como o caso do “Circuito MS dos Amigos” em Barrocas na região sisaleira, que sofreu intervenção por parte do MP-BA. Na ocasião, crimes de falta de preparo técnico e ambiental foram citados na intervenção da promotoria da justiça.
A fim de evitar casos como esse, a ABVAQ, visando prevenir práticas inadequadas, realiza uma atualização em seus regulamentos de fiscalização a cada ano. As diretrizes abrangem aspectos cruciais como a tabela de pontos, o bem-estar animal e a segurança dos participantes, e já estão disponíveis para consulta sua página oficial da associação.
Para o ano de 2025, foram publicados dois regulamentos oficiais distintos. O primeiro é um regulamento geral para eventos, que estabelece diretrizes para garantir contratações técnicas adequadas, além de medidas de prevenção sanitário-ambiental e higiênico-sanitária, e a segurança geral dos eventos. O segundo regulamento é específico para o cuidado e garantia do bem-estar animal, com as práticas fiscalizadas por especialistas nas áreas de zootecnia e medicina veterinária
ESPORTE NORDESTINO
Considerando a importância da agropecuária para o desenvolvimento socioeconômico do país, não é de se estranhar que tantas práticas culturais e esportivas estejam ligadas ao trabalho diário com o gado e outros animais. Tourada, vaquejada, boiada e entre outras práticas se entrelaçam como a representação de um povo.
Especialmente no Nordeste, a habilidade de dominar o gado é uma das principais atribuições de quem trabalha na pecuária do sertão. Em um contexto de caatinga, onde as vegetações são altas, os trabalhadores desenvolvem técnicas para laçar seus bois e controlá-los sem esbarrar em árvores, galhos e pedras altas. Para que essa habilidade se tornasse um esporte não demorou muito, e menos ainda para que se espalhasse pelo país.
“Existe a percepção que a vaquejada só existe no Nordeste. E quando nós fizemos o levantamento para mostrar exatamente a força da vaquejada e esse elemento cultural enraizado no povo brasileiro, nós descobrimos que praticamente todos os estados do Brasil possuem alguma coisa de vaquejada. São Paulo, no estado do Rio de Janeiro, Santa Catarina, nós temos vaquejada Roraima, nós temos vaquejada, Rondônia, Amazonas. Minas Gerais nós temos vaquejada. É algo sensacional porque demonstra que onde o nordestino vai, ele leva a vaquejada com ele”, ressalta.
Ou seja, eventos como o Circuito Valmir Velozo (CVV) e o Campeonato Baiano de Vaquejada (CBV) atraem competidores de todas as regiões do Brasil, pois movimentam milhares de reais em prêmios e geram uma quantidade significativa de empregos diretos e indiretos.
A preparação para essas competições envolve meses de treinamento intensivo e deslocamentos, o que acaba estimulando a economia local e regional de maneira notável. Além do impacto econômico, as vaquejadas são importantes manifestações culturais, reunindo tradições e costumes do sertão nordestino.
Ao Bahia Notícias, os representantes dos principais circuitos falam sobre a evolução da prática. Para o médico veterinário Valmir Velozo, criador do circuito que leva o seu nome, a evolução foi crescente, especialmente durante os últimos 35 anos em que se dedicou ao esporte. A carreira que começou como vaqueiro e atleta, o levou a empreender no nicho.
"Quando comecei a correr vaquejada, não existiam regras. Então, passei a organizar corridas com horários definidos, divisão de categorias e participei da criação das categorias aspirante, amador e profissional, que não existiam antes. Antes, se você quisesse competir, teria que correr contra os profissionais. Isso criava uma desigualdade grande”, Velozo explica.
Diante dessa realidade, Velozo implementou em seus circuitos um sistema de índice técnico, para equilibrar a competição e evitar que fatores financeiros determinassem os resultados:
"Na vaquejada tradicional, quem tem dinheiro leva vantagem, pois pode permanecer como amador ou aspirante por anos, enquanto quem corre para terceiros é obrigado a virar profissional. Isso é injusto. No CVV, nós equilibramos as categorias pelo índice técnico, ou seja, pelo desempenho real do vaqueiro na derrubada de boi. Assim, independentemente da condição financeira, cada atleta compete no nível correspondente às suas habilidades", garante o coordenador.
Enquanto o CVV implementa um novo modelo de competição, o Campeonato Baiano de Vaquejada (CBV) surge como uma iniciativa para fortalecer a organização do esporte no estado. Pedro Rocha, administrador e diretor do CBV, destaca que a competição nasce da necessidade de criar um campeonato unificado.
“Nunca houve um Campeonato Baiano de Vaquejada. Sempre tivemos circuitos particulares. Então, resolvemos chamar os principais parques com credibilidade e estrutura para participar, a maior edição foi desse ano de 2024”, explica.
Ele conta que o CBV também pretende fortalecer a regulamentação do esporte, e assim o faz incorporando a pontuação da Associação Brasileira de Vaquejada (ABVAQ) e da Associação Brasileira de Criadores de Cavalo Quarto de Milha (ABQM). “Nos últimos anos, muitos parques baianos abandonaram a regulamentação da ABVAQ. Este ano, decidimos resgatar essa tradição e garantir que os cavalos possam pontuar no ranking nacional”, detalha Rocha.
Um impulso importante é a Vaquejada de Serrinha, considerada a maior do Nordeste em termos culturais — com festas e shows — e esportivos, já que o evento é sediado no maior parte de vaquejada da região: Parque Maria do Carmo. O evento, organizado por Valmir Velozo, chegou a atrair 40 mil pessoas. Este e outros circuitos demostram a profissionalização do esporte na Bahia.
Alegria e tradição marcaram a tarde desta terça-feira (04) no circuito Osmar (Campo Grande), onde a família de Ellen Bárbara, 33 anos, Vanda Maria, 67, e Gilda de Jesus, 65, celebrou mais um ano de Carnaval. Em entrevista ao Bahia Notícias, elas compartilharam a paixão pela festa e a preferência pelo circuito do Campo Grande.
"Aqui no Campo Grande. Sempre para ver samba, qualquer um que passa a gente vem para ver, porque a gente gosta de todos. A gente gosta de assistir tudo", conta Vanda Maria.
A paixão pelo Carnaval é tradição na família, que frequenta a festa desde a infância. "Desde que eu era criancinha, que eu gosto do Carnaval", relembrou Vanda Maria.
"Eu vejo de tudo, mas eu prefiro ver Léo, né? Mas eu vou ver um pouquinho de cada coisa. Venho acompanhar as tias. É, as tias, é, com certeza", disse Ellen Bárbara.
Ao longo dos anos, a família acompanhou diversos blocos e artistas, mas alguns se tornaram especiais. "Eu gostava muito de Carnaval. Porque minha família sempre curtiu o Carnaval. Minha família toda saía em blocos. Depois da idade, eu saía no Alerta Geral. Que massa! Agora no Alerta, nem eu não saio mais. Agora só mesmo dar uma voltinha, um bloquinho de samba leve e um camarote", contou Gilda de Jesus.
A facilidade de acesso ao circuito do Campo Grande e a paixão pelo samba são os principais motivos que levam a família a escolher o local para celebrar o Carnaval.
Quem é baiano provavelmente já ouviu os versos da cantiga que diz “São Cosme mandou fazer/ Duas camisinha azul/ No dia da festa dele/ São Cosme quer caruru”. É certo também que muita gente fica eufórica em setembro, na ânsia pelos convites para se esbaldar nos tradicionais banquetes em homenagem a Cosme e Damião e aos Ibejis.
Na esteira dos festejos, após receber muitos pedidos por orientações sobre o preparo dos pratos típicos do período, a afrochef baiana Paloma Zahir, que comanda o Kissanga Restaurante, em Salvador, resolveu fazer mais do que ensinar os passos dessa gastronomia regada a dendê. Ela decidiu desvendar os mistérios por trás desse costume bem baiano, juntando cozinha, história, cultura, religião, tradição e solidariedade.
“[Elas perguntavam] ‘Paloma, como é que faz o caruru, como faz o vatapá? O xinxim o tempero não pega direito, tem algum toque, tem algum segredo?’. E aí eu parei pra pensar em como entregar um conteúdo com mais qualidade para as pessoas. Eu falei ‘pô, não quero ficar só dando direcionamentos curtos, vou formular uma coisa mais completa’. E aí, pelo fato de eu ser uma mulher de Axé, de ser iniciada no Candomblé, eu lembrei de como iniciou a tradição aqui do caruru de Cosme e Damião e toda essa questão também da fraternidade, de matar a fome das pessoas”, explica a cozinheira, que, neste sentido, resolveu criar o Workshop Caruru dos Ibejis, para apresentar dicas culinárias, mas também promover discussões sobre ancestralidade (saiba mais).
Totalmente virtual, o projeto será ministrado ao vivo, na próxima segunda-feira (20), a partir das 13h, por meio da plataforma Zoom. Para aqueles que não puderem acompanhar em tempo real, o conteúdo ficará disponível pelo período de um mês. O ingresso custa R$ 50 e a renda vai ser totalmente revertida para o Instituto Conceição Macedo, que apoia pessoas soropositivas na capital baiana. Além disso, o caruru preparado durante a atividade também será doado em quentinhas distribuídas nas ruas de Salvador, para pessoas em vulnerabilidade social. “Com toda essa pegada caótica que a gente está tendo na economia e como está mais difícil pra colocar comida na mesa, é uma forma também de eu estar entregando meu Axé às pessoas, em forma de comida, em forma de afeto”, pontua Paloma.
"É uma forma também de eu estar entregando meu Axé às pessoas", diz chef baiana que promove workshop sobre o tradicional caruru de Ibejis ou de Cosme e Damião | Foto: Divulgação
DICAS PARA MANDAR BEM NO CARURU
Ao Bahia Notícias, a chef deu alguns macetes para fazer um caruru como manda a tradição, sem sair de um orçamento que caiba no bolso. “Partindo da situação econômica do país, uma dica coringa é você começar a comprar os ingredientes com antecedência”, alerta a especialista, garantindo “uma economia absurda” para aqueles que não deixam para adquirir os produtos em cima da hora.
Outro ponto importante apontado por Paloma Zahir é evitar os excessos. “Em relação à questão de tempero, acho que as pessoas erram quando colocam mais itens do que o necessário. Porque comida baiana, principalmente o caruru de Cosme e Damião, dos Ibejis, que é uma comida votiva [comida preparada para oferecer a divindades], o tempero não é cheio de ingredientes”, adverte a cozinheira. “O único que leva mais tempero mesmo é o vatapá, com as oleaginosas, o amendoim e a castanha. Mas no caruru, no xinxim e outras coisas, o tempero é básico. Tem gente que eu vejo colocando coentro, colocando tomate, que são coisas que não devem ser utilizadas”, instrui.
Paloma explica ainda que na gastronomia baiana há uma base simples para o preparo da maioria dos pratos: cebola e camarão defumado. Mas não o crustáceo tingido com corantes, que custa mais barato, e sim aquele que passa por um processo de cura com fumaça de verdade. “O segredo do caruru é você ter um bom camarão. O camarão é um dos personagens principais na composição do tempero”, resume.
“O segredo do caruru é você ter um bom camarão", alerta a cozinheira | Foto: Divulgação
A HISTÓRIA POR TRÁS DO BANQUETE
Todo mundo já foi criança um dia, e, na Bahia, provavelmente já figurou entre os sete meninos servidos com o caruru de Cosme e Damião, ou dos Ibejis. A origem desta tradição, assim como o motivo da celebração no mês de setembro e o porquê de um banquete tão vasto em guarnições são algumas das informações que serão detalhadas no workshop.
“Vou falar como iniciou a tradição, vou contar os itans, porque se originou essa tradição na Bahia, como tudo ocorreu, para as pessoas entenderem. Porque o pessoal tem muito a cultura de comer o caruru, mas não procurar saber o porquê. Por que ele é em setembro? Como se iniciou?”, promete a afrochef. “Então, a questão é mesmo de trazer esses questionamentos e mostrar o quanto a cultura e a religião é potente ainda no nosso dia a dia”, pontua.
Para os leitores do BN, Paloma adiantou algumas explicações. Conta a lenda que Exu costumava entrar no palácio e devorar toda a comida servida ao rei Xangô. Contrariado, o orixá da justiça resolveu armar uma cilada com a ajuda de seus dois filhos gêmeos, os Ibejis, que propuseram um desafio para que o visitante parasse de “roubar” a comida do pai.
“Essa questão dos pratos vem do Itan, os contos africanos. O que acontece? Os Ibejis são os filhos de Oyá e Xangô. Teve uma certa vez que Exú desafiou Xangô em questão de dança, e aí Xangô colocou seus filhos, sem Exu saber. Então, a questão era, Exu disse que aguentava dançar por muito tempo. Xangô então colocou um dos Ibejis pra tocar. Ele tocava, tocava, tocava, e quando um ficava cansado o outro trocava de lugar. E Exu não percebia isso, porque, na verdade, ele estava comendo as coisas de Xangô. E aí ficou nessa questão e Exu não aguentou (risos) e perdeu”, conta Paloma.
Vencida a aposta, Xangô decidiu dar uma compensação aos filhos. “Aí, em comemoração a isso, Xangô perguntou aos Ibejis o que eles queriam. Eles falaram que queriam o que ele recebia, mas como Xangô comia amalá, com rabada e pimenta, que Ibejis não gostam, eles disseram que poderia ser o caruru mesmo”, narra a chef baiana, lembrando que a celebração não ficou restrita aos gêmeos. “Ele convidou também os outros orixás e cada um levou seu prato preferido, por isso que é o banquete. Tem o caruru de Ibeji; tem o vatapá, que é uma associação ao ipeté de Oxum; você vê a abóbora, que tem enredo com Iansã; o abará a Oxum também; arroz a Iemanjá; o milho branco a Oxalá; e por aí vai. Então, todos os orixás são representados ali naquele banquete. Por isso que o banquete é grande, porque todos os orixás estão ali em comunhão com Ibeji”, detalha os motivos pelos quais o caruru dos Ibejis é tão farto.
Os sete meninos, por sua vez, são representados pelos Ibejis, que não são apenas os dois gêmeos filhos de Xangô. “Tem uma legião de sete crianças, de sete divindades africanas, que não são cultuadas totalmente aqui no Brasil, porque a cultura foi se perdendo. Com o tráfico dos negros pela a travessia atlântica e aquela questão de você não ficar com pessoas da mesma região, então as culturas foram se dispersando, foram tendo uma fusão com a questão da resistência. Então aqui ficou só o culto a Ibeji no Ketu, ou Vunje na nação de Angola, Jeje, por essa questão. Então eles pegaram e cultuaram dois, que é Taiwo e Kehinde, mas tem as outras cinco divindades”, conta a chef. Os outros cinco são Idhoú, Alabá, Talabí, Adoká e Adosú, sobre os quais ela também vai falar no seu workshop.
Registro de Pierre Verger do Caruru de Sete Meninos
TRADIÇÃO NA BAHIA E ASSOCIAÇÃO COM COSME E DAMIÃO
Não é segredo para ninguém que existiu e ainda segue existindo preconceito contra as religiões de matriz africana no Brasil. Foi por isso, que na Bahia, o caruru dos Ibejis foi associado aos santos Cosme e Damião, celebrados pelos católicos em 26 de setembro.
“A gente tem os Ibejis, que são as duas crianças, e temos Cosme e Damião. Como já tinha essa cultura da comemoração do dia de Cosme e Damião, uma grande ialorixá aqui da Bahia fez isso [associar as divindades africanas aos santos], porque ela queria continuar a dar o caruru, que era uma tradição dos Ibejis, mas tinha a questão da perseguição religiosa”, explica Paloma Zahir. “Não gosto do termo sincretismo religioso, eu vejo isso como uma questão de resistência mesmo que os negros tiveram naquela época pra poder continuar a seguir com sua religião e sua culturas”, pontua.
“Pra ter liberação desse culto, tinha que dizer que era de Cosme e Damião, já que ficava próximo da data de comemoração deles. Então, é mais uma maneira de fortalecer e seguir a tradição, e um jeito de burlar mesmo a perseguição”, destaca a cozinheira sobre a estratégia usada para manter um costume que era proibido pelas autoridades da época. “O que aconteceu foi que as crianças começaram a aparecer próximo da roça de Candomblé, e aí ela serviu o caruru, as crianças ficaram brincando, teve aquela profusão de crianças, e daí continuou essa cultura, essa tradição, até os dias de hoje. O caruru de Cosme e Damião, o caruru dos Ibejis, veio em celebração a matar a fome das crianças que estavam passando por necessidade. Foi uma maneira também que o Candomblé achou de ajudar ao próximo, ajudar os seus irmãos”, acrescenta.
E foi assim que o célebre caruru se tornou um delicioso costume em setembro na Bahia. Especificamente, a festa é celebrada no dia 26 pelos devotos de Cosme e Damião e 27 por aqueles que cultuam os Ibejis, mas o hábito acabou se estendendo por todo mês de setembro.
Consumir os pratos típicos da culinária baiana virou tradição também às sextas-feiras. Segundo Paloma, isso é fruto de herança ancestral dos negros, pois é neste dia da semana que eles se reorganizam e fazem um banquete para entrar em comunhao entre si e comer bem. “As pessoas acham, erroneamente, que preto não pode ter fartura, mas os africanos têm fartura em sua essência. E a sexta-feira é o dia de estarem entre si, de lembrarem de onde vieram. Acaba sendo um momento de resistência”, conclui a chef, orgulhosa de ser mulher, preta, baiana e de Axé.
Para marcar o mês de setembro na Bahia, a afrochef Paloma Zahir, do Kissanga Restaurante, promove um workshop no qual ensina o preparo do caruru de Ibejis, ou de Cosme e Damião, além de discutir aspectos da ancestralidade e da cultura por trás desta tradição.
A atividade será ministrada ao vivo pelo Zoom, no dia 20 de setembro, a partir das 13h. Os interessados podem adquirir ingressos através do Sympla, pelo valor de R$ 50. Quem não conseguir assistir ao vivo, poderá acessar o material pelo período de um mês.
Visando cumprir o que a afrochef considera papel social da gastronomia ancestral, as quentinhas produzidas durante o workshop serão doadas a pessoas em situação de vulnerabilidade social, nas ruas do centro de Salvador. Os valores arrecadados com as inscrições, por sua vez, serão doados para o Instituto Conceição Macedo, que fica auxilia pessoas soropositivas, dentre elas crianças.
SERVIÇO
O QUÊ: Caruru dos Ibejis com a AfroChef Paloma Zahir
QUANDO: Segunda-feira, 20 de setembro, às 13h
ONDE: Zoom
VALOR: R$ 50 (clique aqui)
Nesta sexta-feira (20), dia em que Bruno Reis assinou a ordem de serviço para a recuperação do Memorial das Baianas (saiba mais), a prefeitura contratou, por meio da Secretaria de Cultura e Turismo, uma empresa responsável por fazer o censo da categoria, cujo ofício foi registrado em 2005 como patrimônio cultural brasileiro pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
O documento, que prevê a contratação da Consulting do Brasil - Consultoria & Inteligência em Negócios Governamentais para realizar o censo socioeconômico das baianas de acarajé de Salvador, foi publicado na edição do Diário Oficial do Município desta sexta (20).
O valor global estimado para o serviço é de R$ 122.100 e o prazo de execução previsto é de 60 dias após emissão da ordem de serviços.
Depois de destravado o processo burocrático junto ao governo federal para liberação dos recursos (saiba mais), o prefeito Bruno Reis assinou, nesta sexta-feira (20), a ordem de serviço para a recuperação do Memorial das Baianas, situado na Praça da Sé, em Salvador. "Esse memorial representa a história, os valores, e, principalmente, a tradição de um dos principais símbolos do nosso estado, da nossa cidade: as nossas quituteiras, as nossas baianas de acarajé", comemorou o gestor municipal.
Em sua fala, Bruno agradeceu ao deputado Márcio Marinho por destinar cerca de R$ 450 mil de suas emendas parlamentares ao projeto e ressaltou a importância da preservação do patrimônio. “Todo homem público, todo gestor que quer deixar uma marca na sua gestão tem que ter a capacidade de reconhecer os símbolos da nossa história. E as baianas representam a história da nossa cidade, do nosso estado”, assinalou.
Além de destacar o potencial do museu como guardião da memória e da cultura local, o prefeito reafirmou a importância do equipamento como um dos esforços de sua gestão voltados para dinamizar o turismo da capital baiana, sobretudo o etnico. "Quando você faz um investimento como esse, você resgata o passado, mas você também aponta para o futuro. Porque esse equipamento aqui das baianas será visitado por nós soteropolitanos, mas também por milhares de turistas que vêm ao Centro Histórico, que vão aqui comprar o acarajé da baiana, a água de coco, a fitinha do Senhor do Bonfim. Vão andar no Uber, no táxi, vão frequentar os bares e restaurantes de nossa cidade, dormir nos hotéis, vão deixar dinheiro na cidade, e com isso vão melhorar a vida incrementando a renda de milhares de pessoas que dependem do setor de serviços, tão fundamental para a economia da nossa cidade”, declarou Bruno Reis.
RECUPERAÇÃO
Desenvolvido pela Fundação Mário Leal Ferreira (FMLF), o projeto visa melhorar e valorizar toda a estrutura do espaço, que se encontra degradado. Estão previstas intervenções da cobertura, complementação em laje pré-moldada, assim como melhorias no revestimento das paredes, no piso e nos forros, além de pintura, instalação de esquadrias de madeira, metálica e vidro.
SOBRE O MEMORIAL
O espaço foi inaugurado em 2009, com o objetivo de preservar a tradição e a história das baianas do acarajé, ofício registrado em 2005 como patrimônio cultural brasileiro pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Fechado desde março de 2020, por conta da pandemia, o equipamento cultural viu acelerar o processo de degradação que vinha ocorrendo ao longo dos anos, tendo passado por uma série de invasões e sofrido danos causados por agentes naturais.
Um grupo de lideranças do município de Cachoeira, situado no Recôncavo baiano, esteve na Secretaria de Promoção da Igualdade Racial (Sepromi), nesta terça-feira (20), para discutir o fortalecimento dos povos e comunidades tradicionais da região, principalmente na proteção dos seus territórios.
Dentre as pautas da reunião, estava a série de ataques ao terreiro Icimimó, que recentemente teve sua área invadida e espaços sagrados depredados. Para tratar deste tema, a titular da Sepromi, Fabya Reis, recebeu o babalorixá Antônio da Silva, conhecido como Pai Duda de Candola; a prefeita Eliana Gonzaga; o cantor e compositor Mateus Aleluia; além de outros amigos e filhos do terreiro.
Terreiro é alvo de ataques consecutivos | Foto: Divulgação
A casa religiosa, que encontra-se em período de obrigações religiosas e recebe periodicamente visitas de pessoas idosas, teve sua rotina prejudicada por causa de constantes episódios de violência. No mais recente, ocorrido na semana passada, parte de sua vegetação foi destruída e o caso foi registrado em delegacia.
O Icimimó é um terreiro centenário, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e registrado pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac).
“Reafirmamos compromissos na proteção destes patrimônios, na atenção ao conjunto de comunidades da região, que também são alvo de diversas investidas, para as quais estamos pedindo apuração rigorosa dos órgãos do Sistema de Justiça”, pontuou a secretária Fabya Reis.
Nascido em Alagoinhas, no Agreste baiano, Adrião Filho (30) é formado em Direito, tem mestrado em Ciências Sociais, mas encontrou na poesia que lhe acompanha desde a infância a possibilidade de viabilizar o doutorado em Lisboa, Portugal.
Inspirado pela paisagem rural e o gosto pelas letras herdado do avô, o advogado e poeta lançou recentemente seu primeiro livro, “Redemoinho”, cuja renda será revertida para custear sua segunda incursão acadêmica na Europa. A primeira delas foi entre 2015 e 2018, quando, no intuito de se debruçar na pesquisa sobre estado de bem estar social, estudou o programa Bolsa Família em mestrado na École des Hautes Études en Sciences Sociales, em Paris, na França.
Para concretizar aquela empreitada, ele reuniu as economias de mais de cinco anos de trabalho na Federação dos Comerciários, onde passou pelo cargo de assistente de administração, até conseguir uma vaga no setor jurídico, área de sua formação.
Durante a experiência internacional, Adrião tinha sede de conhecimento e aproveitou todas as possibilidades, dentro e fora da Universidade. “Através do Mestrado eu pude descobrir que o Bolsa Família, querendo ou não, é um programa de viés neliberal de transferência de dinheiro, de nascimento, digamos assim, de direita, mas abraçado pela esquerda. E nesse meio de campo conturbado e não muito dado à reflexão, nós temos a direita chamando um programa cunhado nas escolas desta direita de comunista e esquerdista, e temos as esquerdas vendo o programa como seu, salvador das terras e dos céus”, explica o baiano, que a partir dos estudos visualizou com mais clareza a complexidade do cenário no Brasil.
Adrião em um dos intervalos do Mestrado, enquantro trabalhava de babá cuidando dos irmãos Isaure e de Basile (o fotógrafo), que brincam em um parque em Paris | Foto: Arquivo Pessoal
Na França, quando aliava a pesquisa a serviços como babá e garçom, ele também despertou uma maior consciência de classe e a respeito dos direitos trabalhistas, já que o país é pioneiro na luta pela humanização das relações laborais. “Enquanto estudante de direito, atuei muito na área trabalhista. Foi interessante ver o cenário da legislação na França. Coisas simples mostraram como o zelo pelo cidadão traz uma resposta à saúde pública futura”, conta Adrião, lembrando um episódio no qual colegas mulheres da época em que servia mesas em uma creperia de Paris não podiam carregar insumos pesados, pois estudos indicavam que aquele tipo de atividade era agravante para a incidência de câncer no colo do útero.
Já ambientado, ao concluir os estudos, o pesquisador, advogado e poeta poderia seguir no país, após ser aprovado em um doutorado com um sociólogo especialista em pobreza. A realidade no Brasil, entretanto, abortou o projeto. Era outubro de 2018 quando ele resolveu “deixar o discurso” e partir para o concreto, retornando à terra natal para votar no segundo turno das eleições presidenciais. “Era uma questão de humanidade”, lembra. “Decidi voltar para o Brasil, não me arrependo, mas sigo chocado com o quão desumano, vil, perverso e pervertido o ser humano pode ser ao tratar temas tão sensíveis e importantes, como se fosse futebol”, avalia, em crítica frontal à polarização protagonizada pelos chamados “petralhas” e “bolsominions”.
De volta à casa, Adrião trabalhou por seis meses no escritório de advocacia do pai, chegou a pensar em enveredar na política como vereador, mas entendeu que a dureza da disputa eleitoral e a burocracia do ofício de operador das leis não lhe despertavam a mesma paixão que as artes. Em 2019 ele resolveu se mudar para São Paulo e viver com a namorada da época. Durante um ano, o baiano deu aulas de francês, até fez algumas petições para complementar a renda, mas se dedicou de corpo e alma às letras.
Adrião com o avô e o irmão recém-nascido, no avarandado da casa dos avós, próximo a Rafael Jambeiro, nos Dez Réis, onde ele escutava histórias passadas de geração a geração | Foto: Arquivo Pessoal
Foi naquele período, fruto das andanças pela capital paulista que nasceu o livro “Redemoinho”. O despertar surgiu pelas ruas do bairro de Santa Cecília, quando um taxista gritou para um morador de rua: “vá trabalhar, vagabundo!”. “O mendigo era conhecido na região, trabalhava com coleta seletiva. Aí ele deu risada, olhou para o taxista e falou assim: ‘rapaz, eu tenho endereço fixo, não devo ao banco não, eu sou livre, vá trabalhar você, vagabundo!’. Eu achei genial, o taxista deu risada, buzinou pra ele e seguiu”, conta o poeta. “E aí, eu falei: gente, tá aí! Tudo é uma questão de afeto, de acolhimento”, conclui o artista de discurso acelerado, revelando que vez por outra é incompreendido pelos amigos, mas diz ser bem interpretado pelos “ditos mendigos e os doidões”, que nunca lhe pediram que repetisse suas falas. “No final, o que importa é estar abraçado, é o diálogo estar fluindo alí”, conclui.
O grande fio condutor da história, então, virou aquele morador de rua. “Ele me permite falar sobre os atores sociais marginalizados, falar dos discursos marginais, que falam de verdades da sociedade, me possibilita ser o observador, porque tudo passa por ele na rua. Ele me possibilita costurar a ideia de afeto e acolhimento. E aí eu falei: ‘temos aí um personagem’”, detalha Adrião Filho.
Além da inspiração concreta das ruas, as tradições ancestrais também deram tom ao projeto. “Redemoinho foi girando, os orixás foram permitindo com muito axé, porque eles costuram todo esse novelo de redemoinhos que giram e giram. Escutando o ‘Obatalá - Uma Homenagem a Mãe Carmen’, encabeçado por Gil, eu pensei: é isso. Ela [Mãe Carmen] fala que terreiro é um espaço de acolhimento, um espaço de afeto, fala que não há hierarquia como lá fora, mas o respeito que forma hierarquia. Aqui todo mundo é pai, é irmão, irmã, filhos e filhas. E aí eu falei: é isso que é basicamente a mensagem de ‘Redemoinho’: acolhimento e afeto”, explica.
Paralelo à obra literária, a ideia de seguir os estudos nunca morreu para o baiano, que por indicação de um amigo residente em Portugal, viu as portas se abrirem para o doutorado na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Desta vez, a pesquisa é na área de Gestão de Patrimônio Imaterial, com o tema “Terreiros de Candomblé - Potências Socioeconômicas“, que casa com o livro e toda sua trajetória, tanto acadêmica quanto pessoal.
“Eu vi a oportunidade e pensei que estava diante de um tema que é muito importante. Porque eu sempre falei isso: os marginais, via de regra, são os explorados. A gente pega a mulher, que sofre feminicídio, machismo, e a sociedade global vai da economia doméstica e faz trilhão no mundo e não é paga; você bota o Brasil, a sociedade foi construída pelos pretos, que são os marginais; os índios; os homossexuais que são abusados em toda estrutura. Estruturalmente você vai ver que os marginais são abusados, explorados, oprimidos e expropriados da possibilidade do ser”, conta Adrião, que a partir desta análise entendeu que os orixás “costuram todas as narrativas”, desde o livro até o doutorado. “O que é o terreiro na Bahia e em Salvador? É uma potência socioeconômica. Por quê? Na pandemia, a cidade de Salvador deixa de receber R$ 1,7 bilhão sem o Carnaval. O Carnaval da Bahia é diferenciado e é essa grande festa por quê? Porque, basicamente, se inspira na festa de terreiro, ou seja, no grande culto chamado festa, que é o grande presente que nos foi dado por Olodumare”, concluiu o poeta, destacando a contribuição social e econômica das religiões de matriz africanas, ainda que elas sejam marginalizadas.
“Partindo do universo que se delimita e se expande dentro dos Terreiros de Candomblé, temos a pretensão de trabalhar com uma tese que gire em torno ‘Dos ganhos socioeconômicos que se advêm da implementação de políticas públicas de proteção ao patrimônio imaterial (fazendo uma imersão no universo da pretitude baiana), articuladas às proposições das convenções internacionais’. Enfim, a correta gestão do patrimônio imaterial tem o poder de preservar, valorizar e ampliar os bens que o compõem”, resume.
O artista Davi Rodrigues lança, nesta quinta-feira (7), o livro “Folia de Oti - Jogos e Brincadeiras Populares do Recôncavo Baiano”. Em formato virtual, o lançamento da obra acontecerá a partir das 16h, através do YouTube, e contará com a participação do cantor e compositor Mateus Aleluia, da educadora e pesquisadora Sálua Chequer e apresentação musical do poeta e compositor Fábio Haendel.
“Folia do Oti - Jogos e Brincadeiras Populares do Recôncavo Baiano” busca valorizar o imenso repertório de brincadeiras que o Brasil possui, algumas herdadas dos povos africanos e europeus, muitas com referências indígenas e outras com intenso valor folclórico. O livro é composto por 50 brincadeiras e utiliza poemas e ilustrações como recurso de aprendizagem. É direcionado a crianças de 04 a 12 anos e será distribuído como material didático-pedagógico para escolas públicas da região.
Através do livro, espera-se que as crianças possam experimentar e compreender o mundo à sua volta, testar habilidades físicas, aprender sobre regras e sobre ganhar e perder. É também um recurso para aprimorar o desenvolvimento da inteligência emocional e das relações sociais durante a infância.
Além do lançamento, o projeto propõe uma agenda de formação para professores, educadores e demais profissionais pedagógicos ou educativos que utilizarão o livro em suas aulas. Além do conteúdo relacionado ao próprio livro, a formação abordará tópicos sobre a preservação dos jogos e brincadeiras enquanto ferramenta mantenedora da memória afetiva da cultura popular e tradicional.
O projeto tem apoio financeiro do Estado da Bahia através da Secretaria de Cultura e da Fundação Cultural do Estado da Bahia (Programa Aldir Blanc Bahia) via Lei Aldir Blanc, direcionada pela Secretaria Especial da Cultura do Ministério do Turismo, Governo Federal.
Estilizadas ou tradicionais, as quadrilhas não irão desfilar nos principais circuitos juninos deste ano. Em razão da pandemia do novo coronavírus (Covid-19) as cidades que sediam os festejos de São João, São Pedro e Santo Antônio tiveram suas comemorações suspensas por determinação do governo estadual. Algumas delas resolveram cancelar muito antes e se adiantaram em relação à decisão do governador Rui Costa (relembre aqui).
Em Cruz das Almas, no Recôncavo, gritos de “anarriê” também não serão escutados nas quadras. De acordo com Benedito Paiva, presidente da quadrilha Mistura Gostosa, a agremiação foi pega de surpresa pela pandemia. Com 80% dos preparativos prontos, ele conta que o enredo deste ano traria a história de uma garota que tem a vida arrasada por uma aposta do pai, que a "perde" em um jogo de azar.
"Íamos fazer uma viagem pelos jogos, a fé religiosa, a fé nos santos, mas tudo foi por água abaixo. Tínhamos as melhores expectativas. Havia um incentivo maior, estávamos dando alguns passos, íamos participar de concursos em mais de dez cidades do Recôncavo, no Sul do estado e pensávamos até em participar de competições em outros estados", relata o presidente da Mistura Gostosa, afirmando que apesar da não realização dos desfiles a agremiação não parou de fazer reuniões para "voltar com tudo" no próximo ano.
Semelhante à situação do grupo cruzalmense, a diretoria da Quadrilha Asa Branca, de Salvador, também continua trabalhando remotamente. A agremiação estava com 60% do projeto em execução e teve que parar quando viu que a pandemia não permitiria ao grupo seguir em frente. "Nosso processo de construção é dividido em cinco etapas e já tínhamos cumpridos três. No dia 13 de março a diretoria convocou assembleia extraordinária e suspendeu o trabalho por 15 dias, no dia 21 vimos que não daria para dar continuidade em decorrência da pandemia e suspendemos o nosso trabalho para o São João 2020", conta o diretor de marketing da quadrilha, Rarén Araújo. A Asa Branca tem em seu quadro mais de 200 colaboradores que auxiliam diretamente e indiretamente na execução dos trabalhos.
Foto: Caio Vinícius | Quadrilha Asa Branca
Conforme aponta o Fórum Permanente de Quadrilhas Juninas, a situação dos grupos baianos não difere das outras no resto do país, que paralisaram as suas atividades coletivas como ensaios, produções e apresentações. "Os trabalhos temáticos, ou seja, a construção dos espetáculos, foram guardados para 2021. Algumas atividades internas já tinham sido iniciadas, a exemplo da produção de figurinos, cenários, adereços, composições coreográficas e musicais, o que significa a compra de materiais diversos e a contratação de profissionais para a realização das mesmas", relatou Soiane Gomes, representante do fórum, ao Bahia Notícias.
Não há um número exato de agremiações na Bahia, mas só no último Campeonato Estadual de Quadrilhas Juninas da Bahia, organizada pela Federação Baiana de Quadrilhas (FEBAQ) em parceria com a Bahiatursa, no ano passado, participaram 43 grupos que utilizam da linguagem artística popular - todos eles associados à FEBAQ.
O fórum reclama que as agremiações, mesmo as associadas, não tiveram nenhum plano emergencial de auxílio ou ações compensatórias pelos recursos investidos por parte da federação ou pelo poder público. Tudo o que tem sido feito para dar apoio aos integrantes das agremiações tem acontecido de maneira independente pelos próprios grupos.
Tal falta de apoio tem trazido implicações negativas para o cenário artístico. Isso é o que explica Vilma Soares, presidente da Associação de Quadrilhas de Feira de Santana. "A realidade das quadrilhas de Feira é uma das piores, por falta de apoio do poder público e também empresarial elas estão cada vez mais extintas", explica. Este ano, a entidade voltaria a realizar uma competição anual, que estava sendo articulada desde janeiro, o "Arraiá de Santana".
Foto: Reprodução | "Arraiá de Santana", na quadra do Sesc Feira de Santana
O QUE ESTÁ POR VIR
Mesmo com a suspensão dos festejos, o sentimento geral dos representantes das quadrilhas que conversaram com o Bahia Notícias é de que a interrupção das apresentações e da preparação foi a melhor alternativa.
"Apesar da tristeza por não ter um São João, temos que ter responsabilidade com o próximo e entender que a vida vale mais do que o festejo. É preciso nos cuidar agora para estarmos juntos no futuro", contou Ráren, da Asa Branca, que vai realizar um festival solidário virtual no próximo dia 26 para arrecadar cestas básicas a serem destinadas aos seus brincantes.
O meio virtual como alternativa também foi escolhido pela Quadrilha Raízes do Iguape, que vai realizar uma live para falar sobre a sua história no próximo dia 30 de junho.
O QUE DIZ A BAHIATURSA
Procuramos a Bahiatursa. À reportagem, o órgão de fomento ao turismo do governo do estado admitiu não ter "uma verba destinada a este tipo de projeto". "No entanto, estamos atentos a solicitação do fórum [de quadrilhas] e estudando possíveis ajudas", acrescentou.
Somando mais de 50 anos de tradição, a Mudança do Garcia segue concentrada no fim de linha do bairro, nesta segunda-feira (24), com seus blocos de protesto, personagens fantasiados e o folião assíduo, que não deixa nenhuma edição passar em branco. A saída dos trios estava marcada para as 11h, mas houve um atraso no Circuito Riachão.
Dentre as figuras tarimbadas na folia engajada da Mudança, que este ano tem “Intolerância Zero” como tema, estão Divina Valéria (clique aqui) e o ator George Washington (clique aqui), que nasceu na liberdade, mas sempre vai ao bairro do Centro de Salvador.
Até as 12h, o movimento de blocos de protesto foi menor em relação ao carnaval passado, mas o movimento na via principal do Garcia é intenso.
Figurinha tarimbada no carnaval de Salvador, a atriz e cantora transformista carioca Divina Valéria acompanhou mais uma Mudança do Garcia, nesta segunda-feira (24), e comparou a festa no passado e atualmente.
“Participei tanto do carnaval da Bahia, que hoje eu sinto um carnaval diferente. Houve uma mudança, não tem mais aquela coisa tradicional do carnaval, da Mudança. É porque entrou muita gente que nem sabe o que é a Mudança do Garcia e eu que frequento há muitos anos, lógico que encontro uma diferença muito grande. Mas não deixa de ser uma coisa animada, ainda é uma coisa que resta do carnaval antigo e é isso aí”, avaliou a artista, lembrando que está presente na folia há mais de quatro décadas. “São 46 anos [de carnaval], eu fui homenageada pelo prêmio Dodô e Osmar há seis anos, pelos meus 40 anos de carnaval e são 12 anos de Bloco do Jacu. Hoje em dia eu venho pra Bahia mais pra olhar de fora, não participo muito como antes”, contou.
Divina Valéria destacou ainda a importância do “Intolerância Zero”, tema da Mudança do Garcia este ano. “É sempre importante alertar as pessoas porque essas coisas não tem que existir. Preconceito contra cor, contra pobreza, LGBT, contra todas as minorias”, disse a atriz, destacando que é inadmissível a violência, sobretudo no carnaval, “um momento de alegria, que as pessoas saem para se divertir”.
Das fobicas aos caminhões que hoje arrastam multidões ao som de gêneros musicais dos mais ecléticos, os 70 anos do Trio Elétrico são tema do carnaval do governo da Bahia em 2020. Para contar detalhes desta história, Armandinho Macêdo conversou com o Bahia Notícias e lembrou de alguns episódios interessantes sobre a invenção de seu pai, Osmar, e do amigo Dodô.
O Trio Elétrico, que na verdade era o nome de um conjunto musical e não do equipamento, surgiu em 1950, após os criadores presenciarem um desfile de uma orquestra de frevo pernambucana pelas ruas de Salvador. “Meu pai já gostava de frevo, e quando ele viu o povo enlouquecer com aquele Vassourinha, ele: ‘olha, essa é a música que vai detonar aqui!’”, recorda Armandinho. “Meu pai tinha uma [fobica] que ele dizia que usava no começo da metalúrgica dele para carregar as ferragens dele. E aí ele abriu o fundo, ampliou, fez meio caminhonete para carregar as ferragens dele, aí ele fez isso. Disse: ‘Olha, Dodô, já tenho meu carrinho, já tem um fundo aberto, vai eu e você ali, a percussão vai andando pelo chão e a gente sai tocando’. Rapaz, o negócio fez um sucesso! Quando saiu tocando aquele cavaquinho, aquelas cornetas, o povo enlouqueceu. E ele foi para a Castro Alves porque ele sabia que ali não tinha carnaval oficial e ficava sempre uma galera fazendo batucada, tinha uma concentração de um povão mais pobre que não tinha clube, que não participava daquele corso, daquele desfile de carros alegóricos e tal. E aí ele levou pra lá”, conta o músico, lembrando ainda que a novidade provocou euforia e confusão ao encontrar o Carnaval oficial. “Foi aí que deu um problema danado, porque na frente do Carnaval vinham uns homens na cavalaria, anunciando os que iam na frente. Quando eles chegaram perto do negócio, que viram ‘terenrenren’, diz que os cavalos empinaram, um caiu, se machucou, aí veio a polícia. Prende, não prende, leva e tal, mas o povo todo ‘solta, solta!’”, conta Armandinho.
Criador da guitarra baiana, o multi-instrumentista falou com o BN sobre a evolução da festa, a inclusão dos vocais nos trios elétricos a partir de Moraes Moreira, além da importância da valorização e continuidade do “que representa a cultura baiana”, a exemplo dos blocos afro e afoxés.
Armandinho destaca ainda que considera mais do que justa a homenagem aos 70 anos do Trio Elétrico e diz que não existe tema mais democrático. “Veio uma conversa de ‘ah, é que o pessoal está querendo uma coisa mais genérica, pra não favorecer a um e a outro’. E eu ainda falei: ‘mais genérico que o trio elétrico…’ (risos). Todo mundo, é bloco afro, axé, pagode, sertanejo, está todo mundo em cima do trio elétrico. Então, tá todo mundo utilizando o veículo, o carnaval da Bahia é feito por trios elétricos”, defende o artista, que subiu pela primeira vez no trio ainda criança, aos 10 anos, e permanece até hoje, junto com seus irmãos.
Os Palhaços do Rio Vermelho celebram 10 anos de existência em 2020, consagrando o espírito lúdico da infância através da figura do palhaço. Neste ano, o grupo desfila neste sábado (8), com concentração às 17h, na Quadra Esportiva na Rua da Paciência e saída às 19h.
Para o desfile, os Palhaços vão intensificar ainda mais a sua atuação, ampliando as intervenções artístico-cultural no bairro. O Movimento vai aproximar várias linguagens artísticas como artes plásticas, circenses e teatrais, através de ações que vão transformar o Rio Vermelho em um picadeiro cultural. O desfile ganha uma nova ala batizada do Rei da Coringada, que será acompanhada do grupo percussivo Toca Tambor.
“A expectativa é bem grande, ano passado foi um público que a gente não imaginava e sempre vem aumentando. Um público que vem fantasiado, com grupos de amigos e família, é sempre prazeroso. O nosso objetivo sempre foi isso, é uma retomada desse carnaval do povo para o povo, sem amarras, sem cordas”, explica Ruy Santana, um dos fundadores do movimento.
Para Bruno Leal, produtor do projeto, o desfile deixou de ser alegórico. “Trata-se da manutenção das principais manifestações folclóricas e culturais de todo o estado da Bahia. Aos poucos nos tornamos visibilidade para que o interior seja percebido pela população da capital e dos turistas que por aqui estão. Próximo passo é fixarmos o dia do nosso desfile no calendário anual das festas populares do município e do estado. É irreversível!”, conclui.
Criado com a bênção de Luiz Gonzaga, por Lindú (voz e sanfona), Coroné (zabumba) e Cobrinha (triângulo), em 1958, na cidade de Salvador – mais especialmente no Pelourinho –, o Trio Nordestino celebra este ano suas seis décadas de tradição. O grupo, que hoje está sua quinta formação, carrega no sangue o DNA do autêntico forró, com Luiz Mário no triângulo e voz (filho de Lindú); Beto Sousa (afilhado de Lindú) na sanfona; e Jonas Santana, na zabumba. Em entrevista ao Bahia Notícias, os músicos contaram um pouco sobre a trajetória, partindo das ruas do Centro Histórico da capital baiana, passando pelo Rio de Janeiro e chegando ao reconhecimento internacional. “Pra você ver, o ano passado acho que a melhor coisa que aconteceu durante a vida do Trio Nordestino toda, fora as outras coisas maravilhosas, foi a indicação ao Grammy Latino. Já imaginou, um grupo que saiu daqui, três garotos saíram da Bahia, amarrando a cachorrinha, pra correr atrás de um sonho e eles conseguirem depois de 60 anos ser reconhecidos pelo maior prêmio da música internacional?”, lembrou Beto Sousa. Apesar do sucesso no exterior, com passagens pela Europa, Estados Unidos e até Japão, o grupo ainda crê que falta espaço para o gênero musical. “Eu não digo no Brasil todo, digo a mídia em si. O problema da mídia é o modismo, mas a gente não esquenta com esse negócio de modismo, porque aquele que faz sucesso hoje, daqui a uns três meses ninguém lembra”, defende Beto, que diz não ter nada contra os sertanejos – gênero que hoje ocupa grande parte da programação nas festas juninas –, mas acredita que o São João deve respeitar as tradições nordestinas, com forró como principal estrela. "E as pessoas têm mania de dizer que o sertanejo cresce porque eles são unidos, mas é porque tem sim o investimento. O que acontece é a falta de investimento dentro do forró, porque se pegar um empresário desse que investe forte aí você vai ver que qualquer estilo estoura", avalia. O grupo falou ainda sobre as homenagens recebidas este ano e os planos de lançar um novo disco em homenagem à MPB e aos artistas nordestinos e também o primeiro DVD oficial do Trio Nordestino. (Clique aqui para conferir a entrevista completa).
Criador do “Forró Temperado”, estilo que, em sua essência, valoriza as diversas influências e o “não purismo” da arte, Zelito Miranda defende a tradição da festa junina e não apenas da música, que, para ele, deve evoluir. “Eu acho que a tradição, enquanto festa, enquanto marca São João, deve ser preservada. Agora, enquanto trilha sonora, forró, a música não é estática. Ou os forrozeiros também avançam na sua sonoridade, ou vão ficar numa mesmice de anos”, pondera. Nesta linha, atento às mobilizações dos músicos na campanha “Devolva Meu São João” (clique aqui e saiba mais), o cantor e compositor baiano diz ser simpático ao movimento, mas que discorda do discurso anterior, de “resgate o São João”, por considerar tal expressão equivocada. “O São João não está se afogando. Quem precisa de resgate é quem está sendo afogado. Mas, muito pelo contrário, o São João está vigorado, é a maior festa que nós temos no Brasil hoje, em termos de tudo, movimentação financeira, movimentação artística, é a festa que mais gera emprego e renda”, afirma o músico, destacando, no entanto, a necessidade de empoderar “quem é de direito”, já que, segundo ele, em referência à entrada em massa do Sertanejo nestas festas, há “uma tentativa de se arrancar isto do nordestino”.
Zelito diz que nomes já consolidados, como ele, não sofrem tanto com a “invasão” do estilo musical forasteiro, mas afirma que este fenômeno compromete a renovação da tradição junina. “A gente tem uma galera que está começando e, para que esta festa e esta trilha sonora do São João, que é o forró, seja mantida e revigorada, ela precisa de gente nova”, pontua, atribuindo aos velhos e novos forrozeiros a legitimidade artística e cultural dentro da festa tipicamente nordestina. “Está havendo uma tentativa de massacre mesmo, dos valores juninos. É desconexo”, completa Zelito, lembrando a decepção de um amigo suíço, que faz parte de um grupo de forró no país europeu, ao visitar o interior da Bahia no São João. “Ele foi para uma cidade no interior, não vou dizer o nome pra não criar problema, e quando chegou lá, as atrações principais eram Jorge e Matheus e Luan Santana. Ele saiu de lá de Zurique pra dançar forró e só foi achar no Pelourinho”, contou.
Zelito considerou "inconsequente" e condenou a resposta dada por Marília Mendonça a Elba Ramalho sobre a polêmica do sertanejo no São João | Foto: Paulo Victor Nadal / Bahia Notícias
Para o artista, o modelo do sertanejo é antigo e “perigosíssimo”. “O formato do sertanejo é invasor. Se você pegar recentemente, aquela cantora que eu nem ouço as músicas dela, aquela mulher é inconsequente”, disse ele, referindo-se a Marília Mendonça. “Ela pode até ter um trabalho legal, eu não conheço realmente, de fato, vi algumas coisas dela ligando no rádio, mas ela é inconsequente. A resposta dela, ‘vai ter sertanejo’, essa arrogância, falar mal de uma pessoa como Elba [Ramalho], é, no mínimo, inconsequente”, reiterou o músico, sobre a polêmica entre Marília e a cantora paraibana (clique aqui e saiba mais). “Graças a Deus ela [Elba] canta cultura nordestina, forró”, diz Zelito, destacando-a como um dos “astros que brilham no São João”. “Então, nessa discussão entrou Alcymar (clique aqui para lembrar), entrou Santanna, e principalmente os pernambucanos, porque mexeram num território complicado”, acrescentou.
Criticando o formado “industrial” do sertanejo, Zelito Miranda ponderou, no entanto, que a discussão não deve ser levada para o trabalho dos artistas. “Cada um canta o que quer, né? Eu acho que é um direito. Agora, os contratantes estão errados, estão indo pelo vil metal, pela grana. E eles podem destruir uma cena, que é uma das mais fortes que nós temos hoje no Brasil. Hoje, São Paulo está fazendo festa junina, pena que Portugal cancelou, por conta do incêndio, mas o mundo todo tem feito essa festa. Nós temos hoje catalogados 43 festivais de forró na Europa, que vai de Colônia na Alemanha, ao Oxford Forró”, salienta, afirmando que o São João é a única festa que tem indumentária, dança, culinária, e música própria, representando a riqueza cultural de um povo.
Zelito recriou o ambiente do 'arraiá' nas dependências do Museu de Arte da Bahia | Foto: Saulo Brandão
Dentro deste contexto e contemplando todo esse conjunto, Zelito Miranda realiza, neste domingo (25), no Museu de Arte Moderna da Bahia, mais uma edição itinerante do Forró no Parque. No local, o público poderá curtir o forró do artista em um ambiente que remonta um “arraiá”, com barracas de comidas típicas e ornamentação temática (leia mais aqui).
Salvador conta com mais 64 dias de eventos oficiais e/ou tradicionais no calendário festivo da cidade, entre acontecimentos maiores como o Carnaval, Réveillon, Festival da Cidade, e as datas civis, a exemplo da Independência da Bahia, no feriado do 2 de Julho. A capital, que há tempos leva fama de festeira, foi cenário de um longo Carnaval neste ano, com 11 dias de comemorações (lembre aqui). Segundo informações da Empresa Salvador Turismo (Saltur), somente este evento movimentou cerca de R$ 1,5 bilhão na economia local e gerou cerca de 250 mil empregos. A fartura em dias de festa também aconteceu no último Réveillon, com 5 dias de celebração e uma grade extensa de shows (relembre aqui). Já o Festival da Cidade, que marca a homenagem aos 468 anos de Salvador comemorados nesta quarta-feira (29), terá uma programação diversa espalhada por 9 dias de 2017. Até mesmo o São João, que sempre foi mais forte no interior do estado, tem ganhado mais corpo na capital.
Mas se por um lado temos eventos com estruturas maiores, divulgação internacional e atrações de grande porte, Salvador também não deixa de lado a tradição: a Trezena de Santo Antônio envolve a população da cidade por treze dias de junho, unindo quermesse e festa junina; a Lavagem de Itapuã, a Segunda-feira Gorda da Ribeira e a Festa de São Lázaro unem os moradores dos bairros em homenagens mais intimistas e bem mais modestas; o Dia do Samba anima o público no Campo Grande; enquanto as festas de Santa Bárbara e do Dia da Baiana do Acarajé se firmaram como dias de relembrar por que a comida baiana é uma das mais conhecidas do país. Para o historiador Milton Moura, contudo, é necessário buscar um equilíbrio entre a expansão das festas populares, visando o turismo, e o incentivo às manifestações tradicionais da cidade. Moura é professor associado do Departamento de História e membro do Programa de Pós-Graduação em História e do Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade da UFBA, e tem como temática de referência o estudo sobre festas, sobretudo o Carnaval de Salvador e a Festa do Caboclo de Itaparica. Segundo ele, se por um lado algumas festas foram ampliadas, outras acabaram afetadas negativamente. “Por um lado as festas de origem popular, de tradição popular, estão diminuindo. As lavagens acontecem menos, a própria festa do Bonfim está mais modesta. A de Conceição terminou, Boa Viagem só tem um dia... e as que duravam alguns dias, como Itapuã, agora duram um. O que tem se estendido é o estilo de festival. A prefeitura tem promovido festivais, como a virada do ano e o próprio Carnaval, que tem uma dimensão de festival bem desenvolvida. Não acho propriamente ruim, mas devia se oportunizar a permanência de festas mais tradicionais. É muito difícil hoje você montar barracas para vender cerveja, é muito caro para os populares, e também o ônibus... quando não tem ônibus a noite toda, ou para muito longe, dificulta muito a presença das pessoas de bairros distantes”, explicou.
Moura defendeu, ainda, mais espaço e investimento a atrações locais. “A prefeitura tem insistido nas chamadas grandes atrações. Inclusive caras e de fora de Salvador. Acho que seria mais interessante investir em atrações locais de diversos formatos, vários estilos. E isso pode ser feito com boa margem de sucessos. Por exemplo, as Ganhadeiras de Itapuã que se apresentaram no encerramento das Olimpíadas e foram um sucesso. Se você ver, as crianças e adolescentes de Salvador e da Bahia se apresentam em programas de calouros são um sucesso. De ondem vem essas meninos e meninas? Vem de um meio em que se pratica isso”, apontou. Um exemplo citado pelo historiador foi o apoio dado a grupos afro durante o Carnaval. “O governo do Estado tem oportunizado as manifestações do mundo afro, como neste Carnaval o chamado projeto Ouro Negro trouxe muita gente de grupos como por exemplo o Bloco da Capoeira. Foi fantástico, apresentou no Campo Grande uma verdadeira ópera”, apontou. Por isso, ele acredita que o melhor modelo será aquele que conseguir abarcar as mais diversas manifestações culturais soteropolitanas: “Não é só apresentar o tradicional, mas é garantir a presença do que é tradicional no Centro. Agora atenção ao que é tradicional: não é aquilo que sempre foi, o tradicional muda. [...] É continuar com o que vinha do passado, sempre renovado. Isso é importante”.
O Pelourinho Dia & Noite compreende ações da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana, da Secretaria Municipal de Desenvolvimento, Trabalho e Emprego, que coordena as ações na área de economia criativa, a Transalvador, a Secretaria Municipal de Ordem Pública e outros órgãos. A FGM integrou o programa também no último ano, mas em setembro, e, além do samba, tinha em sua grade de projetos contemplados, o "Músicas nas Esquinas", o "Poesia no Pelô", uma programação infantil aos domingos, concertos nas igrejas e as oficinas e ensaios abertos na Casa do Benim. "Todos os participantes que se envolveram na temporada do Pelourinho Dia & Noite tinham ciência [do prazo] e, na verdade, o projeto era uma temporada de cinco meses encerrados em janeiro, mas íamos estender até fevereiro por sobra de recurso", ressalta Viviane Ramos, gerente de programação cultural do programa.
Com forte caráter religioso, as celebrações buscam conservar a tradição que já existe há mais de 400 anos, em Cairu. Nas ruas, a população se fantasia de rei e rainha, com vestimentas adornadas com miçangas e lantejoulas. Os negros relembram seus antepassados através da dança e da simulação de combate entre mouros e cristãos. “Esta é uma das festas mais importantes da cidade. Rica em simbologia, religiosidade, cultura e, com isso, resgata a autoestima da população local”, avalia Fernando Brito, prefeito de Cairu.
Entre as atrações musicais que se apresentam na Praça Teixeira de Freitas estão Kolé I Pan, Thierry e Xamegarte, no sábado, e Guig Ghetto, Samba Connós e ainda É Massa É Dez, no domingo. Para concluir a festa, a Barquinha - manifestação cultural local - desfila na segunda-feira (11) com o barco sendo arrastado pelas ruas da cidade.
Curtas do Poder
Pérolas do Dia
Capitão Alden
"Estamos preparados, estamos em guerra. Toda e qualquer eventual postura mais enérgica, estaremos prontos para estar revidando".
Disse o deputado federal Capitão Alden (PL) sobre possível retirada à força da obstrução dos apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no Congresso Nacional.