STF é acionado para corrigir termo pessoas negras ou pardas em decisão sobre cotas raciais
Por Aline Gama
O Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-Brasileiras (Idafro) protocolou nesta semana um pedido de retificação de erro material ou de autuação como embargos declaratórios de terceiro prejudicado junto ao Supremo Tribunal Federal (STF). A ação questiona a redação utilizada na tese de repercussão geral do Tema 1.420, julgado pela Corte, que trata do controle judicial sobre os processos de heteroidentificação racial em concursos públicos.
A decisão, proferida pelo Plenário Virtual do STF, sob relatoria do ministro presidente Luís Roberto Barroso, foi unânime. Ela afirmou que o Poder Judiciário pode revisar atos administrativos de heteroidentificação de candidatos que concorrem às vagas reservadas a pessoas negras ou pardas, assegurando o contraditório e a ampla defesa. O caso teve origem no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1553243.
No entanto, o Idafro sustenta que a expressão “pessoas negras ou pardas”, constante da ementa do tema 1.420, constitui um erro material aparente. De acordo com a entidade, a terminologia correta, consolidada na legislação e na própria jurisprudência do STF, é “pessoas negras”, termo que abrange tanto pretos quanto pardos, conforme classificação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A petição do Instituto argumenta que a distinção terminológica não é meramente semântica, mas jurídica e socialmente relevante. De acordo com ao Idafro, a Lei nº 12.990/2014, que regula as cotas raciais em concursos públicos, o Estatuto da Igualdade Racial (Lei nº 12.288/2010) e a Resolução CNJ nº 203/2015 empregam consistentemente a expressão “candidatos negros” para designar o grupo formado por pretos e pardos. Essa compreensão foi reiterada em julgamentos do STF, como nas ações ADPF 186 e ADC 41, que trataram da constitucionalidade das políticas de ação afirmativa.
A entidade afirma que o uso da expressão “pessoas negras ou pardas” no Tema 1.420 pode gerar insegurança jurídica e uma indesejada fragmentação do conceito de negritude, que é socialmente construído e fundamentado em critérios fenotípicos para fins de políticas reparatórias. O Idafro alerta que a redação atual pode ser interpretada como se “pardo” não fosse uma subcategoria do racialmente negro, o que contraria o entendimento pacificado.
O Instituto requereu que o STF promova a correção de ofício do erro material ou, alternativamente, que autue os embargos declaratórios para o fim de esclarecer a redação, tornando explícito que o termo “negro” abrange pretos e pardos. O objetivo é assegurar que a decisão não seja interpretada de forma a esvaziar o conceito jurídico de negritude, prejudicando a aplicação uniforme da política de cotas em todo o país.