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Documentário destaca trabalho de restauração liderado por advogada baiana após destruição do STF

Por Edu Mota, de Brasília

Dra. Manuellita Hermes
Foto: Rosinei Coutinho/STF

O dia 8 de janeiro de 2023 entrou para a história brasileira como a data em que uma marcha da insensatez, formada por raivosos manifestantes enrolados em bandeiras verde e amarelas, invadiu a Esplanada dos Ministérios em Brasília e promoveu uma violenta e injustificável destruição das sedes dos três poderes. Estimulados por discursos golpistas e de ódio falaciosos e delirantes, milhares de pessoas decidiram golpear a democracia com suas próprias mãos, em uma atitude desesperada para tentar solapar as instituições.

 

E uma das instituições mais atacadas pela turba investida de ferocidade poucas vezes vista em manifestações no País foi o Poder Judiciário, por meio da sede do Supremo Tribunal Federal, na Praça dos Três Poderes. Centenas de manifestantes quebraram as vidraças do prédio, invadiram as dependências da Corte e destruíram o que viram pela frente. O plenário foi vandalizado, o mobiliário danificado e empilhado, houve um ataque a renomadas pinturas e objetos históricos, e até mesmo uma cópia da Constituição foi exposta do lado de fora do prédio como um troféu símbolo da barbárie, para delírio da tropa ensandecida. 

 

Para que tão deprimente momento da vida nacional seja permanentemente lembrado de modo a que jamais alguém pense em repetir tamanha barbaridade, o Supremo Tribunal Federal lançou, na noite desta quarta-feira (30), um livro e um documentário sobre a violência cometida contra as sedes dos Três Poderes no dia 8 de janeiro. A cerimônia, ocorrida no Museu Ministro Sepúlveda Pertence, contou com a presença da presidente do STF, ministra Rosa Weber, além de outros ministros da Corte e diversas autoridades.

 

Ao falar na solenidade, a ministra Rosa Weber destacou que o livro e o documentário procuram mostrar a imediata resposta do STF ao ataque dos vândalos. A ministra elogiou o comprometimento de todo o corpo funcional da Suprema Corte para reparar os incontáveis danos causados pelos manifestantes. Para ela, as obras apresentadas agora ao público condensam a indignação, a força e a resiliência na defesa da democracia. 

 

“Em três semanas, graças ao esforço e ao comprometimento de todos, reabrimos o Ano Judiciário no Plenário reconstruído”, destacou a presidente do STF, lembrando o “cenário dantesco de devastação” que encontrou ao chegar ao edifício-sede do STF na noite de 8 de janeiro. 

 

O documentário “Democracia Inabalada”, assim como o livro, revela imagens inéditas dos ataques perpetrados pelos vândalos que invadiram o prédio do STF. São apresentados diversos depoimentos de todos os ministros da Corte, assim como de servidores e colaboradores que falam sobre os acontecimentos do 8 de janeiro, e deixam transparecer todo o seu assombro e choque diante do cenário de destruição encontrado. 

 

Os relatos detalham ainda a intensa operação de recuperação do prédio em meio aos escombros da passagem dos vândalos pelas instalações do Supremo. Tudo em apenas três semanas, já que no dia 1º de fevereiro a presidente do STF abriu o Ano Judiciário de 2023. 

 

Um desses depoimentos foi dado pela então secretária de Altos Estudos, Pesquisas e Gestão da Informação do STF, a advogada baiana Manuellita Hermes Rosa Oliveira. Ela era a responsável pela gestão das obras de arte e arquivo histórico da Corte quando aconteceu a invasão da sede do Supremo. Uma das primeiras demandas recebidas pela ex-secretária após os ataques foi conferir se a Constituição levada por um dos vândalos era a original. 

 

“Assim que eu tive a notícia, a primeira demanda que eu recebi foi em relação à Constituição. Aquele vândalo que apareceu com a Constituição em mãos, aquela cena muito forte, foi a primeira demanda que recebemos: saber se aquela Constituição era original ou não. E nós obtivemos a informação que não era a original”, explicou Manuellita Hermes no documentário, explicando que a Constituição levada pelo manifestante era uma réplica. Alguns dias depois dos ataques, o homem que levou a réplica da Constituição, Marcelo Fernandes, se entregou à Polícia Federal de Varginha (MG) e devolveu o exemplar.

 

“Foi uma destruição incrível. Quadros de Sebastião Salgado, de Masanori Uragami, então eu não posso mensurar o valor. Nós fizemos um levantamento para o TCU, mas quanto a esse patrimônio histórico, o valor é inestimável”, explicou a então secretária de Altos Estudos, que atualmente ocupa o cargo de coordenadora-geral de Assuntos Judiciais e Administrativos da Consultoria Jurídica do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. 

 

A baiana Manuellita Hermes comandou uma equipe de restauradores que trabalhou sem descanso na recuperação do patrimônio artístico, histórico e cultural destruído por manifestantes. O trabalho de restauração liderado por Manuellita Hermes recebeu elogios de toda a comunidade jurídica e inclusive da presidente do STF, ministra Rosa Weber. 

 

O destaque obtido pela advogada baiana nos trabalhos de restauração levou Manuellita inclusive a integrar uma lista de juristas negras que são citadas quando se discute a futura indicação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para cadeira no STF. O presidente terá que indicar um novo ministro na vaga que será aberta com a aposentadoria de Rosa Weber, no início de outubro. 

 

Recentemente, professoras e professoras da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA) assinaram uma moção conjunta na qual defendem a indicação da procuradora federal Manuellita Hermes Rosa Oliveira como próxima ministra do STF. Manuellita Hermes teve sua primeira graduação em Direito pela UFBA, e é procuradora de carreira da Advocacia Geral da União. Ela também atua também como coordenadora do Grupo de Trabalho de Igualdade Racial do Comitê de Diversidade da AGU, além de lecionar na Escola Superior da instituição. 

 

De acordo com levantamento feito pela Secretaria comandada por Manuellita Hermes, pelo menos 163 objetos do acervo do tribunal foram afetados durante os ataques golpistas. Apenas 35 objetos sofreram “perda total”, quando mais de 50% do objeto é danificado. A maior parte do acervo do Tribunal - cerca de 110 objetos - já haviam sido restaurados no início do mês de fevereiro, quando a Corte iniciou os trabalhos do ano.  

 

Um dos objetos que não teve como ser restaurado foi um bengaleiro em porcelana que ficava exposto no Salão Nobre, no segundo andar do edifício do STF. O vaso era datado do século 19 e ornava a sede original do Supremo, no Rio de Janeiro. Depois da passagem dos vândalos pelo STF, sobraram apenas fragmentos da histórica peça.

 

“Na Secretaria de Altos Estudos nós começamos a fazer um diagnóstico das peças, dos objetos passíveis de restauração e os que não eram passíveis de restauração com a manutenção da estética. A nossa ideia não era a de fingir que aquele objeto não foi alvo de uma ação violenta, mas mostrar que passou por um ato violento e aquilo passou a compor a sua história”, explicou no documentário a Dra. Manuellita, ao detalhar como se deu o plano para recuperação do acervo do STF. 

 

Todo o trabalho de restauração da equipe comandada por Manuellita Hermes também pode ser conferido na exposição “Pontos de memória”, na sede do STF, que reúne vestígios da destruição causada pelos vândalos. A exposição das peças danificadas e de provas do ataque do 8 de janeiro têm o objetivo de “documentar e ressignificar o sombrio episódio de 8 de janeiro, como também contribuir para que esse dia não caia no esquecimento ou mesmo seja banalizado com o passar do tempo”, como afirma texto de apresentação no prédio do Supremo.

 

O documentário “Democracia Inabalada”, de cerca de 57 minutos, estreia no dia 3 de setembro, às 22h, na TV Justiça. Já a versão digital do livro, que é dividido em oito capítulos, está disponível na página do Supremo Tribunal Federal na internet.