Opinião: 8/1: Esquerda e Lula “sequestram” ato e ausências de outras frentes reforçam extrema-direita
Por Fernando Duarte
Dois anos após o fatídico 8 de janeiro de 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva liderou o evento chamado pelo governo de “Abraço à democracia”. O ato é necessário, especialmente quando a tal democracia é vítima recorrente de atentados — seja no Brasil ou fora dele. A ascensão da extrema-direita é uma ameaça real nos últimos anos e os movimentos das big techs, ao lado de projeto de autocrata Donald Trump, são as partes mais visíveis disso. No entanto, ao ser inteiramente sequestrado pelo governo e pela esquerda, a memória do 8 de janeiro fica embaçada.
O ato realizado em Brasília, nesta terça (8), é necessariamente político. E tem que ser. Todavia, quando interlocutores relevantes, tais quais os presidentes da Câmara, do Senado e do Supremo Tribunal Federal, se ausentam de um evento de tal magnitude, a percepção do cidadão médio acaba sendo ruim — institucionalmente, Arthur Lira, Rodrigo Pacheco e Luís Roberto Barroso deveriam estar lá. Enquanto a direita se mantém ruidosa, com a estapafúrdia ideia de anistia aos crimes cometidos em 2023 e durante as articulações para um golpe de estado, a esquerda se vê como refém de um discurso reativo, permanecendo acuada frente à falta de palatabilidade desse adversário.
Há certo nível de culpa dessa esquerda quando a palavra “golpe” passou a ser repetida diuturnamente pelos petistas e aliados com referência ao impeachment de Dilma Rousseff. No entanto, passada quase uma década do episódio, convivemos com a banalização do termo, que, felizmente, acabou não se concretizando no final de 2022. Uma confluência de fatores contribuiu para isso, mas não foi a beatificação de Lula ou a democracia que garantiram a não ruptura institucional que bolsonaristas tanto almejavam. A proximidade e o tom de brincadeira com que Lula tratou Alexandre de Moraes, considerado algoz do bolsonarismo, apenas reforçam o discurso dos extremistas.
Por infeliz coincidência (ou não), na véspera do 8 de janeiro, o Meta se juntou ao X para eliminar eventuais restrições para a propagação de fake news, algo que abala os Estados democráticos de direito ao redor do mundo. Seja nos Estados Unidos, no Brasil ou na Europa, o poder concentrado por big techs donas de redes sociais é preocupante para a sobrevivência dessa utopia que nos acostumamos a chamar de democracia. Com o falso discurso de “liberdade de expressão”, voltamos praticamente ao marco zero da internet enquanto terra sem lei.
Convenhamos que, no caso do Meta, houve apenas uma aula básica de capitalismo. Com a perspectiva que Donald Trump jogaria contra as políticas até então adotadas pelo conglomerado de redes e com a possibilidade de nações ao redor do mundo regulando — e punindo financeiramente — a atuação de plataformas como Facebook, Instagram e WhatsApp, a defesa do lucro das empresas ianques se tornou uma justificativa “aceitável” para a união desses polos.
E essa extrema-direita, que ascende mais uma vez politicamente com Trump e com o apoio das redes sociais, é o grande adversário de quem defende a democracia e, consequentemente, é contra o que aconteceu no 8 de janeiro de 2023 em Brasília — ou no dia 6 de janeiro de 2021 no Capitólio dos EUA. É preciso reagrupar e reunir quem tem interesse em construir pontes ao invés de destruí-las para quem sabe tornar o “Abraço à democracia” muito mais real do que o simbolismo do ato. O sequestro do tema exclusivamente pela esquerda e a falta de posicionamento de lideranças da direita tradicional são sintomas de que talvez o caminho não esteja tão certo assim…