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Caso Gerson 'mostra como o racismo funciona no Brasil', aponta Observatório

Por Mauricio Leiro / Milena Lopes

Caso Gerson 'mostra como o racismo funciona no Brasil', aponta Observatório
Foto: Reprodução / Twitter

"Cala a boca, negro". O relato de Gerson, jogador do Flamengo, durante o jogo contra o Bahia (relembre aqui), escancara uma dura realidade do futebol brasileiro: o racismo. O Observatório do Racismo no Futebol aponta que mesmo com a pandemia, fato que espremeu o calendário do esporte profissional, foram monitoradas 29 denúncias nos campos brasileiros em 2020. 

 

O diretor do observatório Marcelo Carvalho acredita que o número é "muito grande para os poucos meses de futebol que a gente teve no Brasil". "Se a gente tivesse os 12 meses, teria mais ou menos 60 casos e chegaria muito perto do número de ocorrências de 2019. Ou seja, a curva, nesse caso, vai continuar subindo como vem acontecendo de 2014 para cá”, disse ao Bahia Notícias. 

 

Emblemático pela repercussão, o caso Gerson, segundo Marcelo, "mostra como o racismo funciona no Brasil". "Ele sofreu racismo e aí toda a questão de ter que comprovar que ele sofreu racismo porque a palavra dele só não basta. E aí tudo que ele disse que ele sofreu é colocado sempre em dúvida. Então são duas violências: a primeira é sofrer racismo e a segunda é ter a sua palavra desacreditada. E as pessoas ainda colocaram em dúvida sobre o caso dele pelo fato de que ele é 'malandro', outras vezes que o cara 'perdeu a cabeça'... inúmeras situações que colocam em pessoas negras para desacreditar suas palavras e a gente discute mais a vítima do que o agressor”, acrescentou. 

 

Como forma de combate, o observatório aposta em ações de conscientização e na nomeação de embaixadores para "quebrar e silenciar o que existe dos atletas de futebol no Brasil". 

 

"Poucos atletas falam de racismo e a maioria deles, quando fala, é a partir da denúncia de um caso e muitos nem sequer querem denunciar o caso que sofrem, por isso é tão importante a gente ter atletas e ex-atletas que falem de racismo. Através deles a ideia é promover debates, workshops e palestras para que a gente consiga ampliar o olhar da discussão para que a gente não caia na armadilha de achar que racismo é apenas quando uma pessoa negra é xingada e insultada”, comentou. 

 

Carvalho disse que, em 2020, o Observatório produziu ações em todo o ano para que o debate do racismo no futebol não fosse realizado apenas quando acontecesse um incidente. "Esse ano nós fizemos um vídeo chamado 'Poderia ser eu'. Depois nós lançamos mais dois vídeos falando sobre o silenciamento dos atletas, nós damos informações a respeito dos casos de racismo e geralmente isso é feito em momentos onde o assunto não está na pauta. Então a nossa ideia sempre é ampliar o tema quando a gente vê que praticamente não se fala mais de racismo no futebol, porque demorou algum tempo para ter um caso e entre um caso e outro a nossa ideia sempre é promover alguma ação pelo Observatório ou em parceria com algum clube para que o tema esteja sempre na pauta”, disse.

 

O CAMPEÃO E EMBAIXADOR: JOÃO MARCELO

Vitorioso em 1988 pelo Bahia, o beque João Marcelo faz parte do time de embaixadores do observatório. "Fizemos essa parceria principalmente porque o time de 88 tinham muitos negros. E como eu também já frequentava o Olodum, nós nos unimos em campanhas de conscientização", disse ao BN.

 

O ex-zagueiro explicou que o combate ao racismo também tem que partir da sociedade e ela deve "abraçar isso". "Enquanto a própria sociedade não reconhecer o racismo e disser que é 'mimimi', não vai adiantar", disse João Marcelo. 

 

CBF ATUANDO: EDNALDO RODRIGUES 

Após reunião com a Frente Nacional Antirracista com Rogério Caboclo, presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) (reveja aqui), algumas propostas foram apresentadas para o combate do racismo no futebol nacional. Ex-presidente da Federação Bahiana de Futebol e atualmente na vice-presidência da CBF, Ednaldo Rodrigues acredita na aplicação de punições exemplares.

 

"Entendo que tem leis que ainda são muito brandas. O Congresso deveria criar leis que pudessem ser mais combativas para isso. Isso já era para ter sido estancado. Tem sempre acontecido. Deveria ser mais rigorosa. Não só a CBF, a Fifa e a Conmebol têm o mesmo pensamento. Não tem nenhuma que acha que tem que ser branda e não punir. O problema é que não tem uma legislação nacional mais rigorosa. Os tribunais do esporte não podem ir além. Não encontram o rigor pois podem ser derrubados na Justiça comum. No esporte acontecem situações que não são na veemência do que acontecem em uma loja, supermercado. Aonde quer que aconteça tem que ter uma punição severa. O esporte tem suas leis e muitos acham que são brandas pois a Justiça comum pode derrubar", disse ao Bahia Notícias.

 

NÃO É UM CASO ISOLADO

Os casos de racismo no futebol revelam que não só "na frente das lentes" do esporte profissional acontecem os relatos.  Em Caldas Novas, cidade de Minas Gerais, durante uma partida da Caldas Cup, na categoria sub 11, o pequeno Luiz Eduardo Bertoldo Santiago foi às lágrimas após a partida. O motivo não foi o resultado do jogo, e sim racismo. 

 

Em prantos, Luiz Eduardo disse aos pais que o técnico da equipe adversária se dirigiu a ele com palavras de cunho racista. "Fecha o preto", relatou o garoto, que foi consolado por seu técnico. 

 

"Após tomarmos ciência do fato, não tivemos dúvidas, acionamos a Polícia Militar, fomos à delegacia e fizemos um boletim de ocorrência. De antemão manifestamos que iremos até as últimas instâncias em defesa de nosso aluno e contra mais um ato deplorável que mancha a imagem do futebol", disse o clube do garoto.

 

O caso ainda segue sendo apurado pela polícia.

 

Veja o relato do garoto: