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Artigos

Marina Domenech
Brasil: por que ainda falhamos em transformar boas ideias em produtos de saúde?
Foto: Divulgação

Brasil: por que ainda falhamos em transformar boas ideias em produtos de saúde?

O Brasil vive um ponto de inflexão. De um lado, temos excelência clínica e acadêmica, modernização regulatória, investimentos relevantes em pesquisa e desenvolvimento, programas de fortalecimento da indústria e de fomento à inovação. De outro, ainda tropeçamos na translação de conhecimento em escala. Projetos de pesquisa nascem muitas vezes descolados da prática, sem clareza de viabilidade e sem um olhar integrado entre ciência, sistema de saúde e mercado.

Multimídia

Vicente Neto, diretor-geral da Sudesb, justifica recusa de sistema de biometria em Pituaçu

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Durante participação no Projeto Prisma, podcast do Bahia Notícias, o diretor-geral da Sudesb, Vicente Neto, revelou que quase todas as recomendações do Ministério Público da Bahia para o Estádio de Pituaçu foram atendidas, exceto a implementação da biometria. Na conversa, o gestor justificou a falta do recurso e anunciou uma nova reunião entre as entidades para solucionar a questão.

Entrevistas

Afonso Florence garante candidatura de Lula em 2026 e crava retorno ao Congresso: “Sou parlamentar”

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Foto: Fernando Vivas/GOVBA
Florence foi eleito a Câmara dos Deputados pela primeira vez em 2010, tendo assumido quatro legislaturas em Brasília, desde então.

samba que existe e resiste

Desfile de Ivete Sangalo na Grande Rio inspirou jovem a criar a Diamante Negro, escola de samba mais nova de Salvador
Foto: Instagram

O ano era 2017, quando a Acadêmicos do Grande Rio levou para a Marquês de Sapucaí o enredo 'Ivete, do Rio ao Rio', homenageando a trajetória de Ivete Sangalo. O desfile pode não ter dado à agremiação o título de campeã daquele Carnaval. A escola ficou somente no 5º lugar. Mas, a 1.631 km do Rio de Janeiro, no bairro do Novo Marotinho, em Salvador, a apresentação da Grande Rio inspirou um jovem a resgatar uma tradição quase adormecida no Carnaval de Salvador: a das escolas de samba.

 

Foto: Facebook

 

A vontade de Matheus Couto, o jovem fundador, era do tamanho da Sapucaí. No entanto, tinha um grande empecilho para fundar a G.R.E.S. Diamante Negro: o Carnaval de Salvador do século XXI como plano de fundo, que se apresenta em um formato completamente diferente do que foi nos anos 70, quando as escolas eram protagonistas da festa.

 

“A Grande Rio foi a escola que me fez fundar a Diamante Negro aqui em Salvador, tanto que as cores são iguais. Do Carnaval eu sempre gostei, mas dessa área de escola de samba eu só vim admirar mesmo em 2017, quando a minha escola, que hoje é minha escola do coração, a Grande Rio, homenageou Ivete Sangalo. Lembro que eu estava em Jauá, com 12 anos, e naquele ano eu decidi assistir a um desfile de escola de samba pela primeira vez. Assisti completo, por conta de Ivete Sangalo, e lembro o quanto fiquei extasiado com aquele desfile. Ali começou, de imediato, o interesse de entender o que era aquilo. Para mim, tudo aquilo não era real, era uma fantasia”, conta Matheus.

 

De 2017 para cá, Matheus brinca que a vida passou a ser escola de samba. “Depois daquele momento, minha vida passou a ser escola de samba 24 horas por dia (ou 24/7). Eu assistia documentários, lia livros, ouvia samba-enredo. Mas daí, surgiu uma angústia: eu passei a gostar tanto desse universo e não tinha a possibilidade de viver isso em Salvador, porque a realidade do nosso Carnaval é completamente diferente. Eu cheguei a pesquisar e vi que isso já tinha sido uma realidade, mas nos anos 70.”

 

Foto: Arquivo Pessoal

 

Para tirar o sonho do papel, o jovem começou de baixo e criou a própria escola de samba... em uma maquete. Este é o início da caminhada Diamante Negro, a terceira escola de samba do especial 'Samba que existe e resiste', do Bahia Notícias.

 

“Eu descobri uma Liga de Escola de Samba em miniatura, maquete, que existe até hoje e é muito interessante: a União das Escolas de Samba em Maquete. Aquela foi a única forma que eu encontrei de matar o meu desejo de ter uma escola de samba, então, fiz tudo em miniatura, fui ao armarinho comprar tudo para fazer a maquete, ver os bonequinhos, fazer tudo direitinho. Transformei meu quarto em um barracão para viver essa experiência.”

 

O projeto citado por Matheus foi criado para reproduzir os desfiles dos sambódromos em menor escala, mas com regras dignas de um concurso das grandes escolas, com quesitos como harmonia, enredo, fantasias, alegorias, mestre-sala e porta-bandeira.

 

Para sair da miniatura e se transformar em uma das agremiações que levam adiante a tradição dos anos 70, foi necessário coragem e um empurrãozinho de uma “velha” conhecida na cena, a Filhos da Feira, segunda escola entrevistada pelo Bahia Notícias para o especial.

 


Foto: Arquivo Pessoal

 

“Das miniaturas, eu passei a querer mais e mais. Lembro que reuni alguns meninos aqui da rua e a gente fazia uma bateria. Meu pai tem um time aqui no Novo Marotinho, e eu aproveitei as camisas do time de futebol para colocar os meninos para tocar, mas isso, em algum momento, incomodou os vizinhos com o barulho (risos). O divisor de águas para mim foi quando eu conheci a Filhos da Feira, que eu considero a minha madrinha nessa trajetória. Ali eu percebi que era possível transformar esse sonho em realidade.”

 

Com o auxílio do avô, que tinha uma casa na comunidade, Matheus começou a mobilizar os meninos da rua para a criação da bateria, e a G.R.E.S Diamante Negro nasceu, oficialmente, em 2018. Mas o presidente da agremiação precisou convencer o avô da história toda, mesmo com o apoio incondicional do pai, que sempre foi um jovem envolvido com atividades voltadas para a comunidade local, com o time de futebol e o grupo de percussão.

 

“Eu nunca imaginei que fosse desfilar. Para mim, apesar do sonho de ter uma escola de samba, isso sempre foi como uma diversão. Nossas primeiras apresentações aconteceram no bairro. Eu precisei convencer meu avô que a escola de samba não era só uma brincadeira, e me convencer também, de que aquilo era um projeto de vida. Precisei amadurecer a ideia da escola de samba. Bruna Fernandes (presidente de honra) me ajudou bastante nesse processo, mas, no começo, além da bateria, a gente só tinha o casal de mestre-sala e porta-bandeira.”

 

Caçula entre as escolas de samba da nova geração de Salvador, Matheus conta que, durante o processo, teve um choque de realidade ao perceber como era o cenário para as escolas na capital baiana. “Eu me desanimei quando percebi que, talvez, minhas ideias não pudessem ir para a rua. Mesmo sendo o mais novo, no primeiro ano de desfile, consegui colocar um carro alegórico na rua. Fruto do meu trabalho, mas essa não é a realidade o tempo inteiro. Avani de Almeida conversou com a gente, trouxe um documento da Filhos da Feira para a gente se basear nisso e oficializar a nossa escola. Mas a gente ficou quase um ano sem movimentar a escola.”

 

Foto: Arquivo Pessoal

 

O ano de respiro fez com que Matheus se envolvesse com a Filhos da Feira, e voltasse a sonhar com o próprio projeto. “Voltei com um certo gás para colocar a Diamante Negro na rua, mas entendi ali que seria do meu jeito. Temos oito anos de fundação, mas não temos documentação. Talvez as pessoas se espantem, mas esse não é um interesse meu. No começo, era por eu ser menor de idade. Eu tentei trazer mais pessoas, pessoas adultas, mas as pessoas não tinham interesse nesse universo; foi desgastante.”

 

Atualmente, Matheus divide a missão de tocar a Diamante Negro ao lado de Deise, que também integra a Filhos da Feira, e o trabalho de convocar adultos para participar da escola de samba do Novo Marotinho deu certo.

 

“Neste segundo momento da Diamante Negro, da reorganização, nós começamos a fazer uma campanha no bairro para atrair adultos a participarem desse nosso projeto. Hoje eu acho que as pessoas já entenderam o formato de escola de samba que eu quero. Quando as escolas de samba começaram, eu não acredito que a documentação foi a primeira preocupação deles; a escola de samba surgiu dessa união da comunidade. Quando eu penso na Diamante Negro, eu penso nisso, nessa parte da diversão, da beleza da festa, de fazer as fantasias, arrumar a bateria e ir para a rua. Eu não quero que a escola de samba pareça com os blocos afro, que já existem e são gigantes; quero que a escola de samba tenha a cara das grandes escolas.”

 

Foto: Arquivo Pessoal

 

A G.R.E.S Diamante Negro atualmente conta com cerca de 60 pessoas envolvidas nos desfiles, que acontecem no bairro do Novo Marotinho e movimentam a região. Para Couto, o tema do Carnaval de Salvador em 2026 ser o samba não deve dar uma grande luz às escolas já existentes, pelo fato de os blocos de camisa terem mais espaço, comercialmente falando.

 

“Sendo aqui em Salvador, eu acredito que vai ser voltado para o samba comercial, ainda mais que as escolas de samba aqui da cidade não têm uma liderança para conseguir se inserir nesse debate e ter voz para lutar por espaço.”

 

Quanto à questão do sambódromo, proposta apresentada na Câmara Municipal de Salvador, para Matheus, a ideia se apresenta como algo interessante, mas é necessário pensar além do espaço. O presidente da Diamante Negro pontua que o sambódromo não excluiria a participação das escolas no Carnaval propriamente dito, mas, além da criação do espaço, é necessário o incentivo à arte.

 

“Não dá para ser um ou outro. A gente ser inserido no Carnaval de Salvador é importante, mas se for implantar um sambódromo, é necessário ter o auxílio para que a gente consiga fazer o desfile. Não adianta colocar o espaço, mas não colocar um ônibus para levar as escolas para lá. É preciso ter um local para fazer os ensaios. É importante incluir a gente no Carnaval de Salvador e ter o sambódromo também.”

 

O presidente acredita que a ideia pode despertar na população o interesse na área e fazer surgir novas escolas de samba na cidade, além de fazer com que a comunidade conheça a cena, que um dia já foi o tom da folia na cidade.

 

 

“O espaço fará com que outras escolas de samba venham a surgir. Tem muitos amantes do samba aqui em Salvador; você sai na rua e vê pessoas com camisas da Mangueira e do Salgueiro. Mas existem pessoas que não sabem nem que aqui em Salvador tem escolas de samba. Então, a criação do espaço, pode sim, dar essa visibilidade. Mas não adianta só colocar a gente no espaço e não incentivar a arte. É preciso criar o sambódromo e não ter uma transmissão, nem uma cobertura. Porque aí, um tempo depois, vão falar que um espaço dedicado ao samba não tem público.”

 

Após mais de seis anos de existência, Matheus afirma que segue como o menino sonhador que criou uma escola de samba de maquete e conseguiu tirar o projeto do isopor para levar para as ruas. O presidente da Diamante Negro ainda incentiva a nova geração a investir na área e se permitir sonhar. “Não custa nada”, afirma.

Mais velha entre escolas de samba da nova geração em Salvador, Filhos da Feira acredita na força da comunidade
Foto: Instagram

Frutas frescas, ervas, pescados, artesanato, animais e até mesmo artigos religiosos. Quem faz uma lista para ir à feira jamais pensaria em incluir uma escola de samba entre os itens procurados.

 

Mas, na Feira de São Joaquim, além de tudo isso e dos pratos feitos e famosos como a feijoada, a moqueca de andú, e é claro, o acarajé, é fácil se deparar com rodas de samba e uma escola de samba propriamente dita.

 

Segunda escola de samba entrevistada pelo Bahia Notícias para o especial 'Samba que existe e resiste', a Escola de Samba Filhos da Feira de São Joaquim é a agremiação mais antiga das três remanescentes e que ainda vivem um cenário que por anos foi realidade no Carnaval de Salvador.

 

Fundada em 2006, a Filhos da Feira surgiu de um movimento criado pelo compositor Alaor Macêdo, responsável por enredos das antigas escolas de samba de Salvador. Em entrevista ao Bahia Notícias, Avani de Almeida, presidente da Filhos da Feira, relembrou o início de toda a história com a agremiação.

 

 

"A Filhos da Feira surgiu de um processo do compositor baiano Alaor Macêdo de revitalização das escolas de samba de Salvador. Ele reuniu as antigas escolas de samba da capital, Filhos do Garcia, Juventude do Garcia, Diplomatas de Amaralina, Ritmistas do Samba, e a velha guarda dessas escolas de samba antigas, e administrou o projeto de revitalização."

 

Feirante e envolvida diretamente com a São Joaquim, assim como os mais de 100 integrantes que participam da Filhos da Feira, Avani conta que o olhar de Alaor para a Feira e para a comunidade que existia ali fez com que a escola de samba nascesse.

 

"A escola de samba se trata de uma comunidade, ela tem que atender a uma comunidade. A gente a caracteriza como se fosse uma associação de bairro, então, nós cuidamos de alguns quesitos sociais, e ele olhando assim pensou: 'Poxa, a Feira de São Joaquim é uma comunidade, ali dá uma bela escola de samba'. E isso foi de 2005 para 2006, e ali deu início a toda especulação para entender se conseguíamos levantar uma escola a partir da nossa comunidade de feirantes."

 

Foto: Instagram

 

Até que a Filhos da Feira saísse finalmente do papel, foi necessário um levantamento de dados, já que antes da música começar, é necessário organizar o samba.

 

“Veio um rapaz chamado Liberato, que ajudou nessa questão da administração do projeto, fez um levantamento dos feirantes, de interessados em se tornarem sócios, e fundou o projeto. Até então era um projeto de papel, e aí se foi feito todo o projeto, foi criado um CD que é o 'Abre Alas do Samba' e quem fez esse CD foi o Alaor Macêdo, nosso primeiro samba-enredo foi feito por Guiga de Ogum, que até hoje é nosso hino."

 

Ao site, Avani pontuou outro grande fator determinante para a criação de uma escola de samba: a ligação com a religião. Para a presidente da Filhos da Feira, as duas coisas não podem andar separadas.

 

"Uma escola de samba não pode ser solta, ela tem que estar ligada a um terreiro. A escola de samba é igual ao afoxé. Quando se coloca um bloco de Afoxé para desfilar, é um terreiro na rua, entendeu? E tem que cumprir todos os pré-requisitos."

 

Atualmente, a Filhos da Feira é cuidada religiosamente por Dona Inês, responsável por um terreiro no Largo do Tanque, que é a mesma pessoa que cuida do evento da festa do Marujo. "O projeto de escola de samba ele nasce num terreiro", afirma Avani.

 

Com tudo resolvido, hora de colocar o bloco, ou melhor, a escola de samba na rua. Correto? Infelizmente, não. Para o contexto do Carnaval de Salvador, onde os trios elétricos se tornaram grandes estrelas da festa junto aos artistas, a configuração de uma escola de samba com os destaques de chão, bateria e carro alegórico precisava se adaptar à realidade local.

 

Foto: Instagram

 

“A gente desfilava no Campo Grande, mas o Campo Grande ficou inviável para a gente, porque depende de corda. Porque quando a gente passa com as fantasias, o pessoal fica puxando para tirar foto, as crianças principalmente, e para não estar fazendo uma negativa, acaba atrasando o desfile.”

 

O jeito para a Filhos da Feira foi transformar o circuito Batatinha, no Pelourinho, na segunda casa da escola de samba, já que a primeira será sempre a Feira de São Joaquim. O Fuzuê, no circuito Orlando Tapajós (Ondina/Barra), também entra como uma rota de desfile.

 

"Nós optamos por desfilar no Circuito Batatinha, que é o Pelourinho, a gente sai ali da Rua das Laranjeiras e aí a gente segue ali pelo Pelourinho, porque lá, conseguimos um desfile amplo. A questão nossa, às vezes, é a sonorização que não está contemplando mais o desfile, e quando a gente pega a passagem os trios acabam atrapalhando. Para esse ano estou tentando ver se consigo um nano trio ou uma prancha sonorizada boa para atender ao desfile."

 

RESISTIR NA ERA DOS TRIOS ELÉTRICOS 
O Carnaval de Salvador é cíclico e desde a sua existência já passou por diversas transformações, vide a existência das escolas de samba e a derrocada da expressão artística.

 

Ao Bahia Notícias, Avani falou sobre a luta não só da Filhos, como das outras três escolas de samba que ainda existem em Salvador em sobreviver à festa no contexto atual, onde os trios são destaques e a população endossa o formato participativo da festa, diferente de quando a beleza estava em contemplar.

 

"Foi muito difícil no início. Nós tivemos muita ajuda da Velha Guarda, das antigas escolas de samba, mas até então, não estava suficiente para sustentar. E eu não digo a questão financeira, mas sim para locomoção, para a visibilidade. Nós nos juntamos aos blocos afro, foi formada uma espécie de associação para a gente se unir e um ajudar o outro, porque está todo mundo sufocado. Nós estávamos 'morrendo', as escolas e os blocos, já estávamos sem fôlego para resistir porque não tinha apoio nenhum."

 

Foto: Instagram

 

A resistência está ainda em se manter sem o aporte financeiro necessário para sustentar uma agremiação como uma escola de samba, que conta com mais de 50 profissionais atuando.

 

Segundo a presidente da Filhos da Feira, na época em que as escolas de samba eram os destaques do Carnaval, na década de 70, o incentivo às agremiações por parte do poder público era maior. Com a queda da tradição, as escolas remanescentes acabaram ficando sem apoio para dar continuidade à arte.

 

“Naquela época das escolas de samba, os políticos, eles podiam meter a mão no bolso e ajudar uma instituição ou botar um bloco na rua. Eles não precisavam passar pelo processo de prestação de conta do recurso, e era uma época que os políticos iam lá, gostavam e injetavam o dinheiro mesmo. Depois que passamos pela fase da legalização, essa classe política que ajudava a cultura, passou a não poder mais ajudar, porque se você tira o dinheiro, você tem que fazer a prestação de contas, e com isso, a cultura ficou abaixo da política.”

 

As dificuldades enfrentadas pelas escolas e blocos afro motivou a criação de uma instituição para auxiliar no diálogo com o estado. “A gente se reuniu para formar uma instituição onde temos a maioria dos blocos afro, blocos de reggae para a gente passar a dialogar com o Estado. No início foi complicado, porque tivemos que fazer protestos, manifestações para sermos ouvidos, hoje já estamos organizados, já existe hoje um diálogo muito bom entre nós, agentes culturais, e o governo do estado.”

 

Foto: Instagram

 

Questionada sobre a adaptação das escolas de samba ao atual Carnaval de Salvador, Avani foi categórica ao afirmar que os trios elétricos podem descaracterizar a estrutura das agremiações. Sendo assim, para a folia baiana, cada forma de expressão tem um veículo específico.

 

“Não vejo a necessidade de uma escola de samba passar com um equipamento tão grande que é o trio, porque ela descaracteriza todas as nossas fantasias que a gente confecciona bonito com tanto carinho, aí quando o trio vem a gente fica ali embaixo, o trio lá em cima.”

 

PARA ALÉM DO SAMBA 
Para Avani, o conceito da escola de samba vai além da apresentação no Carnaval. A feirante faz questão de exaltar o fator social das agremiações com as comunidades que elas representam.

 

"Nós da Filhos da Feira temos uma cota, marcamos consultas, exames, fazemos cartas para atestar endereço de quem não tem. Então, a gente faz esse trabalho social. Isso é uma escola de samba. O trabalho social a gente faz com amor, com agregação, com sorriso."

 

Sem cachê para os músicos, Avani define o pagamento como uma ajuda de custo, mas um dos maiores pagamentos para ela, como presidente da agremiação e feirante, é enxergar a transformação através da arte.

 

"A cultura não é só pensar no fator financeiro. Quando se faz cultura dentro das comunidades, é necessário olhar para a forma como aquele movimento vai impactar a vida das pessoas. Quando um jovem participa de um projeto cultural, ele consegue se desenvolver em diversas situações. E a nossa visão, com a Filhos da Feira, é justamente esse senso de coletividade, aqui a gente divide o ônus e o bônus."

 

O SAMBÓDROMO VEM PARA SOMAR?
O debate sobre a criação de um sambódromo em Salvador, que motivou a criação do especial, também foi tópico na entrevista com Avani de Almeida.

 

A presidente da Escola de Samba Filhos da Feira pontuou a importância de um olhar para as agremiações de forma constante, e não apenas no período da festa.

 

"Uma escola de samba trabalha o ano todo. Tem uma menina que ela já está fazendo as cabeças da bateria, porque precisa cortar arame, e a gente já começa a trabalhar antes mesmo da festa. A escola de samba não para."

 

Foto: Instagram

 

Para Avani, caso o sambódromo seja pensado como uma forma de união das expressões artísticas de Salvador que conversam com o samba, e tenha o mesmo destaque que os circuitos tradicionais, o projeto pode funcionar.

 

"A gente fez um desfile no início do ano ali na região onde tem a proposta para a criação do Sambódromo. Se a ideia for colocar blocos afro, afoxés e escolas de samba, não o samba de camisa, pode ser algo interessante. Tem uma sonorização muito boa."

 

Mas a feirante alerta para a necessidade de assistir as agremiações fora da festa. "O espaço precisa ser algo mais amplo, para além do desfile. A gente precisaria de um local dedicado para a confecção das nossas fantasias, por exemplo, dos materiais que utilizamos nos desfiles, instrumentos. A escola de samba movimenta a economia, ajuda a comunidade. Se houver alguém para impulsionar isso, vai dar uma ajuda à comunidade do samba".

 

 

O estilo musical será o tema do Carnaval de Salvador, anunciado pela prefeitura há alguns meses, e o medo de Avani é que as escolas de samba não tenham esse espaço na avenida.

 

"É necessário pensar no samba como tema do Carnaval não apenas os blocos de camisa, temos muitas expressões de samba aqui em Salvador que precisam ser valorizadas. Tenho medo e acho que as escolas de samba e outros estilos serão jogados um pouco para baixo do tapete, acho que o samba de camisa vai se sobressair, por ter mais poder."

 

A feirante ainda fez questão de reforçar a potência do samba no contexto das escolas no eixo Sudeste.

 

 

"A escola de samba tem que potenciar pequenos artistas, ela é uma produtora que ela tem que estar disponível ali, por exemplo, para pegar pequenos artistas e transformar em grandes artistas. Aqui a gente tem outros direcionamentos. A escola de samba ela dá a base da cultura. Por que a cultura no Rio não quebra? Porque o ganho dela é mínimo, aqui em Salvador, o ganho da produtora é altíssimo. São produtoras de grande porte, por isso eu acho que não vai ter um espaço assim para a gente."

 

Apesar de um cenário com futuro em "blur", se depender da comunidade, o samba não morre, e Alcione pode ficar tranquila quanto a isso. "A escola de samba se trata de uma comunidade, e essa é a nossa força", afirma Avani.

Da 'sala de aula' para a rua: Unidos de Itapuã transforma propósito e resgata tradição das escolas de samba em Salvador
Foto: @olhosdepadua

Escola. Palavra de origem latina. Substantivo feminino. Ócio dedicado ao estudo, ocupação literária, lição, curso, lugar onde se ensina.

 

É com esse propósito que a Escola Unidos de Itapuã, primeira escola de samba entrevistada para o especial 'Samba que existe e resiste', do Bahia Notícias, surge. A ideia, em sua criação, era passar adiante os ensinamentos de percussão e funcionar como um espaço para auxílio social da comunidade.

 

Até que, em um momento, é notado o potencial da escola de se transformar em uma agremiação com força suficiente para movimentar o bairro de Itapuã durante as festas populares e resgatar uma tradição antiga do Carnaval de Salvador: o desfile das escolas de samba.

 

Foto: @unidosdeitapuaoficial

 

"A Unidos de Itapuã surgiu em 2007 com o propósito de dar aula, de passar o conhecimento para os outros. Éramos só cinco amigos, músicos, e pensamos nisso de ensinar para as pessoas, e nosso foco era ensinar samba, porque Itapuã é um bairro sambista, a gente passou a nossa infância toda escutando samba. E com isso, pensamos: 'pô, a gente precisa montar uma bateria', e montamos essa bateria de escola de samba", conta Nailton Maia, de 49 anos, gestor da Unidos de Itapuã.

 

Para Nailton, o ensino através da arte sempre foi um fator fundamental na transformação da comunidade. "A gente via os meninos na rua e pensava em uma forma de passar esse conhecimento, de criar essa ligação com o bairro", pontua.

 

O samba, que era para ser miudinho, mas com o propósito de ensinar, ganhou a dimensão de uma grande roda e foi adaptado para o que o público conhece atualmente como uma das escolas de samba da capital baiana, com apresentações em diversos eventos da cidade.

 

Foto: @unidosdeitapuaoficial

 

"A gente não vivenciou a década de 50 a 70, quando existiam as escolas de samba, a gente tinha o conhecimento dos blocos afro, e quando a gente mergulha nesse mundo de escolas de samba e vê esse mundaréu que tinha, o marzão que acontecia em Salvador, entendemos o lugar que tínhamos chegado", conta.

 

Segundo Nailton, pessoas de fora começaram a incentivar o grupo de amigos a investir no conceito de escola de samba, convidar porta-bandeira, criar alegorias, e o apoio da velha guarda no resgate da tradição foi fundamental para que a Unidos de Itapuã migrasse do conceito de apenas um "centro de estudos" para a escola de samba.

 

"Quando começa a chegar a velha guarda, que vivenciou o tempo de ouro, ali a gente mergulha profundamente nesse conceito, e esse processo foi engraçado porque se cruza com o que aconteceu na história, com a ligação do Terno de Reis."

 

 

A história em questão é a semelhança entre a manifestação religiosa, que também é conhecida como Folia de Reis, e o Carnaval, que acontece com um grupo de cantores e músicos visitando as casas e desfilando com estruturas musicais e alegóricas.

 

"Aqui em Itapuã tem o Terno de Reis, aí Pedreira (do Amigos de Pedreira) sugeriu da gente colocar um mestre-sala e uma porta-bandeira para desfilar. Atualmente, essas duas pessoas, que desfilaram com a gente no início, são nossos destaques, e eles conseguiram descobrir a forma deles de dançar, criaram a identidade deles."

 

Foto: @unidosdeitapuaoficial

 

Atualmente, a Unidos de Itapuã conta com pouco mais de 100 pessoas em seus desfiles. O número é uma média e depende, também, de quantas pessoas podem participar da festa. Em projetos como o Carnaval no Pelourinho, por exemplo, o número é reduzido para 50, algo curioso, porém, justificável, devido às adversidades apresentadas pela escola.

 

"Nós participamos de editais. Se a gente não for contemplado no grupo, não tem como tocar na festa. No Pelourinho a gente toca e a velha guarda pergunta como a gente consegue tocar subindo e descendo ladeira. Muita gente optou por sair de lá por não ser um lugar com possibilidade para tocar direito devido a essa questão da mobilidade."

 

Foto: @unidosdeitapuaoficial

 

No cenário atual, onde as cores da folia são determinadas pelos abadás de cada bloco, o brilho das escolas de samba já não consegue reluzir tanto quanto o glitter, que nem sempre é biodegradável.

 

"Não temos espaço nenhum. Tem muita gente que veio do nascimento e do renascimento; eles contam muito o que aconteceu no auge das escolas de samba até agora. E o espaço deles antigamente era como um teatro de rua. Quando veio o trio elétrico, isso foi jogado um pouco para trás, ficou de escanteio, o incentivo público também minou. Muitos artistas das escolas de samba migraram para os Blocos Afro, para os Blocos de Índio."

 

Foto: @olhosdepadua

 

O músico relembrou ao site um dos momentos mais críticos da escola nos mais de 15 anos de existência: sobreviver à pandemia da Covid-19, que foi diretamente prejudicial para o mercado do entretenimento.

 

"Uma das maiores dificuldades nossa foi durante a pandemia e no pós, porque a gente fazia um trabalho de formiguinha, trabalhava no verão para manter a escola durante o ano todo. Além dos editais, fazíamos trabalhos em hotéis. Quando veio a pandemia, a gente ficou zerado. Tivemos que tirar do nosso bolso. Hoje, eu digo para você que a gente conseguiu se reerguer. A gente já estava acostumado com o poder público não investir nessa área, então começamos a nos capacitar e hoje a gente já sabe o caminho que a escola quer a curto e a longo prazo."

 

O PALCO EM CASA
Se falta espaço no circuito tradicional, a Unidos de Itapuã faz a festa em casa, no bairro onde foi fundada e que a partir de 2026 será circuito oficial da folia na Bahia.

 

"Aqui em Itapuã a gente costuma dizer que o nosso Carnaval é a nossa lavagem. Aqui a gente consegue colocar nossa escola para desfilar com as três alas, tudo certinho. No Pelourinho, através do edital que a gente participa, não tem como. Na avenida também não tem como, e eu acredito que ali é um dos carnavais mais culturais que existem, mas não temos esse espaço para que a gente consiga passar a mensagem que a gente quer passar. Os foliões ficam dispersos com tantas informações, palco e trio."

 

Foto: @unidosdeitapuaoficial

 

Festa centenária, a Lavagem de Itapuã se transformou ao longo dos tempos, mas segue com o propósito de homenagear a padroeira do bairro, Nossa Senhora da Conceição de Itapuã, e envolve diversos rituais, entre eles a lavagem das escadarias, um cortejo de Piatã até Itapuã, a famosa baleia rosa, o café da Dona Niçu, servido tradicionalmente pela família da moradora que iniciou a pré-lavagem do evento. E como em Salvador tudo consegue virar festa, após os rituais, a lavagem abre espaço para o desfile de blocos, fanfarras e grupos musicais.

 

Em 2026, o bairro de Itapuã será um dos pontos oficiais do Carnaval de Salvador após a oficialização, por parte do Governo da Bahia, do Circuito das Águas, que faz o percurso entre o Parque Metropolitano do Abaeté e o monumento à Sereia.

 

De acordo com o secretário de Cultura da Bahia, Bruno Monteiro, a oficialização do espaço veio com o propósito de dinamizar o Carnaval de Salvador e promover a festa fora dos circuitos tradicionais. Para Celso Di Niçu, organizador da Lavagem de Itapuã, a oficialização do circuito é uma conquista da comunidade e um reconhecimento da potência do bairro.

 

"A efetivação do Circuito das Águas é um anseio já antigo da comunidade de Itapuã. O Circuito das Águas foi inaugurado em 1980, com o primeiro desfile do Bloco Afro Malé de Balê. E ao longo desses anos, a comunidade itapuãzeira sempre vem fazendo as suas celebrações, começando na Lagoa do Abaeté e terminando na Sereia, o que remete ao Circuito das Águas, às águas doces de Oxum, com as águas salgadas de Iemanjá. Nós temos muitas coisas para oferecer à cidade", afirmou ao BN.

 

Foto: @unidosdeitapuaoficial

 

Para o presidente da Unidos de Itapuã, é necessário revitalizar essa aba da cultura carnavalesca baiana. "Eu vejo que a gente precisa de espaço, precisa dessa revitalização, não só das escolas, mas dos blocos também. Hoje em Salvador temos três escolas atuando, e a gente não tem esse espaço onde a gente consiga mostrar a nossa área".

 

Nailton ainda pontua que, em meio ao debate sobre a criação do sambódromo em Salvador, a capital e as escolas de samba precisam de um espaço onde a mensagem consiga ser passada de forma clara, que chegue ao público, algo que, atualmente, foge do conceito participativo do Carnaval de Salvador.

 

"O samba precisa voltar para o lugar onde ele merece aqui em Salvador."

Curtas do Poder

Ilustração de uma cobra verde vestindo um elegante terno azul, gravata escura e língua para fora
Na eleição do TJ, Roto mostrou a força que um showmício pode ter. Pior que ainda sobrou pro Galego a fama de ter ajudado o novo presidente. E na Bahia tem os políticos que se recusam a aceitar que a idade chegou, enquanto outros já passaram da fase da negação. E tivemos mais um exemplo de alianças que envelheceram igual a leite fora da geladeira. Saiba mais!

Pérolas do Dia

Flávio Bolsonaro

Flávio Bolsonaro
Foto: Lula Marques/ Agência Brasil

"Apenas 30 minutos de conversa". 


Disse o senador Flávio Bolsonaro (PL), que assumiu o papel de porta-voz do ex-presidente Jair Bolsonaro após sua prisão preventiva no último sábado (22), criticando veementemente as condições de visita autorizadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

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