MP-BA emite recomendação contra projeto de criação e abate de jumentos em Amargosa
Por Aline Gama
O Ministério Público da Bahia (MP-BA), por meio da Promotora de Justiça Jessica Camille Goulart Mendes Tojal, emitiu uma recomendação oficial ao município de Amargosa alertando sobre os riscos ambientais, sanitários e de maus-tratos animais associados a um protocolo de intenções firmado com a empresa chinesa Shandong Dong’e Black Donkey Husbandry Technology Co. Ltd. O documento, que previa a criação, abate e melhoramento genético de jumentos no município, foi considerado potencialmente perigoso e carente de fundamentação legal.
A recomendação, publicada nesta segunda-feira (25), baseia-se em um parecer técnico elaborado por uma bióloga do próprio MP-BA. O estudo concluiu que as ações previstas no protocolo têm um “potencial de causar impactos ambientais significativos”, incluindo alteração da paisagem, poluição do solo, água e ar, perda de habitats naturais, compactação e salinização do solo, além de contaminação por resíduos putrescíveis e efluentes orgânicos, especialmente se as atividades forem implementadas em larga escala.
O parecer técnico destacou ainda que o protocolo é lacunar e omisso quanto à obrigatoriedade de licenciamento ambiental junto ao Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA), à fiscalização por órgãos estaduais e à necessidade de aprovação prévia de eventuais técnicas de melhoramento genético pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). A introdução genérica de tecnologias de melhoramento, sem especificar as técnicas a serem usadas, foi apontada como um impeditivo para uma avaliação de riscos adequada.
O MP-BA também levantou a bandeira do bem-estar animal. A recomendação cita que o Brasil é signatário de diretrizes internacionais sobre o tema, como as normas da Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) e a ISO/TS 34700:2016, e que há relatos técnicos de experiências anteriores na Bahia onde jumentos foram submetidos a maus-tratos extremos, abandono e transporte indevido em projetos similares. Os efluentes de abatedouros, com altas cargas orgânicas e risco de contaminação, também foram mencionados como uma preocupação que exige tratamento adequado e monitoramento rigoroso.
Diante desse quadro, o MP-BA recomendou expressamente que o município de Amargosa se abstenha de firmar, implementar ou dar qualquer suporte institucional à empresa chinesa ou a qualquer outra voltada para a cadeia produtiva de jumentos, sem o prévio cumprimento de uma série de requisitos.
Entre eles, estão a obtenção de um licenciamento ambiental válido do INEMA, a aprovação da CTNBio para técnicas de engenharia genética, a garantia do cumprimento de todas as normas nacionais e internacionais de bem-estar animal, uma análise jurídica detalhada pela Procuradoria do município e estudos técnicos que comprovem a viabilidade ambiental e socioeconômica do empreendimento, com ampla publicidade.
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Além disso, o MP requisitou que o município comunique previamente qualquer nova tratativa com a empresa, encaminhando minutas e documentos, e que, caso uma parceria formal venha a ser concretizada no futuro, implemente ações permanentes de fiscalização local para assegurar o cumprimento das normas.
O município de Amargosa tem um prazo de 15 dias, a contar do recebimento do documento, para informar por escrito se acatará ou não a recomendação. O MP advertiu que a omissão na adoção das medidas recomendadas poderá implicar o “manejo de todas as medidas administrativas e ações judiciais cabíveis” contra os responsáveis.
Dados do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) revelam que, entre 2018 e 2024, cerca de 248 mil jumentos foram abatidos no país, representando uma redução de 94% da população da espécie em território nacional. A Bahia lidera o ranking tanto em número de abates quanto no risco à preservação da espécie.