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Baiana que disputa filho com americano não fala com pais presos nos EUA desde fevereiro

Por Rebeca Menezes

Baiana que disputa filho com americano não fala com pais presos nos EUA desde fevereiro
Casal foi preso acusado de ajudar a 'sequestrar' neto | Foto: Arquivo Pessoal

Filha do casal de baianos preso nos Estados Unidos, acusados de auxiliar no “sequestro” do neto, Marcelle Guimarães pede ajuda do governo brasileiro para libertar os pais. Carlos e Jemima Guimarães foram detidos em fevereiro deste ano, ao pousarem em Miami, após denúncia do médico americano Christopher Brann, ex-marido de Marcelle. Desde então, ela foi proibida pela justiça americana de ter qualquer contato com Carlos e Jemima. Em entrevista ao Bahia Notícias, a baiana conta por que decidiu deixar os EUA com o filho Nicolas, de 9 anos, e como os pais foram presos sem sequer saberem que eram alvos do processo.

 

Marcelle e Christopher se conheceram durante um mestrado e se casaram em fevereiro de 2008. O filho do casal nasceu em setembro de 2009. Mas o casamento não durou muito. De acordo com a mulher, ainda durante o namoro, ocorreram situações pontuais de violência, como empurrões, mas que escalaram quando a convivência aumentou com o casamento. A mulher começou a fazer perguntas sobre desconfianças que tinha do marido, o que teria feito com que começassem as reações explosivas. Marcelle conta que ele chegou a fazer buracos nas paredes e a quebrar objetos, como celulares e televisões. "Eu fui descobrindo as coisas aos poucos. E havia essa pressão psicológica também, de culpa. Eu não sabia dos problemas dele. Ele nunca havia confessado que tinha esse problema, que ele já sabia que tinha. Então tudo que acontecia era culpa minha. 'Você que está imaginando', 'Não foi isso que aconteceu'...", relembra.

Marcelle conversou com o BN sobre o caso | Foto: Bahia Notícias


Após o nascimento do filho, ela cogitou pela primeira vez o divórcio. Foi quando o americano teria confessado problemas com compulsão sexual, que gerariam as reações violentas. A baiana conta que Christopher pediu uma chance de passar por terapia para ajudá-lo com problema. Além de ajudar a arcar com três tratamentos, Marcelle começou a estudar sobre o assunto e até participou de grupos de apoio a mulheres vítimas de violência. E se assustou ao conhecer casos parecidos com o seu. "Pessoas inteligentes, pessoas formadas, e passando por essas situações [de violência] por tanto tempo. Eu pensava: 'Como é que elas suportaram isso por tanto tempo'. Me deu até um desespero. Foi ali que eu vi que isso era real, que as mulheres não conseguiam sair desse ciclo".

 

Para provar que estava comprometido em melhorar, o americano teria enviado e-mails em que confessava as agressões cometidas. Marcelle entregou uma série de e-mails que trocou com o ex-marido durante o tratamento. Em um deles, está a "confissão" de que, na noite de 4 de agosto de 2012, ele gritou e xingou a mulher, a empurrou na cama, puxou seu cabelo e bateu em sua cabeça com as mãos, tudo isso na frente do filho. "Não tenho orgulho de meus atos. Espero que a minha sentença seja justa aos olhos de Deus e da Justiça", conclui no e-mail. Em outros registros, o médico confessaria que sofria com "gatilhos", como fazer exames pélvicos e de mama em pacientes, e pede desculpas por ter quebrado uma televisão: "eu não aguento quando você acorda gritando comigo".

E-mail apresentado por baiana mostraria confissão de agressões

"Ele falava pra mim [que ia melhorar]. Aí chegou ao ponto dele mandar a confissão e falou: 'pra você não achar que eu não estou falando sério quando eu digo que quero me tratar...'. Ele queria me provar que estava disposto. Foi o último apelo dele, com a esperança de que eu desistisse do divórcio. Os outros, em que ele fala do gatilho, foi algo acordado dentro da terapia. Que tipo de pessoa faz isso?", questiona Marcelle.

 

O PROCESSO
Quando a baiana decidiu pedir o divórcio, em 2012, ela conseguiu na Justiça a guarda da criança e uma ordem de restrição contra o marido. A baiana chegou a vir ao Brasil depois do pedido de separação, e voltou aos EUA. Porém, meses depois, a sua situação mudou. "Teve uma hora que ele demitiu uma advogada que ele tinha e contratou outro. A partir desse momento, tudo começou a mudar. A ordem de restrição caiu. E esse ano eu descobri que, comprovadamente, meu advogado me traiu. E ele fazia tudo de uma forma para piorar a minha situação. Ele começou a ter mais tempo com Nico, sugeriu que seria melhor a guarda compartilhada. Nesse momento, até o meu passaporte foi apreendido. O passaporte de Nico foi apreendido. Eu me sentia uma criminosa". 

 

"Eu me sentia presa. Eu estava em um país que não era meu, com uma língua que não era minha língua primária, com um sistema judiciário que eu não entendia, sem família, ele me ameaçava. Eu tinha muito medo dele fazer alguma coisa e eu ficar sem poder ver o meu filho”, narra. Marcelle pediu à Justiça para poder voltar ao Brasil para um casamento. Quando conseguiu o direito de reaver o passaporte, descobriu que o documento tinha sido perdido. Ainda assim, fez um novo passaporte e veio ao Brasil. Quando chegou ao Brasil, decidiu ficar no país.

 

"Eu no meio de uma crise, sem ter esse conhecimento prévio, você já está em uma desvantagem incrível. Veja: uma mulher, latina - que já tem um preconceito sobre o que você está fazendo lá -, e casada com um americano e médico. Eu estava cem anos luz atrás dele. Então eu tinha medo de me ver em uma situação sem volta. Eu tive que tomar uma decisão pra salvar a minha vida e a do meu filho", defende.

 

Na Justiça brasileira, a baiana conseguiu a guarda do filho. Christopher tinha o direito de visitar a criança sempre que quisesse, mas acompanhado. Porém, segundo a mulher, o médico passou a fazer ameaças a ela e a sua família: "Ele dizia 'isso não vai ter fim', 'vocês não sabem com quem estão lidando', 'tudo vai ser destruído', 'tudo que você conquistou vai ser destruído'. 


PRISÃO DOS PAIS
Em fevereiro, uma semana após uma das visitas do americano ao filho, Carlos e Jemima Guimarães foram aos EUA visitar um filho que mora no país. Ao chegarem ao aeroporto, foram detidos e enviados para prisões federais. "Eles foram presos em celas com pessoas que já tinham sido condenadas, até por homicídio. E eles nem sabiam do que estavam sendo acusados. [...] E um não tinha contato com outro, porque minha mãe foi levada para um presídio feminino e meu pai para um de homens. E minha mãe não fala quase nada de inglês. Então imagine o medo, com 66 anos, totalmente fragilizada. A gente não podia nem entregar os óculos dela. Se ela quisesse ler um livro, não podia", criticou.

Marcelle não fala com os pais desde fevereiro | Foto: Arquivo Pessoal

Depois de passar 40 dias no presídio, o casal pagou fiança de US$ 1 milhão para ir para prisão domiciliar, com tornozeleira eletrônica, na casa do filho que mora no país. Desde então, tanto pais quanto o irmão de Marcelle estão proibidos de ter contato com a baiana. Ela só soube da prisão dos dois porque um funcionário da empresa do pai a informou. Em maio deste ano, Carlos e Jemima foram condenados por um júri popular pelo sequestro do neto, apesar de serem absolvidos de outras acusações. As provas que a mulher apresenta sobre a violência que sofreu e sobre o suposto vício do marido não foram sequer consideradas pela justiça americana. "Eu tenho laudos médicos, ordem de restrição, os terapeutas não testemunharam. Como ele que está acusando, ele pôde participar de uma audiência e passar um dia inteiro falando na frente do júri de lá. E nem a defesa pode questionar nada. [...] Só que eu não estou lá. E o argumento é de que eu que tenho que apresentar as provas, porque tudo aconteceu comigo. Meus pais não têm nada com isso, nunca tiveram. Eles não tinham nem noção do que estava acontecendo. Então, como as provas vieram de mim e eu não estou lá, não podem aceitar as minhas provas. E não me deram nem a oportunidade de escrever uma autorização, de testemunhar pelo computador...", lamenta, dizendo que ainda não acredita no que aconteceu com seus pais. "De tudo que ele fez, de falso testemunho, de violência, de pedir dinheiro na internet, eu nunca imaginei que ele pudesse fazer algo assim. [...] Ele foi pra TV, chorando, pedir que meus pais continuassem presos no presídio”, acusa.

 

A família chegou a pedir ajuda aos consulados no Brasil e nos EUA. Agora, esperam que o governo brasileiro possa ajudar para que a pena, que deve ser anunciada apenas em outubro deste ano, seja a menor possível. "Eu faço um apelo ao governo brasileiro, de ajuda. Nós estamos dentro da lei, a Justiça brasileira está do nosso lado".

 

O OUTRO LADO
Christopher Brann nega que tenha vício em sexo ou que tenha sido violento com a ex-mulher. O médico afirmou, em entrevista ao Fantástico, que apenas uma vez deu um tapa no rosto de Marcelle durante uma briga, porque ela havia dito que ele não era homem.

Christopher Scott Brann | Foto: Arquivo Pessoal

Segundo o G1, em fevereiro, logo após a prisão do casal, o advogado do pai da criança publicou uma nota com comentário do americano sobre a detenção. "Sinto muito que tenhamos chegado a isso. Tudo o que sempre quis - e tudo o que ainda quero - é que meu filho N. tenha acesso igual a ambos os pais amorosos. Se N. for imediatamente devolvido a Houston, estou preparado para pedir à promotoria dos Estados Unidos que seja leniente em como lida com os casos de Carlos e Jemima”.

 

Ainda conforme Brann, no início de maio de 2013, Guimarães pediu a ele para viajar com o filho ao Brasil para o casamento de seu irmão. Para receber garantias do retorno de Nicolas, em 20 de maio de 2013, Brann e Guimarães fizeram na Corte do Texas um acordo de viagem, segundo o qual Guimarães poderia viajar ao Brasil em 2 de julho de 2013 e regressar em em 20 de julho de 2013. 

 

De acordo com A Procuradoria Geral da República, só depois Brann alega ter descoberto que a mãe da criança teria preenchido um formulário de inscrição para registrar o filho na escola de sua família, Escola Nova Nossa Infância, e soube que Marcelle recebeu e aceitou uma oferta de trabalho assinada por sua tia, autenticada em 13 de maio de 2013. Para ele, ficou claro que ela pretendia mudar a residência de Nicolas em violação a ordem da corte texana do dia 18 de janeiro de 2013, e que ela não iria honrar o acordo de viagem antes de instruir seus advogados a assiná-lo.

O formulário de inscrição e oferta de trabalho foram apresentados por Guimarães como anexos de uma petição em que pediu liminarmente a guarda exclusiva ao Tribunal de Justiça da Bahia em Salvador, protocolada em 10 de julho de 2013. O advogado Sérgio Botinha, que representa o pai da criança na Justiça brasileira, Carlos teria comprado as passagens usadas pela filha e pelo neto quando deixaram os Estados Unidos em 2013. "O pai [de Marcelle Guimarães] comprou as passagens e as enviou para Christopher como forma de mostrar que eles voltariam", o que teria motivado a acusação de conspiração para sequestro contra ele.