Usamos cookies para personalizar e melhorar sua experiência em nosso site e aprimorar a oferta de anúncios para você. Visite nossa Política de Cookies para saber mais. Ao clicar em "aceitar" você concorda com o uso que fazemos dos cookies

Marca Bahia Notícias Justiça
Você está em:
/
/
Justiça

Notícia

Promotor pode responder a ação penal por suposta agressão a esposa; decisão será do TJ

Por Cláudia Cardozo

Promotor pode responder a ação penal por suposta agressão a esposa; decisão será do TJ
Foto: Divulgação

O promotor de Justiça Luciano Rocha Santana poderá responder a uma ação penal por violência doméstica. Para se tornar réu, o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) precisará aceitar a denúncia oferecida pelo próprio Ministério Público (MP-BA) por suposta agressão à ex-mulher. A votação do recebimento da ação penal começou na quarta-feira (11), na sessão plenária da Corte baiana. O voto da relatora, desembargadora Ivete Caldas, é pelo recebimento da ação, diante dos indícios observados que indicam a culpabilidade do promotor. Nos autos, é relatado que o promotor agrediu a então companheira Jennifer Silva no dia 15 de abril de 2016. De acordo com a relatora, no dia da agressão, o promotor chegou em casa por volta das 15h, pois pretendia almoçar em casa e ficar o período da tarde na residência, cuidando de assuntos pessoais. Ele questionou a empregada doméstica onde estava a esposa, e esta respondeu que Jennifer havia saído para levar algumas peças na costureira. O promotor então teria reclamado da demora da vítima. Ele começou a beber bebida alcoólica. Por volta das 18h, Jennifer chegou em casa, quando foi iniciada a discussão do casal, que teria culminado em agressões. A vítima chamou a polícia, que os conduziu à Delegacia Especializada da Mulher (Deam) de Brotas. Ivete Caldas afirma que um laudo do Instituto Médico Legal (IML) constatou diversas escoriações pelo corpo da vítima, como na região mandibular e lesão no braço. A desembargadora ainda relatou que a vítima sofreu agressões em outras situações anteriores. Inclusive, uma das agressões teria ocorrido na casa de praia de Luciano, em Praia do Forte. Disse que Jennifer era rotineiramente humilhada perante a empregada e vizinhos, pois Luciano, por ser promotor, acreditava que nunca seria punido. A vítima afirmou que foi ameaçada pelo promotor e que, se ela o denunciasse, a mataria. Ivete Caldas narrou que, no dia da agressão, Luciano pediu ao porteiro para não deixar a vítima adentrar no condomínio. Mas mesmo assim, ela conseguiu entrar em casa. Contou que ela, naquela data, mais cedo, havia ido à Deam. Quando chegou à residência, observou que Luciano estava alcoolizado e agressivo, a xingando de “puta, vagabunda, prostituta”. Ainda a acusou de flertar com outros homens, até mesmo com uma médica, a chamando de “sapatão”. Ele teria arremessado bebida nela e depois dado um tapa em seu rosto, tentando agarrar pelo pescoço e braço. Eles conviviam há pouco mais de um ano juntos e tiveram um relacionamento marcado por brigas. A desembargadora, por fim, afirmou que o acusado não negou a agressão, afirmando apenas que “não se lembra das coisas”, admitindo que estava embriagado no dia dos fatos.

 

A defesa do promotor se manifestou no plenário antes do voto da relatora. O advogado Fabiano Pimentel sustentou que o promotor exerce a função há mais de 20 anos e que não havia nenhuma rusga que pudesse atingir sua conduta e sua carreira. Contou que Luciano teve um relacionamento por dez anos com uma promotora de Justiça, sem qualquer tipo de ocorrência familiar. Pimentel afirma que a delegada da Deam não poderia investigar o promotor de Justiça, ferindo a prerrogativa do membro do MP. Disse que no dia da agressão o acusado foi levado para a delegacia e, chegando lá, se apresentou como promotor e conversou com a delegada de que aquele procedimento não era o adequado para seu caso. “Mesmo assim, a delegada o deixa preso por cinco horas, sem pertences. O celular foi apreendido, carteira, apreendeu objetos. Ele pediu que as prerrogativas dele de promotor fossem respeitadas. Ela passou a investigar o membro do MP. Ele insiste que ela não poderia fazer a investigação, e mesmo assim, a delegada inicia o procedimento”, conta o advogado, complementando que a medida não observou a Lei Orgânica do Ministério Público. Para Fabiano Pimentel, a defesa na ação penal em discussão não era apenas do acusado, mas também das prerrogativas da função. Destacou que a própria delegada instaurou outro inquérito contra o promotor por desacato de autoridade. “Ela foi vítima e delegada ao mesmo tempo. Colhe depoimento de testemunhas, diante do promotor ter dito 'a senhora não tem atribuição para me investigar, nem por violência, nem por desacato’”. Outro fato levantado pelo advogado foi que a vítima, em dois depoimentos posteriores, negou que foi agredida por Luciano. “No dia dos fatos, ela teve uma discussão com promotor, se trancou no banheiro da residência, estava muito nervosa. Ela acredita que neste momento, bateu o rosto e ficou vermelha”, afirmou. Pimentel afirma que posteriormente, a vítima foi ouvida pela Procuradoria Geral de Justiça e pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), onde mudou a versão de seu depoimento inicial. “A própria vítima diz que mentiu para a Polícia, que as declarações foram feitas em um momento de raiva, que não foi agredida pelo investigado. Que justa causa há para o recebimento desta ação penal? Uma prova colhida ilicitamente e dois depoimentos da vítima dizendo que mentiu, que foi um momento de raiva? Interessante que a própria delegada, que entrou em discussão com o próprio promotor, afirmou que não viu lesões aparentes na vítima”, questionou a defesa do promotor. Para ele, a “denúncia foi esvaziada pela vítima”.

 

A relatora refutou que o caso ali tratava sobre desacato de autoridade e lembrou que o autor da denúncia foi o próprio Ministério Público. Disse que o promotor se comportou de forma inadequada na delegacia, entrando a força na sala da delegada, dizendo que a vítima era “prostituta e vagabunda”. Ele chegou a ser retirado por policiais do local. Também disse que não há nenhuma prova ilícita produzida. Ivete afirmou que a “nova versão trazida pela vítima, pra inocentar o indiciado, não revela capacidade para desconstituir o contexto probatório” e mostra indícios suficientes para receber a denúncia. Sinaliza que os elementos coletados até o momento devem ser analisadas junto com outras provas produzidas no contraditório no curso da ação penal. A desembargadora reforça que as lesões na vítima foram praticadas pelo denunciado. Logo depois da relatora votar pelo recebimento da denúncia, o desembargador Luiz Fernando afirmou que foi procurado pelo advogado e disse que não há respaldo legal para uma delegada investigar um promotor, tendo ele razão ou não. Também disse que recebeu um laudo psicológico da vítima, atestando que ela faz tratamento para depressão, transtorno de humor, irritabilidade e impulsividade, aspectos que afetavam a crise conjugal, e que ela “apresenta comportamento anormal”. Luiz Fernando ainda contou sobre um laudo pericial não oficial, em que aponta que as lesões no corpo foram produzidas pela própria vítima. “Ela se autolesionou”, declarou. Conforme o desembargador, as declarações da vítima de que mentiu devem ser consideradas.

 

Ivete Caldas destacou que quando a PM foi até a residência do casal, não sabia que Luciano era promotor e que este recebeu assistência da Promotoria na Delegacia. Contou que posteriormente a Polícia transferiu a investigação para o Ministério Público. O advogado de Luciano esclareceu que o promotor só recebeu acompanhamento do Parquet depois que a delegada já havia ouvido a vítima, as testemunhas e feito a apreensão dos objetos. Explicou ainda que há um processo no Juizado Especial Criminal contra a delegada por abuso de autoridade e que o próprio CNMP entendeu que houve violação de prerrogativas na Deam. Logo após os esclarecimentos, o presidente do TJ, desembargador Gesivaldo Britto, começou a coleta de votos. A desembargadora Maria da Purificação entendeu que há indícios suficientes para recebimento da denúncia. O desembargador José Olegário votou com a relatora. O desembargador Luiz Fernando pediu vistas. A desembargadora Sandra Inês pediu vista sucessiva, por uma preocupação e dúvida no depoimento da vítima.

 

“Ela retorna da Delegacia, chega em casa, o porteiro avisa a ela que estava impedida de subir por ordem do promotor, proprietário da casa, ela consegue entrar no imóvel, viu que ele estava embriagado, e começaram a discutir. É uma espécie de provocação que me preocupa muito. O fato dela ter ido provocar para receber talvez a retroação. Se ela tinha ido à delegacia e lá não se constatou, aparentemente não, porque ela volta para casa, talvez para provocar”, declarou. Com o pedido, o julgamento foi adiado. O promotor chegou a ser suspenso pelo CNMP, por 30 dias, por violar deveres funcionais. A sindicância contra o promotor foi aberta pela Corregedoria do MP-BA.