Barroso quer que STF adote regra para evitar que políticos renunciem para fugir de julgamento
Por Cláudia Cardozo
Ministro participou de evento em Salvador | Fotos: Guilherme Kardel
Quase um ano depois de sua indicação para o Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Luís Roberto Barroso voltou a Salvador nesta sexta-feira (9) para palestrar na 14ª edição do Congresso Brasileiro de Direito do Estado. Ao Bahia Notícias, o mais novo ministro defendeu que o Supremo Tribunal Federal (STF) adote um critério "geral e objetivo" para não retirar a competência da Corte para julgar casos contra parlamentares que respondem a ações penais, e que renunciam para perder a prerrogativa do foro por função. A declaração foi dada em referência ao declínio de competência do Supremo para a Justiça de primeiro grau em julgar o ex-deputado Eduardo Azeredo, um dos indiciados pelo Ministério Público Federal no chamado mensalão tucano. De acordo com o ministro do Supremo, sua proposta é que, “depois do recebimento da denúncia, a eventual renúncia do parlamentar não retirava mais a competência do Supremo”, mas que sua sugestão depende de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). “Enquanto a norma não é modificada, eu acho que o Supremo deve ter um critério geral e objetivo. Pode ser o que eu propus que a partir do recebimento da denúncia, a competência continuará a ser do Supremo, pode ser ao final da instrução processual, quando se produz todas as provas. A única coisa que acho ruim é não haver um critério pré-fixado”, salienta. Barroso ainda disse que o “sistema de prerrogativa de foro por função é, como um todo, muito ruim, e que é preciso ser reequacionado”.'
O mais novo ministro do Supremo tem um acervo de mais de oito mil processos para relatar, herdado de seu antecessor, ministro aposentado Carlos Ayres Britto. O magistrado diz que é triste de se dizer que “uma grande quantidade das questões que são submetidas ao Supremo Tribunal Federal não deveriam ser”, por não ter relevância e nem repercussão geral que as justifiquem tramitar na Casa. Para ele, as ações sem maiores importâncias deveriam ter acabado na segunda instância de jurisdição. Para lidar com o grande número de processos, Barroso diz ter adotado a seguinte estratégia: “os novos, eu estou conseguindo manter em dia, para não deixar criar um novo estoque. E estou lidando com o estoque [de processos antigos], na medida do possível”. Para não atrasar os processos e não correr risco de que algum prescreva ou que algum direito pereça, o ministro tem recorrido a sua assessoria para lhe dar suporte.
Na palestra ministrada nesta sexta, Barroso afirmou que é uma “pessoa que tem alma de advogado”, por não querer acusar ninguém, e sim defender, e diz que isso é “um ponto de observação sobre a vida”, mas que precisa ser reajustado quando alguém “se transforma e um juiz”. Dessa forma, o ministro contou como tem sido o seu primeiro ano, ainda não completo, como um membro togado da mais alta Corte brasileira. “Uma das circunstâncias mais complexas dessa nossa vida de ser juiz do Supremo Tribunal Federal é a exposição pública. Esta é uma situação nova e estranha. Primeiro, é o único emprego no mundo que o sujeito diz em casa para a mulher que vai trabalhar, e a mulher pode ver pela televisão. Ou seja, ver se de fato ele está lá”, brinca. Outro ponto, já dito em tom sério, ele diz que a exposição pública tem seus aspectos positivos, como de contribuir para um debate público, fazer reflexões importantes. Já sobre os negativos, a exposição deixa o juiz do STF “muito vulnerável a todo o tipo de crítica”, mas que é saudável em um Estado Democrático de Direito, quando há exposição de argumentos, e não ofensas. Barroso diz que os piores críticos que tem encontrado são os oriundos da academia, que desmerecem a trajetória do profissional que alcança o Supremo, e que o desqualificam diante de algumas decisões com “está vendo, eu sempre soube” ou “eu sempre disse que esse sujeito não era confiável”.
Sobre as suas decisões no tribunal, o ministro diz que dorme todas as noites bem, “com a absoluta convicção de que faço o que acho certo”. “Eu sirvo ao bem, sirvo à Justiça, com a maior correição possível”, declara. “Eu acho que aceitar um cargo como esse é estar exposto a crítica pública. Se eu não quisesse participar do debate público e estar sujeito à crítica, eu teria ficado na vida boa que eu levava, de professor, de advogado, escolhendo as causas que eu queria atuar. Mas a vida me proporcionou a benção de servir ao país, em um momento que eu já não tenho outra ambição na vida, que não seja fazer bem feito o papel que me tocou fazer”, pontua. Nesse quase um ano de Supremo, Barroso diz que aprendeu que “só a verdade ofende”. Aos participantes, Barroso expôs seus pontos de vistas sobre a judicialização de questões políticas no Brasil e a discricionariedade judicial.