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Entrevista

'Não é hora de abrir mão do voto obrigatório', diz novo presidente do TRE-BA

Por Cláudia Cardozo

'Não é hora de abrir mão do voto obrigatório', diz novo presidente do TRE-BA
Fotos: Divulgação

Empossado como presidente do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia (TRE-BA) no final de março, o desembargador Roberto Maynard Frank promete levar sua experiência na Corregedoria para melhorar o serviço da Justiça Eleitoral. Na entrevista, o novo presidente avalia a disputa recente e acirrada entre os desembargadores do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) para ocupar uma vaga no TRE-BA. Para Frank, o desembargador Mário Alberto Hirs “é um paradigma de operador do Direito”. “É uma pessoa experimentada, com experiência ter sido presidente do Tribunal de Justiça e de ter sido presidente desta casa também. Eu tenho certeza de que a vinda do desembargador Mário acrescenta em muito a qualidade da prestação profissional e até, inclusive, gera um ambiente de harmonia para este Tribunal Eleitoral”.

 

O desembargador também considera que a melhor medida para combater as fake news é a boa informação. Sobre a obrigatoriedade de voto no país, Roberto Maynard Frank assevera que a regra ainda deve ser mantida. “O voto é fundamental para a nossa democracia e para dar legitimidade às nossas eleições. Não é hora de abrir mão do voto obrigatório”, declara.

 

No dia de sua eleição como presidente do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia (TRE-BA), foi empossado o desembargador Mário Alberto Hirs como juiz eleitoral pela classe de desembargadores. A eleição desta vaga foi bem concorrida e midiatizada. Como o senhor avalia a eleição de Hirs?

Eu até me julgaria suspeito para falar do desembargador Mário Alberto Hirs, pois ele é um paradigma de operador do direito . É uma pessoa experimentada, com experiência ter sido presidente do Tribunal de Justiça e de ter sido presidente desta casa também. Eu tenho certeza de que a vinda do desembargador do Mário acrescenta em muito a qualidade da prestação profissional e até, inclusive, gera um ambiente de harmonia para este Tribunal Regional Eleitoral da Bahia. Foram três candidatos, todos com candidaturas legítimas, e o órgão competente para analisar a indicação foi o plenário do TJ, que fez sua opção.

 

Houve uma movimentação na imprensa devido a candidatura do desembargador Mário, de um tema tratado no passado e que não me parece ser de interesse da coletividade, pois já foi resolvido pelas instâncias pertinentes. Eu diria que foi até injusto a abordagem. O caso foi finalizado com o instituto da prescrição. Mas a questão atinente à precatórios, no passado o Superior Tribunal de Justiça, entendeu, pelo menos até onde eu tenho ciência, de que o erro de cálculo só pode se dar quando há um equívoco de liquidação da decisão judicial. Ou seja, se a decisão judicial é certa ou errada, estando ela transitada em julgado, ela é imutável. E esse entendimento é majoritário no Superior Tribunal de Justiça, cujas decisões mais antigas remontam de ministros respeitados. Inclusive da ex-ministra baiana Eliana Calmon que proferiu decisões no Superior Tribunal de Justiça, inclusive em casos da Bahia, do município de Salvador, que fizeram parte da sindicância daquela época contra o desembargador. Esse assunto não só foi enfrentado pelo Conselho Nacional de Justiça devido ao instituto da prescrição. No entanto, eu tenho só uma tranquilidade para lhe dizer que o desembargador Mário é um homem sério e que respeita uma decisão transitada em julgado, e que o presidente do TJ não tem o condão de modificá-la unilateralmente. Até porque, houve uma defesa específica feita por procuradores do Estado ou procuradores do município. E um juiz não pode, rememorando o livro o Mercador de Veneza, de William Shakespeare, violar o princípio da isonomia, da igualdade, princípios básicos da Justiça. 

 

Como foi seu trabalho desenvolvido na Corregedoria do TRE-BA em plena pandemia? 

Eu tive a oportunidade de desenvolver essa honrosa função, que me despertou um olhar diferenciado em torno do tribunal, guiado pelo espírito público de gestão. Impulsionamos um trabalho junto com o então presidente do Regional, desembargador Jatahy Fonseca, para conseguirmos cumprir todos os prazos eleitorais e realizar as eleições de uma forma segura e célere. Enquanto estive à frente da Corregedoria do Eleitoral, realizei correições virtuais a fim de aferir a regularidade dos trabalhos administrativos e judiciais, tanto que, no final do ano passado, fomos premiados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). São 199 zonas eleitorais em todo o estado da Bahia, um estado grande. Conseguimos realizar esse trabalho, observamos as dificuldades enfrentadas pelos servidores e magistrados, de sorte que a riqueza de conteúdo que eu pude adquirir em razão da realização destas inspeções serão utilizadas agora no exercício da presidência do Regional Eleitoral. 

 

Como essas ações desenvolvidas na Corregedoria poderão subsidiar a sua gestão na Presidência? 

Quando eu formulei as questões virtuais, eu não me ative somente a questões processuais e acervos judiciais. Eu busquei saber especificamente quais eram as deficiências que poderiam impactar no trabalho dos servidores e dos magistrados. Vamos ter que investir em tecnologia, com custo ou sem custo, através de parcerias com outros tribunais, para dinamizar a prestação do serviço jurisdicional. O orçamento é bastante restrito e foi bastante impactado pela pandemia. Mas vamos tentar nos reinventar, fazendo esses investimentos e parcerias para melhorar o serviço, e também impactar na gestão do serviço cartorário, o que facilita, por óbvio, no cumprimento das metas do CNJ. 


 

Em sua gestão, haverá medidas para continuar as ações de desburocratização do serviço da Justiça Eleitoral e aproximar o cidadão?

O Judiciário vem sendo compelido a reinventar-se como poder do Estado. E por isso, precisamos buscar soluções inovadoras com o maior custo-benefício possível visando a simplicidade e a desburocratização em respeito ao cidadão. São tempos já suficientemente difíceis, e por isso, haveremos de implantar essa principiologia.


 

Antes da pandemia, o TRE estava fazendo o recadastramento biométrico para eleição realizada em 2020. Mas por medidas sanitárias, suspendeu a votação por biometria. O senhor acredita que em 2022 já poderemos ter uma votação com biometria ou ainda manteremos a modalidade de votação dos anos anteriores?

Como eu sempre digo: eu sou um homem de fé. Eu costumo ter esperança de que as coisas haverão de melhorar. Costumo ter esperança na boa fé das pessoas, eu costumo ter esperança nas instituições, de forma que eu espero que essa nova realidade seja retomada o mais rápido possível. Eu espero que essa vacinação seja acelerada no nosso país, mas se Infelizmente essa normalidade não for retomada, o Regional Eleitoral já demonstrou que tem condições de enfrentar novas eleições em em situações adversas. 

 

No ano passado, as campanhas tiveram que ser reformuladas por conta da pandemia, mas mesmo assim, houve muitos atos públicos, com aglomerações, o que possivelmente, elevou o número de casos da Covid-19. O senhor acha que é preciso pensar uma nova forma de fazer campanha política, até mesmo para ser mais limpa e transparente?

A nossa democracia é representativa. O Congresso Nacional, através da Medida 107, estabeleceu que as campanhas políticas deveriam respeitar as autoridades sanitárias por vivermos um período pandêmico. Por uma questão de interesse coletivo e de saúde pública, algumas práticas de campanha não poderiam se opor ao posicionamento da autoridade sanitária, seja ela federal ou estadual. A Medida 107 foi incorporada a legislação eleitoral como se lei fosse, e portanto, haveria essa vedação legal.


 

Quais são as ações de combate as fake news no âmbito político e a quem interessa a disseminação de notícias falsas?

Ao meu ver, essa disseminação de notícias falsas, não interessa a ninguém. O caminho para o fortalecimento da democracia dá-se em um caminho inverso, com transparência, e não com fake news. Tanto que este Regional já conta com uma comissão de trabalho relacionada a criação de conteúdo contra essa prática,  e assim também, para que as pessoas conheçam a segurança do processo eleitoral. Queremos que esse material chegue para os eleitores de hoje e também do futuro. Com isso, nós contamos com a ajuda da imprensa, para combater o mal causado pela desinformação. A meu ver, isso pode ser contido com um investimento constante em formação em educação digital. Independente disso, na via judicial, a legislação brasileira confere a possibilidade de coibir a prática das fake news pelos chamados crimes de calúnia, injúria e difamação, além de assegurar o direito de resposta àquele que eventualmente for prejudicado por divulgação de informações falsas. Eu acho que o maior combate à desinformação é a boa informação, e contamos para isso, com o apoio da boa imprensa.

 

Em toda eleição, vira e mexe, sempre tem uma ala política que pede a volta do voto impresso, como sinal de segurança do pleito e de que não há fraudes. Essa medida é viável, seria realmente um sinal de segurança?

É preciso lembrar que ao final de cada eleição, são disponibilizados os boletins de urnas, que são afixados nas portas de todas as seções eleitorais. Para além disso, os relatórios são distribuídos para os fiscais de cada partido, que recebem em primeira mão o resultado da votação por seção, de modo que, ao meu ver, a questão da segurança da urna eletrônica é um pensamento que deve ser superado e combatido com a boa informação.  Ademais, a implementação do voto impresso, além de desnecessária, a meu ver perpassa por questões que impactam diretamente no tempo da duração da votação e no custo do processo eleitoral brasileiro. Hoje, a segurança da urna já é notória, e nosso sistema de votação é conhecido mundialmente como um sistema seguro, rápido e olímpico. E é motivo de orgulho para nós. Aliás, fazer uma eleição em um país com dimensões continentais e divulgar o resultado das eleições no mesmo dia, eu diria que é uma tarefa olímpica. E nós conseguimos fazer isso com sem maiores percalços. Eu me lembro que, ainda jovem, eu me habilitava como escrutinador nas eleições. E me recordo das apurações que duravam dias para que as eleições fossem apuradas e o resultado fosse divulgado.


 

Como a Justiça Eleitoral pode fomentar, cada vez mais, a participação das mulheres na corrida eleitoral? E aqui na Bahia, especificamente, como ainda é possível impulsionar candidaturas de mulheres negras?

Eu penso que a promoção da participação das mulheres na política é uma temática que deve ser destacada, não só na Bahia, mas em todos os rincões do país. A valorização da mulher, ao meu ver, é fundamental para que sejam reduzidas as disparidades de gênero. No nosso tribunal, a maioria dos cargos de alta gestão são ocupados por mulheres de inegável competência, a exemplo da Secretaria Geral da Presidência, da Secretaria Judiciária Remota de 1º Grau - uma secretaria que estamos criando para criar um link com outras secretarias, como de tecnologia - a Secretaria de Gestão de Pessoas, de Orçamento de Finanças, dentre outros postos, são ocupadas por mulheres servidoras abnegadas. O TRE deverá formular campanhas em parceria com o TSE, presidente atualmente pelo ministro Roberto Barroso, para destacar a promoção da mulher na política.

 

É possível fazer uma mudança na legislatura para viabilizar não apenas as campanhas de mulheres e garantir reserva de vagas no Poder Legislativo?

A legislação atual já prevê uma cota de 30% para as candidaturas de mulheres. Essa mudança, ao meu ver, traria uma mudança poderia dar mais efetividade ao espírito que o legislador desejou a conceber essa legislação que acabei de comentar.

 

Em toda eleição, é discutida a obrigatoriedade do voto. O senhor acha que o voto no Brasil deveria ser facultativo?

Nós  temos uma jovem democracia. Eu acho que essa regra ainda deve ser mantida, inclusive, defendo que todos participem da festa da democracia, que são as eleições. Defendo que haja uma participação mais efetiva da população no processo democrático. No entanto, penso que deveria haver um investimento maior para essa participação e incluir a imprensa, por exemplo, na avaliação das candidaturas que são postas, quanto à informação das candidaturas, das propostas de compromisso de que cada candidato expõe para os eleitores. O voto é fundamental para a nossa democracia e para dar legitimidade às nossas eleições. Não é hora de abrir mão do voto obrigatório.