Usamos cookies para personalizar e melhorar sua experiência em nosso site e aprimorar a oferta de anúncios para você. Visite nossa Política de Cookies para saber mais. Ao clicar em "aceitar" você concorda com o uso que fazemos dos cookies

Marca Bahia Notícias Justiça

Entrevista

Reforma Trabalhista atinge quase 80% dos escritórios de advocacia, afirma líder da Abat

Por Cláudia Cardozo

Reforma Trabalhista atinge quase 80% dos escritórios de advocacia, afirma líder da Abat
Foto: Paulo Victor Nadal/ Bahia Notícias

A advocacia trabalhista, nos últimos meses, tem manifestado preocupação com a aplicação da Reforma Trabalhista. De acordo com o presidente da Associação dos Advogados Trabalhistas da Bahia (Abat), Jorge Lima, houve uma retração da demanda, da quantidade de ações propostas. Para Jorge Lima, “o impacto foi muito forte” e atinge os escritórios de advocacia. “Ainda não temos dados concretos, mas as referências que nós temos, comentários de colegas, são de que tem escritório demitido até 80% da sua estrutura funcional e advogados também. Mas a redução é clara”. O representante da advocacia trabalhista reforça o papel da Justiça do Trabalho no sistema capitalista. “Ela serve de reguladora de mercado, regula a concorrência no setor, garante o pagamento de salários dignos, quando ela pune um empregador que age errado, ela garante uma remuneração correta aos trabalhadores e está protegendo, de certa forma, o poder aquisitivo da população e, com isso, garantindo a base da economia, que é o comércio”. Ainda na entrevista, Jorge Lima afirma que a advocacia age com cautela até que se tenha uma posição do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a uma possível inconstitucionalidade da reforma, que mudou a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). 

 

Como a advocacia trabalhista tem avaliado os primeiros seis meses da reforma trabalhista?
Com grande preocupação com seu próprio futuro. Essa preocupação já vinha antes da própria entrada da lei em vigor. Os fatos se verificaram exatamente da forma como a gente previu. Uma forte retração da demanda, da quantidade de ações propostas, e uma redução grave das pautas de toda atividade. O impacto foi muito forte.

 

E isso tem atingido os escritórios de advocacia?
Claro, tem atingido fortemente. Ainda não temos dados concretos, mas as referências que nós temos, comentários de colegas, são de que tem escritório demitindo até 80% da sua estrutura funcional e advogados também. Mas a redução é clara.

 

As pessoas estão deixando de reclamar seus direitos trabalhistas por conta dos impactos da reforma?
Na verdade, logo depois que saiu a reforma, houve a divulgação massiva na mídia de sentenças muito pesadas com penas aplicadas aos trabalhadores. E, como se trata de uma inovação que, na minha modesta opinião, foi extremamente precipitada. E, como toda lei precipitada, acabou gerando esse efeito. As pessoas ficaram com medo de reclamar. Por outro lado, vejo que a advocacia teve muita cautela, porque os advogados estão observando o movimento do Supremo Tribunal de Federal (STF). Toda essa reforma trabalhista está sendo questionada, a sua constitucionalidade. Há, claramente, um toque de espera. Eles estão aguardando para ver qual a manifestação do STF para ter mais segurança em propor as demandas, não submeter demandas inúteis ao judiciário e não proporcionar, penalmente, multas para os seus clientes. Há toda uma cautela da profissão. Naturalmente, isso contribuiu, além da retração e das dificuldades dos trabalhadores, para a cautela razoável dos profissionais.

 

A Abat sempre esteve no enfrentamento da Reforma Trabalhista. Como a associação também defende seus associados?
Nós temos todo o interesse de proteger a advocacia trabalhista. Claro, o principal objetivo de qualquer norma é proteger a coletividade, qualquer norma tem que atuar assim e não seria diferente com uma norma de interesse social. O principal objetivo é defender os trabalhadores, mas temos que lembrar de dois aspectos importantes. A Justiça do Trabalho tem uma ação importantíssima no próprio sistema capitalista. Ela serve de reguladora de mercado, regula a concorrência no setor, garante o pagamento de salários dignos, quando ela pune um empregador que age errado, ela garante uma remuneração correta aos trabalhadores e está protegendo, de certa forma, o poder aquisitivo da população e, com isso, garantindo a base da economia, que é o comércio. Com a retração de salários, quem sofre logo é o comércio. E no comércio vai toda a estrutura. Indústria de base, serviços em geral, imóveis, tudo cai se cai a base da sociedade, que é o comércio. A advocacia trabalhista é altamente especializada, presta um belo serviço e eu preciso aqui fazer esse reconhecimento de que, por mais que falem tanto, problemas temos em qualquer agrupamento humano, mas a nossa atividade em si, quem convive na Justiça do Trabalho vê as preocupações e o zelo que os profissionais dessa área têm. Nós temos uma relação excelente com os procuradores, com os juízes do trabalho, com os servidores. Construímos uma realidade de trabalho que a gente deve se orgulhar. Então, qualquer norma que venha e altere esse quadro tem que ser avaliada com cautela. Nós temos muita preocupação, a mudança foi muito profunda, muito mais do que se anunciava. Mudou totalmente a forma de atuação dos profissionais e, é claro, a associação está aqui para lutar pelos seus associados sim, sem nenhum problema.

 

Em algum momento, a associação enfrentou dificuldades dentro da própria classe, principalmente daqueles profissionais que atuam em prol das empresas?
Na verdade, essa é uma visão equivocada, com todo o respeito, do que se divulga na sociedade com objetivos ideológicos e políticos. A Justiça do Trabalho protege o bom empregador e, como eu falei, o sistema, que é capitalista, depende muito de alguém que regule. Esse trabalho é cumprir esse papel. A interferência do Estado é para garantir uma concorrência digna, respeitosa, na qual você não podia pagar menos que seu concorrente para ganhar vantagem no mercado porque a Justiça do Trabalho poderia corrigir através do acórdão judicial. Então, essa atuação é bem-fazer para qualquer sistema, principalmente o sistema capitalista, que depende disso. A gente não tem nenhuma dificuldade em compreender qual o nosso trabalho na sociedade. E aí vem uma grande preocupação: esse equívoco de avaliação aconteceu muito com os próprios advogados empresariais. Muitos colegas, no início, se voltaram contra os advogados reclamantes para dizer: ‘agora eu quero ver, agora é a minha vez, a vantagem sempre foi sua’. Na verdade, nunca foi e é preciso justificar isso. Não há como a gente compreender que um trabalhador que leva anos para receber seu direito, receba de volta um ganho, porque é mera recuperação do que ele perdeu, com uma correção monetária que é uma das mais baixas do Brasil e praticamente não existe. O mercado pratica juros absurdos e lá pratica 1% ao mês. Não se pode dizer que essa aplicação de juros seja extorsiva. Automaticamente, para o trabalhador, não é esse negócio todo como diziam por aí. E, também, no debate judicial, esquecemos de uma parte muito importante. Os juízes, advogados, procuradores e servidores vieram de uma formação educacional elitizada. Então, automaticamente, não é de acusação contra ninguém a contestação, mas eles têm um perfil conservador na avaliação dos direitos. Não era como diziam: ‘Vai lá buscar teu direito e receber milhões’. São casos pontuais. Na média, a maioria das decisões são também conservadoras. Veja a dificuldade que há, para a Justiça do Trabalho, a atuação sindical. Há forte preconceito contra os sindicatos dos trabalhadores que entram na Justiça do Trabalho. Sempre houve. [Atualmente] Está mudando um pouquinho porque a crise está mostrando que todos estão no mesmo barco. Mas, até esses advogados empresariais, quando perceberam que o efeito prático e mais direto da reforma era a retração do mercado, ou seja, queda de demanda, que atingiu diretamente os interesses deles, muitos começaram a se tocar desse problema e se voltar contra a reforma também.

 

Os sindicatos patronais também estão sentindo essa questão da reforma trabalhista, com o não recolhimento do imposto sindical?
Eu sempre digo que a reforma trabalhista não está só na Lei n° 13.467 de 2017. A reforma trabalhista começa bem antes, com a discussão da terceirização, passando por outras questões, inclusive no plano judiciário, quando o STF vem, através do voto do ministro Gilmar [Mendes], e aplica um entendimento de que o princípio da imputatividade das normas teria que ser afastado. Para que você compreenda bem, a norma é a garantia de que quando há uma coletiva de trabalho, ela tenha vigência até que outra, no futuro, venha substituir. Ou seja, quando uma categoria chegava na database, o patrão era obrigado a negociar para uma base em uma conciliação que se adequasse a realidade. E aí era aquele velho embate do capital de trabalho, correlação de forças, para nascer uma nova norma. Era uma questão democrática, que valoriza as forças das partes. Com a quebra da convenção, a partir do momento que acabou a vigência das normas, acabou a norma em si e os trabalhadores voltam para o zero. É como se tivesse que construir uma nova norma a cada ano. Isso, claro, num cenário de crise absurda, de desemprego, com os trabalhadores fragilizados. O desemprego corresponde a um enfraquecimento sindical e a toda luta dos trabalhadores. O trabalhador lá na obra, na fábrica, na loja, está fragilizado porque lá fora têm tantos outros querendo a vaga dele. O empregador ganha força com relação a isso e dificulta o movimento coletivo e, automaticamente, se torna mais difícil. Estamos observando, hoje, os sindicatos dos trabalhadores perdendo força terrivelmente e os sindicatos dos empregadores também. Se os sindicatos dos trabalhadores perdem força não há movimento que possa ser negociado com os sindicatos dos empregadores. Num resumo, você esvazia a luta coletiva e esvazia a negociação salarial. Quem perde? A sociedade. Sempre que diminuímos o valor do debate coletivo, a gente valoriza soluções individuais e voltamos para aquela lamentável fase, num exagero argumentativo, da vingança privada. As pessoas estão tendo que resolver seus problemas sozinhas.

 

Como vai ficar essas campanhas salariais dos sindicatos neste ano com a reforma trabalhista?
Se eu não me engano a data-base das construções pesadas é 1° de março e, para se ter uma ideia, a data-base da Construção Civil, que é o sindicato mais antigo, está desde 1° de janeiro vencida e não conseguem fechar uma convenção. Ainda estão em fase de negociação salarial com extremas dificuldades de mobilização. No dia 1° de maio tivemos várias categorias também, é uma data simbólica, do Dia do Trabalhador, que serve de data-base para várias categorias. Essas categorias, pelos contatos que eu tenho, estão extremamente temerosas e preocupadas, porque cabe tudo o que eu falei. Dificuldade de mobilização, fragilidade do poder dos trabalhadores perante o empregador, um sistema normativo que é absolutamente ‘desproteger os sindicatos’. Nós temos três aspectos interessantíssimos para avaliarmos o momento que os sindicatos vivem. Ao mesmo tempo, essa norma acabou com o custeio através do imposto sindical, que não cabe discutir aqui profundamente porque não é o nosso tema, que houve uma mudança radical que, de repente, perdeu-se grande parte da sua receita. Os sindicatos de base e estadual estão em uma situação terrível. Perdeu-se, ao mesmo tempo, uma situação interessante que era a autoatividade que garantia ao sindicato a permanência da norma, que praticamente obrigava o patrão a vim para discutir uma nova norma. Hoje, ele e fica aguardando. Não há como comparar a necessidade do empresariado com a necessidade dos trabalhadores. A necessidade dos trabalhadores é humana, de sobrevivência diária, e a das empresas tem um prazo mais dilatado, pode até arriscar sua sobrevivência, mas não é algo imediato como se alimentar. Então, as empresas têm uma condição muito mais forte porque a realidade é que elas são mais ricas e autossuficientes. Essa situação está muito grave. E há um aspecto interessante contido na norma que passa facilmente pela mídia que diz respeito à questão das homologações e das rescisões contratuais. A lei, desde a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), do artigo § 477, parágrafo 1°, estabelecia que o trabalhador com mais de um ano teria que ser homologado no seu sindicato. Isso visava, sobretudo, proteger o trabalhador em um momento difícil da sua vida. Pela frente dele, se apresentava o desemprego. Naquele momento, ele estava fortemente fragilizado perante se empregador e era uma vítima fácil de fraudes. Era a velha história de assinar sem receber, declarar algo na saída que não tinha ocorrido, tinha uma doença ocupacional e era obrigado a atestar que não sentia nada e tudo isso era obtido mediante a pressão dos maus empregadores. Aquela norma tentava proteger o trabalhador disso e a reforma trabalhista acabou. Autorizou, simplesmente, um procedimento administrativo que pode acontecer no ambiente da própria empresa. Seja qual for o tempo do trabalhador, ele pode receber dinheiro perante a empresa e você perde com isso a possibilidade de o trabalhador fazer seu exame e o sindicato atestar em uma entrevista detalhes do que estava acontecendo para dar mais segurança ao trabalhador. E um aspecto importantíssimo do ponto de vista político: o trabalhador não é mais obrigado a ir ao sindicato. Antigamente, quando ele tinha mais de um ano, ainda que fosse no dia da saída, ele tinha que comparecer à sua casa - o sindicato. Como eu disse, os sindicatos também têm problemas, mas era uma garantia de que o trabalhador deveria ir ao sindicato. No momento da saída o sindicato tinha oportunidade de conversar com o trabalhador e fazer um levantamento a respeito da realidade do seu espaço de trabalho, a realidade interna da empresa, o cumprimento das suas obrigações. Inclusive, verificação estatal que os sindicatos faziam, que era a verificação do recolhimento de INSS e FGTS, auxiliando a DRT, o INSS e outros órgãos. Era um papel importantíssimo. Hoje, a lei tirou, reforçando ainda mais a minha sustentação de que isso empurra as pessoas para soluções egoístas, individuais, fragilizando a representação coletiva.

 

A Justiça do Trabalho era paternalista?
No Direito em si, em seu conceito jurídico, há o princípio da hipossuficiência, que na dúvida teria que beneficiar o empregado. Tudo que o trabalhador precisa, é para aquele momento. E a Justiça do Trabalho marca uma audiência para daqui a 4, 5 meses ou até mesmo um ano depois, para ainda ter prazo, sentença, recurso. Tem processos que duram anos. E é a justiça mais rápida do país, imagine. Mas, para a necessidade de um trabalhador, ainda é muito lento. Daí a frustração. Se nós pegarmos a realidade do Brasil, as pessoas dizem ‘ah, a Justiça do Trabalho é paternalista, tem casos de sentenças milionárias’, mas são exceções. O papel essencial da Justiça como um todo, e na Justiça do Trabalho ainda mais, que é puramente patrimonial, é recompor o status quo ante, repor o patrimônio daquela pessoa que foi lesada. Então, automaticamente, o trabalhador não está ganhando nada, ele não está crescendo seu patrimônio, a justiça faz o seu papel social e reequilibra a relação social, proporcionando ao empregado que ele receba de volta a quantia equivalente ao que lhe foi tirado. Daí que me parece absurda a ideia, de que muito se fala, da indenização por dano moral, a indústria do dano moral. Essa indústria é uma realidade. O dano existe e a toda hora se reproduz na sociedade, que é fruto da fragilidade do trabalhador coletivamente considerada.

 

A indenização não cumpre a sua execução pedagógica?
Quando existe a condenação, os valores são muito baixos, chega-se até a estimular mais o dano. Quando você faz uma análise da quantidade de trabalhadores lesados, quantos conseguem ir até a Justiça, que já era difícil porque tinha que perder dia de trabalho, comparecer, pegar testemunhas, os atos que importam em dano moral geralmente são feitos no ambiente dos escritórios, obras, você percebe que é uma coisa difícil de provar. Quando ele consegue provar as indenizações, pelo nosso posicionamento naturalmente conservador, isso gera indenizações ínfimas com relação ao dano causado.

 

Em uma recente conversa com a presidente da Amatra, ela contou que os advogados daqui serão os primeiros juízes da causa. Serão os primeiros a avaliar essa possibilidade do trabalhador entrar com aquela ação ou não, se irá assumir o risco ou não, diante dessa possibilidade do pagamento das custas. Como o senhor avalia essa declaração?
Eu tenho uma admiração e um respeito enorme pela Dra. Angélica, mas tenho ressalvas em relação a esse entendimento particular. Eu entendo que juiz é juiz, advogado é advogado e procurador é procurador. Um advogado jamais será juiz. Eu não gosto nem de fazer esse exercício retórico. ‘Porque terá que fazer uma avaliação’ é uma coisa equivocada. O advogado não está na posição de fazer papel do juiz, ele é advogado. Em tese, no plano constitucional, ele deveria submeter a lesão. O trabalhador faz a exposição dos fatos e ele enquadra aquele fato. E, se perceber, que o fato é antijurídico, ou seja, que é um ato ilícito, ele submete ao judiciário. Há uma pequena confusão nisso com a gratuidade judiciária, a facilidade de acesso porque uma das grandes pérolas da Constituição Federal, pérolas não no sentido pejorativo, mas valorativo e da importância do conceito, é o acesso gratuito ao judiciário. É a perspectiva de que qualquer pessoa, em qualquer situação, vá até o Judiciário e levar a notícia do descumprimento para uma atuação efetiva do Estado. É claro que exageros acontecem, por exemplo, há gente milionária que entra com uma ação e arguia a gratuidade judiciária. Mas esse corte tem que ser feito pelo judiciário e eu acho até que ele fazia bem. Lembro-me de uma situação que a juíza ameaçou, em mesa, um famoso administrador do plano esportivo aqui na Bahia. Ela disse para o advogado dele: ‘Eu sei que o senhor é uma pessoa rica, como irei arguir a gratuidade judiciária?’. O advogado insistiu e ela disse ‘que iria expedir um ofício para a Receita Federal para fazer um levantamento e ver qual é a realidade patrimonial’. O advogado desistiu. O juiz interessado, que graças a Deus na Justiça do Trabalho trata-se da maioria, percebe onde está a má fé, o exagero, a atuação incorreta do judiciário. O que não se pode é estragar é esse direito essencial de acesso ao judiciário sob esse argumento de que o advogado tem a obrigação de pensar no prejuízo que o cliente possa ter. Eu confesso que tenho até um exagero com os advogados e juízes. Eu digo que, lamentavelmente, toda vez que eu ouço uma expressão dessa, eu lembro de Sobral Pinto, que tem uma famosa frase que diz que ‘A advocacia não é uma profissão para covardes’. A partir desse pensamento, passa a ser como se o advogado que soubesse transferir para o seu cliente o temor gerado a partir de uma norma estatal, seria o advogado mais competente, ou seja, que mais se enquadraria nesse papel de juiz. Mas se ele for advogado mesmo, se ele não for um juiz, ele terá o cuidado de avaliar com profundidade aquele fato informado pelo cliente e saber enquadrar corretamente na lei e proporcionar uma ação do Judiciário para que se repare o dano causado. Ele não tem obrigação nenhuma de se comportar ou pensar como um juiz. Isso é essencial para o Estado Democrático de Direito, que cada um pense na perspectiva da sua profissão.



Como é que a Abat avalia as decisões que estão sendo tomadas aqui na Bahia, após a reforma trabalhista?
Eu acho que os magistrados baianos estão tendo a devida cautela também. Está tendo bastante debate e o tribunal daqui ainda não se manifestou de maneira concentrada a respeito da reforma. Eu acho que todos nós, operadores, estamos alocados no mesmo grupo. Juízes, procuradores do trabalho, advogados, promotores fiscais e todo mundo que opera na Justiça do Trabalho acaba ficando a mercê do entendimento do STF.

 

E qual a expectativa de julgamento da ação direta de inconstitucionalidade no Supremo?
E eu tenho muito temor a respeito porque, obviamente, não temos no STF, com exceção da Rosa Weber e do Marco Aurélio de Mello, ministros que são oriundos do Direito do Trabalho. Os demais ministros não têm muita vivência no ramo trabalhista. Mas, eu espero que com assessoria técnica e audiências públicas aja um pronunciamento. É preciso um pronunciamento do STF para que esse imbróglio seja resolvido. Infelizmente, essa dúvida e insegurança nasceram do esvaziamento do processo legislativo. No Congresso Nacional, o debate praticamente não aconteceu. Foi um debate cruel, com forte conteúdo eleitoreiro, ideológico, porque posicionou as pessoas de acordo com seus interesses. O que aconteceu lá foi lamentável, não se aprofundou o debate. A norma 13.467 vai exibir a sua face mais tenebrosa.

 

Quando essa situação poderá ficar um pouco mais estável para se entender quais são os efeitos da reforma?
O ministro Ives Gandra tentou fazer uma reunião no TST [Tribunal Superior do Trabalho] na qual ele pretendia adaptar toda a jurisprudência existente às regras da reforma e isso foi refutado veementemente, no sentido de que isso não seria adequado, porque o STF ainda não se pronunciou. As questões constitucionais estão todas postas. E a gente enxerga que não houve um debate nacional. A grande tentativa é que a gente consiga retomar o chamado Fórum Nacional do Trabalho. Em 2005, eu participei dele e estávamos caminhado com quatro representações centrais: a dos trabalhadores, dos empregadores, o próprio representante de prestação do governo e o chamado quarto setor, com ONGs, cooperativas e entidades em geral. Essas estruturas estavam debatendo em mesa e avançando em vários temas para conseguir um grande pacto nacional, que fizesse uma reforma trabalhista efetiva, profunda, porém, com o consenso que fosse possível e, depois, no embate no próprio Congresso no que sobejasse o encontro das partes, com legitimação e acompanhamento. O governo estava acompanhando tudo diretamente, foi um debate muito rico e, aqui em Salvador. Mas perdemos essa oportunidade e fomos mudados no tempo para 2017, depois da situação toda e após a ruptura institucional que o país viveu com a questão do impeachment, com um quadro político absurdamente dicotômico, com uma relação muito agressiva entre as principais forças políticas do país. E nesse meio tempo, cai uma reforma trabalhista que desde o seu início era manifestada por todos que a promoviam como um meio de refrear a agressividade da Justiça do Trabalho no mercado. A Justiça do Trabalho era vista como um problema econômico, com tantos problemas mais profundos como a corrupção, como a instabilidade econômica, falta de geração de emprego, trabalho escravo. Com tudo isso o problema é uma norma? Não é a norma. O problema está com o que fazem dela no dia-a-dia com o desrespeito as normas trabalhistas e todo o problema que a gente está enfrentando no Brasil.