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Entrevista

Novo Código do Processo Penal pode ‘dignificar a figura do acusado’, afirma jurista

Por Cláudia Cardozo

Novo Código do Processo Penal pode ‘dignificar a figura do acusado’, afirma jurista
Daniela Portugal | Fotos: Estela Marques/ Bahia Notícias
A reforma do Código do Processo Penal voltou a ser discutida na Câmara dos Deputados? Quais inovações a proposta do Senado pode trazer para atualizar o código que vigora de 1941?
O nosso Código tem mais de 70 anos. Eu poderia arriscar dizer que qualquer alteração que se faça com uma defasagem dessa já é muito boa. O projeto de reforma do Código de Processo Penal tem algumas alterações bastante interessantes: primeiro, porque ele cria para gente um novo marco teórico, adota expressamente o Processo Penal Acusatório, e a adoção do sistema acusatório, que vem, se eu não me engano no artigo 4º do projeto de reforma, marca o direcionamento desse Código do começo ao fim, porque no sistema acusatório a gente tem as funções processuais bem definidas. Nesse sistema, cabe ao juiz julgar e só. Esse juiz não vai ser o protagonista na execução criminal, na busca de provas. Os poderes instrutórios do juiz, aquele juiz inquisidor fica de lado, dando lugar a um juiz que tende a ser mais imparcial - por mais que a gente perceba que nenhum sujeito que vá julgar vai ser completamente imparcial, e a idéia da palavra sentença até é um sentimento, toda sentença é um sentimento com relação a algo-, então, por mais que a gente não tenha um juiz absolutamente neutro, a imparcialidade é uma ideia construída dentro de um processo racional. Quanto mais a gente racionaliza, quanto mais a gente distancia esse juiz da busca da prova, melhores resultados a gente vai garantir em termos de garantias processuais. Resumidamente, o que o projeto de reforma faz é adotar o sistema processual acusatório, e ao adotar expressamente o sistema processual acusatório, ele delimita e define as funções processuais, de forma que o juiz não tem a função mais de perseguir a prova, ele não tem mais a função de atuar como parte ativa desse processo.

Essa nova forma de julgar, esse novo sistema acusatório, pode também trazer mudanças na forma como o Ministério Público e a Policia Federal de investigar?
A partir do momento em que o juiz não estará perseguindo a prova, essas funções vão recair para esses agentes. O Ministério Público, no exercício do seu ônus acusatório, poderá perseguir provas, que foi inclusive uma matéria polêmica. Se o Ministério Público poderia ou não buscar provas, ou se seria uma atividade exclusiva da Polícia, ou se poderia ser uma atividade também que poderia ser acumulada com o MP. O projeto de reforma vai falar expressamente sobre isso, permitindo que o MP busque provas para condenar. Eu poderia dizer que esses agentes passarão a exercer, de maneira mais clara, o ônus que possuem, no exercício da atividade de acusação.

Essa proposta pode tirar o caráter autoritário do Judiciário brasileiro, de um juiz com poder absoluto?
Eu acho que não, porque a gente ainda tem muito a ideia do juiz - traçando um paralelo com os inquisidores da antiguidade -, daquele juiz como protagonista do processo, a figura do juiz inquisidor, e a partir do momento que a gente pensa democraticamente a figura do julgador, esse julgador, vai ser tão mais importante quanto mais democrático ele for. Acho que a proposta redefine o juiz, ele não perderá sua importância pelo fato dele não estar perseguindo a prova, basta que ele passe a ser olhado como um juiz democrático. E aí outra alteração importante que é trazida no projeto de reforma é a criação do chamado juiz das garantias. Hoje, no inquérito, nós já passamos a ter a ação do juiz que irá ser responsável pelo julgar da causa final, então se na fase inquisitorial, determinado juiz decreta a prisão preventiva, será esse mesmo juiz hoje que irá julgar o final deste processo. O problema disso é que quando o inquérito se conclui e ele é emitido ao juízo, aquele que conduziu as investigações, já conduziu o processo com sua decisão formada, o que é extremamente prejudicial para o acusado, e com o juiz das garantias, passará a existir um juiz responsável pela condução do inquérito policial, ou seja, pela determinação de uma eventual prisão preventiva, para que ele se manifeste sobre uma interceptação telefônica. Nós temos o juiz que estará atuando no momento do inquérito policial - o juiz das garantias -, a função desse juiz vai ser, somente, se as garantias processuais penais estão sendo respeitadas nessa fase, e um outro juiz para julgar o processo, então nós vamos ter o juiz das garantias e o juiz do processo. Aquele juiz que atua no inquérito não é o mesmo que julga, a única exceção seriam as comarcas em que haveria somente um único juiz, mas para maioria dos casos, se modifica a regra processual de maneira muito significativa, até porque o código também traz como alteração algo que já havia sido objeto de tratamento desse potencial, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, que é o acesso aos elementos de prova já documentados nos autos. O advogado sabe que é muito difícil ter acesso, mesmo com o tratamento jurisprudencial dado em súmula pelo STF, muitos delegados se negam a exibir ao defensor, sobretudo, os elementos de prova já documentados nos autos do processo. O projeto, prevê expressamente o direito ao acesso dos elementos já documentados, ou seja, eu não to falando de prova em andamento, as provas em andamento seriam preservadas em seu sigilo, mas aquelas que já concluídas, o defensor teria acesso e o juiz das garantias estaria ali para viabilizar isso. É uma peça muito importante que passa a existir no nosso sistema processual.

O novo código também enxerga o réu de uma forma diferente? Essa nova proposta pode enxergá-lo como cidadão, como uma pessoa de direitos?
Sim, a palavra réu é relativa a rés, coisa, o réu sempre foi tratado como coisa ao longo do processo. Eu entendo que a legislação, por si só, não muda isso, porque culturalmente, a gente identifica o acusado processado e sobretudo condenado como coisas processuais. Só a mudança legislativa não altera isso, mas o projeto tenta dignificar a figura do acusado, inclusive coloca o interrogatório expressamente como um meio de defesa. A fala do réu passa a ser percebida necessariamente como uma fala de defesa. Isso muda a forma dele ser olhado no processo, de ser interpretado, muda a forma dele ser avaliado ao longo do processo penal como um todo, inclusive existem menção expressa a impossibilidade de espetacularização com relação a esse acusado, a necessidade de preservação da sua intimidade, de preservação da sua dignidade, e é como eu digo, essas normas são trazidas expressamente e a gente tem a esperança de que isso modifique um pouco a cultura processual.

A reforma do CPP já não era esperada há muito tempo? Isso já não deveria ter sido feito há muito tempo?
Sim, estamos em largo atraso, porque o nosso código é da década de 1940, portanto é um código inspirado nos códigos penais da Alemanha e da Itália, sobretudo, da Itália. É um código de inspiração fascista, de inspiração nazista, e que o processo de democratização do nosso Estado, a partir da Constituição de 1988, que marca o fim do golpe de 1964, a gente já está em longo atraso. A jurisprudência chegou a corrigir alguns desses aspectos como, por exemplo, do acesso do defensor aos elementos de prova já documentados no inquérito, mas esse atraso existe. A necessidade de uma norma escrita trazendo garantias ao acusado, e não só o acusado, mas também outras figuras tocadas no crime, como a vítima, crianças e adolescentes, também são objeto de tratamento expresso pelo projeto de reforma, a gente tem realmente uma tentativa de superar esse atraso histórico.

A reforma do CPP pode mudar a situação carcerária do país, tendo em vista que muitas das prisões são preventivas, são provisórias, de réus ainda não julgados?
Sim, pode sim ter. O Brasil é hoje a 3ª maior população carcerária do mundo, se a gente contabilizar nossas prisões domiciliares, são os dados do Conselho Nacional de Justiça [CNJ]. Quase 40% da população carcerária são de réus em prisão preventiva, e aqui na Bahia, especificamente, esses índices são ainda piores, porque nossos índices são superiores a 60%. A Bahia está entre os piores estados no número de prisão preventiva. A reforma do CPP traz alguns novos institutos que podem alterar esse quadro, como por exemplo a aplicação imediata de pena, um procedimento sumário aplicado nos termos do anteprojeto de reforma para crimes com pena não superior a 8 anos. Com isso, vai existir a possibilidade de aplicação imediata de pena, se essa pena for aplicada de forma mais benéfica, algo que se assemelha um pouco ao sistema norte americano de negociação entre a promotoria e o acusado. Eu temo um pouco essa alteração, eu acho que dependendo da forma como ela pode ser conduzida, ela poderá nos levar a resultados desastrosos, de julgamentos antecipados forçados, sem respeito, porque eu não sei se temos um amadurecimento suficiente, um respeito as garantias processuais para poder trabalhar com um sistema dessa natureza como faz os Estados Unidos. Lá, há obediência, há garantias dos precedentes jurisdicionais, que é levada mais a sério do que aqui no Brasil. Aqui, cada juiz decide como quer, cada tribunal decide como quer, o próprio Supremo muda constantemente os seus posicionamentos. Não sei se nós temos o amadurecimento necessário para trabalhar com um sistema de julgamento antecipado de demandas penais, mas em se admitindo o julgamento antecipado de demandas criminais em que nós vamos abrir mão do longo processo para aplicação imediata de pena, pena esta, no seu mínimo, vai existir a possibilidade de desencarceramento, a partir de sanções mais brandas. Temos como buscar vias de desencarceramento, mas não sei realmente, se na prática isso vai trazer bons resultados, a depender da forma como será feito, sim, irá trazer. Outro elemento importante é a ação penal nos crimes contra o patrimônio. Hoje as nossas penitenciárias e os nossos presídios abrigam que tipo de sujeito? Hoje, abrigam homens negros com capacidade econômica, eles estão ali retirados fisicamente, expressamente metaforicamente, em todos os sentidos, estão retirados do mercado de trabalho. Com isso, nós temos homens negros em atividade econômica que estão encarcerados, basicamente por dois crimes: tráfico e crimes contra o patrimônio, em sua maioria roubo. Tráfico e roubo são os dois grandes crimes. E a partir do projeto de reforma, os crimes contra o patrimônio não violentos, furto, estelionato, apropriação indébita, receptação, os crimes patrimoniais não violentos, passam a ser ação penal condicionada a representação da vítima. Se a vítima não tiver interesse de representar, a gente tem a possibilidade de aquela ação penal não ser deflagrada pelo MP, e aí é interessante, porque a partir do momento em que você condiciona a ação penal dos crimes patrimoniais não violentos, a manifestação do interesse da vítima, vai permitir que exista uma espécie de composição. O projeto está abrindo um espaço maior para Justiça Restaurativa, basicamente aplicada a ações penais de menor potencial ofensivo. Crimes que vão para Juizados Especiais, com penas não superior a dois anos. A partir do momento que se condiciona a ação penal a representação dos crimes patrimoniais não violentos amplia o espaço de negociação, muito embora não haja no projeto de reforma do CPP nenhum regramento expresso da Justiça Restaurativa. Ele deixa espaços vazios, que podem ser preenchidos de outra forma. Eu acho que ele poderia ser menos tímido nesse aspecto, o projeto de reforma poderia ser avançado para um tratamento expresso da Justiça Restaurativa, mas ele não faz isso.

A reforma do Código pode reduzir o número de recursos e ela pode estar de acordo com a nova decisão do Supremo, de permitir a execução de uma pena após decisão de segundo grau?
O projeto do novo CPP restringe as espécies recursais, e busca maior celeridade para o processo. Nesse sentido, traz uma boa alteração ao acabar com o recurso de ofício - situação em que a decisão do juiz precisava ser, obrigatoriamente, objeto de recurso, ainda que o Ministério Público concordasse com o teor da decisão; hipótese antes prevista para as sentenças que concediam habeas corpus ou que determinavam a absolvição sumária do acusado.  Entretanto, traz uma péssima alteração ao passar a limitar o número de embargos de declaração em apenas ‘uma única vez’, como prevê a redação proposta para o art. 497. Os embargos são cabíveis quando há omissão, obscuridade ou contradição na decisão. Sabemos que, muitas vezes, as partes embargam da decisão somente com o fim de atrasar o término do processo, mas é elementar que existem outros meios processuais aptos a evitar tal situação que não pela via da restrição do número de embargos, o que pode vir a ferir a ampla defesa e o contraditório como garantias constitucionais fundamentais ao processo penal.

Essa proposta ainda pode ser modificada?
As propostas de modificação estão distribuídas em mais de 200 propostas de emendas. Nem todas as emendas identificam de qual matéria tratam, então é preciso abrir uma a uma para verificar as propostas de alteração, o que só tive tempo de fazer agora pela manhã. Quanto aos recursos especificamente, existe emenda que visa a permitir atribuição de efeito suspensivo às medidas cautelares impostas no acórdão condenatório. A finalidade da proposta de emenda é prevenir a imposição de prisões cautelares prematuras quando há chances de êxito na instância recursal superior e sem comprometer a efetividade dos acórdãos condenatório.

O nosso atual código permitiu que juízes se tornassem heróis e permitiu o funcionamento mais explícito de um justiçamento e surgimento de justiceiros, ainda mais em tempos de operações como a Lava Jato?
Eu acho que o código, o projeto de reforma, como ele sugere o funcionamento bastante garantista. Os juízes supostamente heróis que, no plano processual do que no plano garantista funcionam mais como um grande vilão, acabam perdendo realmente espaço, porque um juiz que persegue a prova, como por exemplo o juiz Sergio Moro procede na operação Lava Jato, não teria espaço, não teria respaldo no projeto do novo código. Mas ainda assim, com o código atual, muitas medidas adotadas na Lava Jato são conflitantes já hoje, com as previsões do nosso Código do Processo Penal fascista, da década de 1940. Nós precisamos de uma mudança cultura para além da mudança legislativa.

A reforma do CPP também atinge algumas previsões do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)?
Com relação a maioridade penal não, o CPP não toca nesse assunto e quando ele toca na questão das crianças e adolescentes, ele toca de maneira muito cuidadosa ao prever que eles, ao serem ouvidos, sejam ouvidos por intermédio de profissionais especializados, para que eles não enfrentem de maneira direta o sistema processual tradicional. Não é o juiz que irá fazer perguntas diretamente as crianças e adolescentes, havendo a necessidade, do diálogo ser conduzido por intermédio de profissionais especializados.
 
O novo CPP pode refletir o nível de maturidade da democracia brasileira?

O avanço no respeito dos ideais democráticos de cada Estado pode ser medido precisamente a partir da forma como esse Estado trata os seus presos. Eu sei o quão democrático um Estado é a depender da forma como ele trata os seus presos e processados. Se os princípios e garantias trazidos no projeto de reforma do CPP forem respeitados e derem origem a uma nova forma de se pensar o processo penal, nós teremos avançado muito no tratamento do preso e, consequentemente, o ideal democrático estará um pouco entre nós. Quando a gente coíbe espetacularização e exploração sensacionalista da imagem do preso, quando a gente impõe a presença de um defensor desde a fase de inquérito até o final, e da própria fase de execução penal, quando a gente prevê um sistema em que o juiz não possa perseguir provas e adotar uma postura ativa no tratamento desde acusado, a gente avança muito em termos de democracia.

Essa reforma, essas garantias, podem ser fundamental para uma parcela desfavorecida da população, como no negro, pobre, morador da periferia, tendo em vista que, quem é rico, tem muito mais chance de ter uma defesa mais ampla, com maiores recursos?
Sim pode. Hoje, a realidade que eu percebo no processo penal é que, em vez de estarmos buscando estender as garantias normalmente aplicadas a processos de ‘colarinho branco’ aos processos comuns, a lógica social tem clamado pelo movimento inverso. Em vez de pedir a extensão das garantias desses processos de colarinho branco para esses crimes comuns, eu quero, na verdade estender as injustiças, as atrocidades desses processos penais comuns aos crimes de colarinho branco, ao processo penal nos crimes de colarinho branco, que tradicionalmente, historicamente, sempre foi um processo mais garantista do que o processo relacionado a crimes comuns. Em vez de estarmos caminhando socialmente para a extensão de garantias, a gente tem clamado socialmente pela extensão de ofensas, pela extensão de abusos, e eu acho que o projeto de reforma, a partir do momento que ele se estabelece como o processo penal acusatório, inclusive como um processo penal que não admite a prova ilícita, e nem as provas derivadas das ilícitas - e aqui o projeto de reforma não traz exceção, isso é importantíssimo. Ele consagra expressamente a impossibilidade de uso da prova ilícita, bem como as provas delas derivadas e não traz exceções. Não sei se, de fato, todas as promessas desse nosso CPP vão se concretizar. Temos como exemplo a Lei de Execução Penal, que é anterior a Constituição Federal. Ela já era anunciada a época como uma lei à frente de seu tempo, extremamente garantista, e essas garantias foram quebradas uma a uma a partir de sanções, a partir de entendimentos jurisprudenciais. Uma lei, às vezes, que institui um sistema de garantias, se não houver um reconhecimento social daquela lei como um novo corpo jurídico e como princípio ideológico, essa lei acaba ruindo, mas a gente tem que olhar de uma forma otimista.

Há chances desse projeto ser aprovado como apresentado pela Câmara dos Deputados, diante de sua atual formação?
Eu realmente não sei a nossa atual composição de parlamento aprova. Me assusta um pouco algus parlamentares que ainda seguem uma lógica extremamente punitivista. A gente ainda escuta de alguns parlamentares que vivemos num país de impunidade e eu penso como um país que é a 3ª maior população carcerária do mundo pode ser visto como um país da impunidade. Eu não sei se nós temos ambiência para autorização de um novo modelo processual, que afaste o sistema inquisitorial, que afaste a coleta de provas ilícitas, que afaste a espetacularização do acusado, eu não sei se nós temos um amadurecimento do nosso legislativo suficiente para isso. O que eu vejo é que existe alguma resistência por parte de alguns parlamentares, uma resistência muito grande ao estabelecimento de garantias como fios condutores do processo penal, mas por outro lado existem alguns outros parlamentares, não vou citar nomes, mas existem alguns outros que tem essa preocupação, que estão olhando à frente do seu tempo e eu espero muito que eles consigam conduzir o processo até a aprovação do projeto de reforma.

Se a reforma for aprovada como proposta, se levaria muito tempo para que ela se tornasse uma cultura, seja entendida pela sociedade?
Sim, mas seria uma construção diária, levaria um tempo, mas a cultura jurídica ela é feita de pequenos passos. Cada ato processual, cada página processual representaria ou um novo avanço ou um novo retrocesso, a depender da forma como a gente encararia isso. Existe uma construção feita dia a dia, até a gente chegar em uma nova forma de encarar o Processo Penal. Outra alteração bastante interessante é a previsão de um lapso temporal limite para a conclusão dos inquéritos policiais. Hoje, nós temos uma série de inquéritos em aberto que não são concluídos e que não são arquivados, eles simplesmente ficam soltos na nossa orbita jurídica, e o projeto ele cria um lapso máximo de 720. Isso significa dizer que, se não for concluído o inquérito no prazo, o juiz das garantias vai poder arquivar esse inquérito, mais ou menos uma hipótese extintiva da punibilidade pela inércia do Estado na busca de provas e de indícios com relação a determinado fato criminosos, o que é bastante interessante, porque hoje, se você está sendo processada, aquele inquérito vai ficar aberto indeterminadamente caso não haja prazo prescricional comum, e o inquérito pode ficar aberto por 20 anos, o que é um grande absurdo. O inquérito é uma fase em que evidências de determinado fato criminoso precisam ser coletadas. O que o projeto de reforma tenta fazer com esse lapso temporal é de alguma maneira impor a ação das autoridades públicas. Se for arquivado por inércia, o agente público ainda pode ser responsabilizado por inércia.