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Marca Bahia Notícias Justiça

Entrevista

Vânia Chaves - Presidente do TRT-BA

Por Claudia Cardozo

Vânia Chaves - Presidente do TRT-BA
Fotos: Claudia Cardozo / Bahia Notícias

Ao contrário do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), sempre presente nas listas das piores cortes do país, o Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região na Bahia (TRT-5) ocupa, nos últimos anos, os primeiros lugares nos levantamentos que o comparam com os outros tribunais regionais trabalhistas do Brasil. A desembargadora que está à frente dos trabalhos do TRT-5, Vânia Chaves, passa o bastão no fim deste ano a um novo presidente do órgão, que terá o desafio de mantê-lo no mesmo patamar de aprovação. Em entrevista ao Bahia Notícias, ela listou os principais desafios que encontrou à frente da gestão do tribunal, defendeu a negociação trabalhista através de acordos e comentou o processo de sucessão ao seu posto. A magistrada também falou sobre o andamento da auditoria do Tribunal de Contas da União que apontou, em 2011, sobrepreço na construção da nova sede do TRT-5. “Foi um equívoco de precificação de alguns itens, mas que foram devidamente adequados”, assegurou.


Fotos: Claudia Cardozo / Bahia Notícias

Bahia Notícias: A senhora assumiu a presidência do Tribunal Regional do Trabalho da Bahia (TRT-BA) em novembro de 2011. Neste meio tempo o TRT baiano foi considerando um dos melhores do país no âmbito da Justiça do Trabalho. Como é para senhora, como gestora, ter comandado por dois anos e ter estes índices?

Vânia Chaves: Para mim é uma grande satisfação. Porque sou juíza de carreira, entrei aqui mediante concurso e segui toda trilha, a começar como juiz substituto. Passei a ser juíza titular, comecei no interior até chegar à capital, fui promovida a desembargadora... Então segui a carreira todinha. Hoje é o fim de carreira. Claro que eu ainda posso continuar como desembargadora, julgando processos, mas na parte administrativa do tribunal cada desembargador só tem direito a ficar quatro anos, é o que a Lei Orgânica da Magistratura permite. Como avalio a minha gestão: avalio de forma altamente positiva, sem vaidade, com humildade. Mas, neste período, nós tivemos grandes desafios que ultrapassaram os limites do nosso regional, que foram traçados em Brasília, inclusive o de cadastramento no cadastro nacional de dados no BNDP (Banco Nacional de Débitos Trabalhistas). O que é que os tribunais tinham que fazer? Fazer um cadastro para alimentar este banco para que devedor trabalhista não possa participar de concorrência publica. O que é louvável. Eu assumi, tive um mês e meio para fazer o cadastramento de todos os processos e alimentar esse banco de dados e eu consegui fazer. Segundo, eu encontrei um tribunal em greve, parado há sete meses, sem diálogo com a comissão de greve. Eu tive que chamar os servidores, o pessoal do Sindjufe, para dialogar e para apresentar uma proposta. Ainda tive ajuda do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e tive ajuda do TST (Tribunal Superior do Trabalho), do presidente na época, [João Oreste] Dalazen. Mas foi a Bahia que conseguiu resolver através do nosso juiz auxiliar, o Dr. Rubens Nascimento, um acordo em que aqueles que estavam sem trabalhar retornariam ao trabalho, nós compensaríamos as horas e também fizemos descontos. Então, é uma atitude antipática um presidente assumir tento que resolver uma greve de sete meses e nós resolvemos. Essa foi duas grandes vitórias de 2011. Iniciando 2012, vieram novas demandas, as programas do TST.

BN: Quais foram essas demandas?

VC: Inicialmente a implantação do PJE (Processo Judicial Eletrônico). O nosso estado é um dos primeiros tribunais que implantaram o processo eletrônico. Foi um desafio. Tive que treinar servidores e dar conta desse trabalho que foi pioneiro, aqui para nós. Treinamos servidores que hoje são multiplicadores. Temos servidores hoje que dão cursos no Brasil todo. Depois, nós tivemos uma campanha muito grande, a do Trabalho Seguro. Foi um trabalho bonito para mostrar o quanto a segurança no trabalho é importante. Este trabalho foi realizado em sete capitais, nas arenas onde tínhamos grandes obras. A Bahia foi um dos incluídos para fazer parte do programa. Nós demos conta do programa e o nosso ainda foi diferente, porque nós fizemos junto com a Associação de Magistrados da Justiça do Trabalho. Demos noções de cidadania e direitos trabalhistas no programa chamado "Trabalho, Justiça e Cidadania". O nosso programa não foi só o evento da Fonte Nova, foi a culminância de um trabalho que veio se desenvolvendo e naquele dia se encerrou. Depois tivemos um grande trabalho, que eu busquei fazer, de aproximar as duas instâncias do tribunal: a primeira, que julga os processos logo que entram, e a segunda, fase do tribunal. Procurei estreitar os laços do tribunal com a primeira instância e consegui, como: visitando vagas, despachando no Fórum do Comércio, atendendo servidores e partes lá mesmo. Nós temos uma sala no 11º andar, que é chamanda Sala da Mesa Diretora. Uma vez por mês nós despachamos lá. Vou com a equipe toda: diretor geral, assessoria de comunicação, diretor de segurança, secretário geral. A gente atende o que tem para fazer. Nós vamos para evitar que o servidor saia do Comércio e venha até nós. Esse programa eu expandi para o interior. Estive em várias unidades do interior, estive em Feira de Santana, Juazeiro e Bonfim. Tenho outras varas programadas como Itabuna e Ilhéus. Visitamos as unidades, dialogamos com os servidores, mostramos o que é que a gente esta fazendo e vemos quais são as dificuldades que eles têm. Nós temos 49 vagas operando pelo sistema do processo judicial eletrônico e temos ainda tribunal inteiro, a segunda instância, que foi um projeto piloto. Nós fomos o primeiro tribunal no Brasil a implantar o PJE. O nosso tribunal foi escolhido como piloto pelo perfil dele, por ser um tribunal com um perfil jovem e que tem desembargadores e servidores com capacidade para operar um trabalho tão qualificado como é esse do PJE, porque existem tribunais no país hoje que possuem poucas varas, mas muitas das capitais onde se concentram o maior contingente de operários não funcionam ainda pelo sistema PJE. Nós tivemos os programas do Trabalho Seguro daqui da Bahia. Fiz trabalho com a Federação das Indústrias, porque eu precisava de um parceiro como ela, com o Sindicato da Indústria da Construção Civil, que é o sindicato patronal, com o polo petroquímico, agora já vou ver o Sindicato da Construção Civil de Camaçari, sempre levando noções de proteção para que o trabalhador fique instruído de que ele tem que usar o equipamento pessoal de proteção individual e que ele tem que ter cuidado com a vida dele, que tem que ajudar o empregador a esse cuidado, que ele é importante como peça, como ser social, como pai de família. Ele tem um papel de fundamental importância na sociedade. Fizemos um seminário de trabalho infantil, porque nós fazemos parte do fórum estadual, que se chama Fetipa. Temos vários juízes trabalhando com eles e é importantíssimo que um juiz do Trabalho e nós todos, a instituição, integre a esse grupo, porque dá legitimidade ao grupo, somos a Justiça Social. A gente não podia ficar só julgando processos, a gente faz esse trabalho também. Além disso, nós temos um programa em 2013 dos 70 anos da CLT [Consolidação das Leis Trabalhista]. Por força disso nós tivemos que fazer vários eventos em Porto Seguro, Valença e em Salvador. Tenho feito outro trabalho, que é no ramo do sindicato aqui, através da sessão do dissídio coletivo. Eu tenho procurado estimular a negociação de parte a parte, porque como desembargadora e presidente, a mim, só cabia fazer a audiência, e se não tiver acordo, sortear o processo e ir para o julgamento. Mas eu tenho investido, estimulado, adiado a audiência para que as partes conversem. Isso tem sido altamente positivo porque tem havido um diálogo muito interessante, muito produtivo entre o empregado e o empregador, e a Justiça do Trabalho tem que ser o canal de diálogo. Ela não tem que ser Justiça impondo, através da sentença, através do bloqueio de bens, através da penhora... ela tem que ser o canal, fazer a interlocução. Eu tenho estimulado esse trabalho de diálogo com todos os segmentos da sociedade e eu quero ressaltar também a excelente convivência com a Ordem dos Advogados do Brasil [OAB], através do presidente da seccional baiana Luiz Viana Queiroz, e com a Associação Baiana de Advogados Trabalhistas [Abat], que é o Dr° Eliel Teixeira. Não sei se alguma vez a administração teve um diálogo tão bom com todos os segmentos, ou seja, com a Ordem dos Advogados, juízes de primeiro grau, com os sindicatos e com os servidores.

BN: A Justiça do Trabalho é sempre vista como uma Justiça ‘justa’. É até estranho e redundante. E também, muitas vezes, as pessoas falam que ela é uma Justiça partenalista, que sempre dá maior ganho de causa aos trabalhadores. Por que há essa sensação na sociedade e por que a Justiça do Trabalho se difere tanto da Justiça comum? Ela parece ser muito mais eficiente, muito mais célere.

VC: Ela é. Primeiro: por ela ser uma Justiça nova. Ela começou há praticamente 70 anos. A outra Justiça vem desde a época em que Dom João VI chegou aqui, tem uma estrutura muito maior, muito mais pesada e a nossa é de estrutura menor, mais moderna. Segundo: ela tem uma legislação que permite o processo do trabalho seja um processo célere, porque trabalha com alimento. O salário, muitas vezes, é o único bem que o trabalhador tem para manter sua família. E se a Justiça do Trabalho não for uma Justiça célere e eficiente ela não cumpre o seu papel. O papel dela é entregar àquilo que ela se propõe. A nossa missão é entregar ao trabalhador aquilo do que ele sobrevive, que é o salário e assim ele mantem a sua família. Se isso falha muitas vezes, o trabalhador fica até sem comer, porque o único bem que ele tem é a sua força de trabalho e a gente tem que, de certa forma, concretizar aquilo que nós nos dispusemos a dar, que é a efetivação dos direitos. Porque ela é uma justiça vista como uma justiça protecionista? Isso é uma ideia, eu entendo, equivocada. O que ocorre: o direito material do trabalho ele é, efetivamente, na sua concepção protecionista, porque ele tem que proteger o empregado. As partes que negociam não são iguais. Na Justiça comum você tem um locador e um locatário, uma pessoa que vende e outra que compra, ambas são iguais. Se um comprar e o outro não vender não acontece nada, mas aqui você tem uma empresa enorme e um trabalhador humilde, às vezes ignorante, às vezes analfabeto. Então, o direito é protecionista no sentido de que ele iguala as partes processualmente. Mas no processo as partes são iguais, elas têm o mesmo tratamento. Agora, no direito material, é um direito que tem que elevar o trabalhador para que ele possa negociar, dialogar com o empregador. Senão, ele ficará sempre em um estado de submissão. Nós temos instrumentos, que através de presunções, mas isso não é lei, no momento que um juiz está em um processo, as partes são iguais, idênticas e o tratamento é igual ao que acontece processualmente com o reclamante, acontece processualmente com o reclamado, são todos iguais. Paternalista não é. Agora, existe outro fator aí embutido, que o empregador, muitas vezes, ele é desestruturado. Então, ele não faz um contato de trabalho, ele não assina a carteira do empregado, ele não recolhe o INSS e ele acha que, porque o empregador aceitou trabalhar sem a carteira assinada ou recebendo salário abaixo do mínimo que ele pode contratar esse empregado, só que quando o trabalhador vem à Justiça e diz que ganha menos que o mínimo e que não teve a carteira assinada, o juiz determina obrigatoriamente que ele assine. Então, há um certo desconhecimento do empregador e desorganização também. Por isso, muitas vezes ele é condenado aqui.

BN: Algumas vezes essas empresas demostram uma indisposição em cumprir os direitos trabalhistas, negligenciar mesmo?

VC: É, às vezes por desconhecer o Direito, embora a ninguém é dado o direito de desconhecer a lei e, algumas vezes, é até por questão de sobrevivência também. Enquanto ela coloca o empregado para trabalhar hora extra e não paga as horas extras ou não entrega essas horas extras, ela fica com aquele valor que ela deveria pagar, então ela acaba fazendo um ‘caixa’ indevido à custa de uma obrigação trabalhista que ela não cumpriu, que ela não adimpliu.

BN: A senhora falou muito sobre a negociação através dos acordos, dissídios coletivos, o que isso traz de benefícios para a sociedade? Isso diminui o número de ações na Justiça?

VC: Diminui e isto dá legitimidade ao trabalhador, porque os sindicatos de empregados e de empregadores dialogam no mesmo nível, todo mundo é igual em uma audiência de dissídio. O empregado fala, o empregador fala, porque cada um representa uma categoria, e no momento em que você resolve um dissídio daquele, você resolve muitas vezes questões de 100, 200, 1000 trabalhadores. Você evita reclamações individuais, porque resolve a nível coletivo, e no momento em que os sindicatos patronais assinam acordos aqui ou há um dissídio coletivo que determina que ele conceda determinado benefício, evita que milhões de empregados venham à Justiça com reclamações individuais pleitear aquilo. Outra coisa é que isso tem um caráter social muito grande como, por exemplo, a greve dos motoristas. Nesse ano, a Bahia não teve greve. Uma coisa que poderia parar a cidade, um evento que no Brasil inteiro gerou protestos. Através de uma atuação preventiva nossa, colocamos em pauta assim que o dissídio entrou aqui. Conversamos várias vezes, tivemos várias rodadas de negociação e conseguimos fazer um acordo para atender aos interesses da classe trabalhadora e atender aos interesses da classe patronal. Com isso, evitamos paralisação na cidade, prejuízo de toda sorte, perda de ônibus, de violência e tudo. Nós temos conseguido, além do reajuste, que é com base no INPC, o aumento real. Quando o INPC gira em torno de 6,9%, 6,5%, aqui estamos fazendo acordo na base de 9% e 9,5%.

BN: Um dos desafios do TRT, logo que a senhora assumiu, foi baixar a taxa de congestionamento. Como é que a Corte trabalhou para reduzir estes processos, melhorar o seu desempenho e a Corte trabalhista pode ensinar para Justiça comum?

VC: A Corte trabalhou para conseguir diminuir o congestionamento de diversas formas: administrando o seu banco de dados que estavam defasado, muitos processos que estavam no banco como ativos eram processos já arquivados. Trabalhamos nessa faixa de administrar e atualizar esse banco de dados. Nós fizemos uma verificação física de processos para que a tramitação que consta no sistema fosse exatamente correspondente à tramitação do processo e independentemente disso fizemos campanhas regionais de conciliação. O nosso leilão unificado, nossa Central de Execução, contribuiu muito para dar celeridade nas execuções, nos acordos globais que fizemos. Tudo isso são mecanismos que nós utilizamos para diminuir essa taxa de congestionamento. Agora, não sei uma lição que poderíamos dar à Justiça comum. Não me sinto qualificada, autorizada a ensinar, pois eles julgam outro tipo de ação que envolve a vida, questões de família, questões de inventários, homicídios, violência. É uma questão diferente. A nossa Justiça é uma Justiça técnica. Agora, uma lição que eu daria, talvez de que essa instituição é muito querida, muito amada pelos seus servidores, pelos seus magistrados. Talvez um pouco de amor ao trabalho, à instituição, como é o meu caso, por exemplo. Eu faço porque gosto. Quando chego aqui pela manhã, nem parece que eu chego ao trabalho. Eu acho que é uma outra casa que eu tenho, passo o dia todo aqui feliz, trabalhando. Eu acho que eu recomendaria aos juízes mais motivação. Aos nossos também, porque sem motivação não se consegue nada. E eu tenho sempre destacado nas minhas reuniões com os nossos magistrados que eles dissociem questões salariais, questões profissionais do trabalho, porque quando a gente faz o trabalho que gostamos, fazemos até de graça, mas quando fazemos um trabalho que não gostamos, você pode ter a melhor remuneração do mundo e não se sente realizado. Talvez falte à Justiça do trabalho e à Justiça comum, em algumas situações, uma maior motivação e vocação. Porque para ser juiz você tem que ser vocacionado, pois é uma carreira que exige muito sacrifício da pessoa, não só na sua estruturação técnica. Você tem que sempre se manter atualizado, estudando. Como você tem o contato com o publico grande, no nosso caso, você tem que ter um preparo psicológico muito bom para que você consiga dialogar com advogados e conseguir resolver aquele problema que chega. Então, você precisa também ter serenidade e tranquilidade e gostar do que faz, do trabalho. Se a pessoa só veio aqui por causa da remuneração, por causa do poder, que é pequeno, mas encerra um certo poder, então ele não se sente realizado.

BN: Puxando por isso, queria que a senhora comentasse um pouco o resultado do concurso recente para juiz, que pegou todo mundo de surpresa. Nessa fase, até então, no resultado provisório, não teve nenhum aprovado. Como é que a senhora avalia isso?

VC: Nessa última comissão eu avalio o seguinte: o nosso concurso foi muito bem, andou muito rápido, nós conseguimos atingir um nível de aprovação até a segunda prova de até 61 candidatos. Entramos na terceira prova, que é a prova específica de conhecimento jurídico, em que o juiz tem que fazer uma sentença, e essa sentença se desenvolve através de várias questões que ficam embutidas dentro daquela questão que ele tem que resolver. A comissão, que é composta por um desembargador, uma juíza e um advogado representando a OAB, entendeu que os candidatos que se habilitaram, que haviam chegado até aquela fase não haviam atendido aquilo que a comissão queria e avaliava como o nível apto a ele ser um juiz do trabalho, e por isso ninguém foi aprovado. Nós estamos em fase de exames de recursos, temos muitos recursos que as pessoas apresentaram e a própria comissão vai examinar os recursos. Se ela entender que alguma questão foi mal avaliada, através daquilo que o candidato demostrou no recurso, aquela questão pode ter uma pontuação diferente, com certeza. Eu confio nos integrantes da comissão que eles irão aproximar as notas, eu até torço por isso, e se a comissão entender que efetivamente o que o candidato respondeu não era o que e a comissão desejava, de acordo com o espelho de prova que inclusive foi publicado, aí os recursos não terão provimento, então o resultado será mantido. Eu lamento como presidente em fim de gestão, porque eu gostaria de dar posse, mas eu respeito e acato o veredito que a comissão entendeu ser verdadeiro.

BN: Mas esse, digamos assim, baixo resultado dos avaliados não poderia ser um reflexo dessa proliferação de faculdades de Direito que só visam o exame da OAB. Isso não seria um índicio?

VC: Pode ser o resultado. Todos os concurso em todas as áreas têm se ressentido, inclusive a própria OAB, em que os candidatos nunca passam de primeira. O candidato faz duas, três provas e isso demonstra que as faculdades realmente estão aquém do desejado. Eu sou professora, eu ensinei, inclusive na área de Direito. Eu avalio o seguinte: talvez a grade curricular não esteja adequada ao que, na outra ponta, as instituições precisam. O aluno, isso eu avalio como professora, tem aulas e matérias em determinado ramo do conhecimento que ele não vai utilizar na vida profissional. Ele tem que buscar especialização sozinho ou em cursos de pós graduação. Ele sai, na realidade, da faculdade não preparado nem para o exercício da advocacia, nem para o exercício magistratura ou das demais carreiras jurídicas. Quando é um aluno que faz um bom curso, ele tem onde buscar complementação do currículo. Esse tipo de candidato é aprovado em dois, três concursos muito bem. Quando é um candidato que, às vezes não tem oportunidade, até porque trabalha ou não teve os meios, ele realmente não atende às exigências de uma qualificação mais depurada. Mas eu entendo assim, porque eu não vou falar de matérias aqui, mas eu entendo que ele estuda muitas matérias no seu curriculum básico que ele depois não vai utilizar na sua carreira profissional, quando ele poderia ter um direcionamento e as faculdades ainda não atentaram para isso. Eu aponto esta diversidade entre ensino/exigência profissional. Acho que na área de Jornalismo é a mesma coisa. Até na Medicina você sai e tem que buscar especialização, porque a faculdade não lhe dá as ferramentas. As competências que ele precisa.

BN: A senhora falou muito sobre a questão do PJE que o tribunal baiano foi pioneiro. Como é que foi esta migração, recentemente tivemos o fim dos processos físicos, como é que está sendo esta migração?

VC: Esta migração foi feita de forma altamente responsável, cuidadosa, acompanhada. O nosso regional está treinando 100% dos nossos servidores, todos recebem qualificação em PJE. Aquele servidor mais antigo, aquele que não sabe trabalhar com computador, deverá ser redirecionado. Agora que o PJE começou mesmo a operar, ele será redirecionado para outra área, porque, em princípio, nós teremos um período de convivência do processo físico com o eletrônico. O servidor antigo, aquele que não trabalha com computador, ele vai continuar trabalhando com processo físico. Nós temos trabalho para ele. O servidor mais novo, mais qualificado, também vai ter a chance de trabalhar no PJE. Quando nós implantamos o PJE fizemos treinamento de todos os servidores, de setores e também de advogados. Foi uma parceria que funcionou muito bem entre TRT e OAB, tanto os advogados foram treinados para que possam comparecer à audiência, operar e saber atender ao seu cliente, como a Justiça treinou os seus servidores, seus magistrados, principalmente os juízes, para que eles se sentem à mesa de audiência e consigam operacionalizar o sistema.

BN: Qual é a previsão para que todas as comarcas do estado já funcionem com o PJE?

VC: Esta previsão não é nossa, porque o PJE tem um gestor que fica em Brasília. É ele quem decide quantas varas serão implantas e quando deverá ser esse calendário. No momento, ultrapassamos a meta que tínhamos do Conselho Nacional de Justiça [CNJ] com relação as varas eletrônicas, estamos em uma situação bem confortável porque o TRT da 5º Região atingiu e superou a meta que deveria. A previsão é que em um certo momento dê uma parada, inclusive, porque vem gestão nova e essa nova gestão vai entrar em contato com o gestor nacional para ver quando essas outras unidades deverão ser implantadas.

BN: A senhora falou sobre a aproximação do TRT com a sociedade. Como é que ele tem atuado também para combater o trabalho escravo e trabalho infantil? O tribunal deixa de ser um agente só julgador ou ele passa também a ser um agente participativo?

VC: No trabalho escravo, nós somos agentes julgadores, mas em outros estados nós temos vários juízes do Trabalho participando dos grupos que comparecem para flagrar o trabalho escravo. Na Bahia, nós ainda não temos esse grupo, inclusive porque não temos muitos casos de trabalhos escravos. Nós temos alguns episódios que são detectados e são resolvidos pelos juízes das varas. Normalmente esse trabalho de fiscalização e identificação é do Ministério Público ou do Ministério do Trabalho e Emprego. No momento em que [o trabalho escravo] é identificado, é feita uma autuação, que é encaminhada à Justiça do Trabalho e ela, com celeridade, resolve no sentido de condenar a empresa a pagar os direitos trabalhistas. Mas, na fase de prevenção, nós ainda não temos uma atuação, até porque não temos esse cenário aqui na Bahia. Com relação ao trabalho infantil, a nossa atuação se limita à parceria e viabilização de recursos para que o programa possa operar. Mesmo porque não temos muitos casos na justiça do Trabalho, mas estamos lutando pela competência para que juiz do Trabalho seja quem vai autorizar a criança, naquela fase em que a Constituição permite que ela trabalhe, para que ela possa trabalhar, inclusive porque ele tem conhecimento técnico da matéria.

BN: Uma das grandes expectativas de quem atua na da Justiça do Trabalho é ver a obra do CAB concluída. Em que pé está essa obra, qual a previsão de conclusão, como é que vai ser feita essa obra, que tem vários módulos?

VC: A obra é composta de oito módulos, um módulo já está pronto. Quando eu assumi, este módulo estava em início de construção. Durante a minha gestão, o tempo inteiro nós nos empenhamos em concluí-lo. Ele está com 99% da obra pronta, embora seja uma obra de arquitetura com um projeto específico, com materiais específicos, não é uma obra normal. É uma obra de uma engenharia do século 21, engenharia avançada. A nossa expectativa é de que saia a obra, que a gente consiga concluir o trabalho, que o tribunal funcione todo no mesmo lugar. Agora, tudo isso depende de uma série de fatores, os recursos nós já temos, os recursos já estão disponibilizados, porque é uma obra que será construída pela Caixa Econômica Federal, mediante contrapartida que nós daremos. Mas o que tem criado complicadores são fatores realmente de projeto e de engenharia. Nós já começamos a obra, o primeiro módulo já está pronto e agora nós iremos dar continuidade sucessivamente construindo os demais.

BN: A transferência só acontece quando estes módulos estiverem prontos?

VC: Só quando estiverem prontos, a menos que a nova gestão entenda que há condições de alguma atividade funcionar neste único módulo, mas no momento, como nós temos quatro unidades aqui, que são as duas de Nazaré, a do Comércio e o arquivo no Barbalho. Operacionalmente, é muito mais próximo nós ficarmos aqui do que deslocar uma única unidade, mas também esse módulo não está concluído, é chamado o módulo administrativo 5. Ele está em fase de conclusão, mas eu não vou conseguir inaugurar.

BN: A gente pode esperar que esta parte esteja concluída no início do ano que vem?

VC: É, a parte de engenharia está quase pronta. Agora existem a parte elétrica e outras áreas que não conseguimos avançar, como acabamento.

BN: Na mesma época que a senhora assumiu a presidência do TRT, o Tribunal de Contas da União (TCU) apontou que havia sobrepreços na obra e, na época, em conversa com o diretor aqui da casa, ele afirmou que estava tudo nos conformes. Como é que ficou esta situação no TRT perante o TCU?

VC: Essa auditoria ainda está sendo concluída no Tribunal de Contas da União e nós do Tribunal do Trabalho temos atendido a todas as demandas que o Tribunal de Contas da União tem nos feito. Com relação à questão dos sobrepreços, foi um equívoco de precificação de alguns itens, mas que foram devidamente adequados. Enfim, nós seguimos a orientação do tribunal. Todos os itens que ele solicitou, o tribunal atendeu e hoje essa editoria está em fase de conclusão.

BN: Como é que vai ser feito a transição da sua gestão para o novo presidente?

VC: De forma completamente normal, hoje inclusive foi oficialmente entregue a nova mesa diretora representada pelo nosso futuro presidente e nossa futura vice-corregedora, que é atual vice-presidente, de forma pacífica e tranquila com muito amor e com muita amizade e com esperança de que tudo continue como está. Entregamos o relatório de gestão.

BN: Na época em que o ministro Ives Gandra esteve aqui, para as correições, lembro que ele havia falado que uma das coisa que mais chamava atenção dele aqui era que não havia uma disputa realmente de poderes pela direção da casa, como a gente vê geralmente em outros tribunais. Como é que então os desembargadores do TRT se articulam na disputa pela presidência, já que é pelo critério de antiguidade? Geralmente, essas disputas têm um clima muito tenso, muito acentuado.

VC: Aqui também, em várias ocasiões, nós tivemos eleições que foram tensas. A minha eleição foi muito tensa. Mas quando o ministro esteve aqui, o tribunal firmou o compromisso perante o corregedor-geral de que respeitará o critério de antiguidade, esse é um critério que eu entendo como pacificador, porque sempre o juiz mais antigo, o desembargador mais antigo, é aquele que deverá assumir a presidência da Casa. Então, ele tem a oportunidade de se programar, de começar a conhecer a administração, de estar, inclusive, na Mesa Diretora, porque o desembargador que está em mesa julgando não tem condições de saber o que acontece da administração. Há uma diferença muito grande entre você pertencer a uma turma e julgar processo apenas como juiz, como técnico e de uma hora para outra você ser investido e imbuído de funções administrativas. O tribunal se comprometeu perante o ministro a observar rigorosamente a antiguidade. Agora, nós observamos, houve respeito o desembargador mais antigo, a que era mais antiga a desembargadora Graça Laranjeira declinou, ela não quis, se recusou a concorrer neste pleito, mas preservou a antiguidade dela. É um direito dela, que a Constituição assegura, para que numa eventual eleição ela possa voltar a concorrer, daqui a dois anos, mesmo porque ela continua sendo a desembargadora mais antiga que não ocupou a mesa diretora. Mas esse ano a transação foi muito serena, muito organizada.

BN: Quais são os desafios que o Tribunal Regional do Trabalho ainda tem para cumprir? Quais são ainda os obstáculos que a Corte tem ainda pela frente?

VC: Os nosso desafios são: primeiro, nossa grande distância. O estado da Bahia é enorme, uma imensidão geográfica, a Bahia é um país. Não tem servidor e nem juiz suficiente que dê conta da carga de trabalho. Nós temos uma carga superior à nossa capacidade de resolução, porque o nosso trabalho é um trabalho intelectual, que exige tempo, e nós não temos esse tempo para fazer um trabalho cuidadoso. Segundo: falta de recursos físicos. Nós ainda sentimos de falta de material, falta de servidores, porque nós, inclusive, encaminhamos um projeto - nosso tribunal para funcionar adequadamente, segundo nossa avaliação, precisaria, em média de 650 servidores - para Brasília e o Conselho Superior da Justiça do Trabalho entendeu que com 600 servidores o nosso tribunal funcionaria bem. Só 50 foram cortados dos que foram solicitados, só que o atual presidente entendeu que não era o momento de chegarmos com esses pleitos até o Conselho Nacional de Justiça. Esses processos estão parados aguardando continuidade. As dificuldades que eu ainda aponto: falta de magistrados - porque o concurso não preencheu -, falta de servidores - porque o projeto ficou parado em Brasília -, falta de varas em áreas do território baiano que não são assistidas, que não possuem vara do Trabalho. Nem em todos os lugares a Justiça do Trabalho está presente, porque embora a jurisdição compreenda todo o estado, nós temos locais que são muito distantes, então o empregado não se desloca da sua cidade para ir até aquela vara que atende a jurisdição. Hoje, inclusive, a vara de Alagoinhas é composta por 25 municípios. Imagine o tamanho de jurisdição dessa vara. Precisamos de mais computadores, mais link, de mais servidores e de mais gente para trabalhar. As dificuldades são muitas, e nós precisamos investir muito na qualificação do nosso servidor e do nosso juiz. E nós temos investido, fornecendo cursos de capacitação, mas ainda não chega a atender ao nível ideal para o que gostaríamos.

BN: Se fosse possível ficar mais dois anos à frente do cargo, a senhora ficaria?

VC: Acho que não. Porque é muito trabalho. Eu não vejo nem a luz do sol, vejo meu gabinete. Minha família se ressente muito pela minha falta, cobram muito de mim e eu também sinto que eu deixei tudo, deixei minha vida pessoal para me dedicar ao tribunal porque não havia como conciliar. Acho que cada um tem o seu tempo de dar a sua colaboração, eu dei a minha com muita felicidade. Agora, eu vou seguir minha vida em frente porque eu tenho muita vida para viver, muita estrada para caminhar.