Usamos cookies para personalizar e melhorar sua experiência em nosso site e aprimorar a oferta de anúncios para você. Visite nossa Política de Cookies para saber mais. Ao clicar em "aceitar" você concorda com o uso que fazemos dos cookies

Marca Bahia Notícias Justiça

Coluna

Tributo em Pauta: Breves comentários sobre o 'IPTU dos mortos'

Por Anderson Pereira

Tributo em Pauta: Breves comentários sobre o 'IPTU dos mortos'
Foto: Arquivo Pessoal

Recentemente, voltaram a circular páginas da internet que sugerem a instituição de um curioso imposto por um município do interior de São Paulo, rapidamente denominado “IPTU dos mortos", já que o objeto da cobrança seria o espaço em cemitério público da cidade. A polêmica não é realmente nova, pois é possível encontrar referências à mesma exigência ao menos desde março, numa pesquisa superficial. 

 

O Projeto de Lei Complementar nº 03/2022 da cidade de Araraquara foi encaminhado à Câmara de Vereadores daquele município em 10/03/2022, e desde então tramitava, somente vindo a ser convertido na Lei Complementar nº 971/2022 agora em junho.

 

Todavia, o exame da sua exposição de motivos apresenta uma realidade bem diferente da ideia que foi amplamente propagada. Longe de estabelecer um novo imposto, a proposta possuía a pretensão de regular a instalação, a organização, o funcionamento dos cemitérios e dos crematórios no Município, adequando a legislação municipal à realidade existente.

 

A exigência, equivocadamente alardeada como um novo e pitoresco tributo, reflete a percepção de que um determinado cemitério público daquela cidade não possuía qualquer cobrança pela manutenção de suas áreas comuns, o que, além de gerar uma disparidade em relação a outro do mesmo Município, pelo menos, também contribuía para uma situação de abandono de sepulturas, além de irregularidades em suas concessões.

 

O que chama a atenção, mais do que a impropriedade de se considerar viável a “perseguição tributária” pós-morte, é o nítido desconhecimento sobre importância normalmente exigida por cemitérios em todo o país. Ora, uma rápida pesquisa na internet é suficiente para revelar que a cobrança de contraprestação anual pela manutenção de jazigos, sepulturas ou cemitérios é uma realidade de diversas cidades e capitais que mantém cemitérios públicos, já que, em relação aos privados, o mais difícil é considerar a inexistência de pagamentos periódicos.

 

Em 2021, inclusive, foi sancionada a Lei nº 9.604/2021 do Município de Salvador, cujo inciso IV, do art. 7º autoriza o Poder Executivo Municipal a conceder a gestão, operação, manutenção, exploração, revitalização e expansão de cemitérios e crematórios, cuja administração ainda é de competência municipal, à iniciativa privada, por exemplo.

 

Sem adentrar na discussão em relação à natureza da exigência (fica como dica de tema de monografia, para os fortes: é tributo ou preço público?), a realidade é que jazigos, ossários e sepulturas em cemitérios públicos ou privados normalmente são disponibilizados em regime de concessão, em razão da qual o responsável pela administração precisa de recursos para cobrir os custos derivados da sua manutenção.

 

Afinal, a experiência demonstra que “almoço grátis” só é garantido para quem chega montado em unicórnio, acompanhado de duendes e fadas.

 

*Anderson Pereira é advogado tributarista licenciado, professor de Direito Tributário e conselheiro do Conselho de Fazenda do Estado da Bahia e do Conselho Municipal de Tributos de Salvador