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Tributo em Pauta: Multa por pedido indeferido? Vida de contribuinte não é fácil!

Por Anna Tereza Landgraf

Tributo em Pauta: Multa por pedido indeferido? Vida de contribuinte não é fácil!
Foto: Arquivo Pessoal

Você já ouviu falar no direito de petição? É uma garantia constitucional dada a qualquer cidadão de apresentar requerimento ou representar aos Poderes Públicos em defesa de direitos e contra abusos de autoridade.

 

É um direito fundamental que se faz presente em nosso ordenamento jurídico desde a Constituição de 1824. Ela estabelecia, no seu art. 179, inciso XXX, que “todo cidadão poderá apresentar, por escrito, ao Poder Legislativo e ao Executivo, reclamações, queixas, ou petições, e até expor qualquer infração da Constituição, requerendo perante a competente autoridade a efetiva responsabilidade aos infratores”. 

 

As demais cartas constitucionais também consagraram o direito de petição e hoje vigora a redação trazida pelo art. 5º, XXXIV, "a", da Constituição Federal de 1988: “são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder".

 

Pois bem. De acordo com o art. 74 da Lei n. 9.430/1996, o sujeito passivo (contribuinte) que apurar crédito, inclusive os reconhecidos judicialmente e com sentenças já irrecorríveis (com trânsito em julgado), relativo a tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita Federal, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele Órgão.

 

Direito de petição claro e justíssimo, concorda?

 

Agora veja a loucura! Eu, contribuinte, acreditando possuir um crédito perante o Fisco Federal, valho-me de procedimento próprio e peço (direito de petição) à Receita Federal do Brasil para compensar este crédito com determinados débitos meus. Passado algum tempo, sou surpreendida pela negativa deste pedido e, não bastasse ter que pagar o meu débito não compensado acrescido de juros e multa de mora, ainda me é aplicada uma tal multa isolada de 50% sobre o valor do débito que eu pretendia compensar. Tá bom pra você?

 

Creia! É exatamente o que prevê o § 17 do art. 74 da Lei 9.430/1996, após as alterações trazidas pela Lei n. 12.249/2010 e, posteriormente, pela Lei n. 13.097/2015 (conversão da Medida Provisória n. 656/2014).

 

Obviamente, não demorou para este absurdo chegar ao Supremo Tribunal Federal. Muito em breve, no dia 1º de junho de 2022, a Corte Suprema julgará o Recurso Extraordinário (RE) n. 796939 e a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n. 4.905, processos nos quais se discute a (in)constitucionalidade desta multa desaforada, que vem sendo aplicada aos casos de não homologação de pedidos de compensação tributária apresentados pelos contribuintes.

 

A ADI n. 4.905 foi proposta pela Confederação Nacional da Indústria em 2013, buscando a declaração da inconstitucionalidade dos dispositivos que instituíram a referida multa, valendo-se de argumentos bastante contundentes que sinalizam violações ao direito de petição à Administração Pública; ao direito ao contraditório e à ampla defesa; à vedação de tributos com efeito de confisco, estendida às multas tributárias exorbitantes; bem como aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. 

 

Já o RE 796939 foi interposto pela União, visando a reforma de decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que afastou a aplicação da multa de 50% em processo ajuizado por uma transportadora há 10 anos. Além dos argumentos constantes na ADI 4.905, acima elencados, a empresa sustenta, de forma mais efusiva, que a multa configura uma hipótese de desvio de poder, já que, com o pretexto de punir um ilícito, visa-se, na verdade, intimidar os contribuintes a não efetuarem os pedidos de restituição e as declarações de compensação. Tens dúvida?

 

As alterações promovidas na legislação tiveram o nítido propósito de desencorajar o contribuinte a fazer valer o seu direito de recuperar valores pagos indevidamente. Afinal, qual seria a conduta ilícita a ser penalizada neste caso? Respondo: hoje, sem qualquer comprovação de má-fé por parte do contribuinte ou mesmo prejuízo ao Erário, penaliza-se o simples exercício do direito de petição, em flagrante ofensa a diversos princípios constitucionais que tutelam direitos fundamentais do cidadão-contribuinte.

 

Para alento dos contribuintes, em novembro de 2019, o Relator, Ministro Edson Fachin, negou provimento ao RE 796939 e fixou a seguinte tese (tema 736 da repercussão geral): "É inconstitucional a multa isolada prevista em lei para incidir diante da mera negativa de homologação de compensação tributária por não consistir em ato ilícito com aptidão para propiciar automática penalidade pecuniária". O julgamento, contudo, foi interrompido após pedido de vista feito pelo Ministro Gilmar Mendes e posterior pedido de destaque do Ministro Luiz Fux, sendo o processo direcionado para julgamento em sessão presencial, prevista para 1º de junho próximo.

 

Muitas empresas que foram prejudicadas pela aplicação da multa isolada de 50% aguardam ansiosamente o resultado deste julgamento. E, como há risco de modulação dos efeitos da decisão – ou seja, que o STF decida alcançar/beneficiar apenas aqueles que ajuizaram ações buscando o afastamento da multa – os contribuintes devem avaliar a pertinência de ingressarem com medida judicial antes da retomada do julgamento, seja para afastar a cobrança, seja para recuperar o que, porventura, tenha sido pago indevidamente nos últimos cinco anos.

 

*Anna Tereza Landgraf é advogada e professora, especialista em Direito Tributário, MBA em Planejamento Tributário e em Gestão e Administração de Negócios, membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/BA e da Associação Brasileira de Direito Tributário – ABRADT.