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O embate entre o Judiciário e Legislativo na política de combate às drogas

Por Ticiana Miranda Galvão

O embate entre o Judiciário e Legislativo na política de combate às drogas
Foto: Divulgação

Em 2024, as questões de política criminal ganharam um holofote ainda maior nos palcos de debate dos noticiários e no Brasil como um todo. Setores da sociedade estão cada vez mais se engajado quando o assunto é (des)criminalização de determinadas condutas, imposição de penas mais severas ou julgamentos criminais de grande repercussão, sempre levando em consideração determinado viés ideológico ou um certo espectro político. Até mesmo o Judiciário e o Legislativo têm sentido o reflexo dessa tônica da sociedade e cada vez mais vêm travando alguns embates.


A bola da vez é, sem dúvidas, a criminalização ou não do consumo de drogas. No último mês de junho, o Supremo Tribunal Federal decidiu, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 635.659/SP, em regime de repercussão geral, pela descriminalização da posse de maconha para uso pessoal, desde que atendida uma série de requisitos. A título de exemplo, temos: a posse de quantidade inferior a 40 gramas ou até seis plantas-fêmeas de cannabis sativa e a ausência de elementos que indiquem a traficância – como a variedade e forma de acondicionamento das substâncias ilícitas, a apreensão de balanças ou outros apetrechos como cadernos ou aparelhos celulares contendo registros de comercialização de entorpecentes.


Na contramão, o Senado Federal tenta encabeçar a aprovação de Proposta de Emenda à Constituição nº 45/2023, que tem como finalidade alterar a Constituição Federal e inserir um mandado constitucional de criminalização das drogas de forma geral e irrestrita. Isto é, caso a PEC nº 45/2023 venha a ser aprovada, a posse ou porte de toda substância entorpecente passará a ser considerada crime em qualquer situação ou circunstância, independentemente da espécie, variedade ou quantidade, não podendo a lei ordinária ou infraconstitucional contrariar essa determinação da Lei Maior.


Apesar de trazer uma distinção entre a figura do usuário e do traficante, aplicando “penas alternativas” ou “tratamento contra dependência” ao primeiro, o fato é que a Proposta de Emenda à Constituição não traz critérios claros e objetivos para definir quem deverá ser enquadrado como um mero usuário ou um verdadeiro traficante. 


Em última análise, essa definição deverá perpassar pelos órgãos de persecução criminal, seja a autoridade policial ou o Ministério Público, e a última palavra será sempre do Judiciário, que poderá interpretar a norma de acordo com diversos parâmetros distintos e ainda realizar um controle de constitucionalidade da Emenda à Constituição após a sua entrada em vigor para dizer que essa criminalização absoluta de todo usuário de drogas viola a Constituição Federal.


Na mesma linha dessa cruzada entre Legislativo e Judiciário, alguns Municípios e Estados apresentaram propostas legislativas para aplicar sanções administrativas a quem for flagrado usando drogas ilícitas em ambientes públicos e, com isso, evitar o embate direto com a decisão do STF. 


No dia 16 de julho, última terça-feira, por exemplo, foi aprovado e sancionado o Projeto de Lei nº 475/2021 pelo Estado de Santa Catarina, que impõe uma multa equivalente a um salário mínimo ao indivíduo que for pego usando entorpecentes em locais públicos. A nova lei foi aprovada e sancionada após menos de um mês da conclusão do julgamento pelo plenário do STF sobre a posse de maconha para uso pessoal, o que apenas reforça a disputa entre os poderes no que diz respeito a essa temática.


Diante desse entrave entre o Judiciário e o Legislativo, certo é que o Judiciário sempre poderá realizar o controle de constitucionalidade das leis e emendas à Constituição que vierem a ser aprovadas. No entanto, o Legislativo nunca deixará de ter a prerrogativa de legislar novamente sobre a mesma matéria, inclusive as que forem objeto de decisão da Corte Suprema. E essa situação de impasse somente contribui para causar uma instabilidade entre os Poderes, a descredibilidade das instituições e uma enorme insegurança jurídica aos jurisdicionados, que, no fim das contas, são aqueles que estão sujeitos à ampliação e restrição dos seus direitos, além de sofrer na pele as consequências das sanções e penas que vierem a ser impostas.

 

*Ticiana Miranda Galvão é advogada especialista em Direito Penal Econômico e sócia do Galvão e Lino Advogados Associados

 

*Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias