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A (ir) responsabilidade do chefe do Poder Executivo Federal após a promulgação da PEC dos Auxílios

Por Thiago Santos Bianchi

A (ir) responsabilidade do chefe do Poder Executivo Federal após a promulgação da PEC dos Auxílios
Foto: Divulgação

Em meados de julho, o Congresso Nacional promulgou a Proposta de Emenda à Constituição 001/2022, que contempla a majoração de diversos auxílios governamentais à população de baixa renda, como também cria auxílios para caminhoneiros autônomos e taxistas. Estima-se que o impacto desta PEC seja na ordem que supera a casa dos 41 bilhões de reais.

 

O problema não reside tão somente no impacto financeiro da medida. Questiona-se a instituição, por meio desta PEC, de um estado de emergência para legitimar e dar ares de constitucionalidade (e legalidade) para a medida, pouco tempo antes das eleições de 2022.

 

Aqui, devemos fazer uns parênteses para destacar que a Lei das Eleições (Lei 9.504-97) estabelece a vedação para a concessão de benefícios como este, tratando este tipo de conduta como aquela vedada para agentes públicos no ano eleitoral. Contudo, a norma estabelece a exceção para esta regra justamente em períodos que se tenha configurado e declarado estado de emergência ou estado de calamidade pública (art. 73, §10).

 

Contudo, devemos nos atentar para uma situação que até o momento se passa despercebida, que é exatamente a iniciativa da proposta e o controle de constitucionalidade da mesma.

 

Como se pode perceber, a PEC 001/2022 teve como primeiro signatário o senador Carlos Fávaro (PSD-MT), mas a mesma fora subscrita por outros tantos senadores da República Federativa do Brasil. O dado concreto é: tal proposta teve origem por iniciativa parlamentar, nos termos do artigo 60, inciso I, da Constituição Federal de 1988, muito embora o inciso II do artigo 60 da Constituição Federal dote o presidente da República de competência para propor Emendas Constitucionais.

 

Após tramitação, votação e aprovação com quórum qualificado nas duas Casas Legislativas que compõem o Congresso Nacional, a PEC 001-2022 fora promulgada, passando a viger no ordenamento jurídico constitucional vigente.

 

É necessário ressaltar que, em ambas as Casas Legislativas, cada uma delas, exerceu o chamado controle constitucional preventivo e político, quando a proposta tramitou nas respectivas Comissões de Constituição e Justiça do Parlamento, tendo sido aprovada, ou seja, segundo os membros destas Comissões, a proposta de Emenda à Constituição Federal encontrava-se eivada de constitucionalidade. Posteriormente, exercendo mais uma vez o controle preventivo de constitucionalidade, os plenários das Casas ratificaram a aprovação da medida.

 

Cumpre destacar que diversos setores da sociedade, principalmente a classe jurista, ergueram-se para destacar que a proposta criaria um Estado de Emergência supostamente inexistente, o que afastaria as hipóteses de exceção contida na norma eleitoral, podendo fazer com que o atual presidente da República estivesse por infringir a norma eleitoral infraconstitucional.

 

Porém, é necessário se destacar que o presidente da República, muito embora possa vir a executar a norma e instituir os benefícios nela previstos, bem como a majoração de outros deles, não participa do processo de controle de constitucionalidade da medida promulgada. É o que se infere da leitura do §3 do artigo 60 da Constituição Federal. Ou seja, diferente do processo legislativo ordinário, no qual ainda poderia o Chefe do Poder Executivo vetar as medidas que entendessem inconstitucionais ou ilegais, bem como aquelas em que se evidenciem a ausência de interesse público, no caso das Propostas de Emenda à Constituição inexiste a possibilidade do Poder Executivo efetuar tal controle.

 

O que se está a dizer é que seria plenamente possível o Congresso Nacional estabelecer e aprovar medidas e normas que possuam constitucionalidade duvidosa, sem que tenham a sua responsabilidade aferida em momento posterior ao da sua elaboração e consequente promulgação, como é o caso da famigerada PEC 001/2022.

 

Toda lei aprovada pelo Poder Legislativo goza de presunção de constitucionalidade. Se a proposta tramitou regularmente pelo Parlamento, foi aprovado pelas comissões, especialmente a de Constituição e Justiça, e não foi vetado pelo chefe do Poder Executivo, o que não se aplica neste caso por tratar-se de Emenda à Constituição, tem-se que ingressou validamente no ordenamento jurídico, de sorte que deve ser cumprida por todos, como mandam as regras basilares de um Estado democrático de Direito.

 

Contudo, ao conceder os benefícios previstos na PEC 001/2022, não há dúvidas de que o chefe do Poder Executivo Federal poderá ser alvo de diversas ações judiciais, sobretudo ações eleitorais como as AIJE’s, ações de investigação judicial eleitoral, como também representações específicas por condutas vedadas, que poderia lhe acarretar a cassação de seu registro ou de seu diploma, dependendo obviamente do momento da prolação de uma decisão condenatória.

 

Percebe-se que mesmo sem participar do processo legislativo constitucional que culminou na aprovação da PEC 001/2022, poderia o chefe do Poder Executivo Federal ser sancionado por aplicar uma legislação que gozaria de presunção de constitucionalidade, principalmente por ter sido aprovada em dois turnos de votação em cada Casa do Congresso Nacional, após ter sido aprovada nas comissões temáticas, especialmente as de Constituição e Justiça. Caberia ao mesmo, entendendo que a norma esteja em conflito com a Constituição Federal, submetê-la ao crivo do Poder Judiciário para que este venha a dar a palavra final sobre a (in) constitucionalidade da legislação.

 

Assim, ao menos prima facie, poderia se cogitar a não aplicação das sanções previstas na legislação eleitoral ao chefe do Poder Executivo Federal, haja vista que, por gozar da presunção de constitucionalidade, o cumprimento da norma por parte deste mostra-se imperativo, cabendo ao gestor, caso entenda pela inconstitucionalidade, submeter à análise do Poder Judiciário a referida legislação para que a declare constitucional ou não, retirando-a, neste último caso, do ordenamento jurídico em vigor.

Thiago Santos Bianchi é advogado Eleitoralista
*Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias