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Quem é o Estado?

Por Albero Balazeiro e Ilan Fonseca

Quem é o Estado?
Foto: Divulgação
Em sentença que sempre resumiu nos livros de história o exercício máximo do poder ilimitado, o rei francês Luís XIV atribui a si mesmo a força do estado ao afirmar “O Estado sou Eu”. Mas quem é o Estado brasileiro em 2019?

O país foi sacudido nesses primeiros meses do ano por sucessivas e graves tragédias que vitimaram de forma cruel, até agora, mais de duas centenas de pessoas. A tragicidade ganhou contornos de maior comoção pela percepção geral de que as mortes decorriam de acontecimentos previsíveis. Se os acidentes não podem ser imputados exclusivamente à natureza, eles possuem causas decorrentes de decisões humanas, e como tais, podem ser evitados.

Analisando os dois eventos, rompimento da barragem de Brumadinho e incêndio do Centro de Treinamento de futebol do Flamengo, o primeiro traço comum que se observa é a condição de trabalhadores da maioria das vítimas. O segundo ponto em comum é o fato de que, em algum momento, o Estado falhou em sua missão de proteger os cidadãos, ao conceder alvarás para barragens inseguras e não promover interdição do alojamento dos jogadores.

A responsabilidade primária pertence aos empregadores. É evidente que as condições de trabalho nos dois casos beiravam o absurdo, com refeitório e setor administrativo posicionados ao lado da própria barragem, e contêineres improvisados servindo como dormitório para atletas ainda em formação. 

Todavia, não são situações inusitadas se comparadas às condições de trabalho que vemos todos os dias nas grandes cidades. Não parece loucura permitir que garis sejam transportados nos estribos dos caminhões de coleta de lixo? Não é estranho que uma empregada doméstica limpe as janelas de apartamentos da classe média colocando seus corpos pra fora?

Podemos perceber, nestes casos, situações de absoluto desrespeito a normas de segurança do trabalho. Mas, mais importante do que isso, é a capacidade que se tem de coibir de forma rápida e eficaz as situações surgidas. O ente criado para dar essa resposta é o próprio Estado, que incorpora o dever de proteção social.

Não há dúvidas de que situações trágicas testam o poder do Estado e sua capacidade de resposta. Para dar essa resposta o Estado tem de recorrer agora às suas instituições voltadas para o mundo do trabalho.  Por mais invisível que seja o onipresente mundo do trabalho, o Estado brasileiro nas tragédias de Brumadinho e do Ninho do Urubu também é a Justiça do Trabalho, a Auditoria-Fiscal do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho. Pouca gente sabe, mas foi a atuação preventiva destes órgãos que fizeram com que não houvesse mortes em massa de trabalhadores nas obras da Copa do Mundo e das Olimpíadas, e na construção das usinas de Belo Monte e Girau.
 
Em Salvador, apenas nos dias 21 e 22 de junho, mais dois acidentes fatais chamaram a atenção da mídia, um deles no próprio aeroporto, local em que se imagina que o conceito de segurança seja elevado ao grau máximo.
 
O que fica provado é o Estado tem um papel relevante na promoção da segurança e saúde do trabalho. Em um período em que se defende mais reformas na legislação trabalhista e a diminuição do Estado não é fácil defender, na contramão, que se fortaleçam essas instituições. Mas é imperioso. Não podemos perder mais vidas.
 
* Albero Balazeiro e Ilan Fonseca são procuradores do Ministério Público do Trabalho (MPT)
 
* Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias