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Campeão olímpico, ex-técnico da seleção de boxe busca inspirar jovens em Pernambués

Por Nuno Krause

Campeão olímpico, ex-técnico da seleção de boxe busca inspirar jovens em Pernambués
Foto: Arquivo pessoal

Foi para tratar de um princípio de pneumonia que Leo Faísca começou no boxe. Quando tinha apenas 18 anos, Leonardo Silva dos Santos, como é registrado, foi convencido por um colega a praticar a modalidade em um fundo de quintal de Paripe, bairro em que mora até hoje. Ele, que convivia com falta de ar, buscava uma atividade para praticar. Hoje com 37 anos, o lutador tem quatro títulos brasileiros no currículo, na categoria até 52 quilos, e fará sua estreia no boxe profissional em fevereiro. Um dos principais responsáveis por isso é Amonio Silva, o Mone, mestre do projeto Nocaute, que incentiva jovens do bairro de Pernambués a praticarem o boxe. 

 

"Se não fosse o projeto, eu não sei o que seria de mim. As portas se abriram. Defendi a Bahia várias vezes, conquistei quatro ouros e sete bronzes. Tudo pelo projeto de Mone", afirmou Leu, em entrevista ao Bahia Notícias. 

 

A história de Leu é apenas uma entre tantas outras que Mone ajudou a conduzir. Desde 1999, o técnico, que já foi sparring de Popó, atua no final de linha de Pernambués para, como ele mesmo diz, formar cidadãos. "O primeiro passo é formar um cidadão. O atleta surge no decorrer do tempo. Nossa ideia, de início, é tirar os jovens da rua, a criançada desse mundão aí, e se dentro deles tiver aquele ímpeto de atleta, de ser lutador, com certeza vamos trabalhar com a possibilidade do alto rendimento. Mas o objetivo principal não é esse. Quem sabe a gente consiga que ele tenha sustentabilidade, para viver por meio do esporte. Muitos começam, mas poucos terminam", destacou o profissional. 

 

Mone e Leu Faísca estão juntos desde que o lutador tinha 18 anos | Foto: Arquivo pessoal

 

Em 2017, Mone embarcou naquele que era o seu sonho desde sempre: fazer parte da seleção olímpica brasileira de boxe. O objetivo era conquistar medalhas para o Brasil nos Jogos Olímpicos de Tóquio-2020 e Paris-2024. A primeira parte foi um sucesso. Hebert Conceição, Beatriz Ferreira e Abner Teixeira deixaram o Japão com ouro, prata e bronze, respectivamente. Foi o maior número de pódios conquistados pelo boxe brasileiro em uma única Olimpíada.  

 

A segunda parte fica para os que seguiram na seleção. Apesar do desejo de todos na Confederação Brasileira da modalidade (CBBoxe) de que ele continuasse, Mone voltou para Salvador para cuidar da família (veja aqui) e de seu projeto.

 

"Quando eu saí, perdi quase todos os atletas. Não conseguiram se adaptar à pessoa que eu tinha colocado para dar aula. Eles estavam acostumados com meu trabalho. A maioria deles parou. Eu consegui uma outra pessoa, Dodô, parceiro meu, para dar aula. Trabalhamos desde o início juntos. Ele deu continuidade com a molecada. Quando eu terminava de fazer o trabalho da seleção, tinha que entrar em contato com ele, para passar o treino do dia seguinte e o planejamento semanal. Mas eu perdi muitos atletas. Perdi sete atletas para o tráfico, cinco morreram. Eu ficava balançado, porque sabia que podia contribuir de alguma forma. A gente não vai mudar o mundo, mas se cada um mudar o seu redor acho que vamos ter um mundo melhor", relata. 

 

O técnico ajudou o Brasil a conquistar três medalhas no boxe nos Jogos de Tóquio-2020 | Foto: Arquivo pessoal

 

Na última segunda-feira (17), Mone retornou oficialmente ao Nocaute. O próprio Hebert Conceição esteve presente no local, para dar as boas-vindas ao técnico e a toda a "molecada", como são carinhosamente chamados os jovens da comunidade.

 

Neste momento, o técnico procura um outro espaço para melhorar as condições de treinamento. "Estou com o pessoal da Confederação Brasileira, eles estão com o intuito de me ajudar. Marcos Britto, presidente. Se isso acontecer, minha ideia é me mudar. Nosso projeto é no final de linha de Pernambués. Mas, por conta da guerra, às vezes não conseguimos subir. Os atletas de baixo não sobem, os de cima não descem", lamenta. 

 

Além disso, ele pretende comprar luvas, sacos e novos materiais, para começar fevereiro "a todo o vapor". Como saiu da seleção brasileira, Mone não está trabalhando. O técnico até recebeu uma proposta da Federação Sergipana de Boxe, mas, por ser em outro estado, recusou o convite.

 

"Pela imagem que tenho hoje, de treinador da seleção, talvez eu consiga um apoio. Se fosse para sair de Pernambués, de Salvador, e trabalhar em outro estado, eu ficaria na seleção. Também tenho proposta para trabalhar no profissional. Não é minha área, mas precisamos botar o café na mesa", destaca. 

 

O apoio de Leo Faísca com certeza ele terá. "Não quero sair de jeito maneira. O mestre é pai, amigo, pau para toda obra", contou, aos risos. A estreia do pugilista no profissional ocorrerá entre os dias 18 e 26 de fevereiro, pela categoria até 53 quilos, com adversário ainda a definir. 

 

Mone foi sparring de Popó, que ajudou na trajetória de Leu | Foto: Arquivo pessoal

 

Apesar do sucesso que teve no boxe amador, Leo nunca foi convocado para a seleção. Ainda assim, sonha em viver de boxe, seja lutando ou dando aula em academias. Um dos empecilhos para isso, na visão do atleta, é o baixo investimento que a modalidade tem na Bahia. As medalhas conquistadas em Tóquio, por outro lado, "devem melhorar bastante o cenário", diz. 

 

PARIS-2024

Agora fora da seleção, Mone projeta que o Brasil tem um bom futuro no boxe, inclusive com perspectivas de medalha para os Jogos de Paris-2024. Uma das principais esperanças é Keno Marley, baiano de 21 anos, medalhista de prata no último mundial da modalidade. 

 

"Keno é um atleta favoritíssimo. Passou por muita dificuldade nesses três anos. Perdeu irmão, perdeu primo. Quase não foi para o mundial. Um cara que tem muito talento, muito jovem. Tenho certeza que em Paris ele vai arrebentar", projeta Mone. 

 

Para a Olimpíada de Los Angeles-2028, contudo, o boxe está ameaçado. O Comitê Olímpico Internacional (COI) colocou em dúvida a presença da modalidade no evento, por causa do escândalo de manipulação de resultados durante a Olimpíada do Rio de Janeiro, em 2016. A Federação Internacional de Boxe (Aiba) foi suspensa pelo COI, que organizou a modalidade em Tóquio. A suspensão deve durar até 2023 e, caso a Aiba consiga provar uma boa gestão, poderá assumir em Paris 2024.

 

"Isso é ruim para qualquer modalidade. Quando a entidade que comanda gera esses boatos, comentários, é ruim para todo mundo. Não só para os atletas, para as confederações, isso deixa a gente chateado. Não temos envolvimento, mas vemos comentários. Temos que melhorar a modalidade", destaca o treinador.