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Um ano após o fim da Olimpíada, medalhistas baianos contam o que mudou em suas carreiras

Por Matheus Caldas / Leandro Aragão / Ulisses Gama / Bruno Luiz

Um ano após o fim da Olimpíada, medalhistas baianos contam o que mudou em suas carreiras
Arte: Paulo Victor Nadal / Bahia Notícias

Os Jogos Olímpicos, maior evento esportivo do mundo, mobilizaram o Brasil e, sobretudo, o Rio de Janeiro, por 16 dias. Entre os dias 5 e 21 de agosto, as piscinas pararam para ver a redenção de Michael Phelps, o tablado virou palco para a supremacia de Simone Biles e o Estádio Nilton Santos, por um período, fez o futebol se render a Usain Bolt, o homem mais rápido do mundo. O Rio também teve seus momentos de Bahia. Os ringues receberam Robson Conceição, o primeiro campeão olímpico do boxe; a lagoa Rodrigo de Freitas debutou as medalhas brasileiras na canoagem, com Isaquias Queiroz e Erlon Souza; e, por fim, o Maracanã, estádio símbolo do país, fez cair por terra o trauma brasileiro com o 7 a 1. O volante Walace recebeu o primeiro ouro olímpico do futebol - suplente, o goleiro do Bahia, Jean, foi homenageado com um ouro, apesar de não ter jogado. Nesta segunda-feira (21), se completa um ano do encerramento da Olimpíada no Brasil. E, 365 dias depois, o que mudou na vida dos atletas baianos medalhistas no Rio de Janeiro?



"Boa Vista Boxe campeão olímpico!". Robson Conceição, 28, acabara de fazer história duplamente, após a vitória unânime sobre o francês Sofiane Oumiha (relembre aqui). Ele se tornava o primeiro campeão olímpico do boxe brasileiro e o segundo baiano a subir ao lugar mais alto do pódio em Olimpíadas - antes dele, só o jogador de vôlei de praia Ricardo, nos Jogos de Atenas. Naquele momento, as raízes do soteropolitano, no entanto, foram mais importantes que qualquer um dos feitos. O bairro de Boa Vista de São Caetano, em Salvador, conquistava um pedaço do olimpo esportivo. E, um ano após explodir de emoção e lembrar do seu reduto, ele segue morando no mesmo local, instalado na periferia da capital baiana. "Continuo treinando na Cidade Nova, na academia Champions. A estrutura continua a mesma. Continuo morando no mesmo lugar. Não me mudei, porque eu gosto de lá, mas também financeiramente ainda não deu", explica Robson Conceição, em entrevista ao Bahia Notícias. 

Apesar de ainda não ter conseguido dinheiro para eventualmente se mudar, Robson diz que, financeiramente, sua vida teve uma guinada, principalmente pelo fato de ter migrado para o boxe profissional. Contudo, ele se considera uma exceção em relação aos atletas brasileiros, por ter conseguido patrocínio de investidores norte-americanos. "Eu pensava que, com a conquista de uma medalha olímpica inédita no país, teria grandes mudanças, mais investimento no esporte, mais patrocínio. Porém, para mim foi totalmente diferente. Hoje eu sou gerenciado por uma empresa americana. No Brasil, eu não tenho incentivo, nem patrocínio de ninguém", brada.

 

 

Da arquibancada, festa da torcida no ouro de Robson Conceição

 

Medalhista de prata no tiro esportivo, o paulista Felipe Wu lamentou sobre a situação em que o Brasil vive em termos esportivos (entenda aqui). Para o atleta, o país perdeu a chance de se tornar uma potência esportiva. Robson comunga dessa opinião. Para o pugilista, os investimentos na base deveriam aumentar substancialmente após os Jogos Olímpicos. "Não tem que esperar um atleta ser campeão olímpico para apoiar. Tem que apoiar desde a base, com projetos sociais, dando ajuda de custo para que o atleta possa ajudar sua família, sem precisar se preocupar em treinar e logo em seguida ir trabalhar", opina.

O movimento de subir ao pódio foi um divisor de águas de Robson. Ele sabia que, após voltar ao solo, jamais seria a mesma. Seu nome fora imortalizado num seleto hall de ouros baianos e, por isso, ele se considera responsável pela juventude esportista. "Eu acho que já sou (referência). Até hoje eu recebo mensagens de jovens atletas que pensam em ser como eu, se inspiram muito em mim. Pretendo continuar deixando esse legado aí", destaca.

Atualmente, com a profissionalização, ele vive outra fase da carreira. Em quatro lutas, quatro vitórias, sendo três por nocaute. A próxima luta será no dia 31 de outubro, contra Carlos Osório, da Nicarágua. O pensamento é já lutar pelo cinturão do peso super-pena no final do ano que vem. "Os dois são muito importantes, porque cada um tem a sua fase. No boxe olímpico, você tem que conquistar uma medalha olímpica e no profissional é o cinturão", ressalta.



Mesmo não tendo conseguido um ouro, Isaquias Queiroz, 23, fez história no Rio de Janeiro. Ele ultrapassou os limites estaduais e se tornou o único brasileiro a conquistar três medalhas numa única edição de Olimpíada. Ele ganhou duas pratas, nas provas de C1 1000m e C2 1000m (junto a Erlon Souza), e um bronze no C1 200m - nesta, após uma saída abaixo do esperado, teve uma recuperação impressionante, que o levou à medalha.

Um ano após as competições no Rio de Janeiro, ele segue sua saga internacional. Em julho, subiu duas vezes no pódio do Mundial Sub-23 de canoagem: ouro no C1 1000m e prata no C1 200m. Antes da disputa da competição, o baiano de Ubaitaba já havia conversado com o BN sobre sua condição atual no esporte (leia mais aqui).

Com o mesmo discurso humilde que o marcou nas conquistas, ele diz que sua prioridade sempre será competir por prazer. Contudo, a condição financeira não mudou após o recorde de medalhas na Olimpíada. "Espero que mude um pouco mais, apareça mais patrocinadores. Mas, se não mudar, vou continuar treinando para ganhar medalhas, porque o importante é competir", diz. 

O que mudou realmente na vida de Isaquias foi o reconhecimento do público. "A única coisa que mudou foi em relação a reconhecimento e um pouco de fama, mas eu não gosto de falar disso, não (fama). Prefiro chamar de reconhecimento dos resultados. Tirando isso, continuo sendo o mesmo cara, a mesma pessoa, brincalhão e tal... A mesma coisa de sempre", garante.

Segundo o canoísta, a pressão por resultados em Tóquio 2018 será menor, principalmente por se tratar de uma competição fora de casa. "A gente não se importou com essa pressão em casa, então acho que a gente não vai se importar com a pressão em Tóquio, não. (...) Essas coisas a gente deixa de lado, porque a gente sabe que a preocupação real é com o treinamento que vai garantir a medalha para a gente", projeta. 

 



 

Isaquias pode ter conseguido três medalhas na canoagem. No entanto, em uma delas, Erlon Souza, 26, fez parceria com ele e também fez história para a canoagem baiana e brasileira. Natural de Ubatã, cidade próxima a Ubaitaba. De certa forma ofuscado pela performance de Isaquias, Erlon também compartilha de algumas opiniões do parceiro de medalha olímpica (releia a entrevista com Erlon aqui).

Nesta semana, ele participará do Mundial de Canoagem Velocidade, que acontecerá entre a quarta (23) e o domingo (27), em Racice, na República Tcheca. É a chance de conquistar o primeiro título de expressão pós-Olimpíada. Apesar da carreira internacional consolidada, ele garante não ter tido mudanças substanciais na vida, principalmente no aspecto financeiro. "Eu só realizei o meu sonho de ser medalhista olímpico. Mas como as pessoas pensam que a gente muda radicalmente financeiramente... Na minha vida financeira não mudou nada não. (...) A gente faz uma fantasia e pensa em alguma coisa a mais, mas não aconteceu", lamenta.

Prova de Erlon Souza e Isaquias Queiroz, que garantiu a prata no C2 1000m
 

Na visão de Erlon, o momento no qual o Brasil está imerso prejudicou os patrocínios que os atletas poderiam receber depois dos Jogos. "Muitos acham que a gente já está rico, mas não é bem assim. Pensam que no pós-Olimpíada, no pós-medalha vem muitos patrocinadores, mas na realidade não é assim. Tem que ter um pouco de paciência, porque a gente também sabe das condições que o país está vivendo", pondera.

Em treinamento para o próximo ciclo olímpico, tem o mesmo discurso de Isaquias no que se refere à pressão por bons resultados em Tóquio 2018. Ele diz reverter esse sentimento em inspiração. "Eu sei que muitos jovens, muitas pessoas se inspiram no meu trabalho. Então, tento dar sempre o meu melhor, não como uma pressão em cima das costas, porque eu sei que estou treinando e tenho obrigação de dar o meu melhor", afirma.




 

O futebol possui uma peculiaridade em relação aos outros esportes nos Jogos Olímpicos: apenas atletas sub-23 podem jogar, com exceção de três jogadores acima da idade em cada equipe. Para a modalidade, a Olimpíada é um título de menor relevância. Contudo, desde 1896, o Brasil ainda não havia conquistado o ouro. Na mais que centenária história do futebol nacional, foram diversos craques e cinco títulos mundiais, que credenciaram a Seleção Brasileira a ser um dos times mais representativos no mundo da bola. Essa medalha era a cereja do bolo para o futebol brasileiro, vice-campeão nas edições de 1984, 1988 e 2012. O baiano Walace foi um dos jogadores que entraram na história da modalidade no país, ao vencerem a seleção alemã nos pênaltis, num Maracanã lotado. 

(Relembre a emoção de Walace após a vitória por 4 a 0 sobre a Dinamarca, na Arena Fonte Nova)

Hoje jogador do Hamburgo (Alemanha), ele vê o título olímpico como um dos fatores preponderantes para conseguir realizar o sonho de jogar na Europa. "A conquista olímpica foi boa. Acho que isso, depois, ajudou a mim bastante. A visibilidade, tudo que ocorreu... Do jeito que foi, com as pessoas envolvidas. Me ajudou bastante. Ganhei um pouco mais de confiança, de moral, por parte de algumas pessoas que não confiavam no meu trabalho", comemora.

À época, ele era um dos destaques do Grêmio. Na volta dos Jogos Olímpicos, a equipe gaúcha conquistou o título da Copa do Brasil. Ele crê que a adrenalina da Olimpíada também o auxiliou a ganhar um título a nível nacional depois de 11 anos. "Isso me ajudou a ganhar a Copa do Brasil. Foi um passo também pra eu estar aqui na Alemanha. Um dos primeiros objetivos, que era chegar na Europa, eu consegui. Estou dando continuidade aqui para colher bons frutos", pontua.




Volante Walace fala sobre o que mudou em sua carreira após o ouro olímpico
 

Para Walace, esse título nacional chamou mais atenção dos clubes europeus que a própria Olimpíada, o que exemplifica a condição do futebol dentro dos jogos. "A medalha trouxe um reconhecimento grande, mas acho que mais pela gratidão do torcedor brasileiro do que como projeção de carreira. Acredito que o título da Copa do Brasil foi mais significativo para os clubes europeus, por exemplo", opina.

O volante chamou atenção por conta de a medalha ser inédita. A pressão para conquistar essa medalha era grande, sobretudo após o fracasso na Copa do Mundo. Entretanto, no final, a comemoração foi grande - pelo lado pessoal, ele celebrou a titularidade. "A gente sempre falava isso na concentração. Sabíamos dessa responsabilidade, mas que também se viesse a medalha seríamos lembrados para sempre. E depois que começou a competição, queria muito e coloquei na cabeça que queria ser titular, para que fosse mais marcante ainda. Graças a deus fomos abençoados e deu tudo certo", endossa.

E, um ano depois, Walace teve mais um motivo para se alegrar: ele não sabia que era apenas o terceiro baiano a conseguir um ouro olímpico. "(Vou) Te dizer que não sabia desse feito. Me orgulha muito, sempre levei Salvador, minha favela, por onde eu vou. Valoriza ainda mais a conquista", exalta.



Neste grupo de medalhista, está um jogador que, oficialmente, não é campeão olímpico, mas vale receber um registro. O goleiro Jean, do Bahia, era um dos suplentes do também baiano Rogério Micale, técnico da Seleção olímpica. Contudo, mesmo não tendo participado do grupo que participou da campanha, ele foi homenageado pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF) com uma medalha de ouro, junto ao meio-campista Valdívia, hoje no Atlético-MG. 

Por ter uma condição diferente dos demais esportes olímpicos, Jean, assim como Walace, não têm os mesmos problemas de patrocínio enfrentados por Robson, Isaquias ou Erlon. A carreira do arqueiro de 21 anos decolou. Antes reserva de Muriel, hoje no futebol português, ele se consolidou como titular absoluto da meta tricolor. Além disso, foi campeão da Copa do Nordeste nesta temporada e desperta interesse de outros clubes. 


Jean vai às lágrimas com título da Copa do Nordeste | 

Foto: Jefferson Peixoto / Ag. Haack / Bahia Notícias



Jean relembra o momento de emoção que viveu quando acompanhou a vitória do Brasil por 4 a 0 sobre a Dinamarca, na Arena Fonte Nova, pelas quartas de final do torneio olímpico. "Fui lá vê-los, assisti o jogo. É bom esse contato. Seleção é sempre bom, mesmo com o seu nome na suplência. Só de ter o seu nome gravado na história, já é muito bom", relembra.

Para o goleiro, o ouro é algo que agrega à sua carreira, principalmente por ter sido uma conquista inédita. "É um motivo de muito orgulho. É uma medalha que ninguém tem. Só 23 pessoas, e eu estou incluindo como uma delas. Com certeza é muito especial para mim", conclui.