'É uma mudança de estilo de vida', diz médico baiano adepto da dieta paleo
Dr. Adolfo Duarte | Fotos: Bruno Luiz / Bahia Notícias
Em uma época em que os avanços na ciência são cada vez maiores, a dieta paleo, uma dieta alimentar que vem de nossos ancestrais do período Paleolítico, tem ganhando força entre médicos, nutricionistas e pessoas que vivem numa eterna busca pela alimentação perfeita. A dieta paleo (paleo é uma contração de paleolítico) prega que o cardápio dos homens da Idade da Pedra, rico em alimentos de origem animal e com baixo teor de carboidratos, ainda é o mais adequado à saúde do ser humano contemporâneo. Para saber mais sobre a dieta, o Bahia Notícias conversou com o médico Adolfo Duarte. Pós-graduado em prática ortomolecular, Duarte é um dos únicos profissionais de saúde a trabalhar com a dieta paleo na Bahia. Nesta entrevista, o médico afirma que este não é apenas um regime alimentar de emagrecimento, mas sim um estilo de vida e comenta sobre as polêmicas que envolvem a dieta, nada convencional para o que prega a ciência atualmente, como, por exemplo, a liberação do consumo de gorduras animais e restrição para várias frutas.
No que é que consiste a dieta paleo? Qual a origem deste nome?
No que é que consiste a dieta paleo? Qual a origem deste nome?
Esse nome (dieta paleo), na verdade, é uma contração de dieta paleolítica, que seria a ideia na qual a gente se alimentaria com alimentos atuais que são equivalentes aos que nossos antepassados da Era Paleolítica se alimentavam. Por que essa ideia? Nós entendemos que o registro genético humano mudou muito pouco, de oito, dez mil anos para cá, que é quando incluímos os grãos e as grandes fontes de amido na nossa alimentação. Antes disso, nossa alimentação era, basicamente, carnívora e carniceira. Se você considerar que o homo sapiens está no planeta há, mais ou menos, 200 mil anos, isso quer dizer que a gente passou, mais ou menos, 190 mil anos nos alimentando de alimentos de origem animal, em base de gordura, carne e vísceras, provavelmente, pequenos animais também, e frutas e vegetais, muito dependendo da época do ano e da região, e em pequena quantidade, pois a gente não cultivava. A ideia é que a gente tinha uma alimentação voltada mais para gorduras animais, carnes e com muito poucos vegetais. Diferente das propostas que são feitas hoje em dia. A dieta paleo se dispõe propor que a gente se alimente de alimentos assim. Daí, temos muitas variações. A que gente mais trabalha hoje é a primal. A primal nos permite comer alimentos mais contemporâneos ainda. Se formos pensar na dieta paleo pura não comeríamos queijo, iogurte e nem tomaríamos leite. Já na primal, a gente come queijo, iogurte, manteiga e até alguns vegetais. A gente faz algumas adaptações. A gente entende que, nesse tempo, a civilização e homem conquistaram algumas coisas e a gente pode usar outros itens. A dieta paleo não restringe tudo, não é verdade. A gente vai qualificar isso melhor e vai trabalhar com porções menores que as consumimos normalmente.
Em porções menores do que as que a ciência tradicional recomenda, é isso?
Não é a ciência que recomenda. São grupos que recomendam, com estudos muito frágeis, que demonstram vantagens de forma muito imprecisa. Hoje se faz ciência com estudos populacionais muito grandes. Estudos populacionais não são capazes de definir fatores de causalidade entre situações, entre fatores e resultados. Ele é capaz de levantar hipóteses. Essas hipóteses têm que ser confirmadas em outros estudos, até você chegar numa relação real de causalidade. Hoje em dia, o que vemos ser difundido como ciência não é ciência, são estudos populacionais grandes. Esses estudos são muito válidos para trazer hipóteses, mas eles não são valiosos para definir causalidade. Infelizmente, boa parte do que se define como boa alimentação atualmente são estudos populacionais. Quando a gente vai ler isso para um detalhamento maior, você acaba não confirmando os dados. Hoje, por exemplo, tem muita gente comendo tapioca e achando que isso é bom. Você pega um alimento que é, basicamente, amido, não tem proteína, não tem fibra e prescreve. Chega a ser doloroso!
Você falou de muitos estudos atuais sobre alimentação serem bastante hipotéticos. A dieta paleo é baseada em estudos mais eficazes, que demonstrem mais relação de causalidade?
A cada dia a gente vê sair trabalhos que falam mais em favor de uma alimentação com menos teor de carboidrato simples e um teor de gordura mais livre. A gordura animal saturada, que um dia já foi a grande vilã, a gente já vê um monte de trabalhos interessantes demonstrando, o que de certa forma a gente sabia dentro do raciocínio bioquímico, que ela não é capaz de fazer mal diretamente só por ser gordura. Depende muito do que você come com ela, da forma como você preparou e de como anda seu estado de saúde. Na verdade, é uma situação maior, como se fosse um quadro grande. Botar a culpa na gordura saturada é o mesmo que culpar um prego por uma casa inteira ter caído. Quase tudo em saúde humana é multifatorial. O que a gente sabe hoje? É que uma alimentação que tenha um volume bom de gordura animal, um bom volume de proteína e baixa quantidade de carboidratos é a melhor alternativa para o ser humano. Alguns países, como a Suécia, já decretaram isso como estratégia de saúde pública.

Você falou muito sobre baixa quantidade de carboidratos e a dieta paleo é considerada um tipo de alimentação low carb, ou seja, prega um pequeno volume desse nutriente na alimentação. Isto quer dizer que carboidrato faz mal, que deva ser banido da alimentação?
Não, ninguém está afirmando que carboidrato faz mal à saúde. O que afirmamos é que o volume de carboidratos que nós consumimos hoje em dia e que aprendemos a consumir é estupidamente excessivo e que os tipos de carboidratos que tendemos a consumir é ruim. É claro que nossa proposta é a redução de carboidratos. A dieta acaba acarretando nisso, já que a dieta é baseada na preferência pelo consumo de gorduras e proteínas animais. A redução de carboidratos acaba sendo uma consequência disso. Ela tende a comer menos isso, pois a base gordurosa na alimentação sacia muito. Se você tem uma alimentação rica em gordura e proteína de qualidade, você sente menos essa necessidade de ficar comendo toda hora, enquanto alguns carboidratos aumentam muito a sensação de fome, principalmente os carboidratos simples e os amidos mais curtos e digeríveis. Por exemplo, é muito diferente comer pão de comer inhame. O pão tem um amido de fácil digestão e alto índice glicêmico, ou seja, quando você come o pão, o açúcar no seu sangue sobe muito mais rápido. Quando você usa uma raiz, como, por exemplo, a batata doce, o índice glicêmico é muito menor, o açúcar no sangue não sobe tão rápido. A diferença está em quanto daquilo vai ser transformado em gordura, ou não. Se você disponibiliza no sangue o açúcar muito rápido, você não vai ter como consumi-lo tão rápido, você acaba transformando aquilo em mais gordura. Se eu uso o pão, estarei consumindo um carboidrato ruim. Se eu consumir a batata doce, claro que não em dose tão grande, ela não fará tanto mal à minha saúde.
O que acarreta em nossa saúde um consumo menor e mais qualificado de carboidratos na alimentação?
Acarreta em um índice glicêmico na alimentação mais baixo, fazendo com que você tenha menos picos de insulina. Os picos de insulina são muito lesivos ao nosso organismo e são os causadores da fome toda hora. Isso dá uma pancada de açúcar no seu sangue, que, muitas vezes, você não tem como gastar e isso vai servir para quê? Para te engordar, para desregular a relação entre glicemia e insulina e para, constantemente feito, aumentar o risco de você desenvolver uma diabetes. E aumentar o risco de desenvolver uma série de doenças degenerativas.
Você não é nutricionista. É um médico com pós-graduação em prática ortomolecular. Como essa formação te ajuda no trabalho com a dieta paleo?
Quando eu penso em ortomolecular, penso em regulação do organismo. A dieta paleo e a primal fazem um trabalho de regulação metabólica fantástico, apenas por si. O fato de uma pessoa seguir uma dieta paleo, ou primal, já a beneficia em termos de regulação metabólica divinamente, pois o organismo foi feito para comer assim. Em teoria, se esse organismo se alimenta do jeito que ele foi feito para se alimentar, ele se organiza por si. É fantástico a gente perceber que o nosso organismo, sozinho, trabalha melhor do que com a gente mexendo nele. É assim que as coisas se relacionam. Como a ortomolecular é uma prática de regulação orgânica e a dieta paleo promove a regulação metabólica, essas duas coisas estão conectadas. Não quer dizer que para trabalhar com a dieta paleo o profissional precisa ser ligado à prática ortomolecular.
O que seria recomendado na dieta paleo e o que não é tão recomendado?
É muito mais fácil dizer o que não usar. Se você quer começar a dieta paleo e quer ter uma ideia, eu sempre recomendo que a pessoa procure um profissional para orientar. Eu não recomendo que as pessoas façam isso sozinhas, lendo um livro e fazendo sozinhas, pois existe uma série detalhes por trás das informações que saem nessas publicações que, fatalmente, não estão nessas publicações. Mas, a rigor, o que a gente pensaria é uma retirada da alimentação dos alimentos processados. Pois entendemos que, no processamento, os alimentos perdem uma série de características originais e agregam uma série de características nocivas, como adição de corantes e conservantes. E até as próprias embalagens, dependendo da maneira como são feitas, interferem de maneira negativa nos alimentos. Segundo ponto seria eliminar, tanto quanto possível, os farináceos da alimentação. Em geral, as bases de grãos. Farinha de trigo, aveia, amido de milho. Para fazer a dieta paleo, você vai dar predominância em sua alimentação a alimentos de origem animal, tirar tudo que for processado, beber bastante água. E quanto aos vegetais, dar prioridade aos folhosos (rúcula, alface, agrião, couve) e vai despriorizar as raízes em geral, abrindo espaço aí para a batata doce e o aipim. Controlar também o volume de frutas ingerido por dia e não consumir suco de frutas.
.jpg)
Por que controlar a ingestão de frutas e o consumo do suco delas, se eles são tão recomendados atualmente?
Antigamente, você só consumia fruta que fosse da época. Não tinha fruta fora da época. Hoje tem. Como tem? Com métodos de cultivo modernos que nos trouxeram valor nutricional ridiculamente pequenos e cheias de açúcar. As frutas têm sido cultivadas e selecionadas para nós termos cada vez mais frutas mais doces e com polpas mais tenras. Isso não quer dizer fruta com mais nutrientes. Boa parte dos nutrientes das frutas estão nas cascas delas. Consumir fruta com casca hoje é perigoso por causa de defensivos agrícolas. Aqui, as frutas de cultivo orgânico ganham muita força. Eu vou me restringir às frutas de cultivo orgânico, da região e da época. Se eu fizer isso, estou fazendo em boa escolha? Sim. Mas se eu consumir frutas em excesso, eu vou consumir excesso de açúcares simples, que é o açúcar natural das frutas, a frutose. Tudo em excesso não faz mal? Não é diferente com as frutas. Ah, aquela ideia de que fruta é bom e você pode consumir indiscriminadamente. Nada você pode consumir indiscriminadamente.
A dieta paleo é uma dieta na qual ovos e bacon são permitidos à vontade?
Isso seria mais para a dieta paleo primal. Ovos estão livres, sem problema, ótimo. Essa bobagem toda de proibir ovos caiu, graças a Deus. O bacon têm outros detalhes. Vai depender de origem, de manuseio. É muito diferente do criador que tem em sua fazendinha seus próprios porcos e faz seu próprio bacon, daquele que a gente compra do mercado e eu nem sei de onde veio.
Você frisou muito que a qualidade dos alimentos consumidos depende também da forma como eles são preparados. No caso de frituras, por exemplo, qual seria o modo de fritar os alimentos e que óleo utilizar?
O problema da fritura é o quanto você vai esturricar o que está fritando. O ideal é que você use um óleo que tenha o menor grau de alteração por ação do calor. O óleo ideal para a gente usar em frituras é o óleo de coco. É um óleo que aguenta muito calor sem ter grandes alterações. Se você usa o óleo de coco, o segundo passo é saber fritar. Fritar corretamente vai implicar em você deixar esse óleo ferver antes, ter um volume considerável dele dentro de uma fritadeira e pegar o que você vai fritar, mergulhar ali, fritar rapidamente e tirar. É assim que é fritar. Como ensinam a gente a fritar? Ensinam a gente dar uma meladinha de manteiga na frigideira, coloca o fogo lá em cima e coloca para fritar. Tá errado. O maior problema da fritura não é nem tão somente a base gordurosa que você, é você deixar o que está fritando queimar, esturricar as bordas. É nessas bordinhas que ficam uma série de substâncias nocivas à saúde. Isso pode aumentar o risco de câncer.
Você tem pós-graduação em prática ortomolecular. Essa seria a formação mais indicada para alguém que trabalha com a dieta paleo?
Não, não precisa ter entendimento em ortomolecular para trabalhar com paleo. Precisa somente entender de paleo. Nutricionista é a pessoa mais indicada para fornecer dietas. Eu dou orientações aos meus pacientes. Eu não indico dieta e nem cardápio. Quem tem que fazer isso é o nutricionista. A pessoa consegue se organizar dentro da dieta paleo sem um cardápio? Consegue. Mas é muito mais fácil se ela tiver um cardápio. Recomendo que as pessoas tenham seus nutricionistas para fazer isto.

Quando os pacientes chegam ao seu consultório, como são os procedimentos de consulta?
Temos uma conversa muito longa com os pacientes sobre hábitos de vida, sobre queixas, uma série de perguntas. É uma consulta muito conversada, geralmente longa. O paciente sai, faz uma série de exames que nós prescrevemos, volta um tempo depois, me traz os resultados e, em cima daquilo, a gente começa a trabalhar.
Você é um dos únicos aqui na Bahia que trabalha com a dieta paleo?
Eu não sei dizer se sou o único no estado, mas acho que, no momento, sou um dos únicos, pois eu não vejo muita gente.
O que se diz sobre a dieta paleo é que ela promete resultados rápidos, sem radicalismos e regimes complexos. O senhor avalia a paleo desta forma?
Os resultados rápidos dependem do que você chama de resultado. A dieta paleo ou primal não é uma dieta para emagrecimento. É muito mais uma mudança de estilo de vida para ter saúde. Ela serve, também, para o emagrecimento. E a gente faz metodologias diferentes para quem quer emagrecimento e para quem quer a dieta mais por uma questão de ter qualidade de vida. Quem entra na de emagrecimento, fica ali um tempo, consegue o que quer e, depois, vai para outra para manter a qualidade de vida. Então, na verdade, não é uma dieta de emagrecimento. É um estilo de vida. O resultado é perda de peso? Não, até porque emagrecimento não é perda de peso, mas perda de gordura.
Mas como ela pode perder gordura se a dieta paleo recomenda um consumo maior de gordura animal?
Ela perde fundamentalmente gordura, pois o que faz você acumular gordura no seu corpo, basicamente, não é gordura alimentar, mas o excesso de açúcares e energia na alimentação. Se você comer um excesso de gordura, você vai, provavelmente, acabar engordando. Só que quando você faz a dieta paleo, você não consegue consumir em excesso, pois é como se seu corpo regulasse o que ele é capaz de consumir. Quando você faz uma refeição baseada em carne e folha, faz esse experimento uma hora dessas, coloca um filezão com uma salada com folhas, brócolis, couve-flor, nozes, amêndoas, azeitonas e até um ovo cozido. Eu duvido que você coma este prato inteiro. Não come. Agora, nesta mesma quantidade, se você colocar arroz com farofa, você come tudo. Coloque esse arroz com farofa e, em cima do filé, coloque um molho bem doce de maracujá. Quero ver se você não come tudo. O açúcar tem essa habilidade de fazer o corpo querer mais. É um processo de vício, até, que, na dieta paleo, a gente tenta tirar do paciente e, fatalmente, ele começa a comer menos.
Você tem um e-book publicado. Do que é que ele se trata?
Você tem um e-book publicado. Do que é que ele se trata?
Ele se chama “As seis coisas que você tem que fazer para ter uma saúde fenomenal”. Esse e-book eu lancei para a Kindle, da Amazon. Teve até uma venda muito legal, sem campanha publicitária, nem nada. Agora a Chiado Editora se interessou, pegou o livro para ela e está lançando uma versão ampliada. Não é a segunda edição, é a primeira edição em papel. Ele traz os seis hábitos que você deve regular para ter uma saúde excelente. É uma coisa muito interessante e simples. Você precisa comer certo, beber água certo, ter suas dejeções corretas, ou seja, fazer cocô e xixi certo, respirar certo e dormir certo. Muita gente quando pega essa ideia logo de cara diz: “besteira, eu faço tudo isso”. Sim, mas nem todo mundo faz isso certo.
Você também tem um blog. O que é publicado nesse blog?
O meu blog é direcionado à saúde, não tem muita relação com a dieta paleo. É mais sobre ortomolecular que sobre dieta paleo. Falo sobre isso em alguns artigos. Eu escrevo muito de acordo com demandas dos clientes, ou sobre o que sai na mídia, me posiciono sobre as reportagens que saem na mídia. Eu escrevo para os pacientes, não manuais para profissionais de medicina. Os profissionais já sabem, já estudaram.