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Conheça o elenco de 'O Pregador', pioneiro em Teatro-Fórum na Bahia

Por Ana Clara Pires

Conheça o elenco de 'O Pregador', pioneiro em Teatro-Fórum na Bahia
Foto: Leonardo Moreira / Divulgação

Um “ensaio para a revolução” é assim que o dramaturgo Augusto Boal define o Teatro-Fórum, uma técnica de Teatro do Oprimido que propõe que os espectadores da peça proponham sugestões para alterar a realidade apresentada pelos atores. 

 

Criado pelo próprio Boal, o Teatro do Oprimido é um método que visa lutar contra todas as formas de opressão dando ao espectador o poder de transformar o anti-modelo apresentado. Com o poder de ensaiar sua própria revolução, o público se torna um “espect-ator” e se vê em uma posição de poder para mudar a realidade.

 

No último dia 25, estreou o primeiro espetáculo que utiliza a técnica do Teatro-Fórum na Bahia. Em cartaz até o dia 18 de agosto, no Teatro Martin Gonçalves, a peça “O Pregador-Teatro-Fórum Antirracista” é uma readaptação de uma obra, de mesmo nome, apresentada pela primeira vez em 1995. 

 

Nela, a personagem principal, Clara dos Anjos, tenta escapar do destino trágico que o racismo tem para ela. “Ao propor essa poética, Boal nos faz perceber que as opressões vivenciadas por Clara dos Anjos não são pessoais, são de todo o povo preto”, declara Licko Turle, diretor da peça.

 

A obra, dirigida por Licko Turle e com co-direção de Leonardo Moreira, é da CIA de Teatro da Universidade Federal da Bahia com co-realização da Pele Negra - Escola de Teatros Pretos, da Cooperativa Baiana de Teatro e da Cia Estupor de Teatro.

 

 

O ESPETÁCULO 

Dividido em três etapas, a encenação visa analisar as relações entre opressor x oprimido, como forma de entender a dinâmica da violência estrutural. Em sua primeira fase, o público é estimulado pelo elenco através de jogos e exercícios teatrais. 

 

Já na segunda fase, o elenco apresenta um anti-modelo, uma realidade social que precisa de mudança. Na última fase,os espectadores são convidados a se tornarem “espect-atores” e entram em cena para transformá-la.

 

O ELENCO

Com 10 atores negros de idades, naturalidades e realidades variadas, a peça possui um elenco variado, onde o mesmo personagem é apresentado por diferentes atores em diferentes dias. Conheça o elenco do espetáculo “O Pregador-Teatro-Fórum Antirracista”.

 

Anna Pires

 

Foto: Laiane Apresentação / Bahia Notícias

 

Com apenas 19 anos e natural de Salvador, Anna Roberta Pires sonha em cursar Medicina, mas encontrou no teatro a chance de estimular pessoas iguais a ela. “Chegou um momento em que como uma mulher preta, eu comecei a ficar inquieta para entender o que eu poderia fazer no futuro para estimular pessoas como eu”.

 

“E pessoas que também estivessem um pouco perdidas porque a verdade é que eu estava meio perdida mesmo. Estava em um período em que não aguentava mais esperar, o Enem estava me matando. Eu passava todo meu tempo em casa estudando. Então, eu queria me sentir útil para alguma coisa”, declarou Anna.

 

De acordo com Anna, ela entrou na peça porque estava procurando “pessoas que tivessem ideologias parecidas com as dela”. Por acaso, ela descobriu que estava acontecendo as audições para o espetáculo.

 

“A principal informação sobre mim é que eu sou uma mulher preta que tem doença de pele. E eu gosto de falar sobre a minha doença de pele porque essa doença tentou me matar muitas vezes e eu estou viva”, contou.

 

Para Anna, o ponto alto da peça é o momento do Fórum, principalmente quando o público é de maioria jovem. “A peça em si é uma peça forte mas a gente já está cansado de viver isso. Então, quando eu vejo meninos e meninas com poder de agir maior que o de pessoas adultas, eu fico chocada com como a nossa juventude negra é muito potente”.

 

Emille Barbosa

 

Foto: Júlia Batista

 

Filha de um pescador e de uma marisqueira, Emille Barbosa contou ao Bahia Notícias que sempre foi apaixonada pela arte e, por isso, não chegou a escolher o teatro, na verdade ele a escolheu.

 

Mulher quilombola, de 22 anos, natural de Santiago do Iguape, em Cachoeira, Recôncavo Baiano, Emille não sabe dizer há quanto tempo faz teatro. “Não sei se conta o tempo em que eu fazia teatro na igreja. Mas eu acho que faz uns 10 ou 11 anos”.

 

Já sobre o ponto alto da peça, a atriz contou que o ponto mais forte “é a coragem que o público tem de ir ao palco durante a parte do fórum e mudar uma cena que às vezes já aconteceu na vida real deles mas que eles não tiveram coragem de agir”.

 

“Então com coragem eles vão criar um novo cenário para aquilo que passaram”.

 

Kayk Souza

 

Foto: Reprodução / Instagram

 

“Um artista negro queer”, é essa característica que Kayk Souza quer que as pessoas se lembrem sobre ele. Com 20 anos de idade e 11 anos de teatro, Kayk já teve muitas casas em sua vida. Nascido em Itabuna, no Litoral Sul da Bahia, o ator cresceu em Porto Velho, Rondônia mas pede que lembre que veio de Serra Grande, Uruçuca.

 

Kayk começou no teatro aos 9 anos na Companhia Belas Artes enquanto ainda vivia em Rondônia.

 

“Eu comecei a fazer teatro no ministério da Igreja. Então falei para o meu pai que gostava daquilo que estava fazendo e pedi para ele procurar alguma coisa de teatro para eu fazer porque na minha escola não tinha. E aí ele me inscreveu no curso de teatro e desde então eu sigo. O teatro foi a forma que eu tive de me encontrar no mundo”, declarou.

 

Sem coragem para se inscrever na peça, Kayk foi incentivado por seu namorado. “Eu não queria fazer teste de elenco porque passava por um processo de vídeo e, eu tenho muita dificuldade. Mas meu namorado me apoiou. E aí eu consegui gravar o vídeo, fiz a seleção presencial e passei”.

 

Ludimila Agostinho

 

Foto: Reprodução / Instagram

 

Incentivada por um projeto da comunidade de Seabra, na Chapada Diamantina, onde nasceu e foi criada, Ludimila Agostinho começou a fazer teatro há 13 anos, depois que se sentiu acolhida e pertencente ao grupo de teatro da escola onde estudava.

 

“O projeto se chamava SOS Cidadania e foi lá que eu fiz a minha primeira peça. Em seguida, eu fiquei com um gostinho de quero mais. Então, na escola eu encontrei um grupo que se chamava mandalas e lá a gente começou a fazer teatro”, confidenciou.

 

O que a motivou a fazer teatro foi o acolhimento que recebeu dos colegas de teatro. “Lá as pessoas não me agrediram com gordofobia. Eu sofri muita gordofobia na infância, e foi com o teatro que eu aprendi a lidar com a minha identidade e com a minha imagem”.

 

Foi através de uma iniciação científica da UFBA que Ludimila chegou até a peça. “A gente passou a investigar mais a dramaturgia do espetáculo. É um espetáculo de 1995 e quando chegou em minhas mãos para fazer a leitura dramática foi bem impactante porque eu como uma uma mulher negra de pele clara me identificava com várias coisas que a personagem principal uma mulher preta retinta enfrentava”.

 

“Eu sou uma ‘artivista’ que é uma artista que não consegue enxergar a arte sem ser através da luta antirracista, da luta contra as diferenças de gênero e, de classe. Então acredito na arte política”, finalizou.

 

Luisa Rodrigues

 

Foto: Maré

 

Mineira só de nascença, Luisa Rodrigues conta que, na verdade, seu território é em Pituaçu e na Boca do Rio. Antes de nascer, sua família se mudou para Minas Gerais para viver “o sonho do concurso público”.

 

Motivada por sua alta sensibilidade, Lua entrou no teatro aos 4 anos. “Eu nunca consegui esconder as coisas que eu sentia e sempre percebi que as músicas me traziam reflexões de tudo que eu queria ter dito e não tinha conseguido dizer. Então, a primeira vez que eu ocupei um palco foi recitando uma música”.

 

“Eu entrei na UFBA no ano pandêmico. Tive quatro dias de aula e entramos no processo da pandemia. A única disciplina que eu consegui ficar foi com o Teatro do Oprimido nesse processo. Foi nessa disciplina que eu percebi que já fazia teatro do oprimido na minha comunidade sem saber”, disse.

 

Para Luisa, o ponto alto da peça é “quando a gente está diante de uma situação que não sabe como agir e, nesse momento, a gente ensaia as formas de agir diante dessas situações para que quando elas cheguem gente tenha uma noção de como a gente consegue agir”.

 

“O que é interessante perceber é que esse é um espetáculo que não é moldado bonitinho. Como estão os outros espetáculos é uma marcação de rua também, porque é pensado para que ele esteja em outros espaços. Além, é claro do teatro porque também é importante ocupar esse espaço elitizado que é o teatro”, finalizou.

 

Zola

 

Foto: Reprodução / Instagram

 

Mesmo tendo sido batizado como Matheus, Zola considera seu nome um pré-nome. Ele gosta mesmo de ser chamado de Zola. Com 24 anos, o ator nasceu no ABC Paulista, em São Paulo, mas atualmente mora em Camaçari.

 

Quando questionado sobre o que o motivou a entrar no teatro, a resposta foi simples: “Não sei”. A verdade é que Zola faz teatro há tanto tempo que não se lembra quando foi que começou. Sua sugestão é que seus pais observaram como ele era inquieto e colocaram ele no teatro como forma de extravasar toda sua energia.

 

“Eu era muito bagunceiro, queria fazer muitas coisas ao mesmo tempo. Eu comecei fazendo uma oficina de teatro que a prefeitura disponibilizava para as pessoas e aí fiquei por bastante tempo. Todo ano a gente fazia oficina e apresentava peças”, contou.

 

Zola destacou que gostaria que as pessoas soubessem que ele é um homem gay, negro, professor e artista. “Eu gosto muito de cantar, dançar e de fazer rap”.

 

RAIO

 

Foto: Júlia Batista

 

Se Matheus Gomes é um jovem tímido, RAIO não sabe nem o que significa a palavra timidez. Com 20 anos e natural de Feira de Santana, RAIO surgiu quando Matheus entendeu que a arte era o caminho que ele queria tomar na sua vida mas ainda faltava coragem para dar o primeiro passo em busca do sonho.

 

Motivada por uma professora, RAIO começou no teatro da igreja. “A professora falou para minha mãe que eu era muito bom no teatro e, eu já gostava muito dessa área. A partir do momento que ela falou isso, a minha mãe entendeu e decidiu me colocar para fazer”.

 

“Eu comecei a fazer teatro no Cuca - Centro de Cultura e Artes da UEFS –, onde eu conheci uma professora chamada Denise Chaves, esse nome é muito importante na minha vida porque ela foi a minha única professora de oficina de teatro que eu tive na minha vida”, declarou.

 

Sua entrada na peça envolve diversas coincidências. RAIO estava prestes a apresentar um teatro sobre Augusto Boal quando descobriu que iria acontecer a remontagem da peça.

 

“Eu estava com um seminário na minha matéria da faculdade que interligava com isso. Já estava pesquisando sobre o autor e eu me interessei muito sobre a didática e o que ele falava. Então eu pensei por que não estudar isso de uma forma prática, então foi aí que eu decidi participar da seleção”, declarou.

 

Thaísa Ingrid

 

Foto: Divulgação

 

Mulher negra de pele clara, natural da Mata Escura e iniciada no Candomblé, Thaísa Ingrid não tem uma relação contínua com o teatro. Ela começou seu primeiro curso voltado ao teatro, em 2015, após isso ela decide largar e e investir em outro curso. Tempos depois, ela se forma Técnologa em Segurança do Trabalho.

 

“Eu queria melhorar a minha apresentação pessoal, a minha oratória. E aí eu encontrei o curso de teatro para poder me desenvolver mais e agora não parece, mas eu era muito mais tímida do que eu sou hoje”.

 

Todavia, mesmo formada, Thaísa não passou muito tempo trabalhando na área. “Fui tentar me desenvolver dentro dessa área, fiz curso de bombeiro civil uma série de coisas. E aí de repente eu não consegui me desenvolver mais, não por não gostar, mas por não ter muitas oportunidades. Era uma área muito masculina e havia muitas exigências, tirar a documentação era muito caro, eu tinha que tirar habilitação e eu não tinha condições”.

 

Sobre a peça, Thaísa contou que a melhor parte é a função pedagógica que ela cumpre. “Não só para as crianças, mas para o adulto também. Por ser uma uma peça anti-racista. Então ela provoca também questionamento e faz com que até as pessoas brancas passem a se questionar. E também se perceber racista em determinados momentos”.

 

Thalia Anatália

 

Foto: Laiane Apresentação / Bahia Notícias

 

Mãe de uma menina, Thalia faz teatro há quase 10 anos. Anatália viu no teatro uma forma de se expressar. “Eu queria me comunicar porque eu sempre falei bastante, sempre fui uma criança muito comunicativa. Busquei outros caminhos e fiz geologia no ensino médio, acabei não concluindo o curso no IFBA, porque eu entendi que eu precisava me expressar”.

 

A aluna da licenciatura em teatro da UFBA da modalidade EAD com polo em Alagoinhas, descobriu que teria teste de elenco para O Pregador pelas redes sociais. O diretor da peça, Licko Turle, enviou a publicação para ela.

 

“Eu já tinha uma experiência anterior com ele. Ele foi o diretor do espetáculo Pele Negra Máscaras Brancas, que foi aqui a quinquagésima nona montagem da CIA de Teatro da UFBA”, relembrou.

 

Para ela, participar de uma peça com o elenco todo negro é uma “responsabilidade e uma tristeza”. “Porque é uma conquista pessoal, mas ao mesmo tempo é uma tristeza porque a gente imagina que em Salvador, que é a cidade mais preta fora do continente africano, deveriam existir mais montagens com um elenco todo preto ou com a maioria do elenco preta. Não só elenco como toda a equipe, mas esse debate é muito mais profundo”.

 

“Eu preciso falar com sua mulher negra de pele clara de cabelo crespo, que tem uma filha e que sou uma pessoa LGBT, que já trabalhei em algumas escolas, já fiz poesias no ônibus, já fiz parte do coletivo de poesia feminina”, finalizou ela.