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Entrevista

Jeffinho fala de amor pelo rádio e lembra terror ao levar tiro: 'Não posso ir agora'

Por Júnior Moreira

Jeffinho fala de amor pelo rádio e lembra terror ao levar tiro: 'Não posso ir agora'
Foto: Priscila Melo / Bahia Notícias

Com mais de 30 anos dedicados ao rádio, Jeferson Silva Oliveira, conhecido como Jeffinho Simpatia, é um dos comunicadores mais queridos do meio. Nascido e criado em Itabuna, iniciou na profissão em 1985 na Musical FM, ainda na cidade de origem. Dois anos depois, mudou-se para Salvador e conseguiu uma oportunidade na Piatã FM. De lá para cá, trabalhou na Morena FM, Bahia FM e, entre idas e vindas, está na Itapoan FM há 16 anos. O apelido, que é uma das suas grandes marcas, veio, como o nome sugere, da forma carinhosa com que interage com seus ouvintes, muitas vezes atribuída às mensagens do dia. “Gosto de ler uma frase de autoestima ou motivação, porque a gente já tem tanta notícia ruim no dia a dia que de manhã eu gosto de passar uma coisa positiva. As pessoas ligam o rádio para dar risada”, lembra em entrevista ao Bahia Notícias. Durante o papo, além da carreira, Jefinho detalhou um dos momentos mais difíceis de sua vida. Em maio de 2017, ele foi baleado no peito durante um assalto dentro do seu carro, no bairro Caminho das Árvores. “Na ida para o carona, pulei, bati a perna em um aparelho celular e o outro caiu no chão. No que eu fui pegar, ele achou que era uma arma e disparou. Tomei aquele tiro e na hora pensei em minha mãe e minha filha. ‘Não posso ir agora, tem essas duas pessoas que dependem de mim’. Veio o medo de pensar que 'de repente chegou a hora de ir', mas eu lutava muito contra isso”, lembrou. Durante o longo processo de recuperação, recebeu apoio de muitas pessoas, inclusive de artistas baianos como Ivete, Claudia e Xanddy. “Em nenhum momento eu me desesperei. Vim me emocionar quando soube que o tiro tinha atingido o diafragma, porque minha preocupação era não voltar ao rádio. Minha voz estava pausada, baixinha...”, explicou. Por fim, ainda falou sobre o sentimento que nutre pelo assaltante e a lição que tirou disso tudo.

 

Ao longo de todos esses anos, você cogitou outra carreira?
Não. Gostava muito de televisão, mas o rádio sempre foi mais forte em mim. Até cheguei a fazer algo de TV em Salvador, na época na Piatã tinha um programa chamado “Para Quebrar”, que passava no Pida. Fazia o papo com a galera do pagode na rua, mas o rádio sempre foi o meu foco.


Nos seus programas, você costuma abrir com uma mensagem. Por quê?
Sempre leio uma mensagem do "Bom dia, Simpatia", às 7hrs da manhã. É um ato de positividade. Além disso, durante as músicas da programação, gosto de ler uma frase de autoestima ou motivação, porque a gente já tem tanta notícia ruim no dia a dia, que quero passar uma coisa positiva. As pessoas ligam o rádio para dar risada. Claro, tem que ter noticia e informação, mas o foco da gente é ser mais entretenimento entre o comunicador e o ouvinte.



Sua carreira está toda trilhada em rádios mais populares da Bahia. É difícil agradar esse público? Tem segredo?
Acho que o grande lance é ser transparente. Tento passar um pouco da intimidade do Jeffinho, não maquiar. Eu sou o que sou no dia a dia. Essa pessoa alegre, sorridente... O público que a rádio tem não é muito exigente não. Eles entendem que o Jeffinho está para transmitir alegria. Não buscam informação. Tem uns que chegam a confessar: "eu prefiro quando você está falando ou brincando do que quando coloca música, porque música a gente pode ouvir a qualquer hora no celular". Eles cobram muito que a gente responda o WhatsApp. É um público muito participativo.

Com tanta interação, já houve alguma situação inusitada?
Já aconteceu de colocar ouvinte ao vivo para dar o "Bom dia" e ele falar: "Poxa, estou com a minha mãe precisando de uma cadeira de rodas". Nesses casos, a gente tenta se mobilizar. Tem também aquelas situações de estarmos em promoção de evento, sorteando ingresso de pista e o ouvinte dizer ao vivo que queria camarote ou ir ao camarim ver o artista.


Por conduzir programas mais voltados para o entretenimento, sofreu algum tipo de preconceito das rádios tidas como “mais sérias”? As que focam em passar informação?

Já. Quando cheguei aqui em Salvador em 1987 existiam brincadeiras dos colegas de outras emissoras, em forma de chacota. Falavam do Axé, que a nossa linguagem era "brega". Acontecia uma sátira por parte deles. Hoje em dia não. As rádios adultas respeitam nosso espaço. Sabemos que cada uma tem sua fatia do bolo.

Atualmente, o cenário musical da Bahia não desperta tanta atenção no Brasil. Você que viveu o auge do Axé. Como percebe essa fase?
Lamento muito, porque tivemos uma música rica. Hoje, percebo esse momento difícil em que os novos talentos não conseguem o impulso, pois estamos enfraquecidos. Acho que quando estávamos no auge, deveríamos ter apostado na união, em fazer projetos juntos. Acredito que a solução é voltar a pensar como era no passado, com produção bacana e mensagens positivas, porém unidos.  

Com toda trajetória, você vivenciou a mudança da tecnologia que impactou na maneira de consumir rádio. Os avanços digitais prejudicaram vocês de alguma forma?
Prejudicar não. O advento da internet foi bom, mas forçou o rádio a ter uma velocidade. Antigamente, não se tocava o disco todo de uma vez. Hoje, os fãs têm como chegar e pegar um artista e conhecer o trabalho completo de maneira dinâmica. Claro que não dá para ir na velocidade que os ouvintes querem, nem que a internet proporciona, mas temos que tocar outras músicas, trazer novidades, ter um equilíbrio. A audiência não mudou muito, pois o próprio Ibope soma ouvintes das plataformas digitais.

Diante de tantas mudanças, qual o segredo para manter a credibilidade por longo tempo?
É ter um trabalho sério, preocupado com o ouvinte. A internet deixou o comunicador meio preguiçoso. Está tudo no computador. Antigamente, a gente tinha que colocar o disco no ponto, olhar a faixa, o locutor ficava mais ágil... Então, agora temos que ficar atentos a tudo, ouvir muitas rádios de fora para pegar referências, estarmos informados do que está acontecendo e quando abrirmos o microfone sabermos o que vamos fazer. Claro que tem que saber improvisar, mas a credibilidade é passar verdade para essa população.


Antigamente existia o mito e até um "fetiche" de associar a voz do locutor com o seu rosto. Hoje, isso se perdeu com as redes sociais. Você chegou a passar por isso? Realmente mudou?

Sim, tinha. Criavam expectativa e, às vezes, o ouvinte que te colocava como príncipe encantado, quando conhecia pensava "não era tudo isso, não" (risos). A pessoa fantasiava a voz bacana do rádio, dizia que pensava que eu era mais velho, assim ou "assado"... Contudo, hoje facilita, porque as pessoas ligam a voz à pessoa, já veem a fisionomia. Então, tirou o brilho da curiosidade, que era legal, pois despertava um imaginário gostoso, mas a comunicação agora está mais direta.

Percebo que você costuma falar muito em Deus. Qual a importância dele para você?
Deus para mim é uma energia que está em tudo o que a gente faz e no ar que a gente respira. Sempre tive muita fé, porque desde pequeno já sentia a presença dele. Na minha vida, Deus sempre se mostrou presente, em momentos difíceis, como o que eu passei recentemente. Pedi a ele que me mantivesse aqui. Talvez, seja difícil entender, é uma coisa mesmo de espiritismo. Fiquei entre estar aqui e estar lá, senti a sensação de ir querendo ficar. Ele me deu essa força, passou a energia e eu estou aqui até hoje.


Você falou desse momento difícil na sua vida... Bom, já tem alguns meses que você superou tudo isso, em outubro voltou a trabalhar. Olhando hoje, como foi aquele dia do assalto?
Foi algo que eu nunca esperei passar na minha vida. Tantos anos morando em Salvador... É óbvio que sabemos dos cuidados que temos que ter em uma cidade grande. Desde 1987 eu tenho cuidado. Nunca tinha acontecido nada comigo aqui até 21 de maio. Estava com minha filha em minha casa e vim no Caminho das Árvores pegar meu primo para comprar uma televisão para meu tio. Quando cheguei no local, às 11 horas da manhã, estacionei, fiquei com os vidros abertos e fui abordado com uma arma do lado de fora. Minha intenção era sair do carro para ele levar, mas ele pediu que eu fosse para o carona, dizendo que iria assumir o volante e me levar também. Na ida para o carona, pulei para o outro banco, bati a perna em um aparelho celular e o outro caiu no chão. No que fui pegar, ele achou que era uma arma e disparou. Eu tomei aquele tiro. Meu primo estava saindo e viu a situação, entendeu que eu estava sendo assaltado, ficou sem reação, mas já interfonou para meu tio, para descer e dar uma ajuda. Quando tomei o tiro, a primeira coisa que eu pensei foi em minha mãe e minha filha. "Eu não posso ir agora. Tem essas duas pessoas que dependem de mim", pensava. Foi muito rápido, mas percebi que continuava vivo. Ele arrastou o carro e comecei a entrar em luta corporal para não levar um segundo tiro. Na briga, com aquela confusão, o carro bateu no da frente. Ele abriu a porta, caímos os dois no chão, eu segui segurando a mão em que estava a arma dele. Gritei meu primo para dar um socorro e ele ficou sem reação. Chegou um policial na porta do prédio, amigo de meu tio e deu um tiro na perna do assaltante. Aí fiquei aguardando o socorro. Demorou um pouco para chegar, mas fui levado para o HGE (Hospital Geral do Estado). Eu só pedia a Deus para continuar consciente porque sabia da importância de ser atendido lúcido. Não sabia o que a bala tinha causado em mim. Quando você leva um tiro, a sensação é de ardor, de fogo, depois que vem a dor. Cheguei no HGE lúcido, mas a pressão baixou muito, fui sendo atendido e não demorou muito para ir à sala de cirurgia. Te confesso que uma das melhores sensações da vida foi abrir os olhos e perceber que estava vivo.



Em algum momento você teve medo?
Veio o medo de pensar que "de repente chegou a hora de ir", mas eu lutava muito contra isso. Não me desesperei, não fiquei afobado, mas não sei onde encontrei forças para lutar com o assaltante depois do tiro. Acho que foi Deus que mexeu comigo. Quando abri os olhos na UTI, disse "eu tô vivo, muito obrigado". Mexi os pés para ver se tinha perdido os movimentos, não sabia onde a bala tinha atingido. Quando o médico falou que havia atingindo o fígado e o diafragma, veio a preocupação e o desespero, porque minha preocupação era não voltar ao rádio e realmente e estava com dificuldade de respiração. Minha voz estava pausada, baixinha, falei "Poxa, será que volto para o rádio? A fazer o que eu amo?". Veio minha mãe, tia, filha e a psicóloga do HGE. Elas conversaram comigo para ter calma e um pouco de paciência, que a recuperação poderia levar um tempo. O tempo todo pensava nos meus ouvintes, que tinha que voltar a ter voz para passar a alegria de manhã. Foi o que me abalou, mas falei "vou buscar essa força e vamos à luta".

Qual o sentimento que fica do homem que atirou em você?
Não tenho nem um pouco de raiva. Lamento por ter ido para esse lado. Pelo que sei, ele tem família, esposa e mãe. Soube que a mãe dele é uma pessoa muito querida lá na Boca do Rio, mas assim, o sentimento de desejar o mal eu não sinto. Queria que ele saísse, após cumprir a pena, com outro pensamento. Talvez, Deus tivesse um propósito para mim depois disso, sei lá. Passei momentos com minha mãe que não vivia há muito tempo. Pude ficar com ela quase cinco meses no interior, me recuperando. Por outro lado, as pessoas comentam: "Você fala tanto de Deus, será que era mesmo para passar por isso?". Eu digo "rapaz, Deus evitou o máximo que acontecesse comigo e eu estou aqui hoje vivo". Não posso achar que naquele momento ele não estava comigo.

 

Durante todo esse incidente, o público baiano torceu muito por você. Imaginava que era tão querido?
Até outro dia eu estava lendo mensagens no direct do Instagram e no WhatsApp. Você quer responder a todo mundo e agradecer aos poucos, né? (risos). Não tinha ideia da minha popularidade. Uma multidão de gente foi para porta do HGE. Vários artistas, como Ivete, Xanddy, Claudia Leitte, Tuca, além dos ouvintes, empresários oraram por mim. Fiquei muito feliz de saber que tive uma corrente positiva das pessoas.


O assaltante te reconheceu em algum momento?
Acredito que não. Senão ele teria falado alguma coisa.

Qual lição que fica?
Já valorizava o ser humano, sabe? O fato de poder dar um abraço, dizer um bom dia, mas acredito que o que a gente está precisando na vida é de mais contato. Às vezes, vamos para os lugares e ficamos no telefone, vemos casais no restaurante que perdem o papo, a conversa... Sempre fui de valorizar isso. Coisas materiais para mim não são importantes e eu voltei com a cabeça mais firme nisso. A gente muda completamente os valores das coisas materiais na vida. Digo que sou um instrumento de Deus e se eu não puder ajudar financeiramente, vou ajudar com a palavra. A lição que fica é essa.