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Entrevista

‘Independentemente do ritmo, eu faço questão do povo’, diz Tierry sobre novo CD

Por Júlia Belas

‘Independentemente do ritmo, eu faço questão do povo’, diz Tierry sobre novo CD
Foto: Jamile Amine / Bahia Notícias
O cantor e compositor Tierry foi a última atração anunciada para o Arraiá Pirraça, que acontece neste domingo (17), no Parque de Exposições. O artista, ex-vocalista do Fantasmão, lançou recentemente o CD “Na Farra Ou Na Sofrência”, em que explora uma mistura da bachata com o arrocha. Agora, no início da nova fase na carreira, Tierry falou com o Bahia Notícias sobre a sua trajetória e o que ele espera da relação com o público. “Graças a Deus, as pessoas que tinham dúvida e se incomodavam, hoje estão comigo. Independentemente do ritmo, eu faço questão do povo. A minha intenção é ir para a periferia, levar o meu arrocha para a periferia. Falei lá na produtora que não quero ser nada engessado, de casa de show. Quero ir para o povo”, afirmou, em conversa na última segunda-feira (11). O cantor revelou ainda que uma das músicas do seu novo disco, “Fartura”, será regravada com o forrozeiro Gabriel Diniz e pode ser lançada como nova música de trabalho. Confira a entrevista na íntegra:
 

Tierry se apresenta no Arraiá Pirraça | Foto: Jamile Amine / Bahia Notícias
 
Você deu uma nova voz ao Fantasmão e compôs músicas de diversos estilos que fizeram sucesso dentro e fora da Bahia. Você pode explicar como foi a mudança para essa nova fase na sua carreira?
É um momento muito especial na minha vida. Foram seis anos à frente do Fantasmão, fazendo parte da suingueira. Antes do Fantasmão, eu sempre curti o lance da MPB. Eu venho de uma família da MPB. Morava no interior, apesar de ser soteropolitano, e voltei para Salvador para cursar Comunicação. Quase fui colega de vocês, fui até o quarto semestre. Daí eu acabei caindo nesse mundo da música. Fiz parte de uma ONG chamada Musicartes, que na época era a Banda Eva, Saulo, Alan Toreba, os meninos faziam parte. Eu estava sempre ali, acabei virando presidente dessa ONG que cuidava de crianças principalmente da Boca do Rio e, através da música, tirava da criminalidade. Então a oportunidade que eu tive, logo no início, foi de cantar pagode. Fui backing vocal no Fantasmão e, com um ano de carreira mais ou menos, com 19 anos, entrei para cantar. Uma enorme responsabilidade de substituir um cantor como o Eddy [EdCity], que até hoje é muito importante para o movimento. Graças a Deus eu tive o carinho e o abraço das pessoas nesses seis anos. Enquanto eu ainda estava no Fantasmão, comecei a fazer músicas para grandes artistas. Psirico, Ivete, Pablo... E o arrocha sempre foi muito forte na minha vida. Os principais sucessos do Fantasmão, que saíram da Bahia, foram com o arrocha. "Quebrar e Arrochar", "Pra Esquecer Essa Paixão", "Aceita Que Dói Menos" e o primeiro pagode com arrocha da Bahia, que foi "Amor de Motel". Não foi uma coisa que foi ao léu, que eu disse "ah, vou mudar". E neste momento eu estava me sentindo muito ligado ao sertanejo. A música nova de trabalho de Jorge & Mateus é minha, "Vai Vendo" do Lucas Lucco também, "Meu Coração É Seu", de Claudinha e Luan. Então eu sempre estive muito presente neste meio de sertanejo, arrocha, e eu sentia essa necessidade. É isso que eu quero fazer. Foi isso que aconteceu. A mudança foi proveniente disso.
 
Então você já estava seguindo esse caminho...
Eu quis me jogar mesmo. Poxa, estou fazendo muito pagode com arrocha, vou logo para o arrocha. Aí acabei indo para o arrocha.
 
E como está essa nova fase? Nas redes sociais, o CD já está bastante comentado. Como você vê essa resposta do público?
Eu achava que ia demorar mais, sabia? Saí de um projeto consolidado. Foram seis anos de carreira. Claro que tem as desconfianças, os temores, afinal é uma coisa nova. Mas eu lancei o CD e chamei os principais nomes do arrocha hoje na Bahia, que são o Tayrone e o Pablo. Fiz uma música que homenageia tanto o Tayrone quanto o Pablo e o Silvanno Salles, que são os três grandes nomes. Eu consegui atingir o público de uma forma tão grandiosa que eu fiquei muito feliz. Foi "Chorência", meu primeiro single, que foi inspirado no povo. Por esses dias, eu vi em uma rede social que, no principal grupo em que as pessoas comentam sobre pagode, as pessoas estavam me dando apoio e curtindo um vídeo que postaram lá. As pessoas dizendo "o povo abraçou ele, vamos dar apoio a ele também". Isso foi muito bacana, fiquei muito feliz porque, de verdade, ter o apoio do povo é muito importante. Hoje, as pessoas não aceitam mais imposição. A internet está aí. Antes, se colocava a cara na televisão, diziam logo que estava rico, fazendo sucesso. Hoje, você tem que estar bem na internet, bem com o povo, sem imposição. Nas redes sociais, o comentário é geral e o alicerce que eu tenho com a Penta, que está me representando. Agora vou participar desse grande evento, o Arraiá do Pirraça, e eu estou muito feliz com essa fase maravilhosa. Fui abraçado pelo povo, isso que é o mais importante.
 

Cantor lançou o disco "Na Farra Ou Na Sofrência" | Foto: Jamile Amine / Bahia Notícias
 
Mas você pode explicar o que é a "Chorência"?
Estava no Rio de Janeiro com meu amigo Magno [Santana], que fez "Lepo Lepo". A gente estava em um apartamento na Barra da Tijuca e começou a fazer música. Em Salvador, a gente tem um amigo que era sócio da Vem Que Vem, a banda de arrochadeira que nós tínhamos, e ele disse "aqui tem muita gente que fica na chorência". A gente nunca tinha ouvido essa gíria, mas ficou na cabeça. Magno fez um refrão no carro, sem pretensão, e eu guardei aquilo para mim. Lá no Rio de Janeiro, eu comecei a fazer a música. Chamei Magno, a gente aprimorou. Na época, a gente estava fazendo música para Jorge & Mateus e era a cara deles. A gente correu, registrou, mas eles já tinham fechado o disco "Os Anjos Cantam". Então eu falei que ia gravar para o meu disco e ia ser a minha primeira música de trabalho. Quando a pessoa está na festa, comendo a água dela e perdeu o amor, a pessoa acaba não desabafando. Aquilo vai crescendo e, a partir do momento em que você bebe, extravasa, chora, aquilo começa a diminuir e, como tudo na vida, passa. A chorência é isso.
 
Em dezembro, quando você deu adeus ao pagode baiano, pensou em fazer uma despedida do pagode?
No Carnaval, eu anunciei que ia sair do Fantasmão. Fiz quatro shows que foram os meus últimos quatro shows com o Fantasmão. Quando eu falei "adeus" ao pagode, as pessoas já sabiam. Muita gente sentiu, mas eu percebi que algumas pessoas se incomodavam um pouco com as minhas misturas. Eu senti que, para as pessoas que eram super fãs de pagode, 100% pagode, surgia um pouco de dúvida. Graças a Deus, as pessoas que tinham dúvida e se incomodavam, hoje estão comigo. Independentemente do ritmo, eu faço questão do povo. A minha intenção é ir para a periferia, levar o meu arrocha para a periferia. Falei lá na produtora que não quero ser nada engessado, de casa de show. Quero ir para o povo.
 
Nesse CD, você tem parcerias com Lucas Lucco, Léo Santana, Tayrone e Pablo. Como foi o processo de produção desse disco?
Eu trouxe algumas coisas que estouraram no Fantasmão e que eram o arrocha, como "Quebrar e Arrochar", "Para Esquecer Essa Paixão" e "Aceita Que Dói Menos", que Pablo regravou comigo. Já tinha músicas que estavam prontas, parcerias com o Magno e com o Flavinho. Falei que precisava de músicas para o meu disco e músicas boas, precisava selecionar. A gente acaba fazendo música para todo mundo e esquece da gente. Então eu comecei a fazer a poesia de "Top de Linha", os caras me ajudaram. "Fartura", que, em primeira mão para vocês, vou gravar com o Gabriel Diniz em breve. São 13 músicas no disco e cada uma foi feita com muito carinho, porque eu fiz as coisas para que dessem certo. Graças a Deus, está dando certo.
 

Artista deixou o Fantasmão após seis anos | Foto: Jamile Amine / Bahia Notícias
 
E um dos seus primeiros shows foi em Nilo Peçanha, cidade em que você cresceu. Como foi apresentar um novo projeto para um público que já te conhece?
Posso te falar uma coisa? As pessoas lá tinham muita desconfiança disso. As pessoas do interior se prendem muito. Se você já faz parte de uma história, as pessoas às vezes não querem muita mudança. Eu ganhei muito respeito no interior porque fui cantor do Fantasmão, mas quando eu mudei, quis estar bem. Para a gente fazer sucesso em qualquer lugar, precisa estar bem na casa da gente. Meu primeiro show foi em Valença, que é perto de lá e foi onde eu estudei. As pessoas têm um carinho muito grande por mim, e quando eu fui fazer o show em Nilo, coloquei a música nas duas principais rádios de lá do interior. A música bateu o primeiro lugar, as pessoas começaram a ligar para pedir. Quando eu cheguei lá e falei "Chorência", as pessoas começaram a gritar como se fosse um gol da seleção brasileira. Foi mágico. Aquilo ali só me deu forças, foi um combustível e eu trouxe isso para mim. Hoje está acontecendo tanta coisa bacana por isso. Claro que uma coisa que tem me dado um acesso muito grande é o lance da minha composição, de ter músicas com os grandes artistas, mas a partir do momento em que as pessoas conhecem o cantor Tierry, isso tem sido um complemento. Nos vídeos, na internet, as pessoas têm gostado bastante. Muita gente falou que achava que eu precisava ir para um ritmo que pudesse mostrar um pouco mais a minha voz. Porque o axé e o pagode são ritmos que a gente até brinca: "cara, a gente canta para o povo, mas no trio elétrico a gente esquece de cantar". Cantor de pagode e axé é animador, é aquela coisa de botar a galera para pular. Eu sentia um pouco de falta disso que o arrocha está me proporcionando, que é cantar mais ao pé de ouvido das pessoas. A gente sempre faz isso. Sempre me reúno com Levi [Lima], com Tomate, para tocar violão e faz uma música mais lenta, saindo do fervo. Eu coloquei um pouco desse fervo no meu disco, porque o arrocha é um pouco passivo, aquela coisa mais dançante, então eu coloquei um pouquinho de Bahia e está muito dançante.
 
Na Micareta de Feira, você cantou praticamente com todos os artistas que passaram pelo Maneca Ferreira. Como foi a experiência de poder se apresentar com tanta gente diferente em um único evento?
Foi maravilhoso. As pessoas passavam e chamavam. Alinne Rosa, Claudia Leitte... Claudinha fez uma mega declaração, amo Claudinha, uma pessoa maravilhosa. Gravou três músicas minhas: "Cartório", "Foragido" e "Abraço Coletivo". Passou Levi, meu amigo irmão, cantamos "Brindar À Vida", música do DVD dele. Cantei com Tayrone em um camarote, com Márcio [Victor] em outro camarote. São amigos queridos que eu guardo no meu coração, que têm me dado força. Márcio me chamou para fazer parte do ensaio que ele fez no Cais Dourado, mas eu tive que fazer um show em Feira de Santana e acabei sem tempo de ir lá.
 

Tierry garantiu que quer levar música para a periferia | Foto: Jamile Amine / Bahia Notícias
 
Você lançou o novo CD recentemente, mas estamos a pouco mais de um mês do São João. Tem mais coisa nova por aí, talvez um forró?
Eu sou um cara que não gosta de rótulos. Acho que o sertanejo se dá tão bem porque ele canta o axé, canta o reggae, tem essa atividade. Estava até falando com Tomate essa semana que eu não gosto de me rotular. Por que é Tierry na farra e na sofrência? Porque eu chego no meu show e canto pagode, canto "Homem Não Chora" e, claro, canto o meu repertório, que é a bachata com o arrocha, o estilo que eu sigo. Eu acho que você tem que ter um foco, pode ser tudo, mas tem que ter um foco. E o meu foco hoje é a bachata com o arrocha, que é 100% do meu disco. No São João, eu vou continuar com a "Chorência", vou passar mais uns seis meses tocando. Talvez a gente mude para outra música, "Top de Linha" ou "Fartura". Para o São João, o que eu posso dizer é que o repertório está maravilhoso, muito forte. A gente não deixa as pessoas respirarem no show. A gente fez um lançamento aqui no Buteco do Gaúcho que foi um sucesso, quase mil pessoas na casa. Em Feira de Santana também. Esse disco está recheado de sucessos. Eu fui muito feliz no Fantasmão, mas há muito tempo não me sentia tão feliz e tão realizado.
 
Já que você está tão envolvido com vários setores da música aqui da Bahia, o que você acha do momento da música baiana? Existe uma crise?
Eu tenho uma opinião muito direta com relação a isso. Acho que tudo é fase, a música da Bahia está em uma fase. Se você for reparar, o sertanejo teve uma época em que você acordava cedo e o sertanejo só tocava na rádio entre as 4h e as 6h da manhã. Acordava de manhã cedo com o galo cantando para ir para o colégio, porque morava no interior, e ouvia só ali. O sertanejo começou a crescer com essa coisa do universitário, ele se tornou jovem. O sertanejo já era uma música muito respeitada e, com o universitário, ficou mais jovem. O sertanejo foi tipo um vírus, sofrendo mutação com outros ritmos. A música da Bahia não passa por uma crise. O axé passa por uma crise, o pagode passa por uma crise. Os seis últimos hits do país foram da Bahia. "Liga da Justiça", de J. Telles e Márcio Victor; "Rebolation", de Léo Santana e Nenéu; "Domingo de Manhã", de Bruno Caliman, baiano de Teixeira de Freitas; "Balada", de Cássio Sampaio; "Ai Se Eu Te Pego", Antônio Dyggs, de Feira de Santana; "Lepo Lepo", de Magno Santana e Filipe Escandurras. Os últimos hits do Brasil foram da Bahia. A música daqui continua muito forte, mas claro que existem parâmetros e coisas que aconteceram e fizeram o axé e o pagode enfraquecerem. Isso é nítido e todo mundo sabe. Mas eu acredito que tudo é uma fase e eu espero que passe logo, porque a nossa música da Bahia é o nosso maior bem. Sem dúvida, precisa passar por uma renovação, mas vai voltar. A gente está aqui trabalhando também para isso.