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Entrevista

Titular da Secti, Adélia Pinheiro busca 'amadurecimento' para futura filiação partidária - 15/07/2019

Por Matheus Caldas

Titular da Secti, Adélia Pinheiro busca 'amadurecimento' para futura filiação partidária - 15/07/2019
Foto: Paulo Victor Nadal / Bahia Notícias

Ex-reitora da Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc), Adélia Pinheiro resolveu aceitar o convite do governo estadual para assumir a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação (Secti). Em entrevista ao Bahia Notícias, no entanto, a titular da pasta afirma que pensa em, futuramente, se filiar a algum partido político para concorrer em eleições. “A militância político-partidária específica com filiação, eu digo que tudo tem um tempo para acontecer”, indica.

Dentro outros assuntos, Adélia falou sobre a relação do governo do estado com as universidades estaduais após o período de greve das instituições e dos cortes federais em bolsas e investimentos na área de Ciência e Tecnologia. "No cenário atual, as assimetrias tendem a se perpetuar, o que, obviamente, não contribui para o desenho e fortalecimento do desenvolvimento dessas regiões [Norte/Nordeste/Centro-Oeste]”, preocupa-se.

Ao longo da entrevista, a secretária também fala sobre os investimentos estaduais na área, a atuação da Secti junto às instituições de ensino, a relação da pasta com a Secretaria de Educação (SEC) e o modelo de gestão do Parque Tecnológico da Bahia.

 


Investir em ciência e tecnologia sempre foi um problema no Brasil e se agravou muito recentemente, com o corte de bolsas e investimentos na área. Como a senhora avalia os cortes promovidos pelo governo federal e como isso influencia nos financiamentos de bolsas e pesquisas?

Efetivamente nós temos o funcionamento do Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia. Ele está amparado no apoio e nas politicas públicas definidas, principalmente a partir do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC). A diminuição no orçamento concedido na área repercute na diminuição do apoio da chegada desse auxilio a todo o sistema. No Brasil, as bolsas em boa parte se destinam aos programas de pós-graduação, à formação inicial cientifica, e às bolsas de apoio aos pesquisadores. E quando você tem uma diminuição do número de bolsas do financiamento, consequente vai ter o impacto sobre todo o sistema. Especificamente quando tratamos das bolsas de apoio aos programas de pós-graduação stricto sensu - mestrado e doutorado -, teremos um impacto subjacente à diminuição do número de bolsas, que é exatamente a diminuição da produção científica. Se não temos bolsas, os programas passam a ter dificuldades na permanência dos mestrandos e doutorandos, eu terei uma diminuição no volume do conhecimento científico produzido e, ao mesmo tempo que, muito provavelmente, colheremos também uma diminuição de mestres e doutores formados. Desta forma, quando projetado para adiante, quem milita na área de CTI [Ciência, Tecnologia e Inovação], localiza que colheremos resultados muito ruins para a nação, uma vez que a nação passa a produzir menos ciência, menos desenvolvimento tecnológico e produz um menor numero de pessoas de alta qualificação em mestrado e doutorado.

E os impactos aqui no estado podem ser mais profundos?
A Bahia tem um conjunto de programas de pós-graduação stricto sensu bastante pujante e sólido, devo dizer. Dentro do Nordeste, talvez seja o estado com o maior número de programas implantados e consolidados em entes como as universidades federais e estaduais, e algumas instituições privadas de pesquisa mantém bons programas, de boa qualidade. Portanto, o impacto aqui também se fará e também tem ocorrido com prejuízo sempre para nosso estado, nossa região e nosso país como um todo. Não podemos deixar de mencionar: toda vez que se discute o sistema nacional de CTI, identificamos que Norte e Nordeste são regiões do país que têm um menor número de programas e ainda uma produção de conhecimento menos sólida e quantitativamente menor quando comparadas a Sul e Sudeste. Nos vários planos voltados para o plano da ciência e tecnologia, e também para a consolidação da pós-graduação stricto sensu, vários planos nacionais enfrentam e reconhecem que há uma assimetria Norte/Nordeste/Centro-Oeste e Sul/Sudeste, existem políticas que vinham sendo desenhadas justamente para favorecer a diminuição das assimetrias macrorregionais do Brasil. No cenário atual, as assimetrias tendem a se perpetuar, o que, obviamente, não contribui para o desenho e fortalecimento do desenvolvimento dessas regiões, e também penalizam a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico enquanto instâncias de respostas a perguntas que têm relação com cadeias produtivas próprias dessas regiões, questões climáticas próprias dessas regiões. Enfim... clima, relevo, potencial energético. Aquelas características que são próprias dessas três regiões do país.

Uma das funções da Secti passa pelo incentivo à produção intelectual e a promoção de iniciativas de fomento à pesquisa e desenvolvimento, especialmente via Fapesb. Porém, o orçamento para a área nunca é alto. Não será um contrassenso de aliados do governo estadual atacarem cortes de bolsas quando o próprio governo baiano não investe tantos recursos no setor de pesquisa e desenvolvimento?
Há que fazer a diferenciação de qual é o papel do nível federal e do nível estadual. O financiamento da Fabesp está definido em lei como 1% da receita liquida tributária, e enquanto orçamento isso vem sendo cumprido. Entretanto, o desenvolvimento e as ações próprias da Fapesb que tem relação com a liberação financeira de recursos não vinham sendo feitas por algumas outras questões, mas estamos fazendo a recuperação disso com o recente equacionamento e aporte de recursos com o pagamento dos compromissos da Fapesb, de forma que neste mês já conseguimos fazer o lançamento de dois editais, com previsão de que, no segundo semestre, outros editais de apoio à pesquisa sejam lançados.

Qual a situação do atual Parque Tecnológico da Bahia? É mais um elefante branco estatal?    
Não. O Parque Tecnológico não é um elefante branco. Ele está em funcionamento e tem cerca de 30 empresas entre residentes e incubadas. Atualmente, estamos fazendo o levantamento da situação, adimplência dessas empresas, para planejamento, lançamento de edital para empresas residentes e incubadas neste segundo semestre. E, paralelamente, acontece a discussão, que ainda é interna, mas ainda vai envolver outros atores, de modelo de gestão. Efetivamente, os parques tecnológicos pelo Brasil que vem avançando com maior celeridade não funcionam sob aceleração direta. Esse modelo, em alguns momentos, entra em conflito com a dinâmica própria de um parque tecnológico. Então, estamos discutindo um modelo estão que permita ao Parque funcionar com outro modelo, seja em cogestão, ou em parceria publico-privada. A expectativa é que, no mais tardar no primeiro trimestre de 2020, esse segundo passo esteja dado e possamos caminhar de forma célere com o Parque Tecnológico.

Apesar das universidades estaduais não terem vinculação com a Secti, a senhora não deixou de acompanhar a paralisação recente, que suspendeu parte do calendário acadêmico delas. Como fica a relação do governo estadual com as universidades estaduais, sobretudo após a greve das instituições?
As universidades estaduais estão vinculadas à SEC, mas a Secti, como uma secretaria transversal, mantém também importantes vínculos e apoios com as universidades estaduais, seja através das bolsas de iniciação cientifica, mestrado, doutorado, apoio à pesquisa em desenvolvimento tecnológico, enfim... Essa relação se mantém permanentemente. É claro que com a greve ocorrida nas quatro universidades estaduais, com a repactuação de calendário acadêmico, de atividade docente, que são ações próprias das universidades e acompanhadas pela Secretaria de Educação, mas, efetivamente, não há um impacto sobre a produção cientifica e o desenvolvimento tecnológico. E, portanto, as ações que a Fapesb e a Secti apoiam mantêm um desenvolvimento contínuo. 

Como ex-reitora da Uesc, qual o posicionamento diante da paralisação dos professores? As reivindicações eram legítimas? Qual o tipo de influencia disso na relação com as universidades neste período pós-greve?

A relação estabelecida entre a Secti, a Fapesb e as universidades não sofreu nenhuma alteração no período de greve, até porque o maior conjunto de atividades se dá entre dirigentes. As demais atividades estão subordinadas a relatórios de atividades. E, como eu já disse, ocorreram normalmente durante este período. Em relação ao movimento de greve, é um movimento com decisão da categoria. Um movimento da representação estabelecida de forma legítima e que teve um desfecho a partir do posicionamento do governo do estado, da representação e negociadores do governo do estado, sendo avaliado pela categoria como um posicionamento favorável às reivindicações da categoria, de forma que o movimento foi efetivamente encerrado.

O ex-secretário da Secti, Rodrigo Hita, defendeu que a pasta deveria hospedar o orçamento destinado às universidades estaduais – hoje isto é responsabilidade da SEC. Qual sua opinião sobre o assunto?

Entendo que universidades estaduais fazem parte, a principio, do sistema estadual de educação superior. Esse sistema está sob vinculação da SEC, do conselho estadual de educação, que fazem parte de um conjunto. O relacionamento das universidades estaduais e das demais universidades e instituições de ciência e tecnologia presentes no território estadual se fará com a Secti e com a Fapesb. A ação finalística de uma universidade não é exclusivamente CTI, mas, além disso, envolvendo também a educação superior e a extensão. Portanto, diz respeito à atuação da SEC em maior volume, ainda que envolva também a ação finalística da Secti. Mas eu entendo que o papel precípuo das universidades estaduais, e considerando ser estrutura de Estado, e considerando ainda que a Secti se relaciona com um conjunto muito maior de instituições que produzem CTI, que vai muito além das universidades estaduais, envolve institutos federais, universidades federais, entidades privadas com ou sem fins lucrativos, um conjunto de outros atores bastante mais amplo, entendo que essa vinculação de organograma, ela se dá de forma muito mais sólida na direção da SEC.

A senhora acha que houve uma personificação do projeto de lei que acabou batizado de Lei Adélia Pinheiro?
Houve uma personificação, e não soube exatamente porque - talvez a questão temporal tenha contado para isso. Entretanto, entendo que existem na atualidade cerca de cinco secretários de estado que são professores de universidades estaduais, e que podem ter uma forma diferente de se relacionar a partir de suas carreiras e do cuidado com suas carreiras a partir desta alteração legal. Entendo que esta alteração não ocorre em prejuízo das universidades, uma vez que reconhece que um docente, um membro da carreira do magistério superior do estado da Bahia, ele pode e tem condição para contribuir e colaborar com o Executivo estadual a partir dos seus saberes e suas vivências, e poder qualificar com sua atuação as políticas públicas estaduais.

A senhora era uma ilustre desconhecida do mundo político até ser indicada ao posto de secretária de Ciência, Tecnologia e Inovação. Já foi tocada pela mosca azul da política ou pretende permanecer como uma figura mais técnica?
É importante pontuarmos. Eu não tenho mesmo uma militância político-partidária. Não tenho filiação partidária. Mas temos uma militância política desde quando nasci. Eu sou filha de professores, fiz o curso superior em universidade pública, com residência, mestrado, doutorado, todos realizados em universidade pública, dentro da minha área de formação que é Medicina, de Saúde Coletiva. Não há como não militar politicamente. Eu conclui meu curso de Medicina e realizei a residência em Medicina Social justamente no período em que a sociedade brasileira discutia a reforma sanitária, discutia o que teríamos de previsão na Constituição em gestação. Fazia parte de todas as discussões do SUS e como viabilizá-lo. Ao lado disso, sempre estive na defesa da educação pública de qualidade e dos direitos de cidadania. Entendo que, sobre qualquer coisa, quando militamos em área publica, e essa foi a minha opção... Sou professora da universidade por concurso, membro do quadro de magistério superior da Bahia por opção... Defini meus caminhos para ser uma servidora pública e assim me mantive. Nunca tive vínculo privado ao longo da minha vida. E, como agente pública por escolha, a militância política sempre esteve comigo. E não é diferente ocupando o cargo de secretaria. E assim me mantenho: em militância política, em prol e na defesa dos direitos de cidadania, sociais e humanos, entendendo que a ciência, tecnologia e inovação estão e sempre estarão a serviço da melhor igualdade social, do exercício da empla e da sempre presente cidadania, e de um estado que se faça protetor e executor e das políticas sociais

Mas essa militância poderia se estender eventualmente para formalizar uma candidatura a vereadora, deputada ou algo do tipo?
A militância político-partidária fiz no sentido de me colocar aliada àqueles partidos que se colocam em defesa dos direitos de cidadania, do respeito à instituição democrática e republicana, à democracia. Então, sempre estarei aliada ao partido que se coloca desta mesma forma. A militância político-partidária específica com filiação, eu digo que tudo tem um tempo para acontecer. A gente vai seguir amadurecendo o caminho e percurso como agente público. Ainda está em amadurecimento.