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reggae music
“Reggae é música, reggae é som, beleza pura”, é o que diz Edson Gomes, nos versos da canção da Rastafary, de 1988. A definição simples representa um dos movimentos culturais mais potentes da contemporaneidade. No domingo, 11 de maio, é comemorado o Dia Nacional do Reggae, data em que, desde 2012, os apaixonados por reggae music homenageiam o percursor da sonoridade, o cantor e compositor jamaicano, Bob Marley, falecido nesta data.
A comemoração é válida. O gênero influenciou o surgimento de grandes artistas e bandas no país através do “roots” e sua mensagem de paz, como Edson Gomes, Remanescentes, Ministereo Público Sound System, Natiruts e até mesmo Skank. Ritmo negro e de origem caribenha, o reggae se expandiu no Brasil e na Bahia ganhando ainda mais referências e contornos específicos.
O maior símbolo do movimento, o cantor Bob Marley, iniciou sua carreira em Kingston, capital jamaicana, a partir dos anos 60, ao lado da banda The Willers. No entanto, foi nos Estados Unidos dos anos 70, que a lenda começou a tomar forma, com o álbum solo “Natty Dread”, com um tom militante e provocativo. Nesta reportagem, o Bahia Notícias revisita essa história, nascida na Jamaica.
A SEMENTE
"Don't worry about a thing, 'cause every little thing gonna be all right / Não se preocupe com nada, porque cada pequena coisa vai ficar bem", era o que cantava Bob Marley quando o ritmo chegava ao Brasil. Quem conta essa história é o músico, produtor cultural e pesquisador do reggae, Fabrício Mota. Ao BN, o especialista e entusiasta do gênero dá detalhes sobre o processo de importação da música caribenha no Brasil dos anos 70.
“O reggae chega no Brasil pela zona portuária, pelo rádio, é um processo de literal contaminação da influência da música jamaicana, dos discos, da música caribenha, particularmente da música de Bob Marley, que vira um dos maiores ícones da cultura popular no mundo”, relata. “[O reggae] É um dos gêneros mais importantes da cultura brasileira, porque ele não é mais gênero jamaicano. Ele nasce na Jamaica, mas as sementes dessa planta vão florescer de outro jeito no Brasil”, afirma.
Em seu livro, “Guerreir@s do terceiro mundo”, publicado em 2012, o pesquisador detalha que a formação de uma nova cena reggae se dá no início dos anos 80, ao lado do fortalecimento do próprio movimento axé music.
“Nos anos 80 já tinha uma presença muito grande do reggae music no subúrbio de Salvador, já tinham pessoas que cultivavam os dread lockes e, ao mesmo tempo, você tem um movimento na Bahia que é a de profissionalização musical, que vai virar a indústria da música. Então nesse processo de profissionalização e gravação é que a gente vai ter um espaço para que essa música reggae gravada apareça”, sucinta.
E ela aparece, especialmente utilizando três regiões como polos e emissão e fortalecimento. “A grande particularidade do reggae baiano é que ele tem uma força muito grande no Recôncavo, tem uma força muito grande no interior da Bahia. Existe uma tríade que envolve Salvador, como capital, o Recôncavo e Feira de Santana. Os primeiros artistas de reggae da Bahia vão surgir nessas localidades ou vão transitar por elas”, revela.
Entre esses artistas que se destacaram a partir dos anos 70, estão Edson e Timtim Gomes (falecido em 2021), ambos nascidos em Cachoeira, no Recôncavo; o soteropolitano Lazzo Matumbi e o feirense Jorge de Angélica (falecido em 2023). As bandas Arembepe - liderada por Chico Evangelista - e Remanescentes também participaram do movimento.
No entanto, mais do que um gênero musical, a reggae music carrega, desde sua criação, um discurso atrelado a justiça social, combate ao racismo e conotação religiosa - especialmente como uma reinterpretação bíblica baseada no pan-africanismo, ideologia de centralidade na cultura africana e afro-diaspórica.
Esse cenário é reforçado por Moura: “A grande relevância dessa música está, para além do fonograma, dos discos e das gravações, no impacto dessa sonoridade e toda carga estética, política, de direito civil”, define.
A ÁRVORE QUE CRESCE NA BAHIA
O impacto nesse discurso militante no cenário baiano fica claro na música “Acorde, levante e lute” de Edson Gomes: “Tens o direito de ser livre, ninguém nesse mundo pode impedir; Porém não espere por esse direito. Acorde, levante, lute”
E essa luta, que começou no Caribe jamaicano, se torna ainda mais complexa e contundente na Bahia entre os anos 80 e 90. O nascimento e crescimento dos blocos afro e da luta contra o racismo após a redemocratização do país, permitiram que os artistas baianos encontrassem uma conexão entre os ritmos brasileiros e a sonoridade jamaicana.
O especialista afirma: “[Em] Como ela contaminou os movimentos dos blocos afro a ponto de surgir, na Bahia, um novo movimento que se batizou de samba reggae, que mistura células rítmicas e a influência sonora da Jamaica, mas sobretudo as temáticas: a ideia de empoderamento negro, pan-africanismo e tudo isso vai parar nos blocos Muzenza, Olodum, Malê Debalê”, afirma.
O samba-reggae, citado pelo pesquisador, é um gênero musical baiano criado e difundido pelo maestro Antônio Luís Alves de Souza, conhecido como Neguinho do Samba. O novo ritmo se faz a partir da mistura do samba, gênero tradicional da Bahia, e seu percussionismo com a influência de Bob Marley. A experimentação deu tão certo que passou a dar o tom da musicalidade baiana a partir disso.
Para Fabrício, essas mudanças apenas reforçam a soberania do reggae. “O reggae tem se afirmado, cada vez mais, como um dos gêneros mais importantes do mundo contemporâneo, dos últimos 60 anos. Ele tem crescido, se ramificado e se tornado base intelectual para outros gêneros musicais”, relata. “Eu acho que essa metamorfose tem pontos muito positivos porque além do processo de mistura, é um processo de espalhamento dessa tradição”, completa.
Além do samba, o reggae também se mesclou com outras influências rítmicas no Brasil e na Bahia, como o rock, bossa nova e até mesmo o pagode.
O entusiasta revela, no entanto, que, “quando um gênero ganha uma proporção continental, transcontinental, é claro que muitas vezes essa mensagem vai caminhar para outras direções. Ela vai ganhar mais embranquecimento e enfraquecimento.”
Em sua obra, o produtor cultural ainda denota que isso se demonstra especialmente no processo de desvalorização dos seus artistas, a exemplo de Edson Gomes. Um dos únicos nomes verdadeiramente reconhecidos do gênero, ele e outros artistas sofrem com a falta de creditação e apropriações violentas da sua arte e estética.
“O reggae é um gênero que sofre um processo de apagamento. O reggae brilha tanto que você sai na porta da sua casa em qualquer dia da semana e tem alguém ouvindo reggae, mas não há interesse de financiar um gênero que semeia a paz, a diferença e a diversidade”, relata Moura.
OS FRUTOS
Nas palavras de Edson Gomes, o reggae é “uma árvore bonita, que precisa ter os seus cuidados”. É mediante o crescimento desta planta que os frutos são colhidos com novos artistas e com o fortalecimento desta potência rítmica.
Influenciada pelo “Roots, Rock, Reggae, this a reggae music”, cantado Bob Marley e The Wailers, em 2005, a cantora e compositora baiana Danzi se denomina, em sua bio no Instagram, Roots Rock Reggae Queen - Rainha do roots, rock e reggae - uma fusão do reggae e da rebeldia na música.
Presente na cena do reggae soteropolitano, a intenção de Danzi com a fusão é trazer um toque de rebeldia com a tradição. “Sempre identifiquei na música um poder muito grande, de alcançar pessoas, de chegar em lugares que até a gente mesmo não consegue ir fisicamente”, explicou Danzi.
Para a artista, que também é professora, a música e o reggae tem o “poder de educar, de elevar as pessoas, de trazer espiritualidade, não necessariamente associada a uma denominação religiosa”. Sua conexão com o gênero partiu do movimento cultural e religioso Rastafari. O movimento, que ganhou notoriedade com a música reggae e Bob Marley, também teve origem na Jamaica e defende a importância do retorno dos negros à África para sua libertação.
“Eu cheguei até o Reggae dessa forma, eu conheci Reggae e o Rastafari, ao mesmo tempo, e o Reggae me ajudou a compreender melhor sobre o que é Rastafari e o Rastafari me ajudou a compreender o que é o Reggae”, explicou.
Para Danzi, apesar do poder transformador do Reggae, o gênero não possui tanta popularidade na mídia ou espaços onde a música possa ser apresentada. “Eles [a mídia] não têm interesse de veicular esse tipo de mensagem [de paz], né? Então, termina que se prioriza uma mensagem mais leve que falam somente de amor ou somente da parte boa de tudo”, justificou.
POTÊNCIA CULTURAL ATIVA
Apesar da falta de financiamento privado e público, o reggae na Bahia segue mobilizando artistas e fãs em todo o país. A República do Reggae, um dos eventos mais tradicionais do calendário de eventos soteropolitano, é o maior evento do gênero na América Latina e já chegou a reunir mais de 20 mil pessoas em Salvador.
No entanto, para os artistas iniciantes e independentes, um palco por não é o suficiente. É o que relata a artista soteropolitana, Danzi. “As possibilidades da gente enquanto artista de reggae se movimentar em Salvador ainda são escassas. Eu acho que o espaço que se oferta para o reggae ainda precisa ser melhorado, porque a música reggae é uma música que é que as pessoas gostam, ela só não tá na mídia, ela só não é popular. Não é uma música popular, mas deveria ser porque a sociedade se beneficiaria muito”, afirma a cantora.
A artista destaca ainda que “em muitos festivais, quando a linguagem não é exclusivamente reggae, eles focam em artistas de outra linguagem e termina que só vai ter, no máximo, um representante”, sucinta.
Para Moura, essas e outras precariedades no cenário musical do reggae na Bahia são acentuados pela falta de apoio da política estatal. Ele cita ainda o exemplo da Praça do Reggae, no Pelourinho, que segue fechada desde 2021.
“Eu penso que a gente precisa, especialmente, lutar e investir para que as políticas públicas sejam direcionadas, valorizem o gênero e reconheçam os sujeitos que são autores e autoras desse gênero. E a gente, na Bahia, sofre porque a gente herdou um modelo de indústria cultural que não gerou renda, ele gerou o enriquecimento de uma pequena parcela. Então você suga o elemento da cultura negra e exclui a pessoa negra”, destaca.
“Não é que eu sou otimista, mas eu acredito que o reggae tem uma força muito grande e a gente precisa, cada vez mais sensibilizar, valorizar e espalhar essa mensagem”, conclui.
Neste domingo, dia em que o gênero é celebrado, ocorre o Festival Reguetho. A promessa do reggae, Danzi, e outros artistas como a Banda Cativeiro e os cantores Mavi, PC. do Reggae e JC. do Reggae estão confirmados no evento, que ocorre às 14h, no Largo Tereza Batista, no Pelourinho.
O cantor e compositor havaiano Mike Love desembarca pela primeira vez em Salvador nesta sexta-feira (1), para participar do projeto "Happy Reggae" da banda Adão Negro, que acontece no Coliseu do Forró, no Rio Vermelho, às 22h.
O cantor de reggae está fazendo sua primeira visita ao Brasil e já se apresentou no Rio de Janeiro, Florianópolis, Vitória, Santo André, São Paulo, Belo Horizonte, Aracaju e os três últimos shows serão em Salvador, Fortaleza e em Brasília.
Em conversa com o Bahia Notícias, Mike revelou que em todos os lugares que ele e o seu companheiro musical Sam Ites passaram no Brasil, foram bem recebidos e encontraram pessoas "amáveis e acolhedoras". Porém, o artista destacou duas das cidades que já visitou: "Eu venho de um lugar com muita natureza, oceano, montanhas e cachoeiras, então eu realmente gostei de estar em Floripa (Florianópolis), porque aquilo foi simplesmente lindo, é um lugar lindo. Nós fomos escalar, fomos ao oceano. Mas em termos de energia, as pessoas de todos os lugares foram incríveis. São Paulo foi louco, mas todos os lugares foram incríveis, com uma boa energia.
Mike contou que os fãs brasileiros sempre pediam, através das redes sociais, shows do músico no Brasil, mas confessou que ficou surpreso ao chegar no país. "Sabíamos que seria bom, mas não podíamos imaginar o quão bom seria. Não tínhamos ideia de como seriam o shows, e todos eles foram incríveis. O povo brasileiro é tão amável, cheio de energia e tão conectado com a música".
"Sempre após os shows, nós vamos falar com as pessoas e descobrimos aqui no Brasil, que muita gente não fala inglês, não vai muito além de 'thank you' e 'we love you', mas nós sentimos que mesmo essas pessoas que não sabem inglês, elas estavam cantando todas as letras das nossas músicas e é um sentimento realmente incrível saber que pessoas que nem falam a nossa língua sabem as letras das nossas músicas até mais do que em lugares em que se fala inglês. Foi realmente surpreendente", relatou Mike.
Sobre o som que Mike Love toca ao lado dos seus parceiros musicais ele explicou ao BN que o tipo de reggae deles é diferente do Reggae local do Hawaii e também do reggae tradicional da Jamaica. "Nosso Reggae é muito diferente porque não somos influenciados por esse reggae havaiano, porque não é o que escutamos, nós somos majoritariamente ainda influenciados pelo reggae raiz, então artistas como The Abyssinians e The Congos e, desses artistas de reggae raiz, um reggae bem espiritual. Nós temos nosso próprio tipo de fãs onde moramos, e é muito único. Nós unimos vários estilos de música também. Então começamos tocando apenas reggae, e antes de reggae, eu tocava rock, e blues, e flamenco, nosso som é essa mistura".
“Se você pensar, a música que Bob Marley criou, está sempre presente na música que nós fazemos. Ele criou aquilo 40 anos atrás, sabe, e se tentamos fazer algo que já aconteceu 40 anos atrás, nós nunca faremos tão bem quanto ele. Nunca em um milhão de anos, ninguém irá. E se tentarmos apenas emular e copiar completamente, então, não há nenhum sentido, porque não estaríamos indo pra frente. E mesmo assim, os elementos daquela música são tão importantes para mim, que eu quero honrá-los, e fazê-los presentes, em cada aspecto da música, seja tocando uma música bastante influenciada por R&B, seja um rock ou folk”.
“Mas o que realmente me levou ao Reggae e Bob Marley e tudo isso, foi o elemento espiritual de Rastafari na música, e isso é o que eu tento honrar em tudo, nas letras e nas mensagens e na energia, isso é o que é importante para mim, e nós temos que ir para frente, temos que tocar música que seja nova e animadora, porque é assim que nós nos animamos. É assim que as pessoas vão se animar, você tem que ter algo que possa apenas acontecer através de você, e que as pessoas só possam encontrar através de você, se quiser criar algo, e construir uma comunidade ao redor disso”, completa o artista.
O cantor havaiano contou que ele e Sam estão ansiosos para se apresentar em Salvador, mas não criam expectativa com relação ao show. “Cada lugar que fomos foi um pouquinho diferente, nós tentamos ir aos lugares sem expectativas porque não sabemos como será. O show depende das pessoas, da noite, do alinhamento das estrelas. Todo show é diferente e é isso que o torna incrível. Tudo que fazemos é organizar nossas coisas e tocar o melhor que podemos, colocando nossa energia nisso, e tentando ser o melhor que podermos ser, sempre”, explica Mike.
SERVIÇO
O QUÊ: Happy Reggae
QUANDO: Sexta-feira, 1 de fevereiro, às 22h
ONDE: Coliseu do Forró – Rio Vermelho – Salvador (BA)
VALOR: R$ 45
Curtas do Poder
Pérolas do Dia
Capitão Alden
"Estamos preparados, estamos em guerra. Toda e qualquer eventual postura mais enérgica, estaremos prontos para estar revidando".
Disse o deputado federal Capitão Alden (PL) sobre possível retirada à força da obstrução dos apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no Congresso Nacional.