Nova portaria do Iphan para Centro Histórico define futuro do terreno do Palácio Thomé de Souza e indica: "Manter vazio é a pior opção”
Por Mauricio Leiro / Gabriel Lopes
A nova portaria do Iphan que estabelece as diretrizes de preservação e critérios de intervenção para o Centro Histórico de Salvador e a Cidade Baixa, conjuntos tombados em âmbito federal, também aborda diretamente a regulação mais detalhada do terreno à Praça Thomé de Souza (TPTS), que atualmente abriga a sede da Prefeitura de Salvador.
A diretriz trata da Orientação para Agenciamento e Projeto (OAP) para o local, e atende à iminente retirada do atual Palácio Thomé de Souza da praça que tem o mesmo nome, em cumprimento à decisão determinada judicialmente. O edifício em questão, uma estrutura de aço e vidro elevada sobre pilotis, foi projetado e executado pelo arquiteto João Filgueiras Lima, o Lelé, em 1986. Com isso, a sede do Executivo municipal será temporariamente transferida para o Palácio Arquiepiscopal, na Praça da Sé.
A saída da prefeitura do local implicará na retirada desta estrutura e, segundo o Iphan, posterior ocupação do terreno com uma nova construção que restabeleça a morfologia urbana original da área histórica. De acordo com a portaria, manter o vazio no terreno após a saída do Palácio "é a pior opção".
Segundo detalhado pelo Iphan, o terreno é limitado a noroeste pela falha geológica que separa a Cidade Alta da Cidade Baixa, a nordeste pela Ladeira da Misericórdia, a sudeste pela Rua da Misericórdia e a sudoeste pela Praça Tomé de Souza. O terreno retangular possui aproximadamente 46 metros de largura e 50 metros de profundidade.

A análise histórica do Iphan indica que, desde a fundação da cidade em 1549, o local esteve ocupado, quase em sua totalidade, por edificações contínuas que delimitavam o lado nordeste da Praça Thomé de Souza. O vazio no local, ou a ocupação parcial, ocorreu apenas em dois períodos: da década de 1870 até a década de 1920 e, mais recentemente, de 1972 até o presente. O atual Palácio, construído em 1986 sobre um estacionamento semienterrado, ocupa uma faixa longitudinal no centro do terreno.
OBJETIVOS E ORDENAMENTOS
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional estabelece que a nova edificação no espaço deve ser capaz de:
1. Recompor a morfologia urbana do Centro Histórico de Salvador, ocupando o quarteirão, que esteve majoritariamente edificado durante a maior parte da história da cidade;
2. Reconstituir o paramento vertical (fachada) que delimita o lado nordeste da Praça Tomé de Souza. Os especialistas em patrimônio criticavam o Palácio de Lelé justamente por ocupar apenas uma pequena parte desse limite;
3. Reconstituir o caráter de "rua-corredor" da Rua da Misericórdia, o que era uma característica da via desde o século XVI até a segunda metade do século XX;
4. Manter o caráter institucional, político e administrativo da Praça Thomé de Souza, que é reconhecida como a primeira praça cívica do Brasil. Devem ser priorizados usos como a própria sede do Executivo Municipal ou funções que preservem a memória coletiva e os valores simbólicos.

Simulação do volume de construção permitido no TPTS, visto a partir da calçada da Câmara Municipal de Salvador, na Praça Thomé de Souza | Foto: Reprodução / Iphan
PARÂMETROS E RESTRIÇÕES
O Iphan dividiu o terreno em três blocos para definir os limites de construção, proibindo o desmembramento dos terrenos.
- Bloco A (obrigatório, acima do nível da Praça): Corresponde aos volumes a serem construídos acima do nível do piso da Praça Thomé de Souza.
Os volumes devem ser construídos sem recuos em relação aos limites da Ladeira da Misericórdia, Rua da Misericórdia e Praça Thomé de Souza. A altura total é fixada em 12 metros, contados a partir do nível do piso da Praça. Para propiciar iluminação e ventilação, cada volume do Bloco A deverá ter uma largura máxima de 12,50 metros, resultando na criação de um pátio central.

Planta geral do Terreno à Praça Tomé de Souza, com a indicação dos Blocos A, B e C e uma simulação do volume de construção permitido no local | Foto: Reprodução / Iphan
Belvedere: É obrigatório um recuo de 5 metros no limite noroeste (encosta) do terreno, criando um mirante sobre a laje do Bloco B com vista para a Cidade Baixa e a Baía de Todos-os-Santos.
- Bloco B (obrigatório, abaixo do nível da Praça): Se refere aos volumes abaixo do nível do piso da Praça. A construção não terá recuos em relação à encosta (limite noroeste), podendo a altura ser ampliada em subsolo, desde que não haja alteração da topografia da encosta contígua e de sua cobertura vegetal.
- Bloco C (optativo): Trata-se de um elemento arquitetônico opcional que pode ser construído sobre o Bloco A, servindo como contraponto à cúpula do Palácio Rio Branco.
Caso seja construído, deve ser um volume único, com dimensões máximas de 12,5m x 12,5m e altura de 6 metros, alinhado no eixo de simetria da fachada do Bloco A voltada para a Praça Thomé de Souza.
O Iphan também impôs regras estritas sobre a estética e materiais para a nova construção, ressaltando que o projeto precisa ser submetido à análise da Superintendência do Iphan na Bahia. Segundo o órgão, a nova edificação deve ser uma expressão da arquitetura contemporânea, sendo vedada a construção de pastiches (imitações da arquitetura tradicional existente no entorno).

Simulação do volume de construção permitido no TPTS, visto a partir de drone sobrevoando o Comércio | Foto: Reprodução / Iphan
As fachadas visíveis a partir do espaço urbano (Praça Thomé de Souza, Rua da Misericórdia, Ladeira da Misericórdia e encosta) devem apresentar predominância de cheios sobre vazios, de modo que fenestrações e vidros não podem ultrapassar 50% da superfície total de cada fachada.
Volumes de instalações prediais, como casas de máquina de elevadores e reservatórios, devem estar incluídos na altura máxima estabelecida. Não é permitida a instalação de antenas (exceto SPDA), placas de captação de energia solar ou unidades de ar-condicionado em fachadas ou coberturas visíveis do espaço público.
O objetivo final é a recuperação da morfologia tradicional da Praça Thomé de Souza e o fortalecimento de sua condição como praça de uso público e mirante privilegiado.
