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Entrevista

Presidente do PT na Bahia avalia eleições e critica ansiedade de ACM Neto: 'comeu cru' - 21/12/2020

Por Lula Bonfim

Presidente do PT na Bahia avalia eleições e critica ansiedade de ACM Neto: 'comeu cru' - 21/12/2020
Foto: Paulo Victor Nadal / Bahia Notícias

Éden Valadares, de 39 anos, é presidente do PT na Bahia desde dezembro de 2019. Se filiou ao partido em 2001, quando foi diretor da União Nacional dos Estudantes (UNE), coordenador de Políticas para a Juventude no estado em 2007 e assessor do senador Jaques Wagner desde 2011, primeiro na Casa Civil do governo federal e depois no senado.

 

Em entrevista ao Bahia Notícias, o líder petista no estado comentou o desempenho da legenda nas eleições municipais de 2020, citou uma necessidade de renovação nas esquerdas e criticou a “ansiedade” do prefeito ACM Neto em falar do PT. “Nós vamos chegar muito fortes, com trabalho e humildade, dialogando com o povo e sem essa ansiedade do prefeito ACM Neto. Engraçado é que ele é ansioso para comentar sobre o PT, mas fica nervoso quando a gente pergunta para ele sobre Bolsonaro”, cutucou.

 

Éden também garantiu que PSD e PP seguirão juntos com o governo em 2022 e comemorou a possibilidade de Rui Costa ser candidato à presidência da República. “O nome do governador é uma possibilidade e o PT da Bahia tem muito orgulho e a honra de apresentar o nome dele como uma das alternativas. Tem uma fila, claro, com Lula e Haddad, mas, quem sabe, não dá Rui Costa e a gente dá uma sacudida na política brasileira”, afirmou.

 

Confira abaixo a entrevista completa:

 

Qual é a avaliação do PT do resultado nas eleições municipais de 2020 e os reflexos desse resultado na articulação do partido pensando em 2022? 

Eu não vejo uma causa e consequência tão direta das eleições municipais para as estaduais. A Bahia já deu vários exemplos de que não é tão direta assim. Vou citar dois exemplos: Wagner venceu as eleições de 2006 mesmo o PT não tendo grandes vitórias nas eleições municipais anteriores [2004]. A quantidade de prefeitos que apoiavam em 2006 era muito reduzida, se comparada a que nós temos hoje. E mesmo em 2016 e 2018. Porque 2016 foi um ano muito difícil e, em 2018, nós conseguimos eleger Wagner o senador mais votado da história da Bahia e Rui o governador mais votado da história da Bahia. Então, relativizando essa relação de causa e consequência, nós estamos em processo de balanço. A executiva teve uma reunião na semana passada e, na próxima semana, o diretório estadual aprofundará esse processo de balanço, que é de copo meio cheio e meio vazio, a depender de onde a gente olhe. É claro que há reveses importantes. Não conseguimos manter o PT à frente de Coité e Senhor do Bonfim. Cruz das Almas, uma cidade muito importante para nós e com uma trajetória, uma marca do PT muito forte. Em compensação, a gente avançou no número de votos das chapas majoritárias - a gente teve 330 mil votos a mais do que na eleição passada - e aumentamos em quase 100 o número de vereadores e vereadoras. A depender do ângulo, a gente pode tirar uma avaliação boa ou uma avaliação ruim. Eu prefiro manter os pés no chão. Minha mãe diz que, nas vitórias, a gente precisa ser humilde e, nas derrotas, a gente tem que resignar. Esta ainda não foi uma eleição de retomada da agenda progressista, de esquerda, no país. Ainda foi uma eleição de resistência à onda conservadora que teve início em 2013. Ainda é um tempo de resistência para aqueles que lutam na defesa da democracia. Nesse sentido, o resultado das eleições mostra um desafio óbvio para a esquerda: se renovar. Renovar seu programa, suas propostas, que tipo de soluções ela apresenta à sociedade brasileira, que mudou muito nesses últimos 40 anos, desde que o PT foi fundado. Há um novo perfil do trabalhador brasileiro. Quais são as resposta do PT para o “uberismo”, para os trabalhadores de aplicativo, que não têm uma relação direta patrão e empregado? É tudo muito fluido, virtual. Quais as respostas do PT para as demandas atuais da sociedade brasileira? A segurança, a saúde, a pandemia. Temos que renovar também nossos quadros, nossa representação e mergulhar mais na realidade do povo brasileiro. Porque tudo que a gente fez, com Lula, Dilma, Wagner e Rui, nos habilita a ser ouvido pelo povo. Nós temos serviços prestados. O povo sabe nosso compromisso com a sociedade brasileira. Mas o povo quer mais. Eles não querem saber só o que a gente fez, mas sim o que a gente ainda pode fazer pela Bahia e pelo Brasil.

 

O PT perdeu o segundo turno em Vitória da Conquista e Feira de Santana para gestores que não têm grandes avaliações nas pesquisas. Você avalia que existe uma resistência da população, na hora H, de escolher representantes do PT ou foi uma característica local dessas cidades?

Eu relativizo esse peso do antipetismo. Reconheço que há o antipetismo na sociedade. Aqui na Bahia muito menos que no sul ou sudeste do Brasil. Mas não considero tão fundamental assim para decidir as eleições. Se o antipetismo na Bahia fosse tão forte, Rui Costa, Fernando Haddad e Jaques Wagner não teriam vencido em todas as urnas de Salvador nas eleições de 2018. Se houvesse um antipetismo tão latente assim, isso não seria possível. Em Feira de Santana e Vitória da Conquista, a rigor, o MDB manteve as prefeituras que tinha. Às vezes, a gente coloca como se fosse obrigação do PT ganhar. A obrigação era de quem estava na cadeira e era candidato à reeleição. A gente teve um salto de qualidade e de quantidade no primeiro turno. Nós provocamos o segundo turno nessas duas cidades, coisa que em 2016 não havia acontecido [só houve em Conquista]. Passamos na frente no primeiro turno e, no segundo turno, nós infelizmente não conseguimos chegar à vitória. Não devo deixar de considerar uma coisa que a narrativa geral está dando como certa e, na nossa visão, não é. Parte da imprensa nacional tem dito que essa eleição não teve fake news, política do ódio e fomento à intolerância. O que nós percebemos, provamos, com provas e evidências, e apresentamos à Justiça Eleitoral, foi que continuou havendo muita política de fake news, desinformação, calúnia, mentira. Houve um abuso do poder econômico, porque boa parte daquilo que era considerado crime eleitoral antes da pandemia, com a pandemia, foi legalizado. Virou política pública. Então o prefeito estava distribuindo cesta básica na semana da eleição, estava asfaltando a cidade até sábado antes da eleição. Nós avaliamos que isso teve impacto eleitoral. Não estamos transferindo a responsabilidade das derrotas para ninguém. Só estou colocando elementos que, ao nosso ver, impactaram. O antipetismo é um deles? Certamente, é. Mas não é o mais fundamental. O mais fundamental é que as cidades discutiram alternativas locais e decidiram pela manutenção do prefeito. A avaliação que vale é a das urnas, não é de pesquisa eleitoral. Agora é respeitar a decisão do povo e trabalhar. Nós estamos muito felizes, apesar da frustração, porque ficou aquele gostinho de que bateu na trave. Nós não perdemos as duas. Nós deixamos de ganhar. E penso que chegaremos fortes em 2022. Não só em Feira e em Conquista, mas no conjunto do estado.

 

O prefeito ACM Neto (DEM) reclamou, na semana após o segundo turno, que o PT não reconheceu a derrota e a vitória do seu adversário nas eleições municipais, citando a frase do senador Jaques Wagner de que “apressado come cru” e respondendo que quem comeu cru foi o PT. Como você avalia: o PT não aceitou a derrota ou o PT não foi derrotado?

Quem vai com muita sede ao pote, às vezes, quebra o pote. Ele, o presidente do DEM, aliado de Bolsonaro, na segunda-feira de manhã após o segundo turno, ao invés de calçar as sandálias da humildade pela vitória que teve em Salvador, Conquista e Feira, ele se arvorou em falar de 2022. Aí é que ele foi apressado e, certamente, comeu cru. Insisto: não há causa e consequência tão óbvia. Tem muita água para passar por debaixo dessa ponte. Nós, da base aliada do governo, vencemos em mais de 300 prefeituras. Ele foi quem se arvorou em transformar vitórias pontuais e colocar como uma vitória sistêmica no estado. Nós só recomendamos a ele mais humildade, mais cautela, mais calma. Nós temos muitos serviços prestados no estado. Nosso grupo político junto é muito grande, muito forte. Nós vamos continuar dialogando com o povo e trabalhando. O governador Rui Costa é o melhor do Brasil, tem uma avaliação altíssima. O senador Jaques Wagner tem o reconhecimento do nosso grupo. Nós temos muitas lideranças importantes dentro do nosso bloco: Lídice, Leão, Otto… Nós vamos chegar muito fortes, com trabalho e humildade, dialogando com o povo e sem essa ansiedade do prefeito ACM Neto. Engraçado é que ele é ansioso para comentar sobre o PT, mas fica nervoso quando a gente pergunta para ele sobre Bolsonaro. Ele passou a campanha toda escondendo seu apoio ao governo Bolsonaro. Mas, logo depois das eleições, ele elogiou Bolsonaro e eu soube que até agenda com o presidente ele teve. Uma agenda oficiosa, um encontro às escuras, clandestino, com o presidente. Ele deveria resolver melhor essa relação dele com o presidente Ele não pode posar de independente de dia e, de noite, jantar com Bolsonaro, para falar seja lá de quê. Porque tem muita coisa que une os dois: privatização do Banco do Brasil, da Caixa Econômica, dos Correios, da Eletrobrás, essa agenda liberal, como também os cargos. As indicações que ele tem no DNOCS, na Codevasf. ACM Neto é presidente de um partido que dá sustentação a Bolsonaro. Ele, particularmente aqui na Bahia, tem muita indicação no governo Bolsonaro e tenta dar baratino na classe política baiana, fingindo ter uma independência que ele não tem. Nós preferimos carta na mesa. Nós temos lado e nosso lado é contra Bolsonaro. Nosso lado é pela volta de uma agenda que privilegie a geração de empregos, trabalho, a distribuição de riquezas, a justiça social. Os nossos exemplos são o presidente Lula, o governador Rui Costa e o senador Jaques Wagner. Nós queremos uma disputa assim, com as cartas na mesa, e não camuflando o apoio que ele dá.

 

Você falou do avanço do grupo político do governador Rui Costa nas eleições municipais. Isso ocorreu principalmente com o PSD de Otto Alencar e o PP de João Leão. O senador Jaques Wagner colocou seu nome para a disputa em 2022, assim como Otto. Há uma possibilidade dessa base de apoio rachar nas próximas eleições?

Nós tivemos, ao longo desses 14 anos, muita responsabilidade e maturidade. Conseguimos conduzir esse grupo político até aqui, juntos, unidos, tanto na agenda de apoio ao governo do estado quanto em questões nacionais. Por exemplo, no impeachment da presidenta Dilma, a bancada de apoio votou junta, a bancada do Senado foi 100% junta. Então nós temos tido muita cumplicidade ao longo desses anos. Especialmente os senadores Wagner e Otto, pessoalmente, são muito amigos. Eu tenho muita certeza de que nós chegaremos juntos. É legítimo que o PP apresente nome, o PSD apresente nome, o PT apresente nome. Partido político é feito para disputar o poder. Se você não almeja o poder, perde um pouco o propósito de ter um partido político. Agora tem que ter a maturidade de cada um apresentar seus quadros e, sob a coordenação do governador Rui Costa, avaliar o cenário e ver quem é o melhor candidato, a melhor hora de cada um, a melhor chapa. Nem o PP nem o PSD nem o PT estão obrigados a ter candidato a governador, mas eles não podem ser proibidos. Nós, do PT, estamos apresentando um nome da qualidade do ex-deputado, ex-ministro, ex-governador, atual senador Jaques Wagner, um quadro de conhecimento nacional, pela sua habilidade, pela sua capacidade de condução. Estamos apresentando o nome do PT para compor a chapa e queremos dialogar com o PCdoB, com o PSB, com os demais partidos da base sobre qual é a melhor tática e quem são os melhores nomes para disputar as eleições em 2022. Que bom que nós temos tantos bons nomes e tantos partidos com tanta gente de qualidade. Não posso reclamar se a gente tem, do goleiro ao centroavante, disputa por posição no time titular. Ainda bem que a gente tem essa disputa saudável. Sobre as vitórias do PSD e do PP, eu não sou daqueles que lamentam as vitórias dos amigos não. Que bom que o PSD e o PP venceram. Isso fortalece o nosso povo e deixa nosso grupo ainda mais forte para 2022.

 

Também tem se especulado a possibilidade do governador Rui Costa ser candidato do PT à presidência da República. Isso fortaleceria uma candidatura petista ao governo do estado também? Como o PT tem construído isso para 2022?

Nós não pensamos uma candidatura de Rui Costa à presidência da República para fortalecer a nossa tática eleitoral no estado. É uma coisa descasada da outra. O nome do governador tem sido lembrado por todo o papel que ele tem cumprido ao longo desses dois mandatos dele. Um gestor primoroso, um cara focado no trabalho, workaholic mesmo, concentrado no trabalho, que, mesmo em meio a uma crise econômica forte desde 2016, ele tem mantido as contas do estado em dia, cumprido os contratos. Não perdemos capacidade de investimento. Um gestor testado e aprovado. É o principal governador do PT no Brasil. O principal estado governado pelo PT é a Bahia. Então o nome é lembrado para a presidência da República. Que bom! Porque o nome do governador Rui Costa apontaria para o conjunto da sociedade brasileira e para as esquerdas uma renovação. Isso deve ser pactuado junto ao presidente Lula, nossa principal liderança, deve ser pactuada dentro do PT. Mas, sim, o nome do governador é uma possibilidade e o PT da Bahia tem muito orgulho e a honra de apresentar o nome dele como uma das alternativas. Tem uma fila, claro, com Lula e Haddad, mas, quem sabe, não dá Rui Costa e a gente dá uma sacudida na política brasileira.

 

A possível mudança do ex-presidente Lula para o estado gera uma possibilidade do PT baiano ganhar mais uma grande força. Ter ele mais próximo seria um ganho de popularidade para o PT da Bahia?

Não sei se isso melhoraria nosso desempenho eleitoral. Eu sei que gostaria muito de ter o presidente Lula aqui, pela experiência política, pela liderança de esquerda que ele é. Lula é um dos quadros que a gente demora gerações para produzir. Do século passado, do tamanho dele, talvez só tenhamos tido Getúlio Vargas. Não sei se isso vai ter impacto eleitoral, mas sei que pode ter impacto em relação ao centralismo da política brasileira muito no sudeste, muito em São Paulo. Só dele vir residir no nordeste pode ajudar a política brasileira a ser menos centralizada no sul e sudeste e se abrir mais para as experiências do nordeste. A experiência do consórcio, por exemplo. Os governos de estado do nordeste e o Consórcio Nordeste são o principal contraponto ao governo Bolsonaro. Ao contrário do que a mídia mais tradicional do sul, que tenta apresentar o [João] Dória como contraponto principal, eu penso que o contraponto principal é aqui, onde os governadores buscam o investimento, gerando empregos, sem perder de vista o social, cuidar dos que mais precisam, sem perder de vista a inclusão de setores produtivos que nunca tiveram oportunidades, como jovens negros e negras, colocando os indígenas na agenda. Lula vir para a Bahia seria bom nesse sentido, deslocando o olhar das pessoas para cá.