Nas redes, Natuza Nery recebe solidariedade e internautas resgatam postagens de policial civil com defesa de golpe
Por Edu Mota, de Brasília
A agressão sofrida pela jornalista Natuza Nery, âncora do canal Globo News, por um policial civil em um supermercado de São Paulo, segue como um dos assuntos mais comentados na rede X (ex-Twitter) nesta quinta-feira (2). O assunto está entre os dez com mais menções nos trending topics da plataforma, e a jornalista tem recebido uma série de mensagens de solidariedade pela agressão e ameaça de "aniquilamento".
O caso aconteceu na última segunda (30), em momento no qual a jornalista fazia compras em um supermercado na zona oeste de São Paulo. De acordo com o boletim de ocorrência, registrado no 14º Distrito Policial, em Pinheiros, Natuza Nery foi abordada pelo policial civil de São Paulo Arcenio Scribone Junior, que após confirmar que se tratava dela, gritou uma série de ofensas e dizeres como "pessoas como vocês deveriam ser aniquiladas".
Surpreendida com a abordagem, a jornalista posteriormente procurou o homem, com o intuito de identificá-lo e denunciá-lo, e o encontrou já no caixa do supermercado, ao lado da esposa. Ao ser interpelado, ele voltou a ofender a jornalista, e chegou a ser repreendido pela própria esposa.
A jornalista da Globo News acionou a Polícia Militar após ser confrontada pelo policial civil e ambos foram levados à delegacia, onde a Corregedoria assumiu o caso. Antes da chegada dos agentes ao mercado, Arcenio Scribone afirmou a outras testemunhas que teria apenas dito a Natuza "que não gostava de seu trabalho".
Na rede X, políticos, jornalistas, artistas, autoridades do governo federal e até o ministro Gilmar Mendes manifestaram solidariedade a Natuza Nery. Gilmar, por exemplo, disse que "o ataque sofrido por Natuza Nery, em razão do simples exercício diário de seu ofício, exige pronta resposta do poder público, em especial dos órgãos de persecução penal".
O ministro da AGU (Advocacia Geral da União), Jorge Messias, também se solidarizou com a jornalista, e cobrou que as autoridades do Estado atuem rapidamente para responsabilizar o policial. "Minha solidariedade irrestrita à jornalista Natuza Nery, que sofreu um ataque recente de um agente do Estado. As autoridades de SP devem agir rapidamente para investigar e responsabilizar o agressor", afirmou em seu perfil no X.
A presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), também repudiou a agressão por meio de suas redes sociais. Gleisi ainda fez críticas ao governador de São Paulo, Tarcísio.
"A ameaça do policial civil de São Paulo à jornalista Natuza Nery tem todo nosso repúdio. Além de expor, mais uma vez, o alinhamento do governador Tarcísio e sua polícia à violência política bolsonarista, mostra que não pode haver impunidade para os crimes da extrema-direita. Sem anistia, sem mais ataques", disse Gleisi.
Os senadores Fabiano Contarato (PT-ES) e Eliziane Gama (PSD-MA), além de criticarem as ameaças feitas pelo policial civil de São Paulo, exigiram apuração rigorosa sobre a agressão. Contarato falou que a Polícia Civil deveria "agir como guardiã da lei e do equilíbrio", e Eliziane disse que "a ameaça é inaceitável e um ataque à liberdade de imprensa e ao Estado Democrático de Direito".
Manifestações de solidariedade foram postadas na rede X por diversos jornalistas da TV Globo e da Globo News. Camila Bomfim, por exemplo, disse que "ninguém tem que passar por ameaça, menos ainda de um policial, que deveria ser sinônimo de proteção, não de ameaça". Na mesma linha, a âncora Julia Duailibi pediu que a "Corregedoria aja imediatamente e todos esses casos sejam punidos".
Companheiro de Natuza na Globo News, o jornalista Gerson Camarotti foi outro que pediu uma "investigação exemplar" da Corregedoria da Polícia Civil de São Paulo. "Engana-se quem pensa que vai silenciar Natuza, referência maior na imprensa brasileira, com uma tentativa de intimidação covarde", completou Camarotti.
A corregedoria da Polícia Civil de São Paulo abriu inquérito para investigar as ameaças cometidas pelo agente Arcenio Scribone Junior contra a jornalista Natuza Nery. Nas redes sociais, além da solidariedade à jornalista, muitas postagens revelam opiniões dadas por Scribone Junior a respeito de política, eleições, Covid, entre outros assuntos.
Internautas resgataram postagens do policial civil em que ele, por exemplo, defendeu intervenção militar no Brasil, além de questionar o resultado da eleição de 2022. Scribone fez afirmações de que o Supremo Tribunal Federal (STF), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a "esquerda no geral" formavam uma "quadrilha".
Em 8 de dezembro de 2022, o policial civil publicou em sua conta na rede X uma foto de uma manifestação a favor de um golpe de Estado no país e escreveu: "Nessas horas tenho orgulho de ser brasileiro. Nosso povo está vivo". Uma outra fotografia, publicada no mesmo dia, sugere que ele esteve em frente ao Comando Militar do Sudeste, sede do Exército que fica na capital paulista, para defender a intervenção, naquele período em que bolsonaristas insatisfeitos com o resultado das urnas ocuparam a entrada dos quartéis em diversas cidades do país.
No dia 12 de dezembro, Arcenio Scribone republicou uma notícia falsa que dizia que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) teria na verdade obtido 73,5% dos votos no segundo turno das eleições de 2022. A postagem dizia ainda que o presidente Lula teria obtido apenas 26,5% dos votos.
"Esta é a realidade que a mídia tentou esconder dos brasileiros", diz o texto. Segundo a postagem veiculada pelo policial civil, o "resultado real das urnas" teria sido obtido após hackers "quebrarem os códigos fonte".
De acordo com a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo (SSP), a Corregedoria da Polícia Civil realizará diligências no estabelecimento em busca de imagens do ocorrido e eventuais testemunhas. A investigação no âmbito administrativo pode resultar no afastamento do policial civil, que é investigador de classe especial e recebe aproximadamente R$ 15 mil de salário.