João Jorge quer retomada de Xangô como símbolo da Palmares e cooperação com África, Caribe e EUA
Por Lula Bonfim
Desde que foi indicado para a presidência da Fundação Palmares, em janeiro deste ano, João Jorge tem alertado para o estado de abandono deixado pelos gestores anteriores, da administração de Jair Bolsonaro (PL). Em entrevista ao Bahia Notícias durante o carnaval de Salvador, o novo presidente do órgão detalhou como está a sede da instituição, em Brasília, e enumerou o que precisa ser feito para a recuperação dos trabalhos.
De acordo com João Jorge, o abandono da Fundação Palmares na gestão de Sérgio Camargo não se deu apenas com o encerramento de projetos de apoio à população negra do Brasil, mas também com o descuido com as instalações da instituição, sediada na capital federal.
“A Fundação Palmares está no chão, na lama. Está funcionando na Asa Norte em Brasília em um ambiente muito ruim, sem ar condicionado, sem lugar para estacionamento, com as paredes caindo e sem projetos. Agora, nós estamos retomando os projetos”, afirmou João Jorge.
Ex-presidente do bloco afro Olodum, João Jorge também afirmou que a fundação retomará o orixá Xangô, oriundo das tradições religiosas iorubás, como o seu principal símbolo, algo que havia sido desconstruído pela gestão anterior.
Além disso, a Palmares deverá voltar a dar atenção à memória do povo negro e da escravidão no Brasil, retomando os cuidados com o Cais do Valongo, no Rio de Janeiro, e com o Parque Memorial Quilombo dos Palmares, no interior de Alagoas.
“Há muita coisa para fazer. Vamos estabelecer editais com mais recursos para aqueles artistas brasileiros que não têm acesso, para o indivíduo que não é bloco afro, não é escola de samba ou terreiro. Vamos montar uma cooperação internacional forte com África, com Caribe, com Estados Unidos, via apoio do Itamaraty”, contou João Jorge, relembrando que todo o continente americano recebeu muitos povos africanos durante o período de colonização e exploração do trabalho escravo.
Advogado de formação, João Jorge também demonstrou preocupação com a mudança da educação no país. Segundo ele, o Brasil precisa aplicar de fato o ensino da História da África e dos Afro-Brasileiros, abandonando de vez o eurocentrismo que ainda domina a produção de conhecimento nos ambientes acadêmicos.
João Jorge relembrou ainda o projeto A Cor da Cultura, que tinha o apoio da Petrobras e da Fundação Roberto Marinho, mas foi paralisado durante as gestões bolsonaristas. Segundo ele, o programa - que tem o objetivo de valorizar a cultura afro-brasileira através da educação - deve ser reativado pela Palmares durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
“Tem uma coisa bem simples que se precisa fazer: fazer com que cumpra-se a lei no país inteiro. Municípios, estados e governo federal. Outra coisa: precisamos juntar a TV Brasil, a TVE, a Fundação Roberto Marinho, todos os sistemas de audiovisual do país, para a gente projetar esse modelo de educação. E terceiro, produzir um conteúdo que seja fácil de explicar o que é a educação da História da África e dos Afro-Brasileiros. Isso era uma responsabilidade da Fundação Palmares e não foi feito. Estava abandonada”, criticou.
“As universidades brasileiras precisam tratar de conhecimento. Conhecimento é universal. Se você ficar apenas no que Estados Unidos faz e Europa faz, não é universidade”, complementou o futuro presidente da Palmares.
Por fim, João Jorge enumerou os caminhos prioritários do seu trabalho de recuperação da Fundação Palmares.
“Primeiro, organizando a gestão das várias entidades afro-brasileiras, mostrando como captar recursos, prestar contas e estar habilitada para os vários editais pelo país inteiro. Segundo, ajudando a mudar as políticas públicas de cultura que tem em cada estado, em cada município e também no Ministério da Cultura. E terceiro, gerando um ambiente de oferta maior de recursos para os afro-brasileiros produzirem cultura. Se pudermos estimular um ambiente sadio e amplo, nós começaremos a mudar isso”, finalizou.