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Comparativo racial mostra aumento de candidatas negras e redução de brancas na BA

Por Jade Coelho / Ailma Teixeira / Mari Leal

Comparativo racial mostra aumento de candidatas negras e redução de brancas na BA
Foto: Marcello Casal Jr. / Agência Brasil

"No dia que ser negro significar agregar alguma coisa dessa sociedade, todo mundo vai querer ser negro". Foi com essa frase do intelectual brasileiro Milton Santos que a doutora em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo, Maísa Vale, refletiu sobre as discussões em torno do aumento do número de candidatos e candidatas pretas e pardas nas Eleições 2020.


Amplamente debatido nas redes sociais, o tema pontua o crescimento, mas levanta questionamentos sobre a existência de um “oportunismo” após candidatos mudarem a autodeclaração racial. “O que nós estamos presenciando na virada do século é negro ter algum valor agregado. Cota no serviço público, na universidade, uma série de coisas, que legalmente na disputa, dentro da legislação, você vê a possibilidade de agregar algo à figura do negro no Brasil. Isso é lamentável, né?”, critica Maísa.


Para a pesquisadora, no entanto, não se trata de oportunismo ou conveniência. No geral, ela avalia que a crescente identificação nestas eleições é fruto de um processo longo de conscientização dessas mulheres enquanto agentes de mudança. 


De acordo com o registro de candidaturas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 466 mulheres registraram candidaturas para o Executivo, sendo 190 para o cargo de prefeita e 276 para vice-prefeita. Destas, 65 se autodeclararam brancas e 122, pretas ou pardas. 


Se comparado com as Eleições 2016, ano em que o TSE começou a registrar a informação de raça e cor dos candidatos, a Bahia teve crescimento da participação de mulheres que se autodeclaram negras e redução das que se dizem brancas. Em 2016, 89 candidatas se autodeclararam brancas, enquanto 95 se definiram como pretas ou pardas. Maísa, inclusive, considera essa descrição uma vitória do movimento negro.


Uma das construções apontadas pela pesquisadora é a Marcha das Mulheres Negras a Brasília, no ano de 2015. A mobilização pautou, entre outras questões, a luta contra a violência de gênero e o racismo.


“Nós recebemos aquela proposta [de construir a marcha com representantes de todo o país] como algo que cutucou e tirou da linha de conforto e cada uma colocando mais gás. Nesses processos foram construídas tantas frente, o movimento se fortaleceu de tal forma que nós mexemos em questões que até então a gente vinha mexendo, mas não de forma sistêmica orquestrada. Foi um momento decisivo porque tivemos oportunidade de estar do sul ao norte discutindo um único objetivo que era chegar a Brasília, mas a partir de várias perspectivas”, acrescenta a pesquisadora.


Como destacado por matéria publicada pelo Bahia Notícias nesta quarta-feira (30), a participação de mulheres na política na Bahia praticamente triplicou nos últimos 20 anos (reveja), com destaque para o acesso ao Legislativo. Ao olhar para o Executivo, o crescimento é mais tímido. Em 2000, 99 mulheres concorreram como prefeitas e 352 como vice-prefeitas em toda a Bahia. Já em 2020, o número de aspirantes à chefia do Executivo chegou a 190, e as vices são 276.


Com menor expressividade, em 2016 a Bahia teve uma candidata à chefe do Executivo municipal indígena e uma identificada como amarela. Neste ano, há uma amarela, mas nenhum mulher indígena como “cabeça de chapa”.


ESCOLARIDADE

Ao descrever algumas características comuns nos perfis das mulheres que adentraram a esfera política, a advogada especialista em direito eleitoral, Erica Silva Teixeira, citou o capital político na família, a participação em movimentos sindicais e o grau de instrução mais elevado. O BN checou esse último item e constatou que, seja a mulher branca, preta, parda ou amarela, o grupo mais numeroso é o daquelas com ensino superior completo.


Isso mostra uma consonância entre a representatividade na carreira política e as condições de trabalho no mercado privado. Diversas pesquisas indicam a enorme disparidade entre mulheres negras, base da pirâmide social, e homens brancos, que estão no topo. Um exemplo foi um estudo lançado em agosto de 2019 pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), em parceria com a Organização Internacional do Trabalho. De acordo com o levantamento, mulheres negras ganhavam, em média, 55% do salário pago a homens brancos no Brasil (reveja). 


Para Maísa, não é necessariamente uma “exigência” de mais escolaridade que demarca o cenário das mulheres negras na disputa política-partidária, mas “uma sociedade racista, estruturada em cima de uma questão racial, onde para que isso exista, essa lógica exista, há uma série de estereótipos, símbolos, representações”. 


Ela avalia que tais aspectos estruturais “colocam as mulheres negras em um lugar de desvantagem muito grande, em todos os aspectos da sociedade, não só na política”. “A política é construída para que nós não consigamos acessar. É um braço do poder”, destaca.