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Entrevista

Maria Clécia Vasconcelos, da Delegacia da Mulher, em Feira de Santana

Por Clara Gibson

Maria Clécia Vasconcelos, da Delegacia da Mulher, em Feira de Santana
Foto: Reprodução / Acorda Cidade

Entre os meses de janeiro a maio 2018, mais de 400 casos de violência moral e psicológica contra a mulher foram registrados na cidade de Feira de Santana. Apesar de o número ser alto, ele também indica uma mudança de postura por parte das mulheres, que começaram a se reconhecer na situação de violência moral e estão começando a denunciar os abusos psicológicos. Até o mês de maio, 1.302 queixas, que incluíam ameaças, lesão corporal, estupro e tentativa de homicídio, foram contabilizadas na cidade. Os números foram registrados pela Delegacia Especial de Atendimento à Mulher de Feira de Santana. Em conversa com o Bahia Notícias, a delegada da unidade, Maria Clécia Vasconcelos destaca que a diferença é que agora, a mulher está sendo estimulada a denunciar ao ver os casos de violência na mídia. Na avaliação da delegada, elas se identificam no contexto e não querem ser a próxima vítima. 

 

Na semana passada foi noticiado que mais de 400 casos de violência psicológica contra a mulher foram registrados em Feira de Santana. A senhora poderia definir o que é violência psicológica e quando uma mulher se enquadra em um caso como esse?
A violência psicológica não demonstra fisicamente os danos como a lesão corporal, então é por isso que ela não é percebida pela vítima e por quem a cerca. É entendida como violência psicológica os crimes de ameaça, injúria e difamação. A mulher pode perceber que se enquadra nesse tipo de violência de várias formas. Por exemplo, ameaça é mais fácil de identificar, são aquelas frases como “se você não for minha não vai ser de mais ninguém”, “eu vou te matar se você me trair”, então ameaça é mais fácil de identificar. Agora, a injúria é aquele crime que fere a dignidade da mulher como chamar de vagabunda, e a difamação que é falar mal e causar um prejuízo a percepção que os outros têm daquela mulher. Fora isso os primeiros sinais são, por exemplo, quando um agressor diz: “não quero você andando com aquela sua amiga”, “não vá pra casa da sua mãe, não sei porque você vai pra casa da sua família”, “porque você vai estudar?”. Quer dizer, ele quer que a mulher fique em casa, com ele privando-a de tudo.

 

A que a senhora atribui esses números tão altos?
Considero 400 um número muito alto, mas não dá para a gente avaliar se houve um acréscimo ou se a mulher está sendo estimulada a denunciar. Eu acredito que a mulher hoje tem uma percepção maior do que seja violência, então é um bom sinal, ela já está identificando e já está se indignando com isso. Ela vê na mídia os exemplos de mulheres que estão morrendo e ela não quer ser a próxima vítima, então ela está vindo denunciar mais.

 

Existe um perfil de mulher que sofre esse tipo específico de violência?
Não, qualquer mulher está passiva a isso.

 

E sobre os agressores, existe um perfil predominante que comete esse tipo de crime?
Olha são vários, de todas as classes sociais, todas as profissões, todas as idades. Porque a violência contra a mulher é algo cultural, é machismo, então atinge a todos em todas as classes sociais e idades.

 

Qual o procedimento da delegacia ao detectar a violência psicológica contra uma mulher?
É feito um inquérito policial, essa mulher é encaminhada ao Centro de Referência Maria Quitéria onde ela pode receber ajuda psicológica, assistência social e o indivíduo pode chegar a ser preso por cometer algum crime contra a mulher. Às vezes o crime é perpetrado contra a mulher, mas as crianças podem ser vítimas indiretas da violência contra a mulher, independente da idade, nesses casos, o ECA protege essas crianças, isso acontece muito.

 

A senhora trabalha desde 2013 na Deam de Feira, de lá pra cá, é possível perceber um aumento no número de denúncias? A que a senhora atribui esse aumento?
Nós percebemos que a população agora acredita mais na rede de proteção à mulher. Ela tem demandado mais esse serviço, e por mais que essa rede de proteção atue, a gente percebe que temos que fazer cada vez mais, porque os exemplos estão aí, mulheres sendo mortas, assediadas e estupradas.

 

Como funciona a capacitação dos profissionais que irão lidar com as denúncias das mulheres violentadas?
Essa capacitação é periódica e constante e também temos um critério, só vem trabalhar aqui quem quer mesmo ajudar essa causa. O critério funciona também dentro das percepções de gênero, o problema do enfrentamento da violência contra a mulher não é o desconhecimento da lei, e sim a sensibilidade ao tema. Por isso, temos mais mulheres do que homens trabalhando. Não que isso seja garantia de alguma coisa, porque a mulher também pode ter um pensamento machista, mas há uma necessidade de termos mais mulheres do que homens.

 

Qual a maior dificuldade que a delegacia encontra para atender as mulheres?
A maior dificuldade é a demanda que é grande, e se faz necessário cada vez mais e mais um número maior de servidores. Por mais que a gente perceba que a administração pública tenha esse cuidado, recentemente foi implantado o plantão aqui em Feira de Santana, mas, mesmo assim, a dificuldade é de um serviço público como um todo.

 

Que medidas a senhora acha que poderiam ser implementadas para aumentar o número de denúncias e também a eficiência da delegacia?
Com uma sede para que seja implementadas as diretrizes de enfrentamento a violência contra a mulher, sala com espaço próprio, que estejam reunidos Departamentos de Polícia Técnica (DPTs), enfim, uma estrutura maior que já vem sendo implementada em outros municípios e acredito que seja implementada também em Feira de Santana.

 

No ano passado, foi implementada a Ronda Maria da Penha tanto em Feira de Santana como em outros municípios da Bahia, a Deam age em conjunto com a Ronda?
A Ronda acompanha a fiscalização das medidas protetivas, se o agressor está ou não cumprindo, assim deixa a mulher mais confiante e a gente, caso haja um descumprimento, fica mais rápido de tomar uma medida. A ocorrência policial, o crime, é aqui da Deam, mas a medida protetiva quem fiscaliza são eles. A presença da Ronda ajudou a melhorar a situação de violência aqui, toda força é bem vinda.