Mundurukus protestam em frente à COP30 contra plano de hidrovias do governo Lula
Por Danilo V., Jéssica M., João G., Tayguara R., Paola F. R. | Folhapress
A sexta-feira (14) amanheceu com um protesto de indígenas do povo munduruku em frente ao acesso principal da COP30, a conferência das Nações Unidas sobre mudança climática, em Belém (PA).
Eles querem a revogação do decreto que estabelece o Plano Nacional de Hidrovias, assinado neste ano pelo governo Lula (PT). O projeto inclui os rios Tapajós, Madeira e Tocantins como eixos prioritários para navegação de cargas.
"Chega de mercadoria com a nossa floresta", afirmou a líder Alessandra Munduruku à imprensa. "A COP tem [mais de] 190 países. Não é possível que alguém não vá nos ouvir. Não é possível que alguém não se sensibilize com essas crianças, que há dias e dias estão no sol quente esperando uma resposta. Não aceitamos ser sacrificados para o agronegócio."
Os manifestantes também pedem proteção contra grandes empreendimentos dentro do território e o cancelamento da Ferrogrão —projeto de ferrovia que vai de Mato Grosso ao Pará. Cerca de 40 pessoas participaram do ato pacífico, com a presença de muitas crianças.
Com a movimentação, o Exército brasileiro ocupou a entrada da COP por algumas horas, fechando o principal acesso à conferência. As pessoas credenciadas tiveram que entrar pela saída.
O presidente da COP30, André Corrêa do Lago, e a diretora-executiva da conferência, Ana Toni, dialogaram com os indígenas por volta das 8h30, pedindo a liberação da passagem.
Cerca de uma hora depois da chegada das autoridades da COP30, o ato foi dispersado. As lideranças indígenas foram convidadas para um encontro com as ministras Marina Silva (Meio Ambiente) e Sonia Guajajara (Povos Indígenas) e membros da Defensoria Pública do Pará.
Segundo Marina, foi o presidente Lula quem pediu às duas ministras que se reunissem com as lideranças indígenas para ouvir as demandas. Corrêa do Lago caminhou para o espaço da reunião de mãos dadas com Alessandra Munduruku, ao lado de Ana Toni, e seguido pelos outros manifestantes.
As duas ministras tentaram responder a algumas demandas dos mundurukis. Marina explicou, por exemplo, que o não há licença liberada para Ferrogrão, uma vez que o processo de concessão do aval está judicializado. Disse ainda que encaminharia às pastas de Transporte e de Minas e Energia as queixas sobre mineração em terras mundurukus.
Já a ministra Sonia explicou os trâmites da demarcação de terras indígenas de dois territórios. Um deles, segundo ela, está nas mãos da Funai, que trabalha na contratação de uma empresa para fazer a demarcação física. O outro ainda está com o Ministério da Justiça, que precisa liberar o seguimento para as próximas etapas.
Depois da reunião com as ministras, Alessandra Munduruku voltou a falar com a imprensa e reforçou a necessidade de que os indígenas sejam mais ouvidos. Disse ainda que estava esperando que as ministras falassem com o presidente Lula.
Após a dispersão da manifestação, a porta principal foi liberada, mas filas imensas haviam se formado. Como é praxe em espaços das Nações Unidas, revistas individuais são feitas em bolsas e mochilas, mas o processo é demorado. Perto das 11h, o acesso ao prédio da zona azul, onde acontecem as negociações diplomáticas, foi normalizado.
Na última terça-feira (11), um grupo de manifestantes invadiu a zona azul após participação em uma marcha sobre saúde e clima que ocorria nas ruas de Belém. Eles foram expulsos do local após confronto com seguranças.
O secretário-executivo da UNFCCC (o braço climático das Nações Unidas), Simon Stiell, assinou uma carta na quarta-feira (12) demandando que a proteção seja reforçada e que os problemas (como alagamentos e altas temperatura no ambiente) sejam resolvidos.
Na manhã desta sexta, a organização do evento chegou a emitir nota informando os participantes da COP sobre a situação. "Está ocorrendo uma manifestação pacífica na entrada principal da zona azul. Não há perigo", dizia o texto. O aplicativo oficial voltado a participantes da COP30 também enviou um alerta.
"Eles querem ser ouvidos na COP30. Eles estão em um situação de dificuldade. Querem também que seja combatida a exploração no território", afirmou o advogado da associação indígena Ipereg Ayu, Marco Apolo. "Apoiar as populações indígenas é apoiar a questão climática, ao menos aqui na Amazônia."
