Financiamento climático ao Brasil se concentra em poucos doadores, aponta relatório
Por Gabriel Gama | Folhapress
A maior parte do financiamento para ações de enfrentamento às mudanças climáticas no Brasil sai dos bolsos de poucos doadores, com 75% dos recursos provenientes de apenas dez instituições. É o que aponta um relatório divulgado no último sábado (8), durante um evento pré-COP30 em São Paulo.
Em média, o país recebeu US$ 208 milhões anuais (R$ 1,1 trilhão) de 2019 a 2023 em doações para projetos de mitigação (corte de emissões), de acordo com o levantamento do Instituto Clima e Sociedade (iCS) e do Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife), feito com apoio da ClimateWorks Foundation.
O valor não inclui empréstimos, investimentos do setor privado ou gastos governamentais domésticos.
A Iniciativa Climática Internacional do governo da Alemanha e a Iniciativa Internacional Climática e Florestal da Noruega concentram a maior parte das doações bilaterais, segundo o estudo. Nos repasses multilaterais, lideram o Green Climate Fund, ligado à ONU, e o Global Environment Facility.
O relatório identificou uma diminuição dos repasses na modalidade AOD (Ajuda Oficial ao Desenvolvimento), feitos na condição de auxílio internacional dos países. Os dados também mostram que as doações de filantropias aumentaram e se aproximaram dos recursos enviados por governos.
Maria Netto, diretora-executiva do iCS, diz que o cenário se deve ao estresse pelo qual passa a geopolítica mundial. "Estamos em um cenário de crise e guerras na Europa, então, naturalmente, os recursos de AOD passam a competir com recursos para pagar armamento e melhorar a defesa nos orçamentos internacionais, em particular de países que eram grandes donatários, como Alemanha e Inglaterra."
O fim das atividades da Usaid, a agência de ajuda internacional dos Estados Unidos, também contribui para a situação, de acordo com Netto.
"Isso naturalmente faz uma pressão para que o setor privado, seja nacional ou internacional, tenha um papel complementar, que não é ideal, porque o papel de AOD e das filantropias é distinto", diz.
"Normalmente as AODs vêm mais para as apoiar governos, e as filantropias deveriam estar focadas muito mais na sociedade civil, setor privado, na academia. Mas é natural que elas tenham que também apoiar um ecossistema que se fragilizou com a saída gradual do recurso público internacional."
A amazônia foi o destino de 80% das doações com localização geográfica. Os dados específicos para cada um dos demais biomas brasileiros serão divulgados no início de 2026.
"Mesmo dentro da amazônia, setores essenciais para uma transição duradoura permanecem notavelmente subfinanciados, como insumos fundamentais para a sociobioeconomia, incluindo energia limpa distribuída, indústria e transporte", diz o relatório.
O estudo identificou que 548 organizações receberam doações para projetos climáticos no Brasil, sendo que dois terços delas arrecadaram menos de US$ 50 mil por ano.
Para as entidades que assinam o relatório, a amplitude de organizações mostra a força da ação climática no Brasil, mas que vem ao custo de um montante menor repassado a cada uma delas. "Com um financiamento geral mais elevado, os diversos beneficiários de recursos climáticos do Brasil poderiam se sustentar e ampliar seu alcance e impacto", afirmam.
