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Cineasta Sylvio Back prepara filme sobre pornô no Brasil e mostra o seu lado poeta

Por Carlos Adriano | Folhapress

Cineasta Sylvio Back prepara filme sobre pornô no Brasil e mostra o seu lado poeta
Foto: Reprodução

"Para mim, fotogramas embutem epigramas. Versos e 'takes' comungam a mesma invisibilidade, esse apelo ao outro lado da imagem e da palavra. O poema antevê o cinema!" É dessa forma que o cineasta catarinense Sylvio Back define o elo entre a poesia e o cinema.

Diretor de clássicos e polêmicos do cinema nacional -"Lance Maior", "Aleluia, Gretchen", "República Guarani", "Radio Auriverde" e "O Contestado: Restos Mortais" são alguns deles--, ele diz acreditar na conciliação entre as duas artes, "como se, aparentemente, poema e cinema dormissem juntos e jamais tivessem trocado algum afago".

Aos 83 anos, ele lança no mês que vem "Silenciário", pela Universidade Federal de Santa Catarina. Com um núcleo de 35 poemas inéditos, é um compêndio, na íntegra, de uma das duas vertentes de sua poesia, com livros de 1988 -"Moedas de Luz"- a 2014 -"Kinopoems".

A outra vertente é a poesia erótica, reunida em "Quermesse", de 2013. Na esteira dos contos de "O Himeneu", lançados há dois anos, ele prepara agora "Tesão Não Tem Idade", seleta de poemas lúbricos para a editora Escombros.

"Logrei demarcar territórios, onde Eros e Tânatos trocam figurinhas e versos para encantar ou desencantar o leitor", diz o autor. "Sem premeditar, produzi uma obra anfíbia. Uma ancorada no fescenino [gênero de versos populares e indecentes, muito cultivados na Roma Antiga], e outra, fruto de influxos da alma ferida diante dos reveses que pavimentam a vida, a obra e a sobrevida de um cineasta no Brasil."

"Silenciário" reúne livros como "Yndio do Brasil: Poemas de Filme", de 1995, "Traduzir É Poetar as Avessas", de 2005, com versões do poeta negro Langston Hughes, e "Kinopoems", de 2006, sobre figuras que apareceram em seus filmes --caso dos poetas Cruz e Sousa e Paulo Leminski e do pintor Miguel Bakun.

"Leitor voraz e veraz de poesia", com uma estante dedicada ao gênero maior do aquela de livros de cinema, Back começou a escrever poemas aos 48 anos, depois de 20 filmes. Dos poetas de preferência, lembra Drummond, Bandeira, Cabral, Augusto de Campos, Auden, Cummings, Emily Dickinson, Sá-Carneiro, Breyner Andresen, Bashô, Wang Wei e Lezama Lima.

Back imagina uma arqueologia do verso. "Quem sabe o poema nasceu rupestre, onde nas pinturas das cavernas podemos identificar tanto uma estrofe visual como uma imagem em movimento", diz.

Segundo ele, filmar é como poetar e vice-versa. Tem pesquisado em acervos de Brasil, Portugal e Itália um novo filme sobre Murilo Mendes, autor de "A Poesia em Pânico".

"Não sou um poeta de sentimentos, mas de pressentimentos. Filme sem poesia é filme sem alma", afirma, ao comentar a escassa magia no ofício que, em vez de lápis e papel no ato solitário, implica indústria onerosa e labor coletivo.

Mas artes irmãs são ímãs. "Cada poema e cada plano filmado resumem tamanho investimento formal e exorcização moral que sempre soam como o último. Como se a musa jamais fosse voltar à cena do crime."

A obscena situação no país provoca o cineasta. "Quando as circunstâncias pisam nas minhas convicções humanistas, invisto num poemário antiutópico. Vivemos constantemente numa tremenda ressaca moral, por esperar o que jamais virá", diz, recitando um verso de "Silenciário" -"a esperança é grotesca".

A coincidência do começo de sua poesia com a dicção erótica "foi como um espanto existencial". Há 35 anos, intimado por "incontornável tragédia familiar" em 1986, fez versos "eivados de viço e isentos de vício", que o alforriaram "do preconceito contra o licencioso", na comitiva de Safo, Catulo, Ronsard, Bocage, Bernardo Guimarães e António Botto.

Um verso de Gregório de Matos dá título a um roteiro inédito, segundo ele "impossível de habilitar a recursos incentivados". Flor de vasta colheita em cinematecas, "Não Existe Pecado do Lado Debaixo do Equador" seria a estreia de Sylvio Back na seara do filme erótico.

"Uma colagem lúdica e explícita do cinema pornô do Brasil desde que surgiu, praticamente junto com a própria introdução do cinema entre nós". Afeito a um cinema de confronto, o bardo não se conforma ao conforto silenciário.