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Marca Bahia Notícias

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Do kit gay ao vídeo da suposta autópsia do miliciano: onde erramos?

Por Fernando Duarte

Do kit gay ao vídeo da suposta autópsia do miliciano: onde erramos?
Foto: Reprodução/ TV Globo

E pensar que quando falávamos sobre mamadeiras de piroca, achávamos ser uma piada de mau gosto. Tem sido cada vez mais frequente a quantidade de vezes que me questiono como trataremos desse período histórico do Brasil no futuro. Junto com o “kit gay”, a mamadeira de piroca pareceu inofensiva no anedotário das guerrilhas políticas no país. Passado algum tempo da emergência dessas notícias falsas, é impossível se desvencilhar da ideia de que éramos felizes e não sabíamos. Enquanto cidadãos comuns seguem como animais em zoológico, em constante exposição, homens públicos surpreendem por suas inúmeras atitudes irracionais.

 

A terça-feira foi marcada, mais uma vez, pelas polêmicas envolvendo a morte do miliciano Adriano Magalhães da Nóbrega. Morto no dia 9 de fevereiro em uma operação da polícia baiana, o corpo do ex-PM fluminense ainda está sob custódia do Instituto Médico Legal do Rio de Janeiro. Um duelo de versões, envolvendo a Bahia e a família do presidente Jair Bolsonaro, segue sendo travado nas redes sociais. Enquanto isso, a família do miliciano segue sem o direito ao luto, com o corpo dele exposto nos mais diversos canais de comunicação - sem qualquer constrangimento para os responsáveis pelas publicações.

 

As imagens mais chocantes aparecem no vídeo da suposta autópsia de Adriano, divulgado pelo senador Flávio Bolsonaro. Para quem empregava até 2018 a mãe e a ex-esposa do ex-policial no gabinete da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), o filho mais velho do presidente não pareceu tão preocupado assim com as consequências da promoção da dúvida “quem mandou matar Adriano?”. Não que essa eventual possibilidade não seja importante. Apenas não faria parte do noticiário se não parecesse uma cortina de fumaça, a esconder as citadas ligações entre eles.

 

O vídeo, inclusive, repercute no mesmo dia em que o apresentador de televisão Luiz Bacci teve que se “retratar” publicamente após exibir, ao vivo, o momento em que uma mãe descobre que a filha foi assassinada pelo namorado. A linha do que é notícia e do que é mau gosto é muito fina e parece que estamos dispostos a ultrapassá-la sem demonstrar qualquer sinal de remorso. Seja por opção da imprensa ou até mesmo por autoridades públicas que não escondem a predileção pelo bizarro em troca de manter uma narrativa. Vide o vídeo do “golden shower” do Carnaval passado.

 

Em dias assim, tenho saudades do que ainda não vivi. Aquele momento em que eu contaria rindo que a mamadeira de piroca e o kit gay não passaram de um surto de histeria coletiva, que foi rapidamente superado. Pena que a realidade é muito mais dura e cruel. Que somos obrigados também a sofrer como a mãe da garota que descobriu pela televisão que a filha foi assassinada. E a família de Adriano, que, independente do que ele tenha feito na vida, merece ter o direito ao luto. Talvez não vivamos como animais em um zoológico, mas em um manicômio imersos na loucura.

 

Este texto integra o comentário desta quarta-feira (19) para a RBN Digital, veiculado às 7h e às 12h30, e para as rádios Irecê Líder FM, Clube FM, RB FM, Valença FM e Alternativa FM Nazaré.