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Marca Bahia Notícias

Notícia

A fé a serviço da morte

Por Fernando Duarte

A fé a serviço da morte
Igreja repleta de fieis no domingo de Páscoa | Foto: Reprodução/ YouTube

Era para ser um período de reflexão religiosa, em uma das maiores nações cristãs do mundo. Porém uma briga por poder e influência gerou uma batalha sobre o funcionamento de atividades religiosas às vésperas da Páscoa, quando se celebra a ressurreição de Jesus Cristo. O mártir cristão foi, ao invés de celebrado, usado de maneira vã e até mesmo desrespeitosa para tentar justificar a sede de líderes religiosos que parecem pouco afeitos à fé original. Na verdade, parecem mais mensageiros da morte.

 

O ministro Kássio Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), acolheu no sábado de Aleluia um pedido de liminar para autorizar o funcionamento presencial de templos religiosos. O argumento é que se trata de um "serviço" essencial, por permitir acolhimento em momentos tão duros como o da pandemia. Eis que aí temos um dos graves problemas do Brasil recente: a fé passou a ser um serviço, não muito diferente daqueles prestados por empresas e corporações. O mercado da fé movimenta milhões e mobiliza milhões ao tempo em que falsos profetas enriquecem as contas das igrejas.

 

Esse movimento não chega a ser novo. A Igreja Católica, ainda na Idade Média, usou e abusou desse artifício para justificar massacres e concentração de riquezas. A diferença entre aquele momento e o atual é que, em tese, as trevas já não mais estariam sobre as mentes das pessoas. Ledo engano. Há tanto obscurantismo agora que não precisa ser um expert em teologia para identificar a subversão dos valores cristãos em nome dos interesses privados de mercadores de terrenos no céu. O ministro do STF foi apenas um instrumento dessa fé que violenta os próprios ensinamentos deixados de legado pelo filho de Deus - para manter a nomenclatura que facilite o entendimento.

 

Abrir igrejas em um contexto de recrudescimento da pandemia, por mais que se imponha um limite, é uma opção temerária, para não tratar como fatal. Há muito faltava força da política para enfrentar essa bancada que impõe valores não-cristãos como se fossem eles eleitos por Deus para disseminar uma única verdade. Agora, com anuência do Judiciário, fica difícil estabelecer a linha que separa a religião e o Estado brasileiro. Somado ao aval da sociedade, que prefere se omitir, vivemos numa época em que a escuridão parece ser o único caminho possível.

 

A fé é um ato individual e inabalável. O respeito à liberdade religiosa perpassa por entender que o ato de ligar o homem a Deus é algo que não impõe nenhuma regra. Mas que também nos obriga a conviver em sociedade com respeito às leis que nos protegem de mercenários da fé. Infelizmente a fé que salva, no Brasil, é capaz de matar.

 

Este texto integra o comentário desta segunda-feira (5) para a RBN Digital, veiculado às 7h e às 12h30, e para a rádio A Tarde FM. O comentário pode ser acompanhado também nas principais plataformas de streaming: Spotify, Deezer, Apple Podcasts, Google Podcasts e TuneIn.

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