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Entrevista

Cássio Peixoto fala sobre o impacto do programa Água Para Todos - 15/02/2016

Por Fernando Duarte / Rebeca Menezes

Cássio Peixoto fala sobre o impacto do programa Água Para Todos - 15/02/2016
Fotos: Cláudia Cardozo/ Bahia Notícias

Cássio Peixoto já trabalhou no Ministério da Agricultura e foi presidente da Bahia Pesca. Seu currículo fez com que ele fosse escolhido para assumir, no final de 2014, a recém criada Secretaria de Infraestrutura Hídrica e Saneamento, que já nascia com um grande desafio: levar água potável e saneamento básico para milhares de baianos, principalmente no interior. Na entrevista ao Bahia Notícias, Peixoto fala sobre o impacto do programa Água Para Todos, dos desafios enfrentados durante a grave estiagem pela qual a Bahia passou nos últimos anos e sobre as principais fontes de desperdício de água no estado.

A secretaria foi criada durante a reforma administrativa do governador Rui Costa, no final de 2014. Como foi participar da estruturação dessa nova pasta e definir as prioridades dela? Qual foi o maior desafio até agora?

Primeiro foi assegurar água e saneamento. Porque água é um direito de todos, é constitucional. Por isso, era necessário dar segurança hídrica para se garantir a saúde da população. Portanto, a secretaria foi criada para unificar as diversas ações que estavam dispersas em outras unidades do governo. Era necessário ter um comando único. O esforço maior do governo tem sido na educação e na saúde. Mas não adianta se ter tantos investimentos em clínicas, UPAs e hospitais enquanto você não oferecer o produto básico, que é a água potável e de qualidade, que possa impedir que as pessoas tenham endemias provocadas por água mal tratada. Então se tratando do básico, isso vai refletir mais adiante nos aspectos da política de Estado. Esse é um desafio não só pra Bahia, quanto pro Brasil e até pro mundo. Hoje, mais de 768 milhões de pessoas não têm acesso a água potável. Mais de 2,5 bilhões não esgotamento sanitário no mundo, dos quais 71% se concentram nas zonas rurais - o que também é um desafio para a Bahia. Além disso, 1,5 milhão de crianças morrem por conta de doenças, principalmente a diarreia, por conta da falta de água tratada e do esgotamento sanitário. Nós estamos quase atingindo a sanealização quando se fala em água, mas o esgotamento sanitário exige o ombreamento. Então esse é o grande desafio que nós temos pela frente. E pra isso, nós estabelecemos alguns objetivos estratégicos. O primeiro é a sustentabilidade hídrica do estado. Porque 70% do estado hoje está no semiárido, o que significa uma linha de pobreza extrema e a necessidade de uma atenção especial. E a oferta de água, com qualidade e potabilidade é também algo estratégico. O segundo é universalizar o abastecimento de água. Nós estamos muito próximos nas áreas urbanas, mas precisamos também adentrar a zona rural para obter essa universalização.


O programa Água Para Todos foi lançado pelo governo do Estado no início da gestão de Jaques Wagner. Qual foi o impacto dele para o sistema de abastecimento da Bahia?
O programa Água Para Todos praticamente deu uma reviravolta nessa questão. Pra se ter uma ideia, no governo Wagner, mais de R$ 8 bilhões foram investidos em água e esgotamento sanitário. Portanto, se você pegar o panorama, vai ver que a Bahia teve 31%, enquanto o Nordeste teve 22,2% em termo de atendimento de esgoto. Em coleta de esgoto, a Bahia teve 52,34% contra 34,17% do Nordeste. Em tratamento de esgoto, a Bahia superou o Brasil. Tudo isso graças ao programa, que foi mantido pelo governador Rui Costa. O Água Para Todos trouxe um novo horizonte. É um programa revolucionário, com uma matriz sólida, e que está servindo de inspiração por outros estados. Se nós pegarmos último ano antes da gestão de Wagner, nós saltamos de 2,3 milhões de ligações de água em 2006 para 3,391 milhões de ligações. Um aumento de mais de 47% nos sistemas, seja ligados à Embasa ou à Companhia de Saneamento (Cerb), sejam os dos próprios municípios. Só em 2015 nós tivemos 135 mil ligações de água, atingindo 426 mil habitantes.
 

 
Qual o papel das gestões municipais no programa?
Os municípios estão precisando de apoio do Estado e da União, porque o Pacto Federativo hoje existente precisa ser repensado. Os municípios são importantes porque são o órgão concedente do processo. É ele quem concede o poder de fazer a gestão da água e do esgotamento.


E em relação ao esgotamento sanitário?
Em 2006, nós tivemos quase 500 mil ligações de esgotamento sanitário. Em 2015, isso pulou pra 1,082 milhão de ligações - um aumento de 118%. Cada real investido em esgotamento sanitário, você economiza R$ 4 em saúde. Portanto vamos ter menos ocupação nas UPAs e clínicas. É o que o governador sempre diz: hospital é pra quem tá doente. Investir em prevenção, você diminui os índices de endemias.
 
A crise econômica prejudicou as ações do programa?
Em 2015, nós projetamos 100 mil novas ligações e batemos 82,9% da meta. Foi um ano difícil. Cerca de 40% dos orçamentos estão ancorados basicamente no Orçamento Geral da União (OGU) e vivemos uma crise sem precedentes. Mesmo assim, nós conseguimos atingir um número muito positivo. Em 2015, nós investimos mais de R$ 700 milhões em água e saneamento básico. No balanço geral, o Água Para Todos beneficiou quase 3,3 milhões de baianos. Mas claro que é uma situação preocupante. Do que foi gasto no ano passado, quase 56% foi de recursos federais. E a tendência do OGU hoje é de ser reduzido. Portanto, a missão é dialogar com o governo federal, de buscar os ministérios de Integração, das Cidades, bater em todas as portas. Nós temos que levar projetos.
 
E os recursos do Estado?
Os recursos próprios praticamente são os recursos da Embasa. Do total, 25% veio da empresa, 7% dos cofres do Estado e 6% do Fundo de Combate à Pobreza. Mas em uma conversa com o governador, nós já discutimos a importância de aumentar o valor que vem do fundo para dar seguimento ao programa. Porque não adianta o fundo ajudar a agroindústria, o laticínio, todos os seguimentos, se não tiver a base de tudo, que é a água.
 
Isso é viável? Não precisa ser feito um projeto?
Sim, é viável. Não há Projeto de Lei. O escopo do fundo é muito claro pra atender principalmente a linha de pobreza e, dentro desse aspecto, a água e esgotamento sanitário são fundamentais.
 
Muito se fala ainda sobre o desperdício de água. Qual é o ponto mais crítico em relação a isso?
Hoje, o que mais consome é a irrigação. Se você pegar a pirâmide do uso de água, 10% é usado para abastecimento urbano, 20% para a indústria e 70% está vinculado à irrigação. Eu não estou criticando a prática, mas estou provocando o debate para uma irrigação racional. Porque ainda se observa no estado uma irrigação por inundação. Você não tem pivôs centrais, como já existem no Oeste hoje, uma modernização tecnológica do sistema de irrigação. E é isso que nós estamos tentando fazer com a Secretaria de Agricultura. Porque sem modernizar, nós vamos ter ainda muitas perdas de água na Bahia. Além disso, estamos revisando o processo de outorga, porque ele limita muito o acesso à água. Se torna um processo cartorial.
 
Você já trabalhou no Ministério da Agricultura, na Secretaria de Agricultura da Bahia e foi presidente da Bahia Pesca. Como a sua trajetória te ajudou a gerir a SIHS?
Claro. Isso me permitiu ter uma visão da importância do seguimento para o setor. E isso também me conscientizou. Porque hoje nós estamos em outro diapasão. A balança comercial do país está ancorada na Agropecuária. E passar por essas instituições foi um aprendizado.
 
 
O Rio São Francisco tem enfrentado problemas graves nos últimos anos, que tem refletido nos reservatórios das hidrelétricas e, consequentemente, na geração de energia. Como você vê essa questão?
O Velho Chico é uma realidade. Ele precisa ser revitalizado e isso é uma bandeira nacional. Inclusive, preciso ressaltar a participação do senador Otto Alencar (PSD), que tem brigado e muito por essa revitalização. E pra nossa satisfação, a SIHS e a Secretaria de Meio Ambiente (Sema) ganharam o primeiro edital para contribuir com o processo de reflorestamento de nascentes com mudas nativas. Nós teremos que montar viveiros em áreas estratégicas, com mudas nativas, para recuperar as nascentes e ter uma garantia de oferta de água por muitos e muitos anos. Esse será um passo significativo para assegurar o Rio São Francisco e principalmente seus afluentes. Mas o Velho Chico não é o único. Nós temos o Rio Paraguaçu, que nasce e morre na Bahia e que, se não tivermos cuidado, também teremos um problema de assoreamento muito grave.
 
Existem outros projetos da SIHS que estejam em curso?
É preciso inovar o sistema. Por isso nós já alinhamos com o governador sobre a necessidade de termos um Plano Estadual de Segurança Hídrica e um Plano Estadual de Segurança de Barragens. A Bahia hoje tem 304 barragens, sendo 54 do governo federal, 54 do governo do Estado e as outras estão dispersas sem um controle rígido e efetivo e sem monitoramento. Isso implica em risco iminente. O caso de Minas Gerais é modelo não só para o Brasil, mas para o mundo. Por isso estamos fazendo esse mapeamento e agregando tecnologia a esses equipamentos.

A Bahia iniciou 2016 com um grave problema de estiagem, que prometia comprometer os recursos hídricos do Estado. As fortes chuvas foram suficientes para reverter o quadro de baixo reservatório das barragens?
As recentes chuvas nos deram uma tranquilidade no armazenamento. Nós discutimos, há cerca de 30 dias, a situação de seca do Estado. Para isso, o governador colocou o Comitê da Seca, que ele já vinha coordenando desde quando era chefe da Casa Civil. Então nós vínhamos discutindo esse projeto de combate à seca. Esse processo exigiu intervenções imediatas. Sobradinho foi o primeiro a ter o alerta detectado. A nossa pasta alocou aproximadamente R$ 600 mil em bombas e tubulações. O lago estava se distanciando das comunidades. Quando o governador viu nossa ação proativa, ele liberou R$ 4,5 milhões dos cofres do governo para que pudéssemos fazer uma cobertura maior, não só nos municípios às margens de Sobradinho, mas nos 152 municípios que decretaram emergência pela seca. E agora estamos discutindo os efeitos da chuva. Pra se ter uma ideia, Pidobaçu está com 100,73% de capacidade de armazenamento. Ponto Novo, que estava no limite também, já ultrapassou a marca de 100%, assim como Pedras Altas. Apertado saiu de 18% para 40%. Bandeira de Melo saiu de 79% para 121%. São José, que é uma das maiores barragens que temos no estado, vai asseguras essa garantia de água até o fim do ano pelo menos. Então agora nós estamos trabalhando para aumentar a capacidade de acúmulo de água em Pedra do Cavalo. A média hoje das barragens do estado está entre 80% e 100%. A intenção do governo, agora, é que a Cerb seja o órgão operador de todas as barragens do estado, pra que a gente tenha um caminho único. Não é papel da Embasa cuidar de barragens. Mas pra recuperarmos isso, é preciso que haja sensibilidade do governo federal.
 
O senhor tem um perfil técnico na função de secretário. Porém, não deixou de ser uma indicação política para o cargo, no caso do Partido Progressista (PP), que é citado como um dos mais envolvidos nos escândalos investigamos pela Operação Lava Jato. Você chegou a trabalhar no Ministério das Cidades, com o então ministro Mário Negromonte, e foi exonerado após algumas polêmicas. A indicação do PP deixa você de certa forma tenso?
De forma nenhuma. Primeiro porque sou técnico por origem, sou concursado do Ministério da Agricultura, fui galgado ao cargo por ter passado por lá, e tive o prazer de ser chefe de gabinete do ministro Negromonte. O PP está sim no hall desse processo, não só nessas operações, mas não só o PP. Há uma gama de partidos envolvidos nesse processo. Mas eu acredito que é preciso mudar o modelo político do sistema eleitoral do país. Porque o financiamento privado de campanha propicia aqueles que estão já com tendência de fazer mal uso do dinheiro público. Me sinto orgulhoso de ser filiado ao PP, porque reconheço na legenda quadros extremamente qualificados, inclusive Mário Negromonte, que hoje é conselheiro do Tribunal de Contas dos Municípios, ou o nosso vice-governador, João Leão. Até o momento não temos indiciamento nenhum, em processo nenhum da Lava Jato ou de qualquer outra operação. O episódio que você citou do Ministério das Cidades foi puramente político. Não tive participação nenhuma, sequer fui ouvido pelo Ministério Público para qualquer depoimento. O processo que deu origem a essa discussão nem chegou de forma protocolar ao gabinete. O que houve foi uma briga política, dentro do próprio partido, e que às vezes a área técnica sai prejudicada. Mas ainda assim me sinto extremamente confortável em servir ao partido e principalmente ao governo.